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quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Especialistas da Coppe fazem balanço da COP-17 e propõem atividades para a Rio+20


O Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC) realizou uma reunião, no dia 19 de dezembro, para avaliação dos resultados e desdobramentos da 17ª Conferência das Partes da Convenção da ONU sobre Mudança do Clima (COP-17), realizada entre os dias 28 de novembro e 11 de dezembro, em Durban, na África do Sul. Na reunião, também foram apresentadas iniciativas de algumas entidades e instituições para a Rio+20 (Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável), que será realizada em junho de 2012.

Promovida por meio de uma parceria entre a Secretaria Executiva do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC), o Grupo de Trabalho Mudança Climática, Pobreza e Desigualdades e o COEP, a reunião foi iniciada pelo presidente do COEP, André Spitz, no Auditório do Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais (IVIG/Coppe), localizado no Centro de Tecnologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

"O que saiu de Durban foi insuficiente”. Esse é o ponto de vista do diretor do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe/UFRJ) e secretário executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC), Luiz Pinguelli Rosa, numa avaliação sobre a prorrogação do Protocolo de Kyoto. “Canadá, Japão e Rússia saíram, o que não dá para festejar. Mas foi bom, foi um passo adiante, ainda que esvaziado”, relembra.
Pinguelli destacou a criação de um grupo que até 2015 vai elaborar uma proposta de acordo global para depois de 2020. “É menos do que nada, mas é pouco, pois não há diretrizes claras”, pontua, lembrando que, mais uma vez, uma conferência climática terminou com resoluções aquém das desejadas. “Mas política é assim mesmo e o mundo vive um momento difícil”, afirma, em referência à atual crise econômica global.

Mirando o futuro, entidades e instituições ligadas ao FBMC apresentaram sugestões de atividades que pretendem realizar na Rio+20, como a discussão dos impactos do desenvolvimento sustentável e das mudanças climáticas no mercado de trabalho, workshop proposto pelo movimento sindical. Já o Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (criado nos mesmos moldes que o Intergovernmental Panel on Climate Change, o IPCC) pretende divulgar o primeiro relatório de avaliação nacional do órgão.

No entanto, em termos gerais e independentemente das propostas apresentadas na reunião, Luiz Pinguelli afirmou temer que a Rio+20 “fique esvaziada por falta de ênfase”. “Não estou feliz com a agenda que está encaminhada para a Rio+20. Talvez fosse o caso, sem eliminar pontos, de focar na questão da pobreza e na mudança climática”, opina Pinguelli em relação aos 25 temas levantados pela sociedade brasileira para a discussão durante a Rio+20, que incluem assuntos de cultura, educação, agropecuária e empoderamento da mulher.

Diversos participantes destacaram que as discussões sobre mudanças climáticas devem estar associadas a questões como a pobreza, desigualdade e economia verde. À luz disso, foram apresentados também os resultados da pesquisa ‘Mudanças Climáticas, Desigualdades Sociais e Populações Vulneráveis no Brasil: Construindo Capacidades’, desenvolvida pelo Grupo de Trabalho (GT) de Mudança Climática, Pobreza e Desigualdades, coordenado pelo COEP. O trabalho estudou o impacto das mudanças climáticas junto às comunidades pobres – consideradas as mais vulneráveis aos efeitos do aquecimento global.

Quando falamos de vulnerabilidade, as mudanças climáticas são mais um ponto agravante. Precisamos ficar atentos a esse tema porque isso só vai piorar a situação dessas pessoas”, explica Gleyse Peiter, coordenadora do GT.

Durante a reunião, foram lançados dois livros relacionados a subgrupos dessa pesquisa, editados com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq): ‘Mudanças Climáticas, Vulnerabilidades e Adaptação’, de Renato Maluf e Teresa da Silva Rosa, e ‘Mudanças Climáticas, Pobreza e Desigualdade’, de Anna Peliano.

O primeiro livro traz os resultados do subprojeto ‘Populações Vulneráveis’, coordenado pelos professores Renato Maluf, do Centro de Referência em Segurança Alimentar e Nutricional (Ceresan), e Teresa Rosa, do Centro Universitário Vila Velha. O trabalho teve como foco os impactos regionais e as vulnerabilidades de populações de baixa renda em três biomas (Amazônia, Caatinga e Cerrado) e duas regiões metropolitanas (ambas em área de Mata Atlântica), que enfrentaram episódios relevantes de eventos climáticos, constituindo cinco estudos de caso.

O outro livro, ‘Mudanças Climáticas, Pobreza e Desigualdade’, reúne os resultados do subprojeto ‘Empresas’, coordenado pela socióloga Anna Peliano, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que investigou se as empresas têm contemplado em seus investimentos sociais o impacto das mudanças climáticas sobre as populações vulneráveis.

Os dois livros integram a Coleção Cidadania em Rede e estão disponíveis em formato eletrônico no site do COEP
 
(www.coepbrasil.org.br/portal/publico/apresentarCadernos.aspx).
 
 
Fonte: http://www.coepbrasil.org.br/portal/Publico/apresentarConteudo.aspx?CODIGO=C20111219105912114&TIPO_ID=1

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

É urgente... Veremos depois



por Stephen Leahy, da IPS
84 É urgente... Veremos depois
O mundo ainda depende fortemente dos combustíveis fósseis, que contaminam o ambiente. Foto: Zukiswa Zimela
Durban, África do Sul, 9/12/2011 – Os países que participam das negociações sobre o clima admitiram publicamente que suas atuais reduções nas emissões contaminantes não poderão limitar o aquecimento global em menos de dois graus. Entretanto, os delegados presentes na 17ª Conferência das Partes (COP 17) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, que termina hoje nesta cidade, propuseram enfrentar a chamada “brecha de emissões” na próxima COP 18, que acontecerá no Catar no ano que vem.
Documentos negociados em Durban reconhecem que a redução necessária de emissões de gases-estufa, segundo estudos científicos, deve ser de 25% a 40% até 2020. Esses cortes e prazos são vitais para impedir que o planeta aqueça acima de dois graus, o que significaria uma catástrofe ambiental ainda maior. O rascunho da declaração do encontro diz que esta deve ser a meta definida na próxima COP.
“Necessitamos de um acordo sobre essa meta, fundamentada na ciência, no mais tardar em 2012”, afirmou Karl Hood, chanceler de Granada e representante da Aliança de Pequenos Estados Insulares. “E queremos que esses objetivos sejam legalmente implantados antes de 2017”, acrescentou. Hood disse à IPS esperar que até 2020 para fechar a brecha é “inaceitável” e significaria “um desastre para os pequenos Estados insulares”, que já sofrem os impactos da mudança climática.
O mundo tem apenas meses para poder reduzir as emissões de gases gerados pela queima de combustíveis fósseis de forma que o aquecimento global não supere os dois graus. Se isto demorar anos, as reduções extraordinárias necessárias para reverter o processo poderão levar a economia mundial à bancarrota e reverter avanços no desenvolvimento na maioria dos países, alertaram especialistas em Durban.
“Estamos aqui para alertar os políticos de que nos aproximamos perigosamente de um ponto tal que não poderemos alcançar a meta de menos de dois graus” no aquecimento da Terra, disse o cientista Bill Hare, diretor da Climate Analytics (http://www.climateanalytcs.org), grupo sem fins lucrativos assessor para temas climáticos com sede na Alemanha. Os atuais compromissos de redução de emissões, acordados na COP 15 de Copenhague, em 2009, permitem um aquecimento de até 3,5 graus, disse Hare.
Hoje, essas promessas continuam essencialmente inalteradas, e isto significa que as opções do mundo para não superar um aquecimento de dois graus estão cada vez menores, destacou em entrevista coletiva em Durban. “Dizendo claramente, quanto mais esperamos, menos opções temos, mais nos custará e maior será a ameaça para os mais vulneráveis”, advertiu.
As emissões mundiais geradas pela queima de combustíveis fósseis aumentaram 49% desde 1990 e alcançaram um recorde de 48 bilhões de toneladas de dióxido de carbono (CO²) em 2010, com a probabilidade de chegarem a 50 bilhões este ano, afirmou Hare. Graças ao efeito moderador dos oceanos, o planeta esquentou apenas 0,8 grau, em média. Contudo, muitas partes da Terra registraram aumento muito maior das temperaturas.
A ciência mostra que as emissões globais devem cair para 44 bilhões de toneladas até 2020 e continuar diminuindo 2% ao ano, meta que para a comunidade internacional, fortemente dependente dos combustíveis fósseis, será “extremamente difícil” de alcançar, mas ainda assim realizável, assegurou o cientista.
Se os países preferem limitar-se a cumprir os compromissos assumidos em Copenhague, as liberações de gases-estufa mundiais provavelmente crescerão entre nove bilhões e 11 bilhões de toneladas acima da meta de 44 bilhões, criando uma “brecha de emissões” considerável, alertou Niklas Höhne, diretor de Políticas de Energia e Climáticas da Ecofys, organização consultora em energia.
“Nossos resultados estão de acordo com o Informe sobre Brecha de Emissões, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), divulgado no começo das conversações em Durban”, afirmou à IPS. Chama a atenção o fato de muitos dos temas de intenso debate na COP 17 (biocombustíveis, agricultura, créditos de carbono para proteção de florestas, captura e armazenamento de dióxido de carbono) não são considerados importantes pelos cientistas para reduzir as emissões.
Segundo Höhne, “com os biocombustíveis é preciso estar muito certo de que não vão derivar em um aumento das emissões”. Vários novos estudos sobre o biodiesel com base no óleo de palma e no etanol de milho indicam que suas emissões são mais altas do que as geradas pela queima de combustíveis fósseis, quando se calcula todo seu ciclo de vida.
Os biocombustíveis não têm probabilidades de constituírem um método significativo para reduzir as emissões, coincidiu Höhne, e a agricultura está na mesma categoria. As práticas de cultivo podem ser alteradas para reduzir as liberações de gases, mas, segundo estudos de diversos cenários, só reduziriam parte da brecha.
A brecha de emissões só pode ser salva com uma combinação de melhoria da eficiência energética em todos os setores com um significativo aumento do uso de fontes renováveis, incluindo biomassa, passando do uso do carvão para o do gás natural. O custo desta mudança é relativamente baixo, de US$ 38 por tonelada de CO² que não é liberada na atmosfera.
No entanto, esperar até 2020 sairia muito mais caro. Cada dólar que não é destinado à redução de emissões do setor energético exigirá um investimento adicional de US$ 4,3 depois desse ano, para compensar todas as liberações de gases-estufa produzidas até então. É o que afirma o estudo “Perspectiva Mundial da Energia 2011”, da Agência Internacional de Energia. Esperar até 2020 “é um risco que não queremos correr”, afirmou Höhne.
Entretanto, os delegados em Durban parecem não compreender isso. “Não agem como se compreendessem”, ressaltou Höhne, lembrando que em 17 anos de negociações não se chegou a um acordo para reduzir substancialmente as emissões.

Fonte: Site Envolverde/IPS

Leia também: "A Disputa pela Terra em Copenhague", "O Negócio Europeu das emissões Perversas "(I e II), Desculpe, qual o preço do CO2.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Desculpe, qual o preço do CO2? "O negócio Europeu das emissões perversas"

 " O negócio Europeu das emissões perversas ", publicado em junho deste ano, que repostamos hoje, como box, para que o leitor entenda  os malefícios dos créditos de carbono. Alem disso, a ideia das duas matérias juntas é mostrar o jogo, agora, na COP 17,  para salvar a economia européia, ameaçando a vida nos países do  Sul.  Leia  também "A disputa pela terra em Copenhague".(COP 15, em 2009).(Zilda Ferreira)

Desculpe, qual o preço do CO2?

por Kristin Palitza, da IPS
35 Desculpe, qual o preço do CO²?
Para Ban, é necessária uma combinação de recursos públicos e privados para combater a mudança climática. Foto: Kristin Palitza/IPS
Durban, África do Sul, 8/12/2011 – Fixar um preço para as emissões de dióxido de carbono (CO²) em todo o mundo é a chave para abastecer o Fundo Verde para o Clima (FVC), que financiará projetos de adaptação ao aquecimento global nos países do Sul. Esta é a conclusão a que chegou o primeiro-ministro da Noruega, Jens Stoltenberg, que preside o grupo assessor de alto nível da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre financiamento contra a mudança climática. “Se der para criar um amplo e mais completo financiamento do carbono, será possível atrair mais fundos privados”, explicou.
Fala-se de “financiamento do carbono” quando se estabelece um preço para as emissões de CO² ou outros gases-estufa, causadores do aquecimento global. Segundo Stoltenberg, fixar um valor para o dióxido de carbono traria três benefícios fundamentais: estimular a indústria a reduzir as liberações de gases contaminantes, contribuir para o desenvolvimento de tecnologias limpas para reduzir emissões, e gerar renda, que poderia ser usada com fins governamentais e também em ações climáticas.
Vários países já demonstraram que os sistemas de comércio de carbono ou os impostos sobre as emissões podem ajudar a reduzir a contaminação, já que promovem o crescimento econômico, disse Stoltenberg. “A União Europeia conta com um completo sistema de comércio de carbono e um regime de emissões. A Austrália acaba de criar um imposto sobre carbono. A China está fixando preços para o carbono e a África do Sul também quer desenvolver um imposto. O bom de fixar preços é que se obtém menos contaminação e mais financiamento”, acrescentou o primeiro-ministro.
Nos dez dias da 17ª Conferência das Partes (COP 17) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, que terminará amanhã, nesta cidade, o tema da obtenção de recursos para o FVC foi protagonista. A crise global e as medidas nacionais de austeridade reduziram a disposição dos países ricos em se comprometerem a encher os cofres do Fundo com dinheiro público.
“A crise financeira e a da dívida, especialmente na Europa e nos Estados Unidos, se agravaram. Portanto, devemos procurar tanto financiamento público como privado”, destacou Stoltenberg, que, como copresidente do grupo assessor, apresentou à ONU uma análise propondo medidas para gerar financiamento de longo prazo. “Nossa primeira conclusão é que constituem um desafio, mas é viável mobilizar US$ 100 bilhões ao ano”, afirmou.
O primeiro-ministro se referia a um acordo obtido na COP 16, realizada na cidade mexicana de Cancún no ano passado, segundo o qual o financiamento por via rápida de US$ 10 bilhões anuais entre 2010 e 2013 deveria ser aumentado para US$ 100 bilhões ao ano até 2020. “Não tem nenhum sentido ter um Fundo se não houver dinheiro para ele”, ressaltou.
Por sua vez, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, concordou que as metas de financiamento de curto e longo prazos só podem ser alcançadas com uma combinação de recursos públicos e privados. Isto não significa que os governos perderão controle político sobre os mecanismos de financiamento do FVC, algo com que os países se mostraram preocupados.
“Há uma variedade de possíveis opções de financiamento, como os impostos sobre o carbono, o transporte, etc. Dependerá de cada país decidir quais regulamentações quer implantar em nível nacional”, disse Ban. Entretanto, não ignorou os governos do Norte. “Os países industrializados devem mostrar liderança injetando capital suficiente de imediato”, afirmou. “É verdade que os governos lutam com crises, mas a mudança climática não é uma opção, é um imperativo. Precisa de um compromisso político inequívoco e transparente”, ressaltou Ban.
Não haverá avanço na luta contra a mudança climática sem mais financiamento, disse, por sua vez, o primeiro-ministro da Etiópia, Meles Zenawi. “Precisamos criar uma estrutura de preços que atraia o setor privado para investir no financiamento do clima. Fixar preços para o carbono enviará um sinal ao setor privado, indicando que a tecnologia verde é rentável. A tecnologia do futuro é verde. Há uma corrida, e quem chegar tarde ficará defasado”, afirmou.
Entretanto, especialistas em economia duvidam que os países industrializados tenham um verdadeiro interesse em fornecer fundos para a adaptação no Sul. “Não precisamos de mais estudos, precisamos de vontade política”, afirmou o economista Nicholas Stern, conselheiro do governo da Grã-Bretanha.
Quanto mais rápido os políticos agirem, mais barato lhes custará, disse, por sua vez, o presidente do México, Felipe Calderón, pressionando para que o FVC comece a funcionar antes que acabe a reunião em Durban. “Uma economia baixa em carbono não sai barato. Custará centenas de milhões de dólares ao ano, dependendo da rapidez com que agirmos. Quanto mais rápido, menos custará”, ressaltou.
Caio Koch-Weder, vice-presidente do Deutsche Bank, um dos maiores grupos bancários do mundo, expressou sua preocupação sobre o lento progresso para a criação do FVC. A indústria está disposta a investir em uma economia verde, assegurou. “Nos deem um preço para o carbono, nos deem uma política confiável e o setor privado fará a maior parte do trabalho. Já estamos vendo uma grande vibração por parte da comunidade empresarial em interação com os governos. Naturalmente, ainda não em escala e velocidade que precisamos”, acrescentou.
Koch-Weser também disse que a atual crise econômica mundial apresenta uma oportunidade para que governos e negócios se transformem e encontrem novos motores de crescimento. Para poder arrecadar US$ 100 bilhões ao ano até 2020, para financiar a adaptação à mudança climática, “necessitamos de novas associações público-privadas que forneçam contextos transparentes, seguros e de longa duração”, ressaltou. Envolverde/IPS

O negócio  europeu das emissões perversas (I)

por Daan Bawens, da IPS
1147 O negócio europeu das emissões perversas (I)Bruxelas, Bélgica, 10/6/2011 – Corporações e governos europeus aproveitam, há anos, um vazio legal do Protocolo de Kyoto sobre mudança climática para obter ganhos exorbitantes. Várias fontes indicam que esse lucrativo esquema causou mais contaminação do que nunca antes. O Protocolo de Kyoto (assinado em 1997 e em vigor desde 2005) permite às empresas europeias “compensarem” seu excesso de emissões de gás-estufa comprando redução de emissões em países pobres.
Esta disposição é o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Os requisitos para incluir nele projetos no exterior e a emissão de créditos de carbono – que neste caso se chamam certificados de redução de emissões (CRE) – são controlados pelo Conselho Executivo do MDL, que funciona na órbita da Organização das Nações Unidas (ONU).
Cada CRE equivale a uma tonelada de dióxido de carbono que não foi lançada na atmosfera. E é entregue ao responsável pelo projeto, após certificar que a redução realmente ocorreu. Estes CRE podem gerar instrumentos comercializáveis, sujeitos às leis da oferta e da demanda.
Em junho de 2010, duas organizações não governamentais ambientalistas – CDM Watch, com sede em Bonn, e a Agência de Pesquisa Ambiental (EIA), com escritórios em Washington e Londres – descobriram que governos e corporações europeias estavam fazendo um flagrante mau uso do MDL.
De todos os CRE, 59% se originaram nos mesmos 19 projetos, embora no MDL estejam registrados 2.800 projetos. Os 19 projetos produziam HCFC-22, um gás refrigerante proibido nos Estados Unidos e na Europa no contexto do Protocolo de Montreal Relativo às Substâncias que Esgotam a Camada de Ozônio. Nos países em desenvolvimento, este gás deverá estar eliminado até 2030.
HCFC é a sigla para os hidroclorofluorocarbonos, e também é um “supergás de efeito estufa”, 1.810 vezes mais potente do que o dióxido de carbono. Além disso, o HFC-23, subproduto da manufatura do HCFC-22, é 11.700 vezes mais prejudicial do que o dióxido de carbono.
Quando os produtores do gás refrigerante decidem queimar esse subproduto HFC-23 em lugar de liberá-lo na atmosfera, estão aptos a receberem numerosos créditos concedidos sob o MDL. A queima de uma tonelada de HFC-23 permite adquirir 11.700 créditos de emissão para a unidade que queima o gás. Este negócio se mostrou muito lucrativo. A queima do equivalente a uma tonelada de dióxido de carbono custa apenas US$ 0,25, enquanto os créditos podem ser vendidos no mercado europeu por não menos de US$ 19,00.
Estes projetos logo atraíram bancos investidores, que quiseram participar dos lucros: JP Morgan Chase, Citigroup, Goldman Sachs, Rabobank e Fortis. Junto a estes bancos, os governos italiano, holandês e britânico aparecem várias vezes nas listas de investidores. Grandes empresas de energia, entre elas E.ON e RWE (Alemanha), Nuon (Holanda), Enel (Itália) e Electrabel (Bélgica) também aparecem como participantes nestes projetos.
Os antecedentes recopilados pela CDM Watch e pela EIA indicam que os ganhos derivados desta compensação de gases acabaram estimulando a produção do nocivo HCFC-22. Segundo a EIA, o preço de uma tonelada desse gás oscila entre US$ 1 mil e US$ 2 mil, enquanto a mesma tonelada vale entre US$ 5 mil e US$ 5,8 mil em CRE quando se vende no mercado europeu. Em economia isto se chama “incentivo perverso”, e ocorre quando um incentivo apresenta um resultado não procurado e indesejável que vai contra o que propõe a política em questão.
No total, empresas e governos europeus financiaram estes projetos por pelo menos US$ 1,5 bilhão, enquanto o verdadeiro custo para reduzir este gás é de US$ 150 milhões. “Este dinheiro foi investido em falsas reduções de emissões”, afirmou Eva Filzmoser, diretora de programa na CDM Watch. “Segundo o MDL, os créditos obtidos representam reduções nas emissões. Mas, em lugar disso, houve mais gases-estufa enquanto as empresas ocidentais seguiam contaminando como antes. O dano ambiental é imenso”, disse à IPS.
Dados do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), entre 2004 e 2009, indicam que a produção de HCFC-22 passou de 15 milhões para 28 milhões de toneladas. Depois das queixas da CDM Watch e da EIA, a ONU iniciou sua própria investigação, enquanto tentava frear a emissão de novos CRE. Esta pesquisa, que terminou em 16 de novembro de 2010, foi catalogada como “confidencial” pela ONU devido à “informação comercialmente delicada” que contém.
Entretanto, a IPS teve acesso a esse documento, que indica que algumas das unidades de produção investigadas estavam “maximizando os créditos em lugar de atender a demanda do produto”. Ainda assim, o informe propõe que são apenas “sinais” de incentivos perversos e que a evidência não é “concludente”. No dia 26 de novembro, o Conselho Executivo do MDL decidiu emitir mais 20 milhões de créditos para 12 projetos de HFC (hidrofluorocarbonos).
Jos Delbeke é o titular da Direção Geral de Ação pelo Clima na Comissão Europeia (órgão executivo da União Europeia), que foi criada no ano passado. Segundo ele, o órgão tinha conhecimento do problema antes que as organizações não governamentais iniciassem sua campanha. “Na ONU, nos queixávamos desse problema há vários anos. Não deveria se obter CRE com gases que estão proibidos na Europa”, afirmou Delbeke à IPS.
O principal problema, disse, não é o dano ambiental. “Estão sendo gerados ganhos a partir da usura, e isso é repugnante”, afirmou Delbeke. “Assim não podemos conseguir que nossa política climática funcione. Temos de perguntar se não poderíamos ter feito muito mais com a quantidade de dinheiro que se gastou”, acrescentou.
Quando ficou evidente que a ONU não tomaria medidas, a Direção Geral de Ação pelo Clima decidiu propor uma proibição dos créditos por produção de HFC. A comissária europeia de Ação pelo Clima, Connie Hedegaard, propôs 1º de janeiro de 2013 como data para a entrada em vigor dessa proibição. Mas a história não termina aí. IPS/Envolverde
* Esta é a primeira de duas reportagens sobre como corporações e governos europeus se beneficiam economicamente de um vazio legal no Protocolo de Kyoto.
(IPS)

Essa  reportagem é muito importante para entender os malefícios dos Créditos de Carbono ao Meio Ambiente e os benefícios ao capitalismo, principalmente europeu, além de afetar  a soberania dos países pobres. Em 2007, recebemos a primeira denúncia. No final de 2009, inauguramos este Blog, denunciando jogo perigoso dos Créditos de Carbono., com o artigo "A terra está doente". (Zilda Ferreira).

Fonte: Site do Envolverde.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Crônica do desastre anunciado



por Luciano Martins Costa*
1610 Crônica do desastre anunciadoComeçou nessa segunda-feira, dia 28, em Durban, na África do Sul, a 17a. Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas, considerado um ensaio geral para a conferência Rio+20, marcada para o ano que vem no Rio de Janeiro.
O clima é de absoluto pessimismo, não apenas porque todas as energias e recursos financeiros estão bloqueados pela crise econômica que afeta os países ricos, mas também porque, no resto do mundo, salvo algumas ilhas de tranquilidade, emergências sociais deixam em segundo plano a urgência ambiental.
Considerando-se que as mudanças climáticas têm potencial para colocar sob risco a própria sobrevivência da sociedade humana como a conhecemos, está colocada uma questão filosófica instigante para quem ainda tem estômago para tais reflexões.
A possibilidade do fracasso é admitida abertamente por alguns dos mais destacados participantes da COP-17.
Em entrevista publicada com destaque nos jornais dessa segunda-feira, o embaixador André Corrêa do Lago, diretor do Departamento de Meio Ambiente do Itamaraty e principal negociador brasileiro no encontro de Durban, afirma não ter dúvidas de que a crise econômica tem um efeito muito grande porque “com ela a preocupação com o futuro do planeta diminui”.
Esse o centro da contradição que se coloca: se a emergência de uma crise financeira coloca em risco o futuro do planeta, de que servem as preocupações de curto prazo com a questão econômica?
A entrevista alinha algumas queixas dos países desenvolvidos, que exigem o compartilhamento das medidas contra os efeitos das mudanças climáticas com os países em desenvolvimento.
Em dificuldades econômicas desde 2008, os Estados Unidos e a Europa não aceitam mais ter que arcar com a maior parte das responsabilidades pelo bem-estar da humanidade, na visão de seus líderes.
Alguns emergentes, como o Brasil, aceitam assumir um papel mais relevante, por exemplo, ampliando e até mesmo antecipando algumas das metas de redução do desmatamento.
Mas relutam em transformar essas metas voluntárias em compromissos obrigatórios.
Além disso, outros países, como o Canadá, a Rússia, o Japão e a Austrália, anunciam que não pretendem assinar o compromisso de continuidade do Protocolo de Kyoto.
Se houver essa defecção, a conferência Rio+20 nasce enfraquecida e praticamente perde o sentido.
A democracia em perigo
O que representaria um fracasso absoluto da COP-17, se a Europa não encontrar rapidamente uma saída para a crise e a economia dos Estados Unidos não consolidar sua recuperação até o final de 2012?
Não há mente humana capaz de calcular as perdas para a humanidade com a combinação entre uma recessão prolongada e o agravamento das emissões de gases que provocam as mudanças climáticas, justamente na década crucial para evitar o desastre ambiental previsto pelos cientistas que acompanham a evolução do aquecimento global.
Mas alguns elementos que circulam em boletins de instituições de pesquisa e nas redes de observadores sociais ao redor do mundo permitem antever um cenário catastrófico, com graves riscos para a democracia e mesmo para o processo civilizatório.
Um relatório divulgado na semana passada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – Pnuma – informa que a atmosfera da Terra terá em 2020, na hipótese mais otimista, 6 bilhões de toneladas de carbono acima da meta anunciada para evitar um aquecimento maior do que 2o.C neste século.
Conforme lembram os jornais, a única possibilidade de reduzir esse índice de emissões seria criada se todos os países cumprissem, nos limites mais ambiciosos, as metas que foram anunciadas no encerramento da Cúpula de Copenhague, em dezembro de 2009.
Infelizmente, essa não é a realidade.
Os países em desenvolvimento estão empenhados em consolidar suas chances de crescimento, e nem sempre suas estratégias contemplam as decisões mais corretas em termos de sustentabilidade.
Os países desenvolvidos, mergulhados em grave crise econômica, são reféns do sistema financeiro e se encontram diante do desafio de impor à suas sociedades enormes perdas em termos de bem-estar –  e os investimentos na redução das emissões de gases nocivos podem ficar em segundo plano.
Por outro lado, a humanidade não produziu líderes qualificados para articular uma reflexão sobre os riscos de escolhas erradas neste momento crucial.
E a imprensa, perdida entre os fragmentos da crise econômica, não se mostra capaz de ao menos expor o dilema que a humanidade precisa solucionar.

*publicado originalmernte no Observatório da Imprensa.
Fonte: Extraído do site Envolverde