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sábado, 14 de dezembro de 2013

Resiliência e uma negra no aeroporto de Frankfurt

09/12/2013 - Sobre resiliência, o direito à felicidade e ser mulher negra no aeroporto de Frankfurt
- Viviana Santiago para o site Blogueiras Negras

Segundo a física, a resiliência é uma certa particularidade apresentada por alguns corpos, de após sofrerem uma deformação, voltar a sua forma original. 

Em linguagem figurada seria aquela habilidade de fazer do limão, uma limonada e quem trabalha no terceiro setor, sobretudo com os chamados grupos em situação de vulnerabilidade e risco social e/ou pessoal sabe que essa palavra faz parte do repertório de ensinamentos.

Falar de resiliência significa evocar aquela capacidade que nós todas, pessoas em alguma situação de vulnerabilidade, devemos possuir, ou ser apoiadas na construção: uma capacidade que nos possibilitaria transformar cada situação ruim vivida, numa situação positiva, a partir de nossa competência de re-significar e seguir em frente.

Há alguns meses, eu, Viviana, negra-mulher-nordestina-pedagoga e mãe fui à Áustria participar de uma reunião de trabalho: atuo na defesa de direitos de crianças e adolescentes, assim como de mulheres e famílias em situação de vulnerabilidade, dentre outros aspectos, defendo a ideia de promoção, proteção, defesa e garantia do direito a convivência familiar e comunitária para todos esses grupos; e nesse contexto fui convidada a ser stakeholder para um processo de elaboração de uma política global.

Meu voo para Áustria deveria fazer antes uma escala em Frankfurt [foto], vocês já imaginam a cena: avião lotado de brasileiras e brasileiros, mulheres e homens desembarcando naquela correria, muitos passageiros habitués, outras pessoas de primeira viagem chegando à Europa, e eu: com aquela sensação de, ainda sob o impacto de tantas vozes, tantas línguas, tantos rostos diferentes, sentir-me num espaço global – o aeroporto de Frankfurt é gigantesco - vendo todo mundo e pensando curiosamente como estaria sendo vista. (Não tardaria em descobrir…)

Na fila da imigração, havia dezenas e dezenas de brasileiras e brasileiros, também muitas mulheres e homens também de outros lugares do mundo, muitos e muitos orientais, mas por uma daquelas coincidências do destino: a única mulher negra ali era eu.

Chegando minha vez de apresentar o passaporte, um jovem me atendeu e extremamente rude, me pergunta num inglês - muito mal falado - para onde vou e o que vou fazer.

Explico que vou prestar uma consultoria sobre gênero, para uma ONG internacional – muito conhecida na Europa -, ele me faz uma pergunta que não consigo entender e peço que repita.

E ai começa o show de humilhações, grosseria e maus tratos: mostro todos os papéis, os convites, meu currículo e ele, sempre me olhando de cima a baixo, com especial atenção para meu cabelo, minha boca e minha bunda; ele rejeita tudo que eu falo, fazendo de conta que não entende, e em alemão, partilhando com o companheiro do guichê ao lado, comentários jocosos a meu respeito.

Somos todas mulheres! escuto  vozes em minha cabeça, daquelas pessoas que querem destituir as nossas lutas e diminuir a importância da abordagem das interseccionalidades com a afirmação de que somos todas iguais…, mas quando olho para o lado, vejo as outras mulheres caminhando livremente apresentando seus passaportes e seguindo em frente, enquanto somente eu: a negra, estou retida.

Somos todas mulheres! escuto mais uma vez, mas percebo que somente eu, mulher-negra, em meio a todas aquelas mulheres, estou tendo que justificar exaustivamente o que faz uma mulher negra indo para Áustria.

Somos todas mulheres! mas só sobre mim recai o estereótipo da mulata e da prostituta…

E eu fico pensando nessa experiência…

Pensando, entristeço e recordo que partilhei com as amigas e amigos e ouvindo de todas: puxa, que pesado! Vixi que perverso!

Mas em seguida, sempre a continuação: ainda bem que você é uma mulher resiliente! Seja resiliente, faça dessa situação uma limonada, aprenda com isso!

E continuam quando eu digo que em mais alguns meses estarei lá novamente: isso Vivi, seja resiliente! Você tem que aprender a lidar com isso!

Sem desmerecer nenhum pouco a importância de darmos a volta por cima, venho sinceramente dizer que eu não quero Ter que Ser Resiliente!

Eu não quero Ter que fazer uma limonada! Eu quero é ser feliz!

Porque felicidade e ser tratada dignamente é um direito.

Aceitar que devo ser resiliente, nesse e em muitos contextos é aceitar como natural que essa e outras violências vão acontecer e vão se repetir, é aceitar que elas estão determinadas, dadas e irrevogáveis.

Penso na minha experiência de ser menina, jovem, mulher e mãe negra…

Não é isso que escutamos quando naturalizam que nós aguentamos dor por isso não recebemos anestesia? Seja forte! Você consegue!

Quando naturalizam que nós somos fortes por isso trabalhamos sempre a mais.

Que nossa pele não queima, por isso ninguém nunca passa protetor solar ou dá um bonezinho para as crianças negras da educação infantil quando vão ao parquinhos.

Somos fortes, e se algo de ruim acontecer seremos resilientes.

Não quero mais ouvir as pessoas me mandando ser resilientes, quero sim, saber, quando as pessoas vão me dizer, (a mim e a todas as outras mulheres negras): vocês têm o direito de serem tratadas dignamente, espero que isso não aconteça mais.

Muitas vezes quando escuto o discurso do “be posisitve!” consigo perceber uma ausência de problematização: porque, ao mesmo tempo em que dizemos que as pessoas devem ser capazes de se recuperar de violências, por que também não defendemos o direito das mesmas a uma vida sem violência?

Sejamos resilientes, mas antes de tudo não sejamos mais violentadas.

Não sejamos mais tratadas como objetos.

Não admitamos nem nos conformemos com essas violências que se repetem. Mudemos esse repertório!

É isso que estou pensando agora.

E é isso que levarei comigo, quando for mais uma vez a mulher negra no aeroporto em Frankfurt.

Fonte:
http://blogueirasnegras.org/2013/12/09/resiliencia-direito-felicidade-mulher-negra-aeroporto-frankfurt/

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

domingo, 28 de julho de 2013

A Amazônia pode mesmo virar cerrado?

27/07/2013 - extraído do site Saber Global

Segundo especialistas, a maior floresta tropical é capaz de resistir com bravura às mudanças climáticas. A questão é até quando?

As teorias sobre os feitos das mudanças climáticas e o aquecimento global na Amazônia são muitas.

Em 2000, o meteorologista Peter Cox lançou um estudo de grande repercussão, que previa que a Amazônia poderia secar até 2050. A possibilidade foi reforçada anos depois por estudos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e da Ong conservacionista WWF.

Em 2007, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) também considerou que uma área entre 10% e 25% da maior floresta tropical do mundo poderia virar cerrado até 2080.

Segundo Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), membro do IPCC e do Experimento de Larga Escala da Biosfera e Atmosfera da Amazônia (LBA), o primeiro estudo de Peter Cox baseou suas previsões em um único modelo climático que, se considerasse a taxa de precipitação da Amazônia atual, chegaria a um índice 30% abaixo do real.

“Se você propaga essa diferença para um aumento de temperatura de 3 a 4 graus nos próximos 50 anos, você não precisa nem ser modelador climático pra prever o resultado: a floresta morre”, afirma o cientista.

Floresta é mais resistente do que se esperava

Em fevereiro deste ano, outro estudo publicado pela Nature, assinado pelo próprio Peter Cox e por cientistas como o espanhol José Marengo, pesquisador do Inpe, trouxe a tona uma teoria conhecida como “Resilience” (“resiliência”, no português).

A pesquisa se baseia em 17 modelos climáticos e explica que os danos originados pelo aumento de CO2 na atmosfera – causado pelo desmatamento e queima de combustível de fósseis – serão minimizados pelo poder fertilizante do dióxido de carbono nas plantas.

Artaxo explica que a Amazônia atua hoje como um sumidouro de CO2 e absorve cerca de 0,9 toneladas de carbono por hectare ao ano.

Não quer dizer que a floresta está imune. O grande risco estudado pelos especialistas é que com as mudanças climáticas e a seca, as plantas entrem em estresse hídrico, deixem de fazer fotossíntese e percam biomassa, liberando carbono. Isso, além de causar um enorme dano à camada de ozônio, faria com que a floresta secasse.

O LBA, durante oito anos, realizou experimentos de exclusão de chuva nas regiões de Caxiuanã e Santarém, na floresta amazônica. Imensos painéis de plásticos foram colocados sobre as copas das árvores para coletar a água que cairia no ecossistema.

A descoberta foi que as florestas dessas regiões são resistentes a uma seca sazonal por um ou dois anos, mas começam a morrer depois de quatro anos.

Elas tem uma resistência natural. Conforme tem uma seca, a planta aprofunda suas raízes e tira água de lugares profundos, mas tem um limite pra elas fazerem isso”, afirma o físico.

E quando chega ao seu limite, a floresta começa a perder biomassa. Isso também pode ser comprovado nas secas de 2005 e 2010, onde houve redução significativa na absorção de carbono pelas plantas, o que prejudica seu crescimento. Pior, com a morte das árvores, além de se reduzir a absorção de CO2, uma quantidade extra do gás é liberada na atmosfera pela decomposição.

Até quando a floresta aguenta?

O que a teoria da resiliência vem mostrar é que, ainda que os efeitos nocivos das mudanças climáticas levem à liberação de bilhões de toneladas de carbono acumulados em terras tropicais, o dióxido de carbono estimularia o crescimento da floresta, levando a um aumento de até 319 bilhões de toneladas de carbono armazenado até o fim do século. Ou seja, as plantas continuariam acumulando CO2.

O pesquisador José Marengo explica que, dessa maneira, mesmo que a floresta fosse afetada, ela não entraria em colapso a ponto de secar. “Há possibilidades dela se transformar em outro tipo de vegetação”, explica.

Mas o cientista deixa claro que a fertilização por CO2 tem limites.

“A partir de um certo ponto, o CO2 não ajuda mais no crescimento da floresta”, explica.

Por isso, o que pode acontecer depois que o nível de dióxido de carbono chegar à sua saturação, ainda é imprevisível. O estudo se baseia em modelos climáticos com cenários até 2100.

Além disso, o estudo tem outras ressalvas. Marengo explica que a pesquisa não levou em conta outros gases do efeito estufa – como o metano -, e a capacidade de absorção de nutrientes do solo pelas plantas, um fator primordial para o crescimento da floresta.

O pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) Paulo Brando também aponta algumas incertezas

Mesmo com o aumento na concentração de CO2 na atmosfera, o crescimento que árvores pode ser restringido por outros nutrientes, principalmente o fósforo, que é escasso nos trópicos”, alerta. Segundo ele, estudos mostraram que o nitrogênio teve esse efeito em florestas temperadas, e o composto é abundante em florestas tropicais.

Ele também conta que não há estudos sobre os efeitos de fertilização de CO2 na dinâmica de florestas tropicais, e que todo o conhecimento sobre esse assunto vem de experimentos teóricos ou realizados em laboratórios.

Os resultados da pesquisa devem ser interpretados como hipóteses interessantes e importantes, mas que devem ser testadas com a utilização de diferentes técnicas”, ressalta.

Exame.com

Fonte:
http://saberglobal.com.br/?p=1494

Nota da editora do Blog: Segundo alguns cientistas, o IPCC manipula dados dos países em desenvolvimento para impor políticas ambientais de interesse dos países hegemônicos. Além disso, o nosso grande geógrafo Aziz Ab'Saber  não concordava com essas análises. Certa vez,ele me disse em uma entrevista que a Amazônia já teve uma vegetação de savanas. Argumentava que para a manutenção da Amazônia era fundamental a preservação do biodiversidade, incluindo a cultura dos povos originários. Por isso, defendia um Código da Biodiversidade e não apenas um Código Florestal como tínhamos.

domingo, 7 de abril de 2013

A resiliência (*) das ideias de Karl Marx

02/04/2013 - por Fred Weston
- extraído do site Esquerda Marxista - da Seção Brasileira da Corrente Marxista Internacional

Quantas vezes ouvimos professores universitários, economistas, políticos e jornalistas declarando que Marx estava errado e que, embora tenha tido algumas percepções de como funciona o capitalismo, fracassou em ver o dinamismo do sistema capitalista e sua capacidade de se recuperar das crises e ir em frente?

No entanto, alguns anos depois, enquanto o sistema mergulha na mais séria crise da história, de vez em quando se ouve comentaristas declarando que Marx estava certo.

O mais recente é um artigo publicado pelo Time Magazine ontem [01/04/2013], intitulado A Vingança de Marx: Como a Luta de Classes se alastra pelo Mundo.

As frases de abertura dos primeiros três parágrafos são: “Supunha-se que Karl Marx estivesse morto e enterrado... Ou era o que pensávamos... Um crescente volume de evidências sugere que ele pode ter acertado”.

O primeiro parágrafo nos informa porque se supunha que Marx estivesse morto e enterrado: o colapso da União Soviética, o abrandamento da luta de classes, a expansão do comércio global, o boom asiático, e assim por diante.

O segundo parágrafo, no entanto, enfatiza a prolongada crise que está afligindo o sistema, causando a elevação dos níveis de pobreza, de desemprego e queda dos salários, e cita Marx, quando ele escreveu sobre a “acumulação de riqueza em um dos polos é, ao mesmo tempo, acumulação de miséria, de trabalho agonizante, escravidão, ignorância, brutalidade e degradação mental, no polo oposto”.

O autor aponta que, “Entre 1983 e 2010, 74% da riqueza criada nos EUA foram para os 5% mais ricos, enquanto os 60% da base sofreram um declínio...”.

Tendo reconhecido que até agora tudo parece indicar que Marx estava certo, o autor então volta para o comportamento padrão, “Isto não significa que Marx estivesse inteiramente certo. Sua ‘ditadura do proletariado’ não funcionou muito bem, tal como planejado”.

Esta é uma clara referência ao colapso da União Soviética. Com isto, espera-se que o público fique avisado para não levar Marx demasiado a sério.

Este é o costumeiro espantalho que se levanta a fim de fazer as pessoas acreditarem que, embora Marx possa ter desenvolvido uma interessante análise das contradições do capitalismo, ele não oferece uma alternativa viável e, portanto, nós pura e simplesmente temos que viver com aquilo que temos: o capitalismo!

O fato de que o que existia na União Soviética não era comunismo é algo que esses jornalistas preferem ignorar. Marx nunca contemplou o socialismo como um sistema que pudesse existir dentro das fronteiras de um só país, para não citar um país atrasado e subdesenvolvido como era a Rússia em 1917.

Lênin, que construiu o partido Bolchevique que levou à Revolução Russa, também nunca teve semelhante ideia. Foi por esta razão que ele gastou tanta energia na construção da Internacional Comunista e porque depositava tantas esperanças na revolução alemã.

Foi Stalin quem desenvolveu a ideia de “Socialismo em um Só País”, rompendo com as ideias fundamentais do marxismo sobre esta questão.

Trotsky explicou o que aconteceu na União Soviética em muitos escritos e, em particular, em seu clássico, "A Revolução Traída", no qual explica as razões objetivas da revolução russa – que começou como uma revolução saudável dos trabalhadores – que finalmente degenerou no monstruoso regime estalinista.

Nos livros escolares e na mídia, nada disto é explicado.

É melhor que a União Soviética sob Stalin seja apresentada como destino inevitável das ideias de Marx, de forma que as futuras gerações não se sintam tentadas a se aprofundar nos escritos de Marx.

Infelizmente para a classe capitalista e todos os seus parasitas, é a severa crise atual que está empurrando cada vez mais trabalhadores e jovens a buscar uma alternativa.

Apesar do que eles dizem as ideias de Marx sempre voltam e hoje mais do que em qualquer outra altura durante décadas. Isto acontece porque a luta de classes está de volta à agenda em escala global.

O artigo de The Time Magazine sinaliza isto: “a consequência dessa maior desigualdade é exatamente aquilo que Marx havia previsto: a luta de classes está de volta. Os trabalhadores do mundo estão crescentemente mais zangados e exigindo sua justa parte da economia global.

Desde o recinto do Congresso dos EUA às ruas de Atenas, às linhas de montagem do Sul da China, os acontecimentos políticos e econômicos estão sendo modelados pelas tensões em ascensão entre capital e trabalho em um grau nunca visto desde as revoluções comunistas do século XX”.

O artigo apresenta alguns pontos interessantes sobre como o conflito de classes se expressa nos EUA mesmo dentro da retórica entre Obama e os Republicanos sobre como os custos para se sair da crise podem ser repartidos entre as diferentes classes na sociedade.

Todas as vezes que Obama levanta a ideia de taxar de forma mais elevada as camadas mais ricas da sociedade estadunidense, os Republicanos o acusam de guerra social, enquanto exercem a sua própria guerra contra os trabalhadores e os pobres!

Contudo, a luta de classes não se confina apenas à América assolada pela crise e à Europa.

O autor salienta que mesmo onde o crescimento tem sido significativo nos anos recentes, como na China, há uma crescente luta de classes:

Apesar de a renda salarial estar crescendo substancialmente nas cidades chinesas, a distância entre ricos e pobres é extremamente vasta.

Outra investigação de Pew revelou que aproximadamente metade dos chineses pesquisados considera a divisão entre ricos e pobres um problema muito grande, enquanto oito entre dez concordam com a afirmação de que ‘os ricos ficam cada vez mais ricos enquanto os pobres cada vez mais pobres’ na China”.

De forma alguma isto é uma surpresa para os marxistas.

Entendemos que o desenvolvimento da economia sob o capitalismo significa o fortalecimento da classe trabalhadora em termos de seu peso na sociedade, e devido a desigual distribuição da riqueza produzida isto inevitavelmente significa tensão entre as classes, mesmo quando há um boom.

Vimos isto no passado na Europa com as explosivas lutas de classe na França em 1968 e na Itália em 1969, em pleno boom do pós-guerra!

O autor cita um trabalhador chinês, Peng Min:

As pessoas de fora veem nossas vidas como se fossem fartas, mas a vida real na fábrica é muito diferente... A forma de o rico ganhar dinheiro é através da exploração dos trabalhadores... Estamos ansiosos pelo comunismo... Os trabalhadores se organizarão mais... Todos os trabalhadores devem estar unidos”.

De sua visão geral das crescentes tensões entre as classes no mundo inteiro, dos EUA à China, da Espanha à Grécia e mais além, o autor conclui o seguinte: “Há indícios de que os operários de todo o mundo estão ficando crescentemente impacientes com suas tênues perspectivas.

Dezenas de milhares tomaram as ruas de cidades como Madri e Atenas, protestando pelo desemprego estratosférico e contra as medidas de austeridade que estão tornando a situação ainda pior”.

Em seguida, esperando oferecer algum consolo a algum capitalista que pudesse estar lendo o artigo, ele declara que, “Até agora, de qualquer forma, a revolução de Marx ainda tem que se materializar”.

Nisto, podemos concordar. Ainda não houve uma revolução socialista. Mas o que o autor deseja com veemência é que ela nunca se materialize. Isto é algo que não podemos concordar.

O que ele tenta apresentar é um quadro de trabalhadores que não querem derrubar o sistema, mas simplesmente reformá-lo. Nisto ele pede a ajuda do suposto “expert em marxismo”, Jacques Rancière, da Universidade de Paris.

Rancière (foto) é um exemplo daquela espécie de Professor Universitário que se refere a si mesmo como progressista, mas que, na realidade, gasta seu tempo negando a essência do marxismo.

Isto fica claro quando ele explica que, “Não estamos vendo nos protestos de classes apelos à derrubada ou destruição do sistema socioeconômico atual. Os conflitos de classes que hoje estão se produzindo são apelos para se corrigir os sistemas, de forma que se tornem mais viáveis e sustentáveis no longo prazo através da redistribuição da riqueza criada”.

A análise do Professor Rancière – que os trabalhadores não estão exigindo uma revolução socialista – pode ser um conforto para aqueles que desejam preservar o sistema capitalista.

Ele afirma que, “as perspectivas dos partidos trabalhistas ou socialistas ou dos governos de qualquer lugar de reconfigurar significativamente – e muito menos de virar – o atual sistema econômico são, para falar gentilmente, fracas”.

Ele baseia tudo isto na presente situação do movimento dos trabalhadores, em particular de seus líderes. Se o futuro do movimento internacional da classe trabalhadora dependesse desses líderes, então o Professor teria razão.

A questão que temos de entender é que os líderes não permanecem líderes para sempre. A crise do sistema está colocando todas as ideias em teste. A ideia de que o sistema pode ser reformado está sendo questionada pelo impasse em que se encontra. Não há mais espaço para reformas como no passado.

Pelo contrário, todas as reformas conquistadas em décadas de luta de classes estão sendo destruídas. Os trabalhadores em todas as partes enfrentam a perspectiva de serem lançados de volta às condições sofridas por seus avós.

O que a citação acima do professor não entende é que os trabalhadores não começam com a ideia de que a revolução é o único caminho.

Eles começam com a ideia de oposição aos ataques sobre os salários, condições e bem-estar.

Esperam que uma solução seja encontrada dentro do próprio sistema.

Eles sonham em retornar ao período do boom, quando as reformas eram possíveis, quando a vida parecia tolerável.

Mas a questão que tem de ser sublinhada é que todas essas esperanças serão despedaçadas pela realidade.

A instabilidade política se espalha por toda a Europa e além – na América, no mundo árabe, na África e na Ásia – e se expressa na volatilidade eleitoral.

Partidos antes poderosos, como o PASOK na Grécia, foram esmagados pela pressão da situação. Os trabalhadores estão votando contra qualquer governo que realize medidas de austeridade. Isto significa que os trabalhadores sabem o que não querem. O problema é que eles ainda não descobriram o programa e as políticas que podem combater a austeridade.

Os marxistas sempre falaram a verdade, mesmo quando é difícil de engolir: não há nenhuma solução para o problema que os trabalhadores e os jovens do mundo inteiro enfrentam dentro das fronteiras do sistema capitalista.

Enquanto o poder estiver nas mãos da classe capitalista, ela o usará para manter sua riqueza e privilégios à custa do povo trabalhador. O sistema não pode ser reformado; ele deve ser removido.

Como afirmou o autor do artigo em Time Magazine, “Se os estrategistas políticos não descobrirem novos métodos de garantir oportunidade econômica, os trabalhadores de todo o mundo podem se unir. Marx ainda pode obter sua vingança”.

Acreditamos que Marx estava correto não apenas em sua análise econômica, mas também em suas conclusões políticas.

A crise do sistema inevitavelmente conduz os trabalhadores a tirar conclusões revolucionárias. O que se requer é uma mudança radical das organizações de massa da classe trabalhadora, de seus partidos e sindicatos. Os atuais líderes esperam que esta crise seja afastada e que, mais cedo ou mais tarde, eles possam retornar às confortáveis relações que eles estabeleceram com os patrões no passado. Isto é, uma quimera.

O que enfrentamos são anos de austeridade, com o declínio dramático dos níveis de vida em todos os cantos.

No momento em que se tornar claro que esta crise não está indo embora depois de um curto período de austeridade, no momento em que ficar claro que este sistema não oferece nenhum futuro, então o único caminho será em direção à derrubada revolucionária de todo o sistema.

É para onde a presente situação está levando.

(*) NOTA DO EDITOR: Sobre o conceito de resiliência
Este conceito foi elaborado para definir a capacidade de superar problemas em situações críticas.

Segundo o dicionário Aurélio, é a propriedade de pela qual a energia armazenada em um corpo deformado é devolvida quando cessa a tensão causadora de tal de formação elástica. Este conceito é trabalhado nas mais diversas áreas das ciências como física, psicologia etc.

Pensamos numa bexiga cheia de ar, por exemplo. Apertamos e ela entorta. Quando soltamos ela volta ao normal. Isto significa sua capacidade de resiliência. Mas sabemos que isso também possui um limite. Pois se pegamos a bexiga e apertamos com muita força, certamente ela vai estourar. Nesse momento dissemos que a bexiga perdeu sua capacidade de resiliência.

Outro bom exemplo na ecologia. Chamamos de resiliência ambiental a capacidade de um ecossistema retonar a sua forma normal após uma perturbação. A isso definimos como grau de resistência do ecossistema. Ou seja, uma mudança para que os impactos a um ecossistema não se converta numa situação irreversível. Caso o impacto supere sua capacidade de resiliência ambiental, chamamos de processo de degradação.

E nesta etapa só uma ajuda externa, no caso, através de técnicas de recuperação de áreas degradadas, é que o ecossistema pode retornar a sua forma anterior. Pois sozinho, sem ajuda humana, ele não poderá mais retornar ao normal, já que os impactos que recebeu ultrapassaram sua capacidade de resiliência.

Nesse sentido, Fred Weston, autor do artigo, utilizou muito bem o conceito de resiliência para defender a vitalidade das ideias de Marx. Mostrando como suas ideias econômicas e conclusões políticas são capazes de se reivinventar e ainda se manterem firmes, sem abalos.

Artigo do site da Corrente Marxista Internacional. Para ler o texto original "The resilience of the ideas of Karl Marx", clique AQUI.

Fonte:

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade e, excetuando uma ou outra, inexistem no texto original.