quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

O Brasil perdeu o charme, diz o rentismo

10/12/2012 - Saul Leblon - Carta Maior

Razões intrínsecas ao modo de produção singularizam a economia em nosso tempo com uma concentração da riqueza financeira proporcional ao agigantamento global da reprodução capitalista.

Não existe, não existirá outro equivalente econômico que rivalize com o poder de comando criado em torno dessa engrenagem. Sua negação terá que ser construída na esfera da democracia e do Estado.

É a essência da crise atual.

O crédito se notabiliza como a viga estrutural da escala assumida pelo hegemonia financeira. Mas é só um pedaço do poder de comando sistêmico exercido pela finança que a distingue como o setor mais poderoso e organizado da economia.

Por "poder de comando sistêmico" entenda-se a hegemonia de um aparato que inclui a gestão da riqueza entrelaçada à propriedade dos meios de produção, mas que vai além revestindo essa posse de salvaguardas institucionais, bem como do poder de sujeição, capacidade de influência e iniciativa que, somadas, firmam um sinônimo daquilo que se entende por dominação social.

Gestores, analistas, mídia, acadêmicos, institutos de pesquisa, think tanks, bancadas parlamentares, a robusta categoria dos consultores (e sua inesgotável bateria de 'estudos' a colonizar redações obsequiosamente receptivas), ademais das articulações internacionais e do controle de amplos segmentos do Estado servem à engrenagem que impulsiona e sustenta o poder do capital a juro entrelaçado às corporações produtivas.

Não são as necessidades do desenvolvimento ou as da sociedade que comandam esse processo. É o inverso.

E esse inverso está sendo afrontando no Brasil na sua autonomeada prerrogativa de ditar a remuneração do capital a juros e os rumos da economia.

Contrariar essa lógica não é algo que se faça a frio: não se trata de questão técnica.

Ela confronta uma escolha de sociedade e um escrutínio sobre quem deve assumir o comando do seu desenvolvimento e do seu destino.

Desde 2008, com a mudança nas relações de forças decorrente da crise global, o Brasil tem aproveitado a margem de manobra para mitigar esse domínio. Inicialmente, com a determinação de criar a menor área de atrito possível.

O governo Dilma foi além das negociações protocolares.

Este ano as taxas brasileiras foram colocadas nos níveis mais baixos da história. Com o nada desprezível poder de indução dos bancos públicos, tenta-se agora dobrar a banca privada no braço de ferro do corte nos spreads e no custo das tarifas - ambos persistem obscenos.

No 3º trimestre os bancos brasileiros tiveram uma queda de lucros de 31% em relação a igual período de 2011.

Nada que ameace a gordura acumulada nas muitas vezes em que o ventre protuberante dos banqueiros locais depositou suas credenciais na liderança mundial da lucratividade financeira.

Mas o fato é que uma queda de 31% nos lucros é suficientemente dura para gerar animosidade na turma dos acionistas e da aristocracia engravatada.

Gestores de carteiras que desfrutam de suculentos bônus anuais, uma bolada extra que pode representar o equivalente a 50 salários em troca de metas e saldos, terão que reduzir as expectativas a partir de agora.

Segundo o jornal Valor desta 2ª feira [10/12]:
"Executivos do setor financeiro devem ter uma redução entre 10% e 30% nos bônus que serão pagos em 2013, relativos a resultados de 2012".

Motivos:
"A pressão por spreads menores nos bancos, a dificuldade que as 
instituições estão enfrentando para gerar rentabilidade em um cenário de juros mais baixos e o impacto da crise financeira lá fora são fatores que devem segurar os bônus dos executivos de finanças este ano", explica ao Valor, Bernardo Cavour, diretor da Flow para o segmento de bancos e private equity"

Há uma outra forma de ver a coisa. Ela evidencia o embate silencioso entre os sócios do rentismo e o esforço de construção de uma política ativa de desenvolvimento para o país no pós-neoliberalismo.

Ou, como preferiu dizer de forma mais técnica a Presidenta Dilma, em seu discurso no Encontro Nacional da Indústria (05-12-2012):

"Vivemos um período de transição, um período no qual os investimentos do setor real da economia tenderão de ser mais atrativos que as demais oportunidades de investimento (financeiro); o Banco Central conseguiu realizar um movimento cauteloso na direção (dessa) mudança macroeconômica ( ...) que é estratégica".

Em resumo, o ajuste global ganhou aqui um impulso ordenado pela determinação política de reduzir a lucratividade desfrutada durante anos pelo capital financeiro. E induzir os investidores a migrarem para os segmentos e projetos da esfera produtiva. Uma travessia de certa forma inspirada naquilo que Keynes prescrevia como 'provocar a eutanásia do rentista' - a sua transmutação em capital produtivo.

Se não o fizer o Brasil naufragará junto com as economias mundiais conflagradas pela desordem neoliberal e soterradas no ajuste que recorre ao mesmo veneno.

A aristocracia das gravatas & cifrões rastreia o ambiente e se remexe inquieta.

O noticiário econômico é farto em motivações para inquietar traseiros longamente modelados em assentos de couro.

O Citigroup vai demitir 11 mil funcionários no mundo (4% da folha); 14 agências vão cerrar as portas no Brasil; o Santander pode demitir 5 mil funcionários no país, etc.

Seria importante se algum curso de jornalismo se dispusesse a centimetrar quanto do noticiário econômico e das colunas ditas especializadas, tem sido ocupado por críticas, 'estudos', projeções e 'advertências' (ameaças?) originárias do aparato ideológico construído em torno da endogamia entre juros siderais e bônus milionários.

Serviçais do teclado e dos microfones farejam o filão e babam ao vivo, ao mesmo tempo em que respingam sofreguidão nos textos.

O episódio da The Economist - que pediu a demissão do ministro Mantega - é só a cereja desse bolo ainda em fermentação.

Uma coisa é certa, a gigantesca massa de forças reunida em torno desses interesses mais que nunca está à campo, pautando e martelando a mídia amiga.

E não é para elogiar o Brasil, que perdeu o charme, dizem as análises isentas. Menos ainda para tornar mais leve a segunda metade do mandato da Presidenta Dilma, a partir de 2013. A ver.

Fonte:
http://cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=6&post_id=1153

Imagens: Google Images

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

As estatais estrangeiras e o mercado nacional

10/12/2012 - Mauro Santayana em seu blog

(Carta Maior) - Com a intenção de “normalizar e simplificar a governança estratégica” do gigantesco grupo de armamentos EADS, assegurando, ao mesmo tempo, que a Alemanha, a França e a Espanha, protejam os seus legítimos “interesses estratégicos”, os governos dos três países acabam de fechar  acordo para manter 24 por cento das ações nas mãos dos estados francês e alemão e 4 por cento sob propriedade do estado espanhol.

Mantêm, assim, o domínio do grupo, que controla, direta e indiretamente várias empresas prestadoras de serviços na área de defesa, no Brasil, como é o caso da Cassidian.

Enquanto no Brasil é pecado o Estado meter-se em outras áreas que não sejam segurança, saúde e educação, países admirados por muitos como paradigmas de capitalismo avançado e do livre-mercado, asseguram a propriedade  do Estado em áreas estratégicas da economia - e nem por isso o mundo vem abaixo. 

       Vamos aos fatos. A participação da Espanha no capital da EADS (abreviatura da denominação, em inglês, da European Aeronautic Defense Space Company), mediante a CASA (Construcciones Aeronauticas S.A) deve ser conhecida. Embora tenha nascido da iniciativa privada, em 1923, a empresa foi sendo absorvida pelo estado espanhol, a partir de 1943, e, desde 1992, a participação estatal é de 99,2%.


       Além da construção aeronáutica, o estado espanhol comanda as empresas ferroviárias, de construção, navais e de armamento. É com essas empresas que a Espanha quer invadir o mercado brasileiro, aproveitando o financiamento farto e barato no BNDES.

     O instrumento dessa operação é uma instituição chamada SEPI - Sociedade Estatal de Participações Industriais.

E atentem bem para a palavra estatal.

A SEPI - a exemplo de organizações congêneres como as existentes na Alemanha, na França, ou na Itália, com o IRI - não está presente apenas como sócio temporário, mas exerce sua tarefa permanente de controle nacional dos setores estratégicos da atividade econômica.

           No Brasil, esse é um assunto tabu. O BNDES pode financiar empresas estrangeiras, e até mesmo estatais, como é o caso da DCNS, que constrói o estaleiro onde serão montados os submarinos que compramos à França. No entanto, não admitem que o Brasil possa ter uma empresa estatal para assegurar diretamente a presença do Estado onde ela é necessária, seja como controlador, seja como indutor do processo de desenvolvimento, como ocorre lá fora.


O temor da opinião dos "analistas" do "mercado" e de certa parcela dos meios de comunicação, já totalmente entregue aos interesses estrangeiros, chegou a tal ponto que os maiores absurdos são vistos como absolutamente normais.

         É o caso, por exemplo, da projetada concessão operacional do Aeroporto do Galeão. Uma empresa controlada pelo Estado francês, a ADP 
(Aeroports de Paris) disse, claramente, que só entra no negócio se a INFRAERO (ou seja, o estado brasileiro) estiver em posição minoritária. E o governo brasileiro, como mostra a mudança no formato do modelo, obedece.

        É preciso definir o caminho correto para que o Brasil possa se desenvolver em ritmo acelerado sem abrir mão de sua autonomia e da sua soberania, agora e no futuro. 
       Ao contrário do que aconteceu no passado, e tem acontecido ainda, o BNDES só deveria financiar empresas autenticamente brasileiras, inclusive estatais, que possam negociar de igual para igual, em cada setor, com as estatais de outros países, como fazem, sem nenhum pudor, as outras nações.


Os estrangeiros que quiserem entrar no Brasil, principalmente no filé das obras de infraestrutura, que se submetam às nossas leis e condições - e tragam o seu próprio dinheiro. 

Fonte:
http://www.maurosantayana.com/2012/12/maior-com-intencao-de-normalizar-e.html

[Equipe Educom: outro que também clama por caminhos corretos, por um diagnóstico, por uma definição clara de objetivos e por uma estratégia para o futuro deste país é o professor J. Carlos de Assis, como pode ser visto aqui, em - Reaglutinar forças e novos rumos para o mundo.

Imagens: Goggle Images

Não deixe de ler: - O cerco do Ocidente à indústria brasileira de defesa

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Reaglutinar forças e novos rumos para o mundo




[Não vemos como, menosprezar este assunto, pois ele ora nos assombra, estamos quase sós e a mídia mercantil vem demonstrando sua pujança fazendo a cabeça de parcelas consideráveis da população. Não apenas do mauricinho rentista da bolsa de Valores, mas também do vigilante noturno que no seu radinho ligado na CBN ouve os comentários de um tal Merval Pereira que exercita com perícia as artes de um hábil enganador de ouvintes e leitores.

É chegada a hora, diz essa mídia, de expurgarmos de vez essa chaga chamada PT que tomou conta do poder e que, desgraçadamente, lançou o país nesse mar de lama chamado corrupção. A verdade, aquilo que de sórdido se encontra por trás dos arautos da CBN, não vem à tona. Não temos, como nos países do chamado Primeiro Mundo, uma regulação da mídia que nos permita, ao menos, contestar as mentiras que ela divulga, as quais, a bem da verdade, não passam de esforços pra retirar do povo o que ele conseguiu de melhorias de vida nos anos de governo Lula.

Tudo porque, a Comunicação nestas terras é via de mão única, exclusiva de apenas quatro famílias, a chamada Família GAFE da Imprensa (Globo/Abril/Folha/Estadão), composta respectivamente, pelos clãs Marinho, Civita, Frias e Mesquita, um no Rio e três em São Paulo, que dominam, controlando com folga, praticamente todos os meios de comunicação do Brasil, das revistas semanais aos jornalões diários, passando pela TV a cabo e pelas bandas largas dos TeleCines, dos joguinhos da internet dos nossos filhos ao futebol profissional voltado pros marmanjos.

Os recados que aí estão têm sua razão de ser, em todos os aspectos oportunos, pois é evidente, como escreveu Mino Carta, "que o golpismo da mídia da casa-grande seja irreversível e é do conhecimento até do mundo mineral", mas é inaceitável e "causa espécie, o envolvimento de personalidades aparentemente voltadas aos interesses do País em lugar daqueles da minoria", como os que Merval Pereira representa, se somarem a uma aparente omissão, tanto das lideranças do PT quanto da cúpula do governo Dilma.

Ou será que blogueiros e internautas militantes, estamos sós? Ou será nossa união quem dará o tom das verdades que queremos que prevaleçam nesse momento de pré-golpe, urdido em silêncio pelas elites reacionárias acantonadas num tal Instituto Millenium, no Rio de Janeiro, e tendo como porta-voz essa mídia empresarial e seus, assim chamados, analistas, articulistas e especialistas a soldo dela, aliás, bem remunerados.

Do que Saul Leblon escreveu anteontem na Carta Maior pinçamos: "Até que ponto o monopólio midiático é responsável pelo 'consenso' que jogou o mundo na pior crise do capitalismo desde 1929? A pergunta não é retórica, tampouco a resposta é desprovida de consequências políticas práticas. Imediatas, urgentes, imperativas. Trata-se, por exemplo, de saber em que medida a formação do discernimento social, condicionado por esférica máquina de difusão de certos interesses, dificulta a própria busca de soluções para a crise. Mais que isso. Se esse poder blindado que se avoca imune à regulação - como se constata em tintas fortes hoje na Argentina, mas não só - tornou-se um dos constrangimentos paralisantes dessa busca, um difusor de impasses e confrontos, como democratizá-lo?"

Se Oscar Niemeyer não está mais conosco para ser aclamado como presidente de honra desse movimento que tem como integrantes de sua comissão organizadora, Luiz Pinguelli Rosa, Marcio Pochmann, João Pedro Stédile, Samuel Pinheiro Guimarães, Pedro Celestino, Roberto Amaral e Ubirajara Brito, propomos que seus ideais permaneçam vivos, pelo menos enquanto ecoar entre nós sua fala romântica que por todos seus 105 anos alimentou a certeza de que um futuro melhor para o ser humano é possível.

Assim, não vemos motivo algum que justifique ficarmos alheios, de braços cruzados diante dessa armação que pretende sem qualquer desfaçatez, reeditar, agora com uma roupagem civil e uma legalidade "made in Paraguai", o traiçoeiro golpe civil-militar de abril de 64.


Fez bem a FALE-Rio quando na última sexta-feira, 7/12, foi pra rua apoiar o governo argentino (manifestações semelhantes ocorreram também em outras capitais) em sua luta para fazer da Comunicação em seu país um marco da conquista de um direito humano fundamental para o seu povo.

A divulgação desse manifesto e a conclamação do professor J. Carlos se inserem nesse esforço, de denúncia dessa mídia que nos impõe uma cultura de silêncio e dominação. (Equipe Educom)]


14/11/2012 - Manifesto defende reaglutinação de forças no Brasil para enfrentar crise mundial
- Marco Aurélio Weissheimer - Carta Maior

Porto Alegre - Um grupo de forças populares, progressistas e de esquerda está articulando um manifesto de reflexão sobre a crise econômica e política mundial e de reaglutinação de forças no Brasil.


A reunião de lançamento desse manifesto deverá ocorrer hoje, 10/12, no Palácio da Cultura, no Rio de Janeiro.

A pauta principal dessa primeira reunião será definir formas e meios de ação a partir de um programa de 11 pontos adotado no texto.

Para tanto, será debatida a criação de um movimento em defesa da democracia, do Brasil e da paz. A ideia é que Oscar Niemeyer seja aclamado como presidente de honra desse movimento que tem como integrantes de sua comissão organizadora, Luiz Pinguelli Rosa, Marcio Pochmann, João Pedro Stédile, Samuel Pinheiro Guimarães, Pedro Celestino, Roberto Amaral e Ubirajara Brito.

O manifesto já reúne mais de 150 signatários. Além dos nomes citados acima há outras personalidades de renome nacional como Carlos Lessa, Ennio Candotti, Geraldo Sarno, Luiz Alberto Moniz Bandeira, Luiz Carlos Bresser Pereira, Manuel Domingos Neto, Mauro Santayana e Pedro Casaldáliga.

O documento parte do diagnóstico de que, em 2012, “o mundo entrou em momento de grave perigo, que ameaça degenerar em guerras e destruições de grande escala”. “O agravamento da crise do capitalismo em escala mundial”, prossegue, “coincide, não por acaso, com iniciativas aventureiras de expansão imperialista no Oriente Médio, mas com alastramento possível a outros continentes”.

As deflagrações decorrentes deste cenário, diz ainda o texto, podem resultar em danos terríveis, inclusive para o Brasil, ressaltando que, aqui, entretanto, se abrem ao mesmo tempo oportunidades de aceleração do desenvolvimento econômico e institucional, que reclamam a mobilização na defesa da democracia, dos interesses nacionais e da paz. E conclui: “É urgente a necessidade de expansão de uma consciência pública de defesa do desenvolvimento soberano e democrático do país – na sua economia, na sua organização política e social, na sua cultura. Quanto maior seja essa consciência, mas forte estará o governo para resistir às agressões da direita e, ao mesmo tempo, maior será a pressão dos movimentos de massa para que suas políticas sejam mais coerentes com os interesses do país e da sociedade”.

A seguir a íntegra do manifesto:

A CRISE MUNDIAL, A DEFESA DO BRASIL E DA PAZ

EM 2012, O mundo entrou em momento de grave perigo, que ameaça degenerar em guerras e destruições de grande escala. O agravamento da crise do capitalismo em escala mundial coincide, não por acaso, com iniciativas aventureiras de expansão imperialista no Oriente Médio, mas com alastramento possível a outros continentes.

Das conflagrações daí decorrentes podem resultar danos terríveis inclusive para o nosso país. Aqui, entretanto, se abrem ao mesmo tempo oportunidades de aceleração do desenvolvimento econômico e institucional. Estas reclamam, para se realizar, a mobilização popular na defesa da democracia, dos interesses nacionais e da paz.

I – NAS ÚLTIMAS DÉCADAS, especialmente após a extinção da União Soviética, uma potente ofensiva de direita abriu caminho para uma aparente vitória definitiva do sistema capitalista liderado pelo imperialismo estadunidense, que se pretendeu globalizado. Essa ofensiva afetou profundamente intelectuais e ativistas dos antigos movimentos e partidos de esquerda. Em grande medida, eles foram absorvidos por duas vertentes que, por caminhos diversos, incorporavam as ideias de vitória capitalista. Não poucos aderiram diretamente à ideologia neoliberal, que atribui ao mercado o 
poder exclusivo de decidir sobre questões econômicas, sociais e políticas.

Outros, também numerosos, inclinaram-se à ideia de vitória do capital, mas o fizeram em diversas construções ideológicas com retórica de esquerda, que aceitam e difundem ideias básicas do neoliberalismo, tais como as do império global, da prevalência inevitável do mercado, da falência do conceito de Estado e, por consequência, do conceito de soberania nacional, do fim da luta política organizada das massas de trabalhadores, da transformação destas em “multidão”, etc.

Essa ofensiva intensificou-se após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos. O governo deste país enveredou por uma política de ruptura declarada e prepotente com o regime de respeito à soberania dos Estados e passou a encabeçar um processo de volta às trevas nas relações entre povos e países.

Comandado pelo complexo industrial militar, depois de por seu próprio povo sob tutela a ponto de privá-lo de direitos civis básicos – entre os quais o direito ao habeas corpus –, adotou uma diretriz de projetar sua soberania sobre o mundo inteiro e intervir em qualquer país onde, a seu critério, seus interesses o reclamem.

Proclamou para si o direito de ignorar fronteiras nacionais e instituições internacionais a fim de empreender em qualquer rincão do planeta ações militares de todo tipo, em grande escala, com invasões e bombardeios, ou em pequena escala, com operações abertas ou encobertas de assassinato em série de civis que os desagradem, ou de sequestrá-los e submetê-los a trato de presas de guerra, sem quaisquer direitos legais.

A ofensiva expansionista dos Estados Unidos e seus aliados, principalmente ex-potências colonialistas da Europa, disfarçada sob bandeiras humanitárias, despertou natural indignação e resistência no mundo e, em primeiro lugar, nos povos agredidos.

A progressiva inserção da China no papel de potência mundial, o ressurgimento da Rússia nessa categoria, a afirmação da Alemanha como principal liderança europeia e a emergência de novos atores, como Índia e Brasil, todos buscando o estabelecimento de uma ordem mundial multipolar, também se contrapõem à expressão da estratégia de poder sem limites dos Estados Unidos.

Sem perder a arrogância, dispondo ainda de grandes reservas de expressão de poder e com um aumento de agressividade similar ao que ocorre com predadores acuados, o governo de Washington vem gradativamente decaindo para uma situação de dificuldade econômica, política e militar, ao mesmo tempo em que cresce a consciência mundial sobre o caráter de rapina do imperialismo estadunidense e sobre a necessidade de resistir a ele.

II – O REPÚDIO à prepotência dos Estados Unidos e a disposição de opor-se a ela, manifestados com força crescente no mundo inteiro, evidenciaram mais uma vez a importância do fator nacional na luta política. Os Estados nacionais, ao invés de desaparecerem, regressaram com força maior à cena. A defesa do interesse nacional diante da dominação ou da agressão externa, que é motor principal da mobilização popular nos movimentos revolucionários desde a luta pela independência nos próprios Estados Unidos, repontando sempre, sob diversas formas, na Revolução Francesa, na Comuna de Paris, na Revolução Russa, na Revolução Chinesa, na Revolução Cubana, volta a mostrar-se fator-chave para que a cidadania se apresente como força transformadora, a fim de levar adiante movimentos que no início apontam para objetivos patrióticos e parciais, mas tendem a avançar para conquistas democráticas de maior alcance social.

Esse ressurgimento do fator nacional no centro da ação política é realidade hoje por toda parte no mundo. É entretanto na América do Sul que ele encontra sua manifestação mais saliente e que mais de perto interessa aos brasileiros. 

III – A CONDIÇÃO ISOLADA e pouco relevante da América do Sul no quadro dos grandes conflitos em que se envolveram os Estados Unidos, afinal, deixou este país, que se empenhava em vultosas ações em outros continentes, tolhido para intervir nessa região que ele tradicionalmente considerou seu “quintal”.

Num eco à assertiva clássica de que a revolução escolhe o elo mais fraco da corrente para eclodir, isto parece ter contribuído para que os povos sul-americanos percebessem a oportunidade de responder às humilhações e infortúnios que durante mais de um século lhe impusera a política imperialista de Washington. 

Em 1998, elege-se na Venezuela o presidente Hugo Chávez, com uma plataforma anti-imperialista e com a intenção de cumprir o prometido. Em 2002, elege-se no Brasil o presidente Lula, que alterou gradativamente a política econômica neoliberal dos governos anteriores para beneficiar a aceleração do desenvolvimento econômico, e adotou uma política de socorro às camadas mais pobres da população, fortalecendo com isso o mercado interno; adotou também uma política externa de autonomia em relação aos Estados Unidos, que permitiu rejeitar o ominoso projeto da ALCA, livrar o Brasil da subordinação ao FMI, privilegiar a aproximação com a América do Sul, com fortalecimento do Mercosul e da Unasul, assim como permitiu expandir as relações do Brasil com países e povos da África, do Oriente Próximo e da Ásia. 

Em 2003, elege-se na Argentina o presidente Néstor Kirchner, que enfrentou a banca internacional a fim de livrar seu país de uma dívida externa abusiva e impagável, conseguindo com isso condições para colocar a nação vizinha numa trilha de desenvolvimento sustentado, que hoje prossegue sob a presidência de Cristina Fernandes de Kirchner. As eleições de Evo Morales na Bolívia, Rafael Cor-reia no Equador, Fernando Lugo no Paraguai, José Mujica, no Uruguai, e Ollanta Humala no Peru, deram maior firmeza à tendência de expansão na América do Sul de governos empenhados em alcançar expressão soberana e desenvolvimento pleno, econômico, cultural e social de suas nações. 

Essa tendência não é retilínea, nem imbatível. Em cada país, a ela se opõem fortes correntes internas de direita alinhadas com os Estados Unidos, que atuam orquestradas em escala internacional e dominam a mídia, os bancos, setores importantes do empresariado local e agrupamentos militares.

Com apoio financeiro, político e militar dos Estados Unidos e de outros países imperialistas menores, assim como de seus órgãos de espionagem e operações encobertas, de ONGs financiadas por empresas e governos imperialistas, de sociedades secretas tipo Opus Dei etc., tais setores de direita empreendem em seus países e na região uma campanha sem trégua através da maioria dos órgãos da grande mídia mercantil.

Esta assume caráter de partido político reacionário, cuja finalidade é impedir que se elejam governantes comprometidos com os interesses nacionais e, quando não consegue isto, tentar acuar e tornar refém o governante eleito para, se julgar possível e oportuno, derrubá-lo. É o que se vê na Venezuela, na Bolívia, no Brasil, na Argentina, no Equador, em toda parte. Os golpes de Estado em Honduras e, mais recente, no Paraguai, são inequívocos sinais de alarme nesse sentido.

IV – HÁ NESSE PROCESSO de ascensão nacional e democrática na América do Sul uma singularidade que lhe dá força de sustentação: ele se desenvolve com a rigorosa observância pelos governos das normas do regime de democracia modelo estadunidense, que pressupõe a mídia submetida aos bancos e outros grandes patrocinadores privados e as eleições, sujeitas a campanhas publicitárias de alto custo, subvencionadas por doações de empresas milionárias.

A vitória e a permanência de governantes que desagradam à direita, em condições tão adversas, tornou-se possível graças a uma elevação da consciência política das massas populares. Estas aprenderam a descolar-se do discurso das grandes redes midiáticas na hora de escolher candidato e ajuizar governo. Com isso, definhou o poder de empossar e derrubar governos que a mídia dos grandes negócios exibia em décadas passadas. 

Criam-se portanto condições novas que favorecem e exigem a recuperação das correntes progressistas e sua intervenção na cena política. No plano internacional, a luta contra a política de guerras sem fim do imperialismo estadunidense e seus associados, que hoje preparam uma agressão de grande escala e consequências imprevisíveis à Síria e ao Irã, é meta que a todos deve unir.

Na América do Sul, e no Brasil em particular, impõe-se a luta em defesa dos interesses nacionais, em especial na resistência às tentativas de projeção dos interesses imperialistas de Washington em relação ao petróleo do pré-sal e das Malvinas. Essa projeção já tomou forma concreta com o estabelecimento de novas bases militares estadunidenses na região e com o deslocamento para o Atlântico sul da IV Frota da Marinha dos Estados Unidos.

A luta pela preservação e o aprofundamento do regime democrático, da soberania e da coesão dos Estados da região é diretriz que favorecerá a mobilização de forças capaz de vencer as fortes coalizões de direita e assegurar o avanço econômico, político e social de nossos povos e nações.

V – NÃO HÁ RECEITAS PRONTAS nem caminhos traçados para essa luta. As experiências vividas por outros povos, no passado ou no presente, servem de lição e inspiração, mas não servem de modelo. A originalidade e a variedade das soluções que a vida vai gerando nos países sul-americanos são muito fecundas.

Em comum, existe entre elas a circunstância de que são encabeçadas por líderes não egressos das classes dominantes, que souberam perceber e potencializar o desejo de mudança das massas populares e o descrédito entre elas daqueles partidos e instituições que conduziam antes a vida política. Essa origem em lideranças pessoais fortes é ao mesmo tempo positiva, porque facilita a participação das grandes massas no processo político, e negativa, porque põe esse processo na dependência das escolhas e limitações pessoais do líder.

Mas a necessidade de recorrer à mobilização popular – uma vez que as forças poderosas que o hostilizam ao mesmo tempo manipulam as grandes empresas de comunicação, as instituições políticas formais e facções militares – induz o líder a estimular a gestação de novas formas de organização de massas do povo trabalhador para o combate político e até para a resistência organizada. Chama a atenção, nesse sentido, especialmente na Venezuela, na Bolívia e no Equador, a ascensão em bairros proletários de associações de moradores que se articulam em torno de conselhos comunitários e, ao mesmo tempo, defendem os interesses imediatos da população local, têm presença ativa na resistência ao golpismo e pressionam em favor do aprofundamento da democracia.

VI – NO BRASIL, os movimentos sociais organizados são ainda débeis. O governo do presidente Lula refletiu essa debilidade. Manteve uma política econômica em que ainda havia espaço para o neoliberalismo, mas adotou medidas de favorecimento ao poder aquisitivo da população pobre e desenvolveu uma política externa de autonomia em relação ao imperialismo estadunidense e defesa da paz. A presidente Dilma mantém nas linhas gerais essa diretriz.

Por sua política de favorecimento aos pobres e à soberania dos povos sul-americanos, o presidente Lula foi alvo de uma incansável campanha hostil da mídia. Para defender-se, ele se apoiou porém, quase exclusivamente, em sua popularidade pessoal. Isso o deixou vulnerável a pressões e prejudicou suas possibilidades de avanço.

A presidente Dilma, diante do agravamento da crise financeira internacional, avança na política econômica, enfrentando a questão do freio dos altíssimos juros à expansão da economia nacional, corrigindo na política de câmbio a valorização excessiva do real e mantendo e ampliando as políticas de inclusão social. No plano externo, embora com mudança de ênfase, persiste de modo geral a afirmação de política não alinhada aos Estados Unidos. A mídia dos grandes negócios busca abrir um cisma entre Dilma e Lula, para que se fragilize o campo popular.

É portanto urgente a necessidade de expansão de uma consciência pública de defesa do desenvolvimento soberano e democrático do país – na sua economia, na sua organização política e social, na sua cultura. Quanto maior seja essa consciência, mais forte estará o governo para resistir às agressões da direita e, ao mesmo tempo, maior será a pressão dos movimentos de massa para que suas políticas sejam mais coerentes com os interesses do país e da sociedade.

Um elenco de propostas nesse sentido deve incluir:

1) a efetiva aceleração do desenvolvimento econômico do país; 

2) a subordinação dos sistemas bancário e cambial aos interesses desse desenvolvimento; 

3) a posse dos recursos naturais do país e a recuperação das empresas e recursos públicos estratégicos dilapidados; 

4) a efetivação de um programa de reforma agrária que penalize o latifúndio improdutivo e beneficie as propriedades produtivas de pequeno e médio porte; 

5) a destinação de maiores verbas às políticas públicas de educação, o fortalecimento do ensino público e a melhor adequação dessas políticas aos interesses do desenvolvimento tecnológico e cultural do país; 

6) o reforço aos orçamentos de entidades de saúde pública, a obrigação dos serviços privados de seguridade de ressarcirem gastos dos serviços públicos de saúde com atendimento a segurados dos serviços privados, o fomento à pesquisa de aplicação de novos procedimentos de saúde sanitária básica, preventiva e de tecnologia atual; 

7) a mudança da política de repressão policial dirigida contra a população mais pobre, principalmente não branca, por uma política democrática de segurança pública, o fortalecimento da política de não discriminação de gênero; 

8) o reforço do controle pelo poder público das concessões de meios de comunicação a grupos privados com vistas ao aprofundamento do regime democrático; 

9) o reequipamento das Forças Armadas e a dotação a elas de recursos necessários à eficiente defesa do território nacional, assim como a adequação do conteúdo da formação nas escolas militares à defesa da democracia e dos interesses fundamentais do país; 

10) a ampliação e a consolidação da política de unidade com a América do Sul – essencial para a preservação dos governos progressistas na região; e

11) a defesa de uma política externa de respeito à soberania dos Estados, de relações amistosas com todos os povos e de defesa da paz. 


Muitas são as metas a nos desafiarem, cujo alcance requer todo o engenho e toda a força que sejam capazes de unir e mobilizar, com sentido estratégico e espírito transformador, as correntes progressistas em nosso país, sem distinção dos partidos e associações a que estejam filiadas.


Povo e governo precisam mobilizar suas reservas de sentimento cívico e patriótico, para que o Brasil possa aproveitar a grande oportunidade que tem hoje de consolidar-se como nação soberana, projetada no cenário mundial e consolidada em seu papel de lastro do processo democrático de reconstrução nacional, pacífico e progressista, que se desenvolve na América do Sul.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21253


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09/12/2012 - Os rumos do mundo nas mãos da direita falida e da esquerda perplexa
- J. Carlos de Assis (*) - Carta Maior


A crise financeira nos países economicamente mais avançados deu visibilidade a um tremendo descompasso entre o violento processo de inovações tecnológicas - o que Marx reconheceria como novas relações de produção -, e a ideologia que lhe corresponde.


Sem a crise, a direita continuaria navegando em mar calmo, a despeito de rupturas no sistema produtivo, confiante em que a ideologia da sociedade é a ideologia da classe dominante. A esquerda, por sua vez, ou as esquerdas, continuariam apegadas a chavões do marxismo vulgar descolado de uma proposta contemporânea para o futuro da humanidade.

A crise fez com que tudo mudasse. A direita está tão perdida quanto as esquerdas. O melhor que oferece é uma volta ao status quo ante do 
neoliberalismo, sintetizada na doutrina do estado mínimo e da autorregulação dos mercados. Contudo a sociedade, ou quem na sociedade pensa e fala por ela, não acredita mais nisso. Simplesmente, não seria viável. A liberação do mercado financeiro está entre as principais causas consensualmente identificadas da geração da crise. O Estado, por conta da crise, tornou-se máximo pelo menos no espaço que lhe foi imposto de salvador do sistema financeiro falido.

Mas a esquerda não está melhor. Boa parte dela ainda rumina o estrago ideológico representado pela queda do muro de Berlim, a implosão da União 
Soviética e a capitalização da China. Entre esses dois esteios ideológicos em colapso, um refletindo os interesses reais da classe dominante, outro representando a utopia da igualdade, a sociedade navega em pleno mar de perplexidade.

Claro, há proposições políticas de parte a parte. Contudo, são manifestações tópicas, sem o sentido de uma estratégia. Vivemos simplesmente uma situação caótica, no caos típico das grandes mudanças histórias de paradigmas.

Para que me compreendam, evitando ambiguidades, entendo por esquerdas aqueles que lutam por justiça social e igualdade de oportunidades. Há os que ainda propõem para isso uma via revolucionária que leve à expropriação dos expropriadores. Trata-se da segunda derivada de uma utopia, cuja primeira derivada colapsou em 91. Destes pode-se dizer que têm proposta, embora não uma estratégia. Como minha preocupação é a definição de uma estratégia que sinalize o futuro, vou me referir sobretudo às esquerdas que têm o objetivo de lutar pela justiça social pela via pacífica, ou seja, pela via da democracia política.

Essas esquerdas estão singularmente perdidas. Elas partem de uma crise avassaladora e justificada do capitalismo liberal mas não conseguem apontar uma alternativa unitária. Dois minutos de conversa consistente bastam para se concluir que, nessa altura da civilização, não dá para jogar o capitalismo inteiro pela janela. A sociedade mundial, não a classe dominante apenas, é capitalista. Liquidar o capitalismo equivale a operar um câncer em plena metástase. Mata o doente.

A organização social contemporânea está ancorada na propriedade privada (inclusive dos meios de produção), na liberdade de investir (base da geração de empregos), no prêmio material à inovação. Não dá para acabar com isso de um golpe. Portanto, teoricamente, a questão é regular firmemente o capitalismo, como na China, só que, do lado de cá, através do Estado democrático.

Do meu ponto de vista, o futuro está assinalado desde que parte da Europa construiu, no capitalismo, uma sociedade de bem estar social com alto grau de igualdade de oportunidades. Isso não foi reconhecido por grande parte das esquerdas na época, sobretudo comunistas e socialistas revolucionários, porque, em plena Guerra Fria, o que se propunha era a destruição, não a domesticação do capitalismo.

Hoje, sociais democratas, socialistas, trabalhistas e comunistas europeus estão encurralados pela direita, que se aproveita da crise para forçar o recuo do estado de bem estar social. Paradoxalmente, as esquerdas não conseguiram formular sequer um plano defensivo daquilo que seus antepassados construíram. Grécia, Espanha, Portugal, Irlanda e mesmo a Itália já entregaram os pontos.

Anos atrás, quando começou a crescer na Europa esse movimento direitista, escrevi que o paradoxo da política contemporânea era que a direita se 
tornou reformista (pelo cancelamento de direitos sociais em nome da produtividade e da competitividade) e a esquerda estava sendo forçada a ser
conservadora (dos direitos sociais conquistados). Hoje, nem isso ela é. E não estou falando abstratamente: o que Hollande, um socialista no poder na França, historicamente o país que era o farol da liberdade e da igualdade no mundo, está propondo para a superação da crise nacional e mundial? 

Nada. Está simplesmente alinhado com a política estúpida de contração fiscal comandada pela Alemanha.

E quanto a nós, no Brasil? Como intelectual de esquerda, definida da forma acima, quero fazer um apelo dramático aos dirigentes dos partidos progressistas, aos intelectuais, aos militantes das bases partidárias, para iniciarmos urgentemente uma discussão coletiva a respeito dos rumos do país e do mundo.


Precisamos de um diagnóstico, de uma definição clara de objetivos e de uma estratégia. Sobretudo de estratégia.

A propósito, se formos tão incompetentes para essa formulação no mundo civil, peçamos uma pequena ajuda intelectual à Escola Superior de Guerra: os militares estão acostumados com isso e, como são jovens, nenhum deles sujou a mão com a tortura na ditadura. 

(*) Economista e professor de Economia Internacional da UEPB, autor, entre outros livros, do recém-lançado “A Razão de Deus”, onde algumas das questões abordadas neste artigo são discutidas.

Fonte:
http://cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21384

domingo, 9 de dezembro de 2012

Aonde eles pretendem chegar?


07.12.2012 - Mino Carta - Carta Capital

Mala tempora currunt, costumava dizer meu pai quando a situação política azedava. Maus tempos chegaram, em tradução livre.

Ele usava relógio de bolso de ouro de celebérrima marca suíça, presente de meu avô materno, Luigi, munido de tampa sobre a qual se lia, gravado em latim, o seguinte dizer: nada aconteça que você não queira lembrar. Nem sempre, contudo, a vida sorri.

Falo de cátedra, porque, quando meu pai morreu, herdei o relógio na qualidade de filho primogênito. Não o uso, mas o guardo com carinho e neste momento vejo meu pai a erguer a tampa com um leve toque de ponta de indicador e pronunciar, entre a solenidade e a pompa, mala tempora currunt.



Há qualquer coisa no ar que me excita negativamente e me induz a pensamentos sombrios, algo a recordar tempos turvos, idos e vividos. É a lembrança de toda uma década, espraiada malignamente entre o suicídio de Getúlio Vargas e o golpe de 1964, aquele executado pelos gendarmes da casa-grande, e exército de ocupação. Dez anos a fio, a mídia nativa vociferou contra líderes democraticamente eleitos e se expandiu em retórica golpista logo após a renúncia de Jânio Quadros.


Muita água passou debaixo das pontes, embora algumas delas levem o nome de ditadores e até de torturadores, mas o tom atual desfraldado à larga pelos barões midiáticos e seus sabujos não deixa de evocar um passado que preferiria ver enterrado.



Talvez esteja, de alguma forma, mesmo porque as personagens têm outra dimensão. Os propósitos são, porém, semelhantes, segundo meus intrigados botões. Acabava de lhes perguntar: qual será o propósito destes comunicadores, tão compactamente unidos no ataque concentrado ao PT no governo? Qual é o alvo derradeiro?

A memória traz à tona Jango Goulart e Leonel Brizola, a possibilidade de uma mudança, por mais remota, e os alertas uivantes quanto ao avanço da marcha da subversão.

Os temas agora são outros, igual é o timbre. Além disso, na comparação, mudança houve, a despeito de todas as cautelas e do engajamento tucano, com a eleição de Lula e Dilma Rousseff. Progressos sociais e econômicos aconteceram.


O ex-presidente tornou-se o “cara” do povo brasileiro e do mundo, a presidenta, se as eleições presidenciais se dessem hoje, ganharia com 70% dos votos.

Percebe-se, também, a ausência de Carlos Lacerda. Ao menos, o torquemada de Getúlio e Jânio lidava melhor com o vernáculo do que os medíocres inquisidores de hoje. Medíocres? Toscos, primários, sempre certos da audiência dos titulares e dos aspirantes do privilégio, em perfeita sintonia com sua própria ignorância.


Contamos, isto sim, com o Instituto Millenium.

Há quem enxergue na misteriosa entidade, apoiada inclusive com empresários tidos como próximos do governo, uma exumação do Ibad e do Ipes, usinas da ideologia fascistoide que foi plataforma de lançamento do golpe de 64.

Até onde vai a parvoíce e onde começa o fingimento?

É possível que graúdos representantes do poder econômico não se apercebam das responsabilidades e alcances da sua adesão ao insondável Millenium?

Ou estariam eles incluídos na derradeira prece de Cristo na cruz: perdoe-os, Pai, eles não sabem o que fazem?

Que o golpismo da mídia da casa-grande seja irreversível é do conhecimento do mundo mineral.

Causa espécie o envolvimento de personalidades aparentemente voltadas aos interesses do País em lugar daqueles da minoria.

Causa espécie, em grau ainda maior, a falta de reação adequada por parte do governo, inerte diante da ofensiva da autêntica oposição, o partido midiático.

Não basta dizer, como o ministro Gilberto Carvalho, que o povo está satisfeito com o bom governo de Lula e Dilma, enquanto a própria liderança do PT recomenda ao relator da CPI do Cachoeira, o intimorato Odair Cunha, que retire os halfos para o morrinho e Policarpo Jr. do rol dos passíveis de indiciamento.

Ri do quê? Este ministro nos deixa intranquilos.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr
E aí se apresenta o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (foto), empenhado no esforço de demonstrar que não foi ignorado pela Polícia Federal no episódio destinado a exibir as mazelas do terceiro escalão governista. Notável protagonista, altamente representativo. Precioso aliado do banqueiro Daniel Dantas em determinadas ocasiões, como, de resto, muitos outros “esquerdistas” brasileiros.

Ah, sim, Cardozo acha que Lula provou sua inocência no caso da secretária Rose e de suas consequências. Acha? Ainda bem. Soletra ele, diante das câmeras da tevê: “Imaginar que o ex-presidente estivesse envolvido por trás disso, está, a meu ver, desmentido”. A meu ver? Estivesse eu no lugar de Lula e de Dilma, viveria apavorado ao perceber este gênero de comandantes à frente do meu efetivo.

E à presidenta, que CartaCapital apoiou e apoia, recomendamos a leitura de um dos mais qualificados arautos da direita golpista.

Merval Pereira (foto) não se confunde com Carlos Lacerda, mas na semana passada avisou não ser o caso de isentar Dilma das denúncias de corrupção, presentes e passadas.

Está clara a intenção de aplicar à presidenta a tese do domínio do fato.

Fonte:
http://www.cartacapital.com.br/politica/aonde-eles-pretendem-chegar/

Demais imagens: Google Images