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segunda-feira, 27 de maio de 2013

Economia verde e financeirização da natureza


Transformar a atmosfera, o oxigênio, os rios, os oceanos, as florestas, os subsolos em mercadorias já é movimento bastante problemático. Permanecer aceitando que os rumos desse tipo de atividade sejam determinados apenas pelo ritmo da especulação financeira é colocar uma verdadeira pá de cal na já exígua credibilidade do conceito de economia verde.

Carta Maior - Paulo Kliass*
 
Às vésperas de completarmos um ano da organização da tão badalada “Rio + 20”, realizada em meados de junho de 2012, muito pouco temos a comemorar no campo das mudanças efetivas no modelo que determina, de forma hegemônica, as relações econômicas no mundo globalizado.

O clima de grandes expectativas criadas em torno do evento, que deveria propiciar um balanço de 2 décadas após a realização da Conferência da ONU de 1992, foi por demais otimista. Estava claro que tal animação não correspondia à realidade da crise econômica internacional e da quase impossibilidade de que os países mais importantes do mundo avançassem alguns milímetros na direção de um sistema menos comprometedor do futuro da Humanidade.

“Rio + 20” e a economia verde

A polêmica toda se deu em torno da avaliação de supostos avanços ou recuos que poderiam estar contidos nos termos da declaração final do encontro. O famoso documento “O futuro que queremos” sintetizava os limites da costura possível entre as proposições das delegações oficiais e das representações das associações e entidades da sociedade civil organizada. Ora, como toda peça resultante de evento de natureza multilateral, o documento procurava expressar algum grau de consenso, a ser obtido entre as representações diplomáticas participantes, a respeito dos temas em questão. Assim, o fato de incorporar o conceito de “economia verde” foi muito criticado por correntes vinculadas ao movimento ambientalista, ao passo que o fato do termo sempre estar acompanhado da expressão “no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza” era saudado por outros grupos como sinalização de um avanço importante.

O fato concreto é que a Rio + 20 deu-se num contexto de dominação política, social e econômica dos valores associados a um modelo que privilegia a exploração descontrolada e desregulada dos recursos naturais e da força de trabalho, na perspectiva da geração e da apropriação privada dos lucros de tais empreendimentos. Some-se a esse quadro a crença de que a solução do ainda tão idolatrado “mercado” seja sempre o mecanismo mais “eficiente” para a busca das soluções de equilíbrio entre os diversos fatores e atores envolvidos no complexo jogo de interesses do mundo globalizado.

Toda e qualquer avaliação mais realista e dotada de bom senso deveria levar em consideração os limites de tal conjuntura. Infelizmente, havia - como ainda continua a haver - pouco espaço para avanços expressivos no campo dos consensos diplomáticos. Afinal, nem mesmo os Estados Unidos aceitaram assinar o já antigo Protocolo de Kyoto (já referendado por mais de 170 países), a respeito de um compromisso para redução da emissão de gases comprometedores do efeito estufa. De outra parte, é necessário recordar que a maioria dos países se volta atualmente para a China, na esperança de que o ritmo de crescimento do gigante asiático seja o elemento de salvação para a recuperação da economia internacional.

As diferentes interpretações da economia verde

O termo “economia verde” vem sendo utilizado há mais tempo em vários circuitos: ambientalista, empresarial, governamental, organismos multilaterais, meios de comunicação, entre outros. Como toda novidade que ainda não foi devidamente digerida e serve para cobrir um nível de ansiedade social a respeito de tema que não apresenta soluções fáceis a curto prazo, ele ocupa o vácuo e preenche a carência. Assim a expressão é muitas vezes apresentada com uma verdadeira panacéia para todos os malefícios que o capitalismo tem proporcionado para o meio ambiente em escala planetária. No entanto, os problemas associados ao processo de degradação ambiental são muito mais complexos do que aparentam numa abordagem superficial. Não basta apenas adjetivar a dinâmica econômica de “verde” para que tudo se resolva, como num passe de mágica.

Exatamente por isso ainda existem diversas acepções do conceito circulando pelos circuitos que tratam do tema. De um lado, permanecem algumas interpretações ainda bem intencionadas no campo dos que estão sinceramente preocupados com a deterioração do sistema ambiental. De outro lado, porém, estão aquelas proposições que estão mais preocupadas em oferecer uma alternativa estratégica de sobrevivência para as grandes corporações multinacionais. Assim, a economia verde se amplia no largo espectro que vai desde os ambientalistas mais ingênuos até aqueles que defendem os interesses do grande capital em seu permanente processo de acumulação e reprodução.

Mecanismos de financiamento: do Protocolo de Kyoto aos dias de hoje

A realidade do sistema capitalista apresenta uma característica essencial: sua tendência a universalizar o conjunto dos processos sociais e transformá-los em relações mercantis. Com isso, o sistema econômico nos tempos mais modernos passou a incorporar a dimensão do “meio-ambiente” também como mecanismo de acumulação e de dinamização do mercado. As primeiras tentativas concentraram-se no espaço da emissão de gases do efeito estufa (GEE). Tendo por base as alternativas previstas no Protocolo de Kyoto, começaram a aparecer os “créditos de carbono”, que se converteram aos poucos em mecanismo de transação no interior do mercado financeiro. De acordo com as normas previstas, as empresas que diminuíssem sua quantidade de emissão de GEE teriam direito a lançar tais títulos de crédito de carbono. Estas novas modalidades de papéis passaram a ter seus preços cotados e negociados no mercado. Segundo os padrões atuais, um crédito de carbono seria equivalente à redução da emissão de 1 tonelada de dióxido de carbono (CO2). Portanto, em tese, a cotação de crédito de carbono deveria ser correspondente ao custo monetário do investimento necessário para obter tal redução de gases poluentes.

A intenção subjacente é que estaria em marcha um mecanismo para estimular, inclusive em termos de ganhos econômicos, a substituição de processos de produção considerados “sujos” por novos sistemas produtivos “limpos”. Esse tipo de ação passou a ficar conhecido como “mecanismo de desenvolvimento limpo” (MDL) e deveria contar com apoio da ONU para fins de regulação e fiscalização, com o objetivo de evitar que os títulos de crédito de carbono pudessem ser fonte de ações fraudulentas e sem nenhum tipo descontrole. O aumento da quantidade de títulos emitidos e a ampliação da escala de sua negociação terminaram por consolidar um verdadeiro mercado, com uma série de produtos financeiros associados. Os créditos de carbono passaram a ser cotados nas Bolsas de Mercadorias, com preços no mercado diário, no mercado futuro e demais características do mercado financeiro em geral. Em conseqüência, a exemplo do que ocorre com outros títulos similares, eles estão também bastante sujeitos a muita especulação.

A partir dessa experiência inicial, novos títulos de natureza financeira foram sendo incorporados pelas empresas multinacionais, mas ainda não contam com mecanismos de controle ou regulamentação. Trata-se dos papéis de “redução de emissão por desmatamento e degradação evitados” (REED), por meio do qual os conglomerados e seus empreendimentos de larga escala buscam obter retornos financeiros a partir de iniciativas que podem reduzir o ritmo de destruição ambiental. É o caso da diminuição de áreas de floresta ou de regiões com atividades de extração mineral. Os mercados financeiros podem facilitar a realização dos negócios e a obtenção de recursos para os projetos, pois todo o processo ocorre por meio de emissões de títulos que têm um valor definido e que são transacionados nos balcões de negócios em todas as principais praças do mundo. No entanto, o problema é que esses papéis – em tese, associados a atividades de “economia verde” - são operados também com base na especulação, a exemplo dos demais títulos financeiros. Ou seja, trata-se um nicho voltado para o meio-ambiente, mas sem quase nenhum lastro no setor real da economia.

Os riscos da financeirização sem regulação

Em termos mais gerais, o processo de financeirização pode ser compreendido como uma etapa de aprofundamento do processo de mercantilização. Assim, em uma primeira fase, observa-se a transformação generalizada dos recursos naturais, bens, serviços e relações sociais em mercadorias. Tudo passa a ser sintetizado e tratado sob a forma de preços e quantidades, tudo passa a ser analisado segundo a ótica da oferta e da demanda. A mercantilização em larga escala abre novas oportunidades à produção nos moldes capitalistas, ampliando os espaços para os mecanismos de acumulação de capital.

Em um momento posterior, não apenas a transformação em mercadorias se consolida pelo conjunto de setores e áreas da economia e da sociedade, mas também os instrumentos financeiros associados a elas se espraiam pelos mercados. Um dos aspectos que fascina e intriga no processo de financeirização é sua dupla face. De um lado, a capacidade de criar as condições de geração de recursos para as atividades onde esteja envolvido.

De outro lado, a sua capacidade de se tornar autônomo em relação ao próprio objeto que foi a razão de seu surgimento. E assim, ele ganha vida independente nos circuitos e searas dos mercados financeiros primários, secundários, terciários e por aí vai. Nos mercados especulativos espalhados pelo mundo, por exemplo, as cotações dos papéis de carbono caíram mais de 90% entre as vésperas da crise de 2008 e os dias de hoje. Ou seja, um movimento no circuito financeiro que tem muito pouco a ver com a realidade concreta dos setores da economia verde.

A resistência dos interesses do financismo em aceitar critérios mais sérios de regulamentação, fiscalização e controle das operações dos mercados de títulos converte-se em um grande obstáculo. As catástrofes observadas a partir da crise financeira não foram suficiente para tanto. Uma das causas foi, sem dúvida, o exagerado grau de financeirização e o descontrole sobre os mercados especulativos. Assim, a insistência na ilusória “liberdade de ação das forças dos mercados” termina por comprometer qualquer busca mais responsável para criação de mecanismos de financiamento de uma economia verde, que seja sustentável em termos econômicos, sociais e ambientais.

Transformar a atmosfera, o oxigênio, o gás carbônico, os rios, os oceanos, as florestas, os subsolos, enfim a natureza, em mercadorias já é movimento bastante problemático. Permanecer aceitando que os rumos de empreendimentos nesse tipo de atividade sejam determinados apenas pelo ritmo da especulação na esfera puramente financeira é colocar uma verdadeira pá de cal na já exígua credibilidade do conceito de economia verde.

Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

Fonte:Carta Maiorhttp://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=6105

Leita também: http://brasileducom.blogspot.com.br/2012/03/quem-ganha-e-quem-perde-com-o-redd-e.html
   

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Desculpe, qual o preço do CO2? "O negócio Europeu das emissões perversas"

 " O negócio Europeu das emissões perversas ", publicado em junho deste ano, que repostamos hoje, como box, para que o leitor entenda  os malefícios dos créditos de carbono. Alem disso, a ideia das duas matérias juntas é mostrar o jogo, agora, na COP 17,  para salvar a economia européia, ameaçando a vida nos países do  Sul.  Leia  também "A disputa pela terra em Copenhague".(COP 15, em 2009).(Zilda Ferreira)

Desculpe, qual o preço do CO2?

por Kristin Palitza, da IPS
35 Desculpe, qual o preço do CO²?
Para Ban, é necessária uma combinação de recursos públicos e privados para combater a mudança climática. Foto: Kristin Palitza/IPS
Durban, África do Sul, 8/12/2011 – Fixar um preço para as emissões de dióxido de carbono (CO²) em todo o mundo é a chave para abastecer o Fundo Verde para o Clima (FVC), que financiará projetos de adaptação ao aquecimento global nos países do Sul. Esta é a conclusão a que chegou o primeiro-ministro da Noruega, Jens Stoltenberg, que preside o grupo assessor de alto nível da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre financiamento contra a mudança climática. “Se der para criar um amplo e mais completo financiamento do carbono, será possível atrair mais fundos privados”, explicou.
Fala-se de “financiamento do carbono” quando se estabelece um preço para as emissões de CO² ou outros gases-estufa, causadores do aquecimento global. Segundo Stoltenberg, fixar um valor para o dióxido de carbono traria três benefícios fundamentais: estimular a indústria a reduzir as liberações de gases contaminantes, contribuir para o desenvolvimento de tecnologias limpas para reduzir emissões, e gerar renda, que poderia ser usada com fins governamentais e também em ações climáticas.
Vários países já demonstraram que os sistemas de comércio de carbono ou os impostos sobre as emissões podem ajudar a reduzir a contaminação, já que promovem o crescimento econômico, disse Stoltenberg. “A União Europeia conta com um completo sistema de comércio de carbono e um regime de emissões. A Austrália acaba de criar um imposto sobre carbono. A China está fixando preços para o carbono e a África do Sul também quer desenvolver um imposto. O bom de fixar preços é que se obtém menos contaminação e mais financiamento”, acrescentou o primeiro-ministro.
Nos dez dias da 17ª Conferência das Partes (COP 17) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, que terminará amanhã, nesta cidade, o tema da obtenção de recursos para o FVC foi protagonista. A crise global e as medidas nacionais de austeridade reduziram a disposição dos países ricos em se comprometerem a encher os cofres do Fundo com dinheiro público.
“A crise financeira e a da dívida, especialmente na Europa e nos Estados Unidos, se agravaram. Portanto, devemos procurar tanto financiamento público como privado”, destacou Stoltenberg, que, como copresidente do grupo assessor, apresentou à ONU uma análise propondo medidas para gerar financiamento de longo prazo. “Nossa primeira conclusão é que constituem um desafio, mas é viável mobilizar US$ 100 bilhões ao ano”, afirmou.
O primeiro-ministro se referia a um acordo obtido na COP 16, realizada na cidade mexicana de Cancún no ano passado, segundo o qual o financiamento por via rápida de US$ 10 bilhões anuais entre 2010 e 2013 deveria ser aumentado para US$ 100 bilhões ao ano até 2020. “Não tem nenhum sentido ter um Fundo se não houver dinheiro para ele”, ressaltou.
Por sua vez, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, concordou que as metas de financiamento de curto e longo prazos só podem ser alcançadas com uma combinação de recursos públicos e privados. Isto não significa que os governos perderão controle político sobre os mecanismos de financiamento do FVC, algo com que os países se mostraram preocupados.
“Há uma variedade de possíveis opções de financiamento, como os impostos sobre o carbono, o transporte, etc. Dependerá de cada país decidir quais regulamentações quer implantar em nível nacional”, disse Ban. Entretanto, não ignorou os governos do Norte. “Os países industrializados devem mostrar liderança injetando capital suficiente de imediato”, afirmou. “É verdade que os governos lutam com crises, mas a mudança climática não é uma opção, é um imperativo. Precisa de um compromisso político inequívoco e transparente”, ressaltou Ban.
Não haverá avanço na luta contra a mudança climática sem mais financiamento, disse, por sua vez, o primeiro-ministro da Etiópia, Meles Zenawi. “Precisamos criar uma estrutura de preços que atraia o setor privado para investir no financiamento do clima. Fixar preços para o carbono enviará um sinal ao setor privado, indicando que a tecnologia verde é rentável. A tecnologia do futuro é verde. Há uma corrida, e quem chegar tarde ficará defasado”, afirmou.
Entretanto, especialistas em economia duvidam que os países industrializados tenham um verdadeiro interesse em fornecer fundos para a adaptação no Sul. “Não precisamos de mais estudos, precisamos de vontade política”, afirmou o economista Nicholas Stern, conselheiro do governo da Grã-Bretanha.
Quanto mais rápido os políticos agirem, mais barato lhes custará, disse, por sua vez, o presidente do México, Felipe Calderón, pressionando para que o FVC comece a funcionar antes que acabe a reunião em Durban. “Uma economia baixa em carbono não sai barato. Custará centenas de milhões de dólares ao ano, dependendo da rapidez com que agirmos. Quanto mais rápido, menos custará”, ressaltou.
Caio Koch-Weder, vice-presidente do Deutsche Bank, um dos maiores grupos bancários do mundo, expressou sua preocupação sobre o lento progresso para a criação do FVC. A indústria está disposta a investir em uma economia verde, assegurou. “Nos deem um preço para o carbono, nos deem uma política confiável e o setor privado fará a maior parte do trabalho. Já estamos vendo uma grande vibração por parte da comunidade empresarial em interação com os governos. Naturalmente, ainda não em escala e velocidade que precisamos”, acrescentou.
Koch-Weser também disse que a atual crise econômica mundial apresenta uma oportunidade para que governos e negócios se transformem e encontrem novos motores de crescimento. Para poder arrecadar US$ 100 bilhões ao ano até 2020, para financiar a adaptação à mudança climática, “necessitamos de novas associações público-privadas que forneçam contextos transparentes, seguros e de longa duração”, ressaltou. Envolverde/IPS

O negócio  europeu das emissões perversas (I)

por Daan Bawens, da IPS
1147 O negócio europeu das emissões perversas (I)Bruxelas, Bélgica, 10/6/2011 – Corporações e governos europeus aproveitam, há anos, um vazio legal do Protocolo de Kyoto sobre mudança climática para obter ganhos exorbitantes. Várias fontes indicam que esse lucrativo esquema causou mais contaminação do que nunca antes. O Protocolo de Kyoto (assinado em 1997 e em vigor desde 2005) permite às empresas europeias “compensarem” seu excesso de emissões de gás-estufa comprando redução de emissões em países pobres.
Esta disposição é o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Os requisitos para incluir nele projetos no exterior e a emissão de créditos de carbono – que neste caso se chamam certificados de redução de emissões (CRE) – são controlados pelo Conselho Executivo do MDL, que funciona na órbita da Organização das Nações Unidas (ONU).
Cada CRE equivale a uma tonelada de dióxido de carbono que não foi lançada na atmosfera. E é entregue ao responsável pelo projeto, após certificar que a redução realmente ocorreu. Estes CRE podem gerar instrumentos comercializáveis, sujeitos às leis da oferta e da demanda.
Em junho de 2010, duas organizações não governamentais ambientalistas – CDM Watch, com sede em Bonn, e a Agência de Pesquisa Ambiental (EIA), com escritórios em Washington e Londres – descobriram que governos e corporações europeias estavam fazendo um flagrante mau uso do MDL.
De todos os CRE, 59% se originaram nos mesmos 19 projetos, embora no MDL estejam registrados 2.800 projetos. Os 19 projetos produziam HCFC-22, um gás refrigerante proibido nos Estados Unidos e na Europa no contexto do Protocolo de Montreal Relativo às Substâncias que Esgotam a Camada de Ozônio. Nos países em desenvolvimento, este gás deverá estar eliminado até 2030.
HCFC é a sigla para os hidroclorofluorocarbonos, e também é um “supergás de efeito estufa”, 1.810 vezes mais potente do que o dióxido de carbono. Além disso, o HFC-23, subproduto da manufatura do HCFC-22, é 11.700 vezes mais prejudicial do que o dióxido de carbono.
Quando os produtores do gás refrigerante decidem queimar esse subproduto HFC-23 em lugar de liberá-lo na atmosfera, estão aptos a receberem numerosos créditos concedidos sob o MDL. A queima de uma tonelada de HFC-23 permite adquirir 11.700 créditos de emissão para a unidade que queima o gás. Este negócio se mostrou muito lucrativo. A queima do equivalente a uma tonelada de dióxido de carbono custa apenas US$ 0,25, enquanto os créditos podem ser vendidos no mercado europeu por não menos de US$ 19,00.
Estes projetos logo atraíram bancos investidores, que quiseram participar dos lucros: JP Morgan Chase, Citigroup, Goldman Sachs, Rabobank e Fortis. Junto a estes bancos, os governos italiano, holandês e britânico aparecem várias vezes nas listas de investidores. Grandes empresas de energia, entre elas E.ON e RWE (Alemanha), Nuon (Holanda), Enel (Itália) e Electrabel (Bélgica) também aparecem como participantes nestes projetos.
Os antecedentes recopilados pela CDM Watch e pela EIA indicam que os ganhos derivados desta compensação de gases acabaram estimulando a produção do nocivo HCFC-22. Segundo a EIA, o preço de uma tonelada desse gás oscila entre US$ 1 mil e US$ 2 mil, enquanto a mesma tonelada vale entre US$ 5 mil e US$ 5,8 mil em CRE quando se vende no mercado europeu. Em economia isto se chama “incentivo perverso”, e ocorre quando um incentivo apresenta um resultado não procurado e indesejável que vai contra o que propõe a política em questão.
No total, empresas e governos europeus financiaram estes projetos por pelo menos US$ 1,5 bilhão, enquanto o verdadeiro custo para reduzir este gás é de US$ 150 milhões. “Este dinheiro foi investido em falsas reduções de emissões”, afirmou Eva Filzmoser, diretora de programa na CDM Watch. “Segundo o MDL, os créditos obtidos representam reduções nas emissões. Mas, em lugar disso, houve mais gases-estufa enquanto as empresas ocidentais seguiam contaminando como antes. O dano ambiental é imenso”, disse à IPS.
Dados do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), entre 2004 e 2009, indicam que a produção de HCFC-22 passou de 15 milhões para 28 milhões de toneladas. Depois das queixas da CDM Watch e da EIA, a ONU iniciou sua própria investigação, enquanto tentava frear a emissão de novos CRE. Esta pesquisa, que terminou em 16 de novembro de 2010, foi catalogada como “confidencial” pela ONU devido à “informação comercialmente delicada” que contém.
Entretanto, a IPS teve acesso a esse documento, que indica que algumas das unidades de produção investigadas estavam “maximizando os créditos em lugar de atender a demanda do produto”. Ainda assim, o informe propõe que são apenas “sinais” de incentivos perversos e que a evidência não é “concludente”. No dia 26 de novembro, o Conselho Executivo do MDL decidiu emitir mais 20 milhões de créditos para 12 projetos de HFC (hidrofluorocarbonos).
Jos Delbeke é o titular da Direção Geral de Ação pelo Clima na Comissão Europeia (órgão executivo da União Europeia), que foi criada no ano passado. Segundo ele, o órgão tinha conhecimento do problema antes que as organizações não governamentais iniciassem sua campanha. “Na ONU, nos queixávamos desse problema há vários anos. Não deveria se obter CRE com gases que estão proibidos na Europa”, afirmou Delbeke à IPS.
O principal problema, disse, não é o dano ambiental. “Estão sendo gerados ganhos a partir da usura, e isso é repugnante”, afirmou Delbeke. “Assim não podemos conseguir que nossa política climática funcione. Temos de perguntar se não poderíamos ter feito muito mais com a quantidade de dinheiro que se gastou”, acrescentou.
Quando ficou evidente que a ONU não tomaria medidas, a Direção Geral de Ação pelo Clima decidiu propor uma proibição dos créditos por produção de HFC. A comissária europeia de Ação pelo Clima, Connie Hedegaard, propôs 1º de janeiro de 2013 como data para a entrada em vigor dessa proibição. Mas a história não termina aí. IPS/Envolverde
* Esta é a primeira de duas reportagens sobre como corporações e governos europeus se beneficiam economicamente de um vazio legal no Protocolo de Kyoto.
(IPS)

Essa  reportagem é muito importante para entender os malefícios dos Créditos de Carbono ao Meio Ambiente e os benefícios ao capitalismo, principalmente europeu, além de afetar  a soberania dos países pobres. Em 2007, recebemos a primeira denúncia. No final de 2009, inauguramos este Blog, denunciando jogo perigoso dos Créditos de Carbono., com o artigo "A terra está doente". (Zilda Ferreira).

Fonte: Site do Envolverde.