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domingo, 22 de dezembro de 2013

Duas aventuras pan-europeias: na África e na Ucrânia

15/12/2013 - Duas aventuras pan-europeias: Asterix em Bangui e a roleta russa da Santa Aliança
- Rui Peralta, Luanda - Página Global

I - São famosas as intervenções francesas em África.
Apenas relembrando as dos últimos tempos temos: a Costa do Marfim (utilizando veículos da ONU, para retirar do poder um presidente incômodo aos interesses franceses e o Mali (em curso).

Por apurar, ainda, o papel da França no genocídio de Ruanda e no presente a intervenção francesa na Republica Centro-Africana (será que caçarão o “mau da fita”, Abdallah Hamat?).

Têm também no seu historial pós-invasão uma série de “eleições”, “legitimando” os governos neocoloniais nascidos das suas intervenções.

A lista das “obras” da França no continente africano é vasta: insegurança alimentar, subnutrição, carências sanitárias, exploração dos recursos naturais, neocolonização, criação de governos fantoches (e sua manutenção no poder) e militarização do continente são apenas alguns itens de tão vasta lista.

A França decidiu exercer a sua faceta de poder colonial em África, de forma aberta e “transparente”.

E tal como acontecia com os regimes coloniais no inicio da expansão europeia em África (a colonização era legitimada por bula papal) a França legitima os governos fantoches no continente através da “qualidade democrática” dos seus funcionários autóctones (assim foi na RDC [República Democrática do Congo], Mali e Costa do Marfim, por exemplo, sempre com o histórico balão de ensaio senegalês por detrás, colhendo as lições do “frére” Senghor).

A intervenção francesa na Republica Centro Africana tem alguns personagens que vale a pena mencionar.

Abdallah Hamat é um desses personagens típicos que pululam pelo continente.

Autodesignado general ascendeu à ribalta como lugar-tenente de Michel Djotodia, coordenando ações militares decisivas para a expulsão do presidente François Bozizé.

Acusado de vários homicídios, Hamat ficou no centro do tabuleiro com um ataque que comandou no passado dia 10 de novembro, ação que aparenta ter um cunho religioso.

Uma vez mais a “ameaça islâmica fundamentalista” serve para tapar peneiras e na Republica Centro Africana não foi necessário fomentar núcleos da al-Qaeda para justificar a invasão: bastou a figura do Hamat - o que reduz substancialmente os custos da intervenção – para o Conselho de Segurança da ONU autorizar que soldados franceses e da União Africana (sempre por arrasto, esta figura pateticamente apática da UA).

O cenário é confuso. As milícias SELEKA, islâmicas, apoiantes de Michel Djotodia, que em março foram decisivas para depor François Bozizé são comandadas pelo tal Hamat e controlavam Bangui, a capital. Do outro lado estão as milícias cristãs designadas por “antibakala” leais a Bozizé.      

O problema é que os franceses, chegados ao terreno, defrontaram a SELEKA, mas devido aos ataques sucessivos dos leais a Bozizé á capital, acabaram também por envolver-se em combates com as milícias cristãs.

Quanto ao presidente interino, Michel Djotodia [foto], quando em setembro anunciou a dissolução da SELEKA – seus apoiantes – viu rebentar uma onda de violência na capital, levada a cabo por milicianos islâmicos que não aceitavam a dissolução, perdendo o controlo da situação.  

O contingente da UA que se encontra no país, em missão de paz, é composto por 2 mil e 500 soldados, com a típica desorganização dos contingentes da UA e as limitações de financiamento que caracterizam estas intervenções africanas.

Este contingente deverá ser enquadrado em força de Paz da ONU, em Julho de 2014, quando o Conselho de Segurança se reunir para reavaliar a situação na Republica Centro Africana, caso a instabilidade persista. Neste caso a MISCA (a força de paz da UA na Republica Centro Africana), será reforçada com mais mil efectivos.

Desta forma a ONU poupa dinheiro, passando as despesas para a UA, deixando todos os parceiros contentes: a UA porque desta forma vê a sua politica de “resolução africana para os assuntos africanos” (leia-se: soluções que transformar-se-ão em parte do problema a medio prazo) e o Ocidente poupa dinheiro e limpa as mãos do assunto, deixando-as livres para o caso de uma intervenção futura, quando o descalabro da UA for irremediável e a terra já estiver queimada, podendo então fazer o que muito bem apetecer, pois tudo estará justificado.  

Em 1997, o país foi palco de uma missão similar, mas a França cansou-se de sustentar a prolongada estadia, acabando por reduzir as operações ao mínimo, criando, desta forma, as condições necessárias para uma intervenção mais direta, como aconteceu agora.

É evidente que os resultados são, como sempre, sentidos pelas populações de forma dramática: cerca de 160 mil refugiados, 240 mil desalojados e largas centenas de mortos.

É o preço que os Povos pagam pelas soluções neocolonialistas (Será que já estão a preparar um programa de recuperação “afrocapitalista” para a Republica Centro-Africana?

De certeza que as elites que se escondem por detrás da falsa “acumulação primitiva” – leia-se: esbanjamento do presente e anulação do futuro – já devem ter uma das suas sábias e pragmáticas soluções na manga).

II - Anteriormente com Sarkozy e atualmente com Hollande, a França alterou procedimentos e mecanismos da sua política externa.
Encabeçou as potências ocidentais na agressão á Líbia e impôs a linha mais dura do ocidente em relação á intervenção na Síria.

Transformados em “falcões” os franceses intervieram unilateralmente no Mali e François Hollande foi recebido como herói gaulês em Israel [foto], aplaudido pelos profetas da desgraça que impõem os seus delírios ao povo hebraico.

O mesmo Hollande acabou de enviar tropas para a Republica Centro Africana, para “restaurar a ordem” (será que os lideres gauleses tentam substituir a milenária “Pax Romana” por uma mais atualizada e eficaz “Pax Gauloise”?

Esta é a mesma França que no início do presente século XXI foi ridicularizada pelo Congresso dos USA, devido á sua recusa em seguir a intervenção norte-americana no Iraque e que renunciou publicamente à “Francafrique”, considerando-o um “comportamento inapropriado”.

Então como explicar esta viragem na política externa francesa?

A explicação tem vertentes internas e externas.

Nos factores internos é de salientar um movimento migratório, provocado pela História colonial francesa: o grande número de cidadãos islâmicos, na sua maioria pobres, ou usufruindo de baixos rendimentos, com muitos dos jovens islâmicos franceses – sentindo-se sem perspectivas e sofrendo com um problema de identidade, devido á sua condição proletária - a serem atraídos pela extrema-direita islâmica.

Ainda que esta viragem na politica externa seja sentida em todo a região pan-europeia, ela foi particularmente forte na França, evocando uma reação politica interna, em que deve também ser salientado a xenofobia da extrema-direita francesa (Frente Nacional) e de uma tendência que se faz sentir na esquerda politica e no “centro-esquerda”, como a representada pelo ministro do Interior, Manuel Valls, do Partido Socialista, cuja principal atividade é reprimir a migração ilegal e em particular as comunidades islâmicas.

Esta política, cujo lema é “Responsabilidade de Proteger”, percorre todo o espectro político francês, da direita á esquerda, principalmente nos sectores pantanosos do “centro” (“centro-direita” e “centro-esquerda”).

Uma das suas figuras principais é Bernard Kouchner [foto], fundador dos Médicos sem Fronteiras (MSF), que foi primeiro-ministro de Sarkozy.

Outro dos seus arautos é Bernard-Henri Levy [foto abaixo], que foi conselheiro de Sarkozy, função que continua a exercer para Hollande.

No entanto é nas dinâmicas externas que poderemos encontrar um fator de maior importância, para entender o que se passou com esta viragem, aparente, da política externa francesa.

Desde 1945 que a França luta para manter-se como figura de maior relevo no cenário mundial. Neste esforço a França teve que contornar um obstáculo: USA.

Para Charles de Gaulle a preocupação primordial era a França reassumir o seu papel mundial e reafirmar-se nas arenas internacionais.

De Gaulle tentou de muitas formas, desde a aproximação com a União Soviética, o seu distanciamento em relação á NATO [OTAN], a sua forte relação com Israel (principalmente na guerra da Argélia), num momento em que as relações de forças na ONU impulsionavam uma direção oposta (foi a França que armou Israel, no ataque conjunto franco-britânico-israelita ao Canal do Suez, em 1956).

O vínculo especial com Israel terminou em 1962, depois da independência da Argélia e a França demonstrou-se mais preocupada em renovar as suas relações (e influencia) com as ex-colônias do Norte de África.

Esta política não foi apenas uma política gaullista, tendo sido assimilada por muitos socialistas franceses e por muitos sectores não gaullistas á esquerda e á direita do espectro politico francês.

A Grã-Bretanha e os USA sempre foram (desde a Segunda Guerra Mundial) os dois grandes fantasmas da política externa francesa, dois concorrentes poderosos, que viam na França um parceiro difícil de controlar e excessivamente espicaçado por uma competição desenfreada pelos lugares cimeiros da política internacional.

A crise econômica internacional, que afeta com particular dureza as economias capitalistas do Ocidente levou a uma cartelização dos interesses do capitalismo, provocando uma estratégia imperialista de concertação em torno de interesses geoeconômicos comuns.

Neste novo cartel a França assume o lugar de “falcão”, desempenhando com graciosidade o papel de “polícia mau”, assumindo a “linha dura” no combate ao “inimigo islâmico”.

É assim, que depois de um longo interregno (desde 1962) que Israel volta a ver a França como o seu melhor amigo (ainda que este não seja um amigo tão poderoso como os USA).
       
Existe no entanto um fator que não permite que a França assuma o seu “destino napoleônico” (esse complexo imperial da burguesia francesa desde a sua ascensão a força dominante na sociedade francesa): o caótico cenário geopolítico da atualidade.

Na Ásia Ocidental (Médio-Oriente) existem potências regionais imprevisíveis, que impedem a França de jogar, aqui, um papel primordial. Muito menos a Ásia Oriental (apesar do peso histórico da França por essas zonas) é um cenário favorável para as elites francesas passearem as suas plumas pós-modernistas.

Resta a África, o único continente onde a França pode reassumir um papel central, aparecendo lado a lado (mas um pouco mais á frente) dos USA e da Grã-Bretanha (graças não apenas à cartelização de interesses, como também ao fator migratório, que permite aos franceses terem agentes provocadores mais baratos e conhecedores do terreno).

E a França aproveita a oportunidade oferecida, continuando a cantar os “Enfants de la Patrie”, mesmo que sejam “enfants terribles”, filhos bastardos de uma França madrasta.

III - A região pan-europeia pode ser dividida em dois polos geopolíticos e geoeconômicos concorrentes.


Uma área aparentemente integrada a vários níveis (U.E.) constituída por um núcleo monetário – a Eurolândia – e uma outra adversa ao atual projeto europeu e dominada pela Rússia.

Esta ultima região pan-europeia (e também meta-europeia, uma vez que abrange vastos territórios não só da Eurásia, mas também da Ásia Oriental) com uma forte tradição autocrática é de difícil sedução para os seus vizinhos europeus (principalmente para as classes médias) que anseiam por se integrar na U.E.

Este conflito entre a Rússia e a U.E. passa na atualidade por um período de alta conflitualidade na Ucrânia.

Apesar da proximidade cultural e histórica entre ucranianos e russos (sem esquecer a existência na Ucrânia Ocidental de uma minoria histórica russófoba) a Rússia não apresenta qualquer atrativo para as classes médias ucranianas, que procuram afirmar-se na sociedade ucraniana.

Esta classe média (maioritariamente média-baixa) vê na U.E. a possibilidade de maior enriquecimento, assim como no Ocidente uma panaceia para os seus problemas centrais (como ficou patente na “Revolução Laranja”) e olha para Oriente com algum receio e incerteza.  

Este receio das classes médias ucranianas em relação aos seus vizinhos tem, obviamente, o respaldo dos setores da burguesia ucraniana (as classes médias caracterizam-se por um comportamento acéfalo, que obedece a dois inputs fundamentais: a vontade de enriquecer e o medo de empobrecer) que apenas poderão assumir um papel preponderante e de domínio total se diluírem-se no seio da Europa Ocidental (esta é uma questão histórica para a burguesia ucraniana e que marca fases decisivas na História da país).

Os dois modelos concorrentes de capitalismo na região pan-europeia (um modelo liberal que hesita entre a incerteza da liberalização total e as indecisões neokeynesianas, no lado da U.E. e o modelo russo de desenvolvimento, assente no capitalismo de estado, tendencialmente oligárquico, consequência do socialismo real e do caos reinante durante o período de transição para o capitalismo) confrontam-se na Ucrânia em função destes fatores de dinâmica interna, mas também de importantes fatores de dinâmica externa, de raiz geopolítica e geoeconômica. [foto: Júlia Timochenko, magnata ucraniana com Vladimir Putin, da Rússia]

A Ucrânia é uma fase atual (como o foi a Geórgia num passado recente) da longa batalha travada entre a U.E. e a Rússia.

O Ocidente (NATO e U.E.) tenta evitar a todo o custo a consolidação geopolítica da Federação Russa – e geoeconômica, afirmando o controle da “rota do gás” por parte da Rússia – e a Rússia, que volta em “pleno” (politica e economicamente) ao palco global, tenta reafirmar-se como potência.    
Com a dissolução da URSS em 1991 e posterior separação da Ucrânia, as relações entre os dois países tem-se constituído por acordos mais ou menos instáveis em matéria de gás ou da presença da frota do Mar Negro nos portos da Crimeia.

A atual estratégia ocidental atua sobre o sector energético e abrange uma miríade de formas que vão desde as rotas alternativas aos gasodutos russos até às medidas anti monopólio contra a GAZPROM, tudo montado a partir de Bruxelas.

Estas constantes pressões ocidentais, com repercussões negativas sobre a Ucrânia, levaram a Rússia a aumentar a sua exportação de gás para o Oriente – China, Japão e Coreia.

A Rússia apresenta-se segura dos seus objetivos.

Tem obtido vitórias plausíveis na política externa, com a desmontagem do cartel OTAN / Estados do Golfo, formado para destroçar a Síria e mais recentemente com o acordo estabelecido entre a comunidade internacional e o Irã sobre o programa nuclear iraniano.

Esta atitude de conforto e de confiança por parte dos russos contrasta com a atitude beligerante e arruaceira da U.E.

A Alemanha continua amarrada ao seu papel na Revolução Laranja, apoiando diretamente duas das forças politicas que organizaram os protestos (através da Fundação Konrad Adenauer, da CDU), advertindo o Presidente ucraniano [Victor Yanukovitch - foto acima] contra o uso da violência e qualifica o sistema judicial ucraniano de “justiça seletiva”, ao referir o caso de Júlia Timochenko [ao lado], a magnata pró-Ocidente (uma das figuras de proa da Revolução Laranja, que pouco tempo depois atolou-se em escândalos de corrupção) enquanto Guido Westerwelle o (ainda) ministro das relações exteriores do gabinete germânico passeia-se pelas manifestações de Kiev, por entre as bandeiras do SVOBODA [abaixo], um partido antissemita da extrema-direita ucraniana.

Para além da Alemanha, a Polônia e a Suécia, através dos respectivos ministros das relações exteriores, expressaram o seu apoio aos manifestantes ucranianos pró U.E. e o primeiro-ministro polaco chegou a intervir em comícios e encontros realizados em Kiev.

Estarão os líderes da U.E a entrarem num processo de senilidade acentuada que já os fazem esquecer princípio básicos do direito internacional, como o da não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados?

Ou será que foram tomados pelo “amigo alemão” (Alzheimer)?

IV - Mas, sobre os acontecimentos na Ucrânia, existe um aspecto que não é referido em qualquer meio de comunicação social: o estabelecimento da “Profunda e Completa Área de Livre Comércio” (DCFTA- Deep and Complete Free Trade Area).
O que é a DCFTA?

Para respondermos a esta questão, vejamos um pormenor crucial da balança comercial ucraniana (e que permitirá uma melhor compreensão deste mecanismo): a Ucrânia exporta cerca de 15 mil milhões de euros para a U.E. e importa desta, cerca de 24 mil milhões de euros.

Ora, o DCFTA contribuirá para uma maior integração econômica com o mercado interno da U.E. através da adoção de medidas legislativas por parte dos ucranianos.

Isto inclui a eliminação de todos os obstáculos ao comércio, serviços e ao fluxo de investimentos (em particular com os investimentos no setor energético).

Uma vez que a Ucrânia incorporou-se ao Acervo Comunitário Europeu a U.E. concede-lhe acesso a todos os mercados internos europeus.

Por enquanto, como o DCFTA ainda não entrou em vigor, as taxas aduaneiras e outras barreiras alfandegárias ou fiscalmente mais vastas, ainda fazem-se sentir nos custos das operações e transações entre a U.E. e a Ucrânia (mesmo que sejam mais baixas e existam algumas isenções), mas quando o DCFTA estiver em vigor os operadores econômicos pouparão cerca de 750 mil milhões de euros por ano, em taxas, impostos e direitos.

Dadas as disparidades (evidentes nos números acima apontados, da balança comercial ucraniana) – e para dar uma ideia mais vasta do atual panorama o poder econômico da U.E é 40 vezes superior ao da Ucrânia e o quantitativo de investimentos europeus é 11 vezes superior – não é difícil imaginar que percentagem dos 750 milhões de euros em poupanças, gerados pelo DCFTA, pertence à U.E. e qual a que é pertença da Ucrânia e aos quais é necessário adicionar os números da liberalização dos investimentos, uma mais-valia incalculável para os investidores da U.E., se atendermos a que os investimentos da U.E. na Ucrânia, na área de infraestrutura (transporte, energia, meio ambiente e equipamentos sociais) estarão cobertos por financiamentos adicionais destinados a cobrir eventuais necessidades de tesouraria.

O que na verdade está a acontecer com a DCFTA é a completa assimilação jurídica da Ucrânia por parte da U.E. (fornecedora, com 40 vezes mais capacidade de capitalização e 11 vezes mais capacidade de investimento).

O principal propósito das leis e dos regulamentos comunitários da U.E. tem como pano de fundo a eliminação dos mecanismos institucionais que possam proteger os mercados nacionais dos estados membros da U.E., abrindo-os completamente a condições alienígenas para os quais estes mercados não se encontram preparados, ou perante os quais não têm qualquer mecanismo orgânico ou interno de defesa.

Por fim uma outra questão é abordada no DCFTA: a mobilidade.

O máximo de mobilidade (livre-circulação) de mercadorias, serviços, bens e capitais, mas um extraordinário vazio sobre uma mobilidade que é fundamental para um efetivo desenvolvimento e fortalecimento da Ucrânia: a livre-circulação de pessoas, sob a forma de mão-de-obra.

Para a economia ucraniana é importante o fator migratório, no sentido de abarcar mão-de- obra tecnicamente especializada, mas também no sentido de fazer escoar a mão-de-obra excedente para a U.E., ao mesmo tempo que permitiria uma maior abertura do ensino médio e superior através do intercâmbio com instituições da U.E., novas especializações, melhor qualidade de ensino, etc.

Mas a profundidade do DCFTA limita-se à livre circulação de capitais, bens, serviços e mercadorias.

As pessoas (o fator humano) ficam de fora, ou com “livre-circulação” de um sentido apenas.

Claro que falar em questões que deveriam ser abrangidas por estes acordos, como a globalização da Segurança Social, através de mecanismos de capitalização global de fundos internacionais, regionais, ou intercontinentais, está completamente fora de questão.

Livre circulação de Capitais, serviços e mercadorias, sim! Livre circulação de pessoas e políticas sociais (mesmo através da capitalização de fundos), não!

V - Pelo conjunto de fatores (internos e externos) acima descritos seria lógico prever que os protestos na Ucrânia contra a decisão do governo de Victor Yanikóvich de não assinar o Acordo de Associação com a União Europeia (com mais de mil e quinhentas páginas, do qual o DCFTA é um anexo) assumiram formas violentas, em escalada de intensidade.

E isto acontece porque estamos perante uma operação de desestabilização, em que as dinâmicas internas (o descontentamento das classes médias e as aspirações das burguesias – financeira, comercial, industrial e agrária – da Ucrânia) foram doutamente explorados e cruzados com as dinâmicas externas.

O auge da intensidade dos conflitos foi atingido no dia 1 de dezembro, com a ocupação de edifícios públicos por parte dos manifestantes.

No dia anterior a BERKUT – o corpo especial da polícia ucraniana – dispersara violentamente uma manifestação pacífica em Maidan, na Praça da Independência.

Os protestos alargaram-se a grande parte do território, com especial incidência em Kiev e na Ucrânia Ocidental (tradicionalmente um bastião pró-ocidental) mas também em Dnipropetrovsk, na Ucrânia Oriental.

O modelo proposto pelo Acordo de Associação com a U.E. choca com a adesão ao projeto russo da União Euroasiática, que engloba também o Cazaquistão e a Bielo-Rússia.

Este projeto, a longo prazo representa uma saída de estabilidade para a débil economia ucraniana, mas que não é viável para a burguesia ucraniana (que será asfixiada e subordinada ao Estado) e muito menos para as classes médias (que passarão por um breve processo de proletarização, que elas tanto temem).

Para as camadas mais desfavorecidas da população e para os setores administrativos (acadêmicos, elite administrativa, elite tecnocrática) esta representa uma forma de escapar à deterioração das condições de vida e adquirem (principalmente os trabalhadores assalariados da industria e trabalhadores agrícolas) uma posição de maior importância na sociedade ucraniana, sendo algumas das suas reivindicações satisfeitas.

De um modo geral e pesando vantagens e desvantagens, a União Euroasiática representa um reforço da soberania nacional e popular da Ucrânia e uma integração mais efetiva nos mercados globais, pois não se encontrará sujeita aos ditames das obrigações impostas á regionalização europeia, que transformariam a Ucrânia numa economia periférica, produtora de grão e de carvão e fornecedora de mão-de-obra barata.

Por outro lado a União Euroasiática representa também uma forma da Ucrânia rentabilizar a sua dependência em relação ao gás russo (baixando o custo e ampliando os créditos a juro mais baixo, por exemplo, ou assumindo uma parceria para a reexportação – adquirindo vantagens nos mercados europeus - com a GAZPROM).

É bom não esquecer que mais de 60% das exportações ucranianas vão para o mercado russo, pelo que a União Euroasiática representaria um importante polo de desenvolvimento para o setor exportador ucraniano, diminuindo desta forma o peso e o impacto das importações.

As elites ocidentais, pan-europeias, do capitalismo contemporâneo, obrigadas – contra vontade - à cartelização, sofrem de um problema que advém dos tempos recentes das “economias de casino”: viciaram-se no jogo.

E se ao Sul, os jogos africanos são mais rentáveis do que nunca, a Leste iniciaram-se os jogos euroasiáticos…

Vinde, Senhores! A adrenalina de vasto mercado espera-vos… (embora na Eurásia, dos gauleses, nem murmúrios).    

Fontes:
Böröcz, József  - The European Union and Global Social Change: A Critical Geopolitical-Economic Analysis Rutger University Press, New Jersey, 2009
Ferrero, Àngel - Ucrania: la bisagra entre Rusia y la !Unión Europea estalla en protestas http://www.sinpermiso.info
Böröcz, József -  http://www.criticatac.ro/lefteast/ukraine-eu-dependency/
Oakford, Samuel - http://www.ipsnoticias.net/2013/12/onu-al-margen-del-caos-en-republica-centroafricana/
Poch, Rafael - http://blogs.lavanguardia.com/berlin/?p=520
Wallerstein, Immanuel - http://www.jornada.unam.mx/2013/12/08/  
http://www.guinguinbali.com
http://www.rebelion.org

Fonte do artigo:
http://paginaglobal.blogspot.pt/2013/12/duas-aventuras-pan-europeias-asterix-em.html

Leia também:
- Líderes europeus rejeitam apoio a missões militares francesas na África - Correio do Brasil

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Brasil, mais que o Oriente Médio

13/11/2013 - Brasil agregará mais petróleo ao mundo até 2025 do que o Oriente Médio
- Fernando Brito - Com Texto Livre

Quem quiser se iludir, que se iluda.

Pode ficar achando que a mídia está preocupada com a receita da Petrobras ao defender o aumento – necessário, aliás – dos preços dos combustíveis.

Ou que a turma do “vende-país” que se assanha para voltar, de carona com Aécio Neves [D] ou Eduardo Campos [foto-E] – tanto faz, como diz FHC – é que sabe fazer “leilão bão”.

Ou ainda que não insuflam os bem intencionados – mas ingênuos – que acham que se pode deixar o petróleo dormindo lá no pré-sal, esperando que o Divino Espírito Santo nos arranje o dinheiro para explorarmos sozinhos, com tudo o que isso envolve de centenas de bilhões de dólares de investimento.

Agora, quem quiser entender, de verdade, o que está por detrás dessa história, olhe o gráfico acima, divulgado ontem [12/11] pela Agência Internacional de Energia, em seu relatório anual.

A Agência é um órgão da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico] reúne os países desenvolvidos e alguns poucos em desenvolvimento, e o Brasil não é um deles.

Sim, é isso mesmo que você está vendo lá nos dados: o Brasil vai contribuir MAIS que o Oriente Médio no crescimento da produção de petróleo mundial até 2025. E o resto do mundo tem previsão de queda na produção.

Entendeu?

Vamos ser mais importantes para suprir o crescimento da demanda de petróleo do que a Arábia Saudita, do que o Iraque, do que o Irã, do que o Kuwait somados!

Será que você se recorda do quanto foi investido em guerra, armamento, sabotagem e intervenção nestes países nos últimos 30 anos?

Será que aqui não vale uns tostõezinhos para quem gastou tanto, em dólares e em vidas humanas, para garantir seu suprimento de petróleo?

A partir daí, meu preclaro amigo e minha arguta amiga, deixo por sua conta imaginar.

Só digo ainda duas coisas, apoiado neste segundo gráfico.

A primeira é de que previsão da AIE para o Brasil é modesta e conservadora, sobretudo no segundo período, de 2025 a 2035.

O potencial de nosso pré sal é maior que esse e nem está integralmente revelado.

A segunda é para tomar cuidado com a conversa de “fontes limpas” de energia que, embora seja correta e deva ser perseguida por todos os países – e são os ricos que mais resistem a essa obrigação – é usada, com frequência, com a mesma hipocrisia com que se fala da Amazônia, depois de terem devastado as florestas de seus próprios países.

Nossa matriz energética para a geração de energia elétrica é e será muito, mas muito menos, poluidora do que a do restante do mundo, sobretudo a dos países desenvolvidos, que são verdes só no quintal dos outros, depois de terem cimentado os seus.

A poluição é um fato econômico e, como todos os fatos econômicos tem um lado perdedor e um ganhador.

O perdedor somos toda a humanidade, mas o ganhador sabemos muito bem quais são.

Fonte:
http://contextolivre.blogspot.com.br/2013/11/brasil-agregara-mais-petroleo-ao-mundo.html

domingo, 22 de setembro de 2013

Investigador da ONU trabalha para Israel e OTAN

19/09/2013 - Relatório Sellstrom, distribuído pela ONU: Investigador da ONU trabalha para Israel e OTAN
- 18/9/2013, Yoichi Shimatsu [*], Global Research [1]
- Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Ake Sellstrom entrega Relatório a Ban Ki-Moon sobre armas químicas na Síria em 17/9/2013

Em vez de assegurar investigação não politizada e análises laboratoriais, a investigação pela ONU sobre ataques denunciados na Síria, por gás venenoso, foi dirigida pelo professor Ake Sellstrom, homem cercado de mistérios, cujos relacionamentos políticos e militares são envoltos num denso véu de sigilos.

O Relatório sobre a Síria para a ONU e, antes, os relatórios sobre inspeções feitas na Síria são ambos duvidosos, para dizer o mínimo. Aos olhos dos leigos, sua aparente objetividade e a aparente isenção baseiam-se no mito da neutralidade da Suécia. A opinião pública assume – erradamente – que a Suécia jamais tomaria partido em guerras e nos conflitos geopolíticos.

A fraude da neutralidade
O verniz apenas cosmético da neutralidade sueca já foi outras vezes habilmente explorado por Israel e pela OTAN para perpetrar falsidades, servindo-se para isso do trabalho de Sellstrom na ONU, inclusive para negar as causas químicas e biológicas da “Síndrome da Guerra do Golfo” e os embarques de armas químicas fornecidas pelos EUA ao governo de Saddam Hussein.

No Iraque, as equipes de inspetores de Hans Blix [foto] e Ake Sellstrom não investigaram os bunkers de armas especiais que foram bombardeados por aviões norte-americanos na invasão.

Sellstrom jamais fez qualquer tentativa de examinar as embalagens de mais de um metro de altura, fabricação norte-americana, do gás VX de efeito neurológico que foram encontradas na Base Aérea de Balad por soldados da American National Guard.

A missão de Sellstrom não era provar a culpa do Irã, mas livrar Washington do crime de ter fornecido gás de destruição em massa a Bagdá. Salvar da desgraça funcionários do governo dos EUA como Donald Rumsfeld, que seria acusado de traição, é muito mais importante para o poder imperial que descobrir fatos num teatro de guerra.

A crítica mais radical das investigações da ONU no Iraque foi feita por um investigador norte-americano, Scott Ritter, que acusou a equipe de ter espionado a favor de Washington e da OTAN.

A mesma dúvida surge hoje, sobre o relatório Sellstrom sobre a Síria. Sellstrom trabalhou para Washington e Telavive?

Homem de frente da OTAN
O que se divulga publicamente sobre Sellstrom é que trabalha como bioquímico chefe do Centro Europeu CBRNE, na Umea University no norte da Suécia, patrocinado pelo Ministério da Defesa da Suécia (FOI).

Embora o país não seja membro da OTAN, os militares e a polícia sueca têm papel importante nos negócios de segurança europeia, e são os autores do projeto de ação repressiva de 2009 da União Europeia, baseado no Programa de Contraterrorismo de Estocolmo.

Praticamente todo o dinheiro que mantém os projetos de pesquisas interdisciplinares do CBRNE vem do orçamento da União Europeia para guerra ao terror.

Esses projetos incluem: defesa estratégica para ataques terroristas de grande escala (o relatório recém divulgado sobre a Síria usa inacuradamente a expressão “relativamente grande escala”); recomendações à União Europeia para resposta médica de emergência; e treinamento especializado para os especialistas na Umea University, inclusive para oficiais militares ligados à OTAN.

O complexo militar sueco, que inclui Saab e Bofors, é qualquer coisa, menos pacifista ou neutro. A imagem de neutralidade que o reino oferece é útil, sobretudo a Israel, que já explorou a imagem de limpeza da Escandinávia, quando se tratou de montar uma política para palestinos e estados árabes, como se comprovou nos Acordos de Oslo.

A Umea University mantém vínculos profundos de pesquisa com o Instituto Israel de Tecnologia (Technion) [vista aérea, acima], a universidade com sede em Haifa que produz tecnologia de ponta para o exército israelense e suas agências de inteligência.

Vários departamentos, envolvidos em pesquisas conjuntas com especialistas de Israel, participam de estudos multidisciplinares no Centro CBRNE de Sellstrom, dentre os quais, o departamento de computação, que coopera com o Technion israaelense no setor de sistemas de controle desde 2004; a faculdade de Medicina; e no campo da química, área de estudos do próprio Sellstrom.

A pesquisa em cooperação sueco-israelense é ativamente estimulada pela Real Academia Sueca de Ciências, que oferece bolsas e prêmios para aproximar as indústrias e as universidades dos dois países.

Esse ano, o Estado de Israel está patrocinando o programa Start Tel Aviv de expansão de laços culturais, numa incansável campanha para subverter a Escandinávia.

A agenda fortemente política e os laços militares por trás da cooperação bilateral já foram causa de uma ação de boicote anti-Israel, entre os professores e acadêmicos suecos.

Nenhuma credibilidade na questão síria
A expressão “relativamente grande escala” que aparece na introdução do relatório da ONU sobre a Síria é erro e exagero, porque qualquer ataque um pouco maior com gás sarin teria resultado em dezenas de milhares de mortos, sobretudo se o gás tivesse sido dispersado por foguetes militares.

Os primeiros vídeos de Ghouta mostravam moradores saindo das casas para a rua, ofegantes, à procura de ar limpo. Se tivessem sido usados foguetes eficientes, todos eles, sem exceção, teriam morrido na rua, instantaneamente. A liberação do gás, portanto, aconteceu em ambiente fechado e tem de ter sido acidental, mais provavelmente num arsenal secreto de grupos rebeldes.

Resíduos químicos de supostos foguetes teriam sido oxidados pelo calor do impacto e com absoluta certeza não restaria nenhum traço detectável de organofosfato, porque o sarín decompõe-se quimicamente em 20 minutos.

Os foguetes são desenhados com um sistema binário, pelo qual dois precursores químicos misturam no ar, no momento da dispersão. Portanto, não há necessidade de estabilizadores ou de dispersantes, o que implica que não restam vestígios químicos identificáveis.

Os inspetores da ONU chegaram muito depois de expirado o prazo para testar amostras. E é também possível que o local e os pedaços de foguete tenham sido mascarados com sinais falsificados pelos rebeldes e seus conselheiros militares estrangeiros.

Não é possível conhecer o número exato de mortos, e com certeza não se veem nos vídeos mais que uma dúzia de cadáveres em cada imagem. As cenas com crianças são clássicas na propaganda de guerra e não são críveis, se só se veem poucos rostos. O efeito somatório daquelas imagens é mais próximo da teatralização que da reportagem confiável.

A estratégia de Sellstrom, como tudo indica, é apontar o dedo acusatório contra o regime sírio, ao mesmo tempo em que fecha a possibilidade de cenários alternativos e, de fato, mais prováveis.

Agenda Oculta
A embaixadora dos EUA à ONU, Samantha Power [foto], fez questão de esclarecer com muita ênfase, que “o gás de efeito neurológico usado na Síria era mais concentrado que o gás de efeito neurológico no Iraque”.

A declaração dela, corretamente redigida é: “Saddan pode até ter transferido para a Síria o gás letal que os EUA lhe forneceram, mas não foi o nosso gás letal que matou civis sírios”.

O ponto crucial do Relatório Sellstrom é: salvar Washington do crime de ter sido o principal fornecedor de precursores do gás letal, das fórmulas, dos sistemas da tecnologia de emprego e armazenagem do gás letal para todo o Oriente Médio, incluindo Israel, Egito, Líbia, Iraque e, possivelmente, também para a Síria (durante a era de boa vontade de Clinton).

O relatório da ONU sobre armas químicas na Síria não tem os mínimos requisitos de credibilidade, também dado o currículo duvidoso do inspetor chefe, Ake Sellstrom, financeira e politicamente comprometido em todos os níveis.

É necessária uma missão técnica imparcial, de especialistas investigadores internacionais conhecidos e respeitados pela própria comunidade de especialistas, mas nem essa terá qualquer chance de fazer investigação confiável, enquanto Washington continuar a fornecer armas e apoio político aos insurgentes, inclusive à Al-Qaeda.


O objetivo geopolítico que se oculta por trás da cenografia orquestrada pela Casa Branca para a Síria é tirar de Damasco a sua já limitada capacidade de contenção contra as forças nucleares israelenses.

Gás de efeito neurológico não chega a ser resposta à altura de um ataque com ogivas nucleares, mas o objetivo de Israel parece ser a absoluta supremacia estratégica contra os estados árabes e o Irã.

Com o novo relatório da ONU sobre a Síria, Telavive está muitíssimo mais perto de conseguir deixar todos os seus vizinhos, além de divididos, também sem defesas.
_______________________

[*] Yoichi Shimatsu é jornalista especializado em ciências, que trabalha em Hong Kong e coordenou a equipe de jornalistas investigativos do jornal Japan Times Weekly. Foi consultor da revista Takarajima 30, na investigação sobre o ataque com gás sarin, no metrô de Tóquio, em 1995.

Nota dos tradutores 
[1] Este artigo foi dica de Pepe Escobar, pelo Facebook: “Até agora, a melhor matéria sobre o caso da inspeção da ONU na Síria. Shimatsu é jornalista de alta credibilidade. A hipótese mais aceitável, para ele, é que não houve foguete algum; que o mais provável é que tenha sido um acidente, num arsenal dos jihadistas; coincide com o que escreveu Dave Gavlak, que entrevistou moradores de Ghouta” (Pastebin)

Ver aqui:
- Sírios acusam a Arábia Saudita pelo fornecimento de armas químicas - por Dale Gavlak e Yahya Ababneh

Fonte:
http://redecastorphoto.blogspot.co.at/2013/09/relatorio-sellstrom-distribuido-pela.html?utm_source=feedburner&utm_medium=feed&utm_campaign=Feed:+redecastorphoto+(redecastorphoto)

sábado, 21 de setembro de 2013

Breve história da guerra dos EUA contra a Síria

15/09/2013 - Uma breve história da guerra dos EUA contra a Síria: 2006-2014
- 14/9/2013, Blog Moon of Alabama, EUA
- Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

"O Congresso dos EUA desobedeceu ao AIPAC [American-Israel Public Affairs Committee] e ao lobby israelense."

"Foi a primeira vez que isso aconteceu, em 22 anos."

"A Síria reconquistou a própria independência."

"O mais provável é que, em 2014, Bashar al-Assad seja reeleito presidente da República Árabe Síria."

"A história síria o recordará para sempre, como governante civilizado e herói do seu povo."

"O povo dos EUA, pela primeira vez em décadas, conseguiu fazer parar uma guerra que o presidente desejava."

"Essa é vitória imensa e um precedente."

"Que todos os norte-americanos lembrem bem desses dias, quando aparecer outra guerra inventada, ou esse ou aquele país pequeno ou distante levantar-se."

"Os norte-americanos, nós, temos os meios para fazer parar qualquer guerra."

Mapa atualizado (até 22/8/2013) da guerra da Síria
(clique na imagem para aumentar)

Em 2006 os EUA estavam em guerra no Iraque. Muitas das forças inimigas contra as quais os EUA lutavam furiosamente chegavam ao Iraque através da 
Síria. No mesmo ano o Hezbollah derrotou Israel, que invadira o Líbano.

As forças armadas de Israel eram emboscadas cada vez que tentavam penetrar no Líbano, enquanto o Hezbollah [foto] usava foguetes contra as posições do exército israelense e nas cidades.

O Hezbollah recebia apoio e suporte da Síria e do Irã, que chegavam através da Síria. Os planos de longo prazo dos EUA e Irã, para manter a supremacia no Oriente Médio dependiam de interromper as vias de abastecimento para o Hezbollah.

Os países sunitas sectários do Golpe viram seus sunitas serem derrotados no Iraque e um governo xiita, apoiado pelo Irã, assumir no Iraque.

Todos esses países tinham motivos para tentar atacar a Síria. E também havia razões econômicas, que tornavam necessário derrubar uma Síria independente.

Um gasoduto, do Qatar à Turquia, competia com outro, do Irã à Síria. 

Grandes reservas de gás natural descobertas nas águas de Israel e Líbano, faziam aumentar muito a possibilidade de que também houvesse gás em águas nacionais sírias.

No final de 2006, os EUA começaram a financiar uma oposição externa ao partido Baath, que governava a Síria. 

Aqueles opositores eram na maioria exilados da Fraternidade Muçulmana expulsos da Síria depois que fracassaram várias tentativas de golpe de Estado, entre 1976 e 1982.

Em 2007, EUA, Israel e Arábia Saudita construíram um plano para “mudança de regime” na Síria. O objetivo do plano era destruir a aliança da resistência” entre o Hezbollah, Síria e Irã:

"Para minar o Irã, predominantemente xiita, o governo Bush decidiu, de fato, reconfigurar suas prioridades no Oriente Médio. No Líbano, o governo cooperara com o governo da Arábia Saudita, que é sunita, em operações clandestinas que visam a minar o Hezbollah, organização de xiitas apoiada pelo Irã."

"Os EUA também tomaram parte em operações clandestinas contra o Irã e seu aliado, a Síria. Resultado colateral dessas atividades foi provocar a radicalização de grupos sunitas extremistas, que têm uma visão militante do Islã e são hostis aos EUA e simpáticos à Al-Qaeda."

Em 2011, três anos de seca, provocada pelo aquecimento global e pela Turquia, que construiu barragens e gigantescos projetos de irrigação na região, haviam enfraquecido a economia síria.

Grandes populações, das áreas rurais mais pobres, perderam seus meios de sobrevivência e acorreram às cidades. Esses fatores criaram o terreno fértil a partir do qual lançar um golpe contra o estado sírio.

A parte que coube aos EUA naquele plano foi garantir cobertura “midiática” e o necessário “clima de opinião”, na opinião pública global, para viabilizar o golpe. Para isso, os EUA usaram as ferramentas que conhecem bem, de criar “revoluções coloridas”.

Jornalistas cidadãos” foram recrutados, treinados e armados com o necessário equipamento de vídeo e comunicações bem conhecidos da “mídia comercial” de propaganda, em todo o mundo. Outros foram treinados para organizar “manifestações civis pacíficas”.

Os sauditas [ao lado] encarregaram-se da parte mais tenebrosa do plano: financiaram e armaram grupos rebeldes, muitos deles associados à exilada Fraternidade Muçulmana, com a tarefa de instigar movimento mais amplo e atacar forças do estado sírio, além de atacarem também manifestantes civis pacíficos.

Uma manifestação local em Deraa, perto da fronteira da Jordânia, foi usada para iniciar o golpe. Manifestações começaram pacíficas, mas logo começaram os ataques à bala contra manifestantes e contra a polícia. Inevitavelmente, os dois lados escalaram.

Grupos armados pelos sauditas passaram a atirar consistentemente contra soldados do estado sírio.

Com colegas mortos e feridos, as forças do exército sírio retaliaram contra os manifestantes. Grupos de manifestantes armaram-se, eles também, para enfrentar o exército sírio.

Os “cidadãos jornalistas” entraram em cena, com propaganda de que só haveria vítimas entre os “manifestantes pacíficos” e jamais noticiaram o 
número de vítimas entre os soldados sírios.

As agências “ocidentais” de noticiário integraram-se ao esquema. Ativaram-se células já organizadas em outras cidades da Síria.

Mais uma vez, a expressão “manifestantes pacíficos” foi apresentada como cobertura para “uma terceira força”, como disse a comissão de investigação da Liga Árabe, que lutava contra as forças do governo sírio e também instigava os manifestantes a armarem-se.

O governo dos EUA ajudou com sua própria campanha de propaganda; por exemplo, quando mentiu sobre ataques da artilharia síria contra manifestantes – que não haviam acontecido.

Organizações para-governamentais norte-americanas, como  Avaaz, Anistia Internacional e Human Rights Watch, uniram-se à campanha contra o governo 
sírio.

E a ciberguerra, movida contra agências noticiosas sírias, suprimiu completamente o outro lado da história. Até hoje, a Agência Sírio-Árabe de Notícias [orig. Syrian Arab News Agency, sana.sy] continua expurgada dos resultados de procura no Google. [1] 

Rapidamente se tornou visível que a estratégia concebida para criar uma “revolução colorida” não funcionara.

O estado sírio mostrou-se mais capaz de resistir do que parecia. O presidente sírio Bashar al-Assad [foto] era mais respeitado e querido pelos sírios do que os instigadores do golpe haviam suposto.

E o presidente atendeu rapidamente várias das demandas dos manifestantes autênticos.

A Constituição síria for reformada, criaram-se novos partidos, houve eleições e as forças de segurança mais violentas e abusivas foram contidas, postas sob 
controle estrito. As grandes cidades, mesmo aquelas nas quais a maioria era de sunitas, não apoiaram e nem se uniram à violência crescente dos milicianos sectários.

As deserções do exército sírio e de quadros políticos foram poucas e sem importância. Durante algum tempo, até a economia conseguiu resultados bastante satisfatórios.

Os inimigos da Síria tiveram de aumentar o “envolvimento”.

Arábia Saudita e Qatar usaram todas as suas capacidades para recrutar jihadis de outros países dispostos a lutar na Síria.

A CIA, alimentada com dinheiro saudita, enviou para lá toneladas de armas e munição, recolhida de seus arsenais pelo mundo. Grupos terroristas foram criados, com treinamento e inteligência de combate.

E criou-se um grupo de exilados, para começar a ser apresentado ao mundo como futuro governo possível para a Síria. O governo sírio foi forçado a recolher-se, para preservar seus soldados.

Grandes porções da Síria rural foram tomadas pelos grupos terroristas. A 
população dessas áreas fugiu pelas fronteiras ou para as cidades maiores. 

Nas áreas urbanas onde os terroristas se acastelaram, tornou-se difícil 
desalojá-los sem causar vasto dano aos prédios e à infraestrutura. Mas o governo sírio, dessa vez, já sabia o que fazer.

Com a ajuda de aliados, unidades armadas do Irã, unidades armadas do Hezbollah foram retreinadas para guerra contra grupos terroristas insurgentes. 

E criaram-se unidades paramilitares locais, para reocupar as áreas das quais o exército já desalojara os terroristas. A Rússia cuidou de manter o suprimento de artigos necessários à sobrevivência dos civis e armamento para as forças do exército sírio.

Do lado dos instigadores do golpe as coisas começaram a dar errado.

Os Jihadis providenciados pela Arábia Saudita se mostraram combatentes eficientes, mas fanáticos religiosos, e não encontraram espaço no contexto 
social da Síria – de governo laico e sociedade multirreligiosa liberal inclusiva. 

Começaram os confrontos com a população e com combatentes locais pró-Assad. Ainda hoje chegaram notícias de luta violenta no nordeste da Síria, entre terroristas jihadistas e bandidos locais.

Questões sobre suprimentos de armas a serem recebidas da Líbia, entre os EUA e grupos da Al-Qaeda, mataram o embaixador dos EUA em Benghazi.

Apesar de ter sido “reformatado” pelo menos três vezes, o planejado grupo para um governo no exílio mostrou-se inefetivo, dadas as disputas internas entre os vários grupos entre si e entre seus patrocinadores.

A campanha de imprensa sobre “manifestantes pacíficos” começou a fazer água, à medida que mais e mais imagens e histórias emergiam, mostrando massacres cometidos pelos grupos golpistas, contra soldados sírios.

população nos países que inicialmente apoiara o que supunha ser um levante democrático mudou de opinião, e passou a opor-se a qualquer 
envolvimento naquele conflito.

Quando se tornou mais evidente que os golpistas não conseguiriam derrotar o exército sírio, o presidente Barack Obama dos EUA apareceu com sua linha vermelha” sobre o uso de armas químicas.

Foi como um convite aos golpistas, para que usassem armas químicas no cenário da guerra, para em seguida culpar o governo sírio.

Assim se criaria a necessidade, dado o que dissera o presidente, de os EUA intervirem militarmente, ao lado dos jihadistas terroristas. Tentaram fazer isso algumas vezes, mas Obama não deu sinal de disposição para usar a força.

Para tentar impedir que, no caso de os terroristas conseguirem tomar o governo sírio, eles assumissem o poder, os EUA alteraram o plano: agora, haveria terroristas moderados”, treinados pelos EUA, que assumiriam o controle dos combates, sobretudo em torno da capital Damasco.

Em meados de agosto de 2013, um grupo de 300 combatentes treinados pela CIA entraram na Síria pela Jordânia. (Hoje, o governo Obama está tentando alterar essa data).

A tarefa deles era ir até Damasco e assumir, eles mesmos, a luta contra o governo sírio. Foram impedidos. Pararam, sem conseguir avançar mais, a 
caminho de um subúrbio de Damasco. Sem o apoio aéreo dos EUA, como havia acontecido na Líbia, o uso de forças especiais treinadas pelos EUA revelou-se 
inútil. Foi ativado então o plano “linha vermelha”.

Locais dos ataques com gás em bairo de Damasco em 21/8/2013
(clique na imagem para visualizar)

Dia 21 de agosto, algum produto químico venenoso foi liberado no ar em alguns subúrbios de Damasco. Instantaneamente surgiram pelo canal YouTube enorme quantidade de vídeos em que se viam cadáveres enfileirados de supostas vítimas de ataque “químico” [abaixo].

Mas os vídeos não indicavam nenhum dos sintomas corretos de vítimas de exposição ao gás sarin, nem os atingidos que se via estavam recebendo os cuidados médicos de protocolo para o caso de ataque real com armas químicas. Tudo era falso.

A conclusão de que se tratava de falsa operação “armada” para inculpar o governo Assad correu o mundo.

Mas Obama ainda tentou convencer o mundo de que o governo sírio usara armas químicas, e insistiu em distribuir fiapos de evidências, mas, de 

fato, não exibiu qualquer prova. E convocou aliados para que se unissem a ele numa intervenção militar.

O Parlamento britânico votou e decidiu que não. O povo britânico, como o povo norte-americano já não tem estômago para mais guerras. [David Cameron, ao lado]

Obama viu-se preso num “ardil 22”: [2] podia ir à guerra sem consultar o Congresso; nesse caso, corria o risco de ser tirado da presidência por impeachment, de uma Câmara de Representantes muito hostil; ou pedia autorização ao Congresso para ir à guerra.

Em pouco tempo Obama desceu da posição de “faço a guerra sozinho[3] e pediu autorização ao Congresso.

O povo dos EUA já era amplamente contrário a mais uma guerra no Oriente Médio, e os militares também.

Pressionados pelos eleitores, e ante o fato de que não havia prova alguma do tal “massacre”, o Congresso negou a licença para matar que Obama lhe pedira.

O Congresso dos EUA desobedeceu ao AIPAC e ao lobby israelense. Foi a primeira vez que isso aconteceu, em 22 anos.

Obama tem agenda urgente a cuidar, no plano doméstico. Há o Obama-care, o orçamento, e disputa já iminente pelo teto da dívida. Depois de perder a guerra no Congresso, Obama não poderia, baseado só em pressupostos poderes presidenciais, ir à guerra. Os riscos eram altos demais: ou um 
impeachment imediato, ou status de pato manco até o final do mandato. O que fazer?

Foi quando o cavaleiro russo, Vladimir Putin [foto], acorreu em socorro de Obama.

Putin ofereceu um negócio: a Síria aceitaria entregar armas não convencionais; e os EUA aceitariam que o governo sírio e o presidente Assad permanecessem no poder.

Não é ideia nova: apareceu há um ano, em agosto de 2012, quando o ex-senador Richard Lugar propôs exatamente isso, em Moscou.

As armas químicas sírias são praticamente inúteis, no campo tático. Mas podem ser usadas contra centros de população israelenses – e têm, por isso, importante poder dissuasório e de contenção, contra a violência de Israel. Mas nas atuais circunstâncias converteram-se em risco a evitar. 

Ao mesmo tempo, os mísseis convencionais do Hezbollah já se comprovaram muito efetivos, como força de contenção; e não implicam os mesmos problemas associados às armas não convencionais.

A Síria pode, com segurança, entregar parte de seu armamento de contenção dissuasória. E confia que seus aliados Irã e Rússia providenciarão substitutos efetivos, se necessário.

Obama agarrou-se à boia que Putin lançou para ele.

Sabia que entrar abertamente em guerra contra oponente bem preparado e aliados significaria guerra longa e incerta. Metera-se em situação de perde-perde, mas agora voltava a ainda parecer vencedor.

Resgatou Israel de uma situação em que estava ameaçada por bombas de gás e ainda arranjou a alguma coisinha para fazer trotar seu cavalinho de batalha premiado – o desarmamento de armas de destruição em massa.

Hoje, os ministros de Relações Exteriores da Federação Russa e dos EUA assinaram umas “Linhas Gerais para a Eliminação das Armas Químicas Sírias” [orig. 
Framework for Elimination of Syrian Chemical Weaponsp].

Exige-se que, sendo possível, todas as armas químicas sírias estejam eliminadas até meados de 2014.

O documento nada diz sobre o futuro do governo Assad.

Mas a Rússia com certeza já providenciou para dar e obter as necessárias garantias.

Nem a Síria teria entregado suas armas sem negociação precisa e suficiente.

A Rússia, tanto quanto a Síria, sabe que Obama tem de manter a imagem, e ninguém falará sobre o real acordo firmado horas antes em Genebra. 

Agiram, aliás, como Nikita Khrushchev, que manteve silêncio sobre seu acordo com Kennedy, sobre a remoção dos mísseis nucleares norte-americanos da Turquia, depois da crise dos mísseis em Cuba.

À parte as garantias anunciadas, o cumprimento das garantias de desarmamento, que pode demorar um pouco mais do que foi acordado hoje, depende da sobrevivência do governo de Assad.

Derrubar Assad é assunto que, por hora, os russos proibiram.

Daqui em diante, Obama começará, aos poucos, a reduzir o apoio aos terroristas na Síria. Pressionará Israel, Arábia Saudita e Turquia para que 
façam o mesmo. Quanto mais rapidamente a Síria promover a eliminação das armas químicas, mais rapidamente Obama se recolherá.

A imprensa-empresa nos EUA rapidamente descobrirá a disputa pelo orçamento e o negócio da espionagem pela Agência de Segurança Nacional dos EUA, que voltarão às manchetes. E, aos poucos, a opinião pública dos EUA esquecerá que existe Síria.

A oposição síria não está gostando do acordo e não deseja que dê certo. O Conselho Militar Sírio fará o possível para que dê errado. Mas logo perceberá que ficou sem apoio político e sem dinheiro.

Enquanto isso, as forças locais do CMS combatem contra grupos aliados da al-Qaeda. É bem possível que alguns grupos locais anti-Assad rapidamente se aliem ao exército sírio, contra os terroristas jihadistas. O general Selim Idris talvez consiga algum emprego burocrático de baixo escalão em Dubai ou no Qatar.

                                     Rei Abdullah, da Arábia Saudita, o grande derrotado

O rei saudita [acima] odeia os ideólogos da al-Qaeda tanto quanto odeia a Fraternidade Muçulmana e todos os persas. Concordará em pôr fim à guerra e 
atacará o bolso dos que insistam em continuar a financiá-la.

O príncipe Bandar [ao lado], responsável por recrutar terroristas jihadistas, deu-se muito mal (outra vez) e não fez o que foi pago para fazer, porque disse que controlava, mas não controlava seus jihadistas alugados. Pode ser mandado de volta para o deserto bravio.

Os estados do Golfo seguirão (terão de seguir) o exemplo dos sauditas.

Em Israel, Netanyahoo já viu que, essa, ele perdeu. A derrota do AIPAC no Congresso já o informou disso. 

Embora esse round contra a Resistência não tenha sido decisivo, é verdade que grande parte da Síria foi destruída e que o arsenal estratégico sírio está, por hora, reduzido.

Netanyahoo também concordará com o plano dos EUA de reduzir os latidos pró-guerra, mas exigirá alguma “compensação” imerecida. É o que ele sempre faz, e Obama sempre cede.

O premiê turco Erdogan [foto] tentará continuar a apoiar os jihadistas na Síria. É o único estadista do planeta que o faz por razões ideológicas: Erdogan é crente fiel.

Mas tem também muitos problemas com outros vizinhos e a economia turca movida a empréstimos externos está à beira de precipício profundo.

Há sinais vindos da Rússia e do Irã, de que pode haver algumas dificuldades técnicas, motivadas pelo inverno, com os suprimentos de gás para a Turquia. Provavelmente bastarão para induzir Erdogan a jogar a toalha.

Há também gente dentro de seu próprio partido, sobretudo empresários da Anatólia, que já não o aceitam como líder. Podem usar a fraqueza política de Erdogan para trazer outro ator para o palco.

Sem apoio e sem qualquer possibilidade de vencer a luta, a parte síria da oposição que se armou provavelmente deporá armas e tentará algum acordo 
de anistia com o governo.

Os quadros estrangeiros da al-Qaeda continuarão a lutar. Mas têm mínima base ideológica de apoio entre a população síria; e não têm qualquer chance contra exército experiente e plenamente mecanizado. Haverá bloqueio contra seus financiadores.

Mas o terrorismo é duro de matar. É possível que, em breve, os EUA ajudem a Síria, com inteligência ou drones, a combatê-los.

Claramente, a Rússia é a grande vitoriosa estratégica na guerra à Síria. Está de volta ao cenário do Oriente Médio, em condições de aí permanecer por algum tempo.

Ganhou por larga margem de pontos, a batalha pela opinião pública global.

A Gazprom ficará feliz se puder ajudar a Síria na prospecção e na extração de gás de suas reservas oceânicas. Daí virão os fundos para reconstruir e rearmar a Síria.

A Gazprom pode também comprar gás do gasoduto Irã-Síria, vendê-lo à Europa e reforçar seu monopólio por ali.

O Irã reforçou seu papel estratégico e está hoje bem posicionado para negociar um bom entendimento com os EUA, que pode pôr fim a 30 anos de 
hostilidades quentes e frias. Investiu muito na Síria e mais gastará para ajudar a reconstruir o país, mas o resultado estratégico – vitória do 
eixo da Resistência” – vale bem o que custou.

A Síria e o povo sírio venceram a guerra e perderam muito.

Serão precisos muitos anos para reintegrar os refugiados, para reconstruir o país e esperar que cicatrizem feridas profundas.

Mas a Síria também reconquistou a própria independência. O mais provável é que, em 2014, Bashar al-Assad seja reeleito presidente da República Árabe Síria. A história síria o recordará para sempre, como governante civilizado e herói do seu povo.

O povo dos EUA, pela primeira vez em décadas, conseguiu fazer parar uma guerra que o presidente desejava. Essa é vitória imensa e um precedente.

Que todos os norte-americanos lembrem bem desses dias, quando aparecer outra guerra inventada, ou esse ou aquele país pequeno ou distante levantar-se. Os norte-americanos, nós, temos os meios para fazer parar qualquer guerra.

Notas dos tradutores:
[1] TALVEZ ISSO ACONTEÇA SÓ NOS EUA. No Brasil, encontra-se o que se vê em Syrian Free Press, acessada às 19h04, 14/9/2013; e encontramos facilmente a Agência SANA, acessada, às 19h03, 14/9/2013.

[2] Ardil 22 é título de um famoso romance-sátira da 2ª Guerra Mundial, lançado em 1961, depois, filme. O “ardil 22” é uma lei-armadilha pela qual os pilotos-personagens sempre
acabavam obrigados a voar em missões de guerra: "Você pode se declarar louco, para não ser mandado voar a missão que eles inventam. Mas se eles perceberem que você não quer voar a missão, prova-se que você não está louco, e eles mandam você voar a missão."

[3] 31/8/2013, Moon of Alabama em: “Syria: Obama’s Climb-down - Congress Vote On All Out War”

"Naquele momento, Obama só poderia ter uma de duas ideias na cabeça: ou
(a) ele não quer guerra e espera que o Congresso o salve daquela estúpida “linha vermelha”, armadilha que ele mesmo inventou para si próprio e que foi a causa real da operação clandestina, falsa, no subúrbio de Damasco; ou
(b) ele quer guerra e espera que o AIPAC, com seu descomunal lobby, ponha ordem no Congresso e lhe dê sua guerra, para benefício do sionismo universal."

Fonte:
http://redecastorphoto.blogspot.co.at/2013/09/uma-breve-historia-da-guerra-dos-eua.html