sábado, 10 de outubro de 2009

Carta aos educadores ambientais do Brasil e dos países de línguas hispânica e portuguesa

O documento que publicamos a seguir foi construído a partir da IV Conferência Internacional de Educação Ambiental, realizada na Índia em 2007, 30 anos após a primeira Conferência, em Tbilisi, Geórgia. A Carta aos educadores ambientais do Brasil e do mundo luso-hispânico foi produzida por, entre outros membros da delegação brasileira, Marcos Sorrentino, então diretor de Educação Ambiental do Ministério do Meio Ambiente e Raquel Trajber, coordenadora geral de Educação Ambiental do Ministério da Educação


Aos educadores e educadoras ambientais do Brasil e dos países de

línguas hispânica e portuguesa,

Poucos de nós conseguiram acompanhar a IV Conferência Mundial de
Educação Ambiental para um Futuro Sustentável, Tbilisi+30, no contexto
da Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável, que se
realizou em Ahmedabad, Índia, nos dias 26 a 28/11.

As causas podem ser atribuídas à fraca divulgação do evento e à falta
de apoio das agências internacionais para lá estarem representantes
destes países, tendo em vista o custo do deslocamento, ou devido ao
motivo de todo evento ter o inglês como única língua oficial, ou pelo
fato de na América Latina existir um forte movimento de resistência à
substituição do nome Educação Ambiental (EA) por Educação para o
Desenvolvimento Sustentável (EDS).

A delegação de três representantes do governo brasileiro que lá
esteve, envia-lhes a seguir um pequeno relato sobre o ali vivenciado,
com alguns documentos e referências para a nossa análise reflexão,
debates e mobilização.

Mobilização que nos anima há mais de três décadas, enfatizada pelas
mudanças socioambientais globais relacionadas ao Aquecimento do
Planeta: fazer uma educação ambiental que contribua para a melhoria da
qualidade de vida de todos e para a recuperação e conservação do meio
ambiente em toda a sua beleza e diversidade.

Mobilização para que a perspectiva de EA que vem sendo construída na
resistência e na luta por liberdades democráticas e pelos direitos
humanos fundamentais (e na compreensão de que não haverá sobrevivência
possível para a nossa espécie e para todas as demais, se não
estivermos profundamente comprometidos com a melhoria da qualidade de
vida de cada humano que habita ou habitará este planeta, num
exercício constante de solidariedade sincrônica e diacrônica que vai
do mais próximo ao mais distante no espaço e no tempo), não seja
excluída dos acordos que vão se estabelecendo entre países de língua
inglesa e do seu campo de influência e países da Ásia e da Europa que
aderiram mais rapidamente ao conceito de Educação para o
Desenvolvimento Sustentável.

Mobilização para explicitarmos que a EA e todos os seus aprendizados,
também quer contribuir para a construção de uma EDS que seja também um
compromisso com a construção de Sociedades Sustentáveis.

Mobilização para que a urgência do momento não seja pretexto para uma
EA/EDS Pragmática que esquece princípios, valores, história e
objetivos e os substitui por metas aparentemente operacionais e
eficientes, mas que podem não ser eficazes e duradouras, contribuindo
para a caminhada na direção de sociedades humanas sustentáveis.

Por fim, mobilização que promova o diálogo includente na diversidade
para que as mudanças sejam sócio-culturais, econômicas, políticas,
éticas e ambientais na direção de possibilitar a todos e a cada um a
enunciação de seus sonhos e utopias e a negociação dos mesmos nos
espaços políticos que os alimentam e por eles são alimentados. Não
queremos mais, do mesmo modo de produção e consumo. Não queremos
modificar para permanecer no mesmo lugar (de desigualdades
fundamentadas em heranças, preconceitos, exploração, degradação humana
e ambiental).

A oportunidade que esta crise coloca é a de enfrentarmos
transformando todas as mazelas e iniqüidades produzidas pelo atual
modelo de desenvolvimento e de vida. Ou fazemos isto, temos disposição
para fazer isto ou não conseguiremos o compromisso, responsabilidade e
engajamento de todos com os cuidados que o planeta exige.
Portanto, vamos convidar as agências das Nações Unidas em nossos
países e região, para debaterem conosco todas as nossas expectativas
em relação a Década.

Já que não pudemos fazer o balanço dos 30 anos de Tbilisi, em cada
país, região e comunidade lingüística. Já que o próprio evento de
Ahmedabad não dedicou tempo a isto, propomos que alguns eventos nos
próximos anos, façam esta avaliação e que possamos, no balanço de meio
termo da Década, em 2009, em Bonn ( segundo anunciaram na IV
Conferência), ter um panorama do estado da arte no planeta e apontar
alternativas para a Educação Ambiental seguir avante sua vocação de
evocar as nossas melhores esperanças e ações por um mundo melhor.

Sugerimos os eventos abaixo, como referência para esses debates:

  • Foro de Ministros da AL e Caribe (janeiro/2008 debatendo o PLACEA);
  • Foro Global de Ministros de Meio Ambiente (fevereiro de 2008, Mônaco);
  • VI Fórum Brasileiro de EA (Rio de Janeiro, 2008);
  • III Conferência Nacional de Meio Ambiente, adultos e infanto-juvenil (2008/Brasil);
  • Jornada de Avaliação do Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global (fevereiro de 2009/Brasil);
  • Avaliação de Metade da Década (Bonn/2009);
  • II Conferência de EA dos Países de Língua Portuguesa e da Galícia (Cabo Verde/2009) debatendo o Programa CPLP de Educação Ambiental;
  • VI Congresso Ibero Americano de Educação Ambiental (2008 ou 2009/Argentina);
  • Conferência Internacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente (2010/Brasil);
  • Rio mais 20 (2012)

Nelas precisamos debater a democratização da Gestão Ambiental no
Planeta e em cada região/país, criando condições de informação, tomada
de decisão e educação para que todas possam participar e se
comprometer com suas decisões.

Vamos imprimir, disponibilizar eletronicamente e debater os vários
documentos de subsídios para o aprimoramento das políticas públicas de
Educação Ambiental.

Vamos criar e/ou aprimorar as Sistemas Nacionais de Educação
Ambiental e suas leis, programas, planos e estratégias Nacionais de
Educação Ambiental, bem como regionais e locais, estabelecendo pactos
de realização entre os seus distintos atores.

Vamos dar continuidade às estratégias inclusivas pautadas pela
perspectiva de uma Educação Ambiental permanente, continuada,
articulada e com a totalidade dos humanos de cada base territorial de
nossos países.

No Brasil estamos diante do desafio de formarmos aproximadamente um
milhão de educadores ambientais populares e de engajarmos a totalidade
das escolas em processos de educação ambiental.

Um milhão de EAP que precisam de apoio continuado em seu próprio
processo de formação. Apoio descentralizado e incrementado por
aproximadamente 300 Coletivos Educadores comprometidos com a formação,
cada um de 200 educadores ambientais. Estes 60 mil educadores
ambientais se responsabilizam pela formação de círculos (ou
comunidades) de aprendizagem participativa sobre Meio Ambiente e
Qualidade de Vida, envolvendo, entorno de 20 pessoas, cada um.

As 170 mil escolas de ensino fundamental e médio, bem como as IES são
convidadas, pelo processo das Conferências Nacionais Infanto-Juvenil
pelo Meio Ambiente e por meio de outras atividades, a participarem
para iniciarem e/ou fortalecerem as Comissões de Meio Ambiente e
Qualidade de Vida (Com-Vidas) em cada Escola, realizando agendas XXI e
ações diversas de EA.

Certamente os estados e municípios, as ONGs, associações de cidadania
e movimento sociais, os sindicatos de trabalhadores e as instituições
empresariais, desenvolvem inúmeros e bons projetos de EA. Todos
precisam ser valorizados e apoiados para termos condições de fazer
frente aos desafios que batem as nossas portas. Para isto precisamos
das articulações locais, com as Comissões Organizadoras das Agenda
XXI, com os Municípios Educadores Sustentáveis , com as CIEAs e os
Programas Estaduais, regionais e setoriais de EA, com os Coletivos
Educadores e as Convidas, com as Redes de EA, para todos cooperarem na
elaboração de projetos políticos e pedagógicos que potencializem as
suas capacidades.

Ahmedabad torna mais claro do que nunca que precisamos promover uma
EA enraizada, capilarizada, comprometida e com o compromisso de todos
e de cada uma das pessoas e ao mesmo tempo articulada regionalmente e
com todos os países do Planeta.