quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Fiscalização constata alto índice de trabalho escravo também no Sudeste

por Robson Braga, jornalista da Adital
As fiscalizações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) para identificação de trabalho escravo no Brasil foram, em 2009, além das regiões Norte e Nordeste e possibilitaram perceber que essa forma de exploração humana está diluída por toda a nação. Dos 4.051 trabalhadores/as libertados da condição de escravo em todo o país de janeiro a novembro deste ano, 39% eram explorados no Sudeste, sendo que, em 2008, esse percentual foi de 10%. Os dados foram compilados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).

Em 2009, 20% das pessoas libertadas da escravidão estavam no Nordeste; 18%, no Norte; 15%, no Centro Oeste; e 8%, no Sul. Por Estado, 749 trabalhadores foram libertados no Rio de Janeiro (Sudeste), 388 em Tocantins (Norte), 386 no Espírito Santo (Sudeste), 379 em Pernambuco (Nordeste), 364 em Minas Gerais (Sudeste) e 288 no Pará (Norte).

Esses valores não significam, entretanto, que o número de casos aumentou ou diminuiu nas regiões brasileiras, e sim, que as fiscalizações focaram mais a região Sudeste, para a qual menos se atentava antes.

Esses valores "não são novidades, o que tivemos de diferente este ano foi o holofote da fiscalização, que se voltou mais para [a região] Sudeste, [os Estados do] Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso", considerou o frei Xavier Plassat, coordenador da campanha de erradicação do trabalho escravo, da CPT.

Um fator que vem permitindo, desde 2007, uma maior atuação do governo federal nas investigações é a participação das superintendências estaduais do Ministério do Trabalho nas investigações. De 2003 - quando foi lançado o Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo - até 2007, o país contava apenas com a fiscalização do grupo móvel do MTE.

"Este ano, metade das investigações foi feita pelas superintendências e a outra, pelo grupo móvel. Essa divisão de trabalho permitiu que mais ações pudessem ser desenvolvidas simultaneamente", explicou Xavier.

Para o frei, a fiscalização do governo federal para erradicar o trabalho escravo não dá conta do problema, "que é estrutural". "Libertar escravos não elimina a escravidão, porque devolve o libertado para a mesma condição", afirmou.

Apesar da crítica, Plassat destacou a iniciativa da superintendência do MTE em Mato Grosso, que tem oferecido capacitação profissional às vítimas retiradas do trabalho escravo.

Na avaliação dele, entretanto, o problema da escravidão só será sanado "quando o campo tiver um campesinato consciente, uma agricultura familiar forte e uma reforma agrária de verdade", disse.

Mesmo as fiscalizações - principal ponto da estratégia governamental - "são insuficientes", enfrentam um déficit de equipes, de grupos policiais e "impasses nas concepções do trabalho", acrescentou Xavier. Dos 74 casos verificados no Pará em 2009, por exemplo, apenas 34 foram fiscalizados. Dos 28 no Maranhão, somente dez foram vistoriados.

Os dados também mostram que, dos 4.051 libertados, 47% eram explorados na cana-de-açúcar, 18% em outras lavouras, 14% na pecuária e 6% no carvão. Dos 207 empreendimentos onde se constatou mão-de-obra escrava no país em 2009, 50% compunham o setor pecuarista; 11%, ligados ao carvão; 7%, canaviais; e 14%, outras lavouras.

Condenações

As punições criminais de exploradores de mão-de-obra escrava, que antes eram pontuais, podem ser ampliadas, devido à condenação penal de 28 fazendeiros pela Justiça Federal em Marabá, no Pará. A avaliação foi feita pelo frei Xavier Plassat.

"A condenação é muito emblemática, porque antes não se sabia ao certo de quem era a competência para julgar esses crimes, se a Justiça Federal ou a Estadual. A decisão do STF [Supremo Tribunal Federal] em 2007 atribuiu a competência à Justiça Federal", explicou o frei.

Para Plassat, a "queda de braço" entre os que lutam contra o trabalho escravo e os que o promovem se acentuou em 2009. "O agronegócio faz uma pressão enorme, tentando desqualificar a fiscalização do Ministério do Trabalho. Eles dizem que a política devia ser educativa, e não punitiva, pra deixar o setor em paz", criticou.