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quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Queimadas continuam a devastar um dos biomas mais ameaçados do país

11/09/2012 - por Assessoria de Imprensa - Fundação Grupo Boticário
extraído do site Envolverde

Queimadas no Cerrado. Foto: protetoresdafloresta

Ação de combate ao fogo é criada no Cerrado para conscientizar população e já apresenta reflexos positivos.

O ano de 2012 nem terminou e o número de queimadas registrado no País já ultrapassou os 32.064 focos de incêndio acumulados no ano passado, de acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).

A situação é ainda pior na região do bioma Cerrado, que compreende principalmente o Distrito Federal e os estados de Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, parte de Minas Gerais, Bahia, Maranhão e Piauí.

Em 2011, foram registrados 22.537 focos de incêndio no Cerrado, sendo que até o dia 20 de agosto deste ano, já foram detectadas 39.892 queimadas, um aumento de 83%.

Com base nos dados do INPE, esses números alarmantes ficam ainda pior quando se faz uma previsão total para o ano de 2012 no Brasil, na qual se estima que serão registrados 79.677 focos de incêndio de janeiro a dezembro, o que representa um aumento de aproximadamente 140%, com relação a 2011.

De acordo com o coordenador de Emergências Ambientais do ICMBio, Christian Berlinck, os incêndios naturais ocorrem por causa de raios, que normalmente, precedem as chuvas. “Assim, a própria chuva ajuda a apagar os focos de fogo evitando que eles tomem grandes proporções”, afirma.

Segundo ele, a maioria dos incêndios na época das secas é causada pelas próprias pessoas da região. “Os incêndios podem ser colocados por muitos motivos, principalmente para limpeza de área para agricultura e renovação de pastagem, porém como a vegetação fica muito seca, o fogo espalha-se muito rápido, fugindo do controle”, destaca.

Berlinck afirma que o fogo em uma unidade de conservação traz grandes prejuízos para a população e para a região. “Podemos destacar a perda de biodiversidade, redução qualitativa e quantitativa da água, emissão de gases com potencial para agravar o aquecimento global, perda de nutrientes do solo, erosão, morte de animais e alteração da vegetação”.Como forma de minimizar o problema, a Reserva Natural Serra do Tombador, uma das maiores Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) do Cerrado, localizada em Cavalcante (GO), criou neste ano uma brigada voluntária comunitária de combate a incêndios.

A Reserva, criada e administrada pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, foi pioneira na ação na região de Cavalcante. De acordo com a administradora da Reserva, Daniele Gidsicki, a experiência tem sido bastante positiva. “Nós unimos esforços com aqueles que estavam interessados em fazer algo a mais pela região e o retorno foi ótimo. Tivemos uma boa aderência e estamos percebendo que a população local está mais conscientizada”, explica.

Daniele conta que, após sua criação em maio deste ano, a brigada já foi chamada duas vezes: na primeira não foi preciso ir até o local do incêndio, pois o fogo foi controlado. Na segunda, ocorrida no dia 23 de agosto, a brigada agiu o mais rápido possível, o que fez com que o fogo não chegasse até a Reserva. “A equipe está de parabéns. A mobilização foi eficiente impedindo que a Reserva sofresse a ação do fogo”.

Segundo a administradora da Reserva, esse cenário de conservação contrasta com o ano passado, quando foram registrados dois grandes incêndios, sendo que um deles, ocorrido em setembro, atingiu cerca de 80% da extensão da RPPN. “Acreditamos que, embora a época das secas ainda não tenha terminado, esse já é um reflexo positivo da conscientização da população local e do esforço conjunto para preservar a natureza”, conclui.

A capacitação dos voluntários da brigada foi realizada em parceria com a Coordenação Geral de Proteção Ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (CGPro/ICMBio).

Segundo Berlinck, esse tipo de ação de prevenção e combate a incêndios florestais dificilmente é realizadas de forma isolada. “O Governo Federal sozinho não consegue fazer frente a eventos difusos e com diversas causas, precisa do engajamento da sociedade civil. Felizmente o ICMBio e a Fundação Grupo Boticário estão construindo uma parceria sólida e integrada para apoio mútuo nas ações de prevenção e combate a incêndios”, completa.

Fogo “colocado”
De acordo com Christian Berlinck, é preciso solicitar autorização para qualquer queima de vegetação e fala das medidas de controle. “Além disso, a pessoa deve aceirar a área, acompanhar a queimada, precisa ter água, abafadores, ferramentas de corte para controlar eventuais saídas de controle desse fogo. Existem diversas técnicas de queima controlada.

Outra medida adotada é fazer aceiros, que são faixas em que o capim é cortado para evitar que o fogo se alastre além daquele ponto. “Os incêndios são risco não só para animais e vegetação nativa, mas para as próprias pessoas. O combate ao fogo exige treinamento e equipamentos adequados”, explica.

Proteção da biodiversidade
A administradora da Reserva Natural Serra do Tombador explica que a formação da brigada voluntária faz parte de um programa mais amplo da Reserva de manejo do fogo, que inclui outras capacitações, ações de sensibilização da comunidade, monitoramento, pesquisa, entre outros. “O nosso objetivo é reduzir o risco de incêndios que possam comprometer a biodiversidade do local, já que a Reserva foi criada justamente para conservar a natureza ali presente, além de garantir a segurança das pessoas e a manutenção da infraestrutura”, afirma Gidsicki.

A Reserva Natural Serra do Tombador é a maior RPPN do estado de Goiás, com 8,7 mil hectares. Ela está localizada ao norte goiano, a cerca de 90 km do centro de Cavalcante, no sentido para Minaçu. Em linha reta, a Reserva se encontra a 24 km do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, mas engloba formações vegetais, relevo e componentes da fauna e flora diferentes das existentes no Parque. “A RPPN também tem amostras de quase todos os tipos de ambientes característicos do Cerrado, o que reforça sua importância na conservação do bioma", complementa Gidsicki.



(Fundação Grupo Boticário)

Fonte: 
http://envolverde.com.br/noticias/queimadas-continuam-a-devastar-um-dos-biomas-mais-ameacados-do-pais/

terça-feira, 17 de julho de 2012

Terras indígenas: ”o filé do mercado de carbono mundial”

16/07/2012 - por Redação do IHU-Online - entrevista com Augusto Santiago
extraído do site Envolverde

São os territórios indígenas da América Latina “que os operadores do mercado pretendem usar como base de troca para que as corporações possam dar continuidade a seus negócios”, declara Augusto Santiago, coordenador do Programa Direito à Terra, Água e Território (DTAT).

Defendemos formas de vidas plurais e autônomas, inspiradas pelo modelo do Bem Viver-Vida Plena, onde a Mãe Terra é respeitada e cuidada, onde os seres humanos representam apenas mais uma espécie entre todas as demais que compõem a pluridiversidade do planeta.

Nesse modelo, não há espaço para o chamado capitalismo verde, nem para suas novas formas de apropriação de nossa biodiversidade e de nossos conhecimentos tradicionais associados.”

É a partir desse discurso, publicado no documento final do IX Acampamento Terra Livre – Bem Viver-Vida Plena, elaborado e assinado por mais de 1.800 lideranças indígenas que participaram da Cúpula dos Povos no mês passado, no Rio de Janeiro, que as comunidades indígenas propõem a sustentabilidade do planeta. De acordo com Augusto Santiago, coordenador do Programa Direito à Terra, Água e Território (DTAT), as comunidades indígenas têm um modo de produção diferenciado do manejo comercial e, nesse sentido, destaca, as terras indígenas brasileiras “têm sido mais eficientes do que as unidades de conservação para a conservação da biodiversidade”.

Na avaliação de Santiago o modo de produção e de vida das comunidades indígenas está ameaçado, especialmente porque “os quase 20 milhões de hectares reconhecidos na América do Sul como de posse de povos indígenas são ‘o filé’ do mercado de carbono mundial. É ele que os operadores do mercado pretendem usar como base de troca para que as corporações possam dar continuidade a seus negócios”, diz em entrevista à IHU On-Line, por e-mail. Ao defender o modo de produção e de vida das comunidades indígenas da América Latina, ele enfatiza que a “tradição não deve ser vista como algo estático e imobilizante, ela se inova e reinventa a partir do contato com o novo. As comunidades também se interessam pelo uso dos produtos e das tecnologias, e nosso objetivo não é voltar ao passado, mas sim construir um futuro com mais justiça. O que questionamos em nosso coletivo é o lucro acima da vida, a obsolescência programada, o patenteamento da vida”.

Augusto Santiago é coordenador do Programa Direito a Terra, Água e Território (DTAT), que reúne 13 organizações brasileiras que atuam nessa temática. Trabalha na Coordenadoria Ecumênica de Serviço (Cese), organização ecumênica de serviço, prestes a completar 40 anos de existência, tendo apoiado cerca de dez mil pequenos projetos nesse período.

Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como o modo de vida das comunidades e dos povos tradicionais pode ser um instrumento na luta contra as mudanças climáticas?

Augusto Santiago – Os meios de vida das comunidades tradicionais são, em geral, de baixa emissão de carbono, no Brasil e em todo o mundo. Este padrão inclui atividades pouco intensivas, com gestão do território como um todo e pouco concentradas, aproveitamento de espécies de plantas e animais em número bem superior ao nosso. Povos e comunidades contribuem com o abastecimento local de cidades com espécies alimentares plantadas e nativas, produzidas com manejo sem veneno e vendidas sem o custo das transações transoceânicas.

Apesar das propostas do documento oficial da Rio+20 não assumirem o desafio da redução do consumo, muitos de nós já sabemos que não há suporte no planeta para o contínuo crescimento da economia e do comércio mundial com seus altos custos de produção e distribuição, e sua concentração e controle por poucas corporações.

É preciso, porém, tomar cuidado com esta questão. Acredito que a tradição não deve ser vista como algo estático e imobilizante, ela se inova e reinventa a partir do contato com o novo. As comunidades também se interessam pelo uso dos produtos e das tecnologias, e nosso objetivo não é voltar ao passado, e sim construir um futuro com mais justiça. O que questionamos em nosso coletivo é o lucro acima da vida, a obsolescência programada, o patenteamento da vida.

IHU On-Line – Em que medida os indígenas e povos tradicionais contribuem para o debate acerca da crise ambiental? Que diferencial eles apresentam no sentido de garantir a preservação do planeta?

Augusto Santiago – Nos últimos 20 anos, os povos indígenas brasileiros têm contribuído no debate sobre a crise ambiental. Um exemplo disso é a realização do Xingu+23, em comemoração ao evento de resistência contra o projeto que hoje se chama de Belo Monte. As iniciativas de Chico Mendes são hoje conhecidas na academia como “ambientalismo camponês” e distinguem as contribuições brasileiras no tema, justamente por terem sido mobilizadas e levadas a cabo por povos e comunidades tradicionais, ainda nos anos 1980, quando lutavam por suas terras e suas florestas e das quais sobrevivem. Os conflitos por terras no Brasil não diminuíram no período. Pelo contrário, acirraram-se.

No documento final do IX Acampamento Terra Livre – Bem Viver-Vida Plena, realizado este ano na Cúpula dos Povos, no Rio de Janeiro, as 1.800 lideranças indígenas presentes indicaram que: “Defendemos formas de vidas plurais e autônomas, inspiradas pelo modelo do Bem Viver-Vida Plena, onde a Mãe Terra é respeitada e cuidada, onde os seres humanos representam apenas mais uma espécie entre todas as demais que compõem a pluridiversidade do planeta. Nesse modelo, não há espaço para o chamado capitalismo verde, nem para suas novas formas de apropriação de nossa biodiversidade e de nossos conhecimentos tradicionais associados”.

Terras indígenas
Estudos mais ou menos recentes indicam, por exemplo, que as terras indígenas brasileiras têm sido mais eficientes do que as unidades de conservação para a conservação da biodiversidade. Onde há terras florestadas, existem comunidades, e as sobreposições entre propostas para criação de unidades de conservação e áreas ocupadas por comunidades tradicionais ou povos indígenas também reforçam a tese de que a conservação sempre esteve ligada ao uso e ao conhecimento associado à biodiversidade. Então, considerando a inexistência de dúvidas quanto à efetiva diferença entre o manejo comercial e o realizado pelas comunidades, destacaria, entre tantas contribuições diferenciais, o conhecimento associado ao uso da biodiversidade e as tecnologias de baixo impacto de que dispõem, além da capacidade de viver com baixo nível consumo.

IHU On-Line – Como você avalia o documento final da Rio+20, que não levou em conta o modo de vida das populações tradicionais? Por que os povos indígenas e tradicionais não são considerados nas negociações governamentais?

Augusto Santiago – Lá na Cúpula dos Povos tivemos uma importante discussão sobre economia verde, com a participação de Achim Steiner (foto), um dos responsáveis pelo relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), que apresenta seus princípios” (ou tenta reunir conceitos e definir diretrizes gerais). Ele estava em uma mesa com diversos movimentos e ONGs, e os discursos contra a economia verde foram muito fortes. Ao final não houve nenhuma consideração sobre a possibilidade de diálogo entre esses dois mundos.

Na noite seguinte, escutei um novo discurso da mesma pessoa. Foi na entrega do Prêmio Equatorial do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), cujo primeiro lugar – em iniciativas sustentáveis – foi para a Articulação Pacari do Brasil. Premiaram 25 comunidades e suas iniciativas locais, que vão contra a corrente. Achim Steiner fechou o evento, aplaudindo aquelas pequeníssimas iniciativas (algumas em ilhas remotas da Indonésia ou do Pacífico). Em pequena escala, esses eventos, em minha opinião, retratam a hipocrisia do documento oficial, batendo palmas para comunidades enquanto estabelece um arcabouço legal para que as (mesmas) corporações se reinventem e deem continuidade à expropriação das terras e também dos conhecimentos associados ao uso da biodiversidade.

IHU On-Line – Quais são os principais problemas apontados pelas comunidades indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais em relação aos impactos gerados pelas mudanças climáticas nos biomas brasileiros? Considerando o último encontro que tiveram com as comunidades tradicionais, o que apontam?

Augusto Santiago – As comunidades têm percebido as mudanças do clima ao longo da última década. As percepções mais fortes estão relacionadas à alteração no ciclo das chuvas e à desorganização dos calendários tradicionais de plantio e colheita, bem como a extensão das estiagens. O aumento do calor foi indicado principalmente nas comunidades do Norte e Nordeste. Estas mudanças implicam uma série riscos climáticos – iminentes ou potenciais. Nosso esforço é para discutir não só os riscos, mas nosso potencial de enfrentá-los no âmbito local, com práticas mais sustentáveis e, no âmbito regional e nacional, com articulação política. Em geral, nosso exercício possibilitou levantar as contribuições das comunidades às emissões de carbono e, da mesma forma, nos permitiram avaliar estratégias para limitá-las.

A análise mais ampla da questão nos permite observar que comunidades e povos tradicionais brasileiros ainda disputam seus territórios com o modelo de desenvolvimento baseado na emissão de carbono: o agronegócio, a mineração, os grandes projetos. A luta pela diminuição das emissões no Brasil passa pela luta pela regularização dos territórios destas comunidades.

Para aquelas comunidades que já regularizaram seus territórios, a discussão também é absolutamente relevante. Os quase 20 milhões de hectares reconhecidos na América do Sul como de posse de povos indígenas são “o filé” do mercado de carbono mundial. É ele que os operadores do mercado pretendem usar como base de troca para que as corporações possam dar continuidade a seus negócios. Índios negociam o carbono de suas florestas, para tanto devem imobilizá-las ou mantê-las com pouco uso. Operadores, mediante boas taxas de retorno, vendem estes créditos na bolsa de valores para indústrias que os usam como uma espécie de autorização para poluir. Ah, ia me esquecendo de uma última fatia do mercado: consultores altamente especializados controlam por meio de satélites se o acordo é cumprido.

IHU On-Line – Que ações para mitigar os efeitos das mudanças climáticas já são realizadas, tendo em vista os relatos das comunidades tradicionais?

Augusto Santiago – Ao fim das oficinas, as comunidades são estimuladas a rever suas atividades que mais colaboram com as “emissões” e a ampliar aquelas que “fixam carbono” – palavrinhas que passaram a conhecer no evento. A roça em geral é a maior contribuição de algumas comunidades, e o desafio de não usar o fogo – trator dos pobres –ainda é grande. Muitas comunidades enfrentam uma crise de sua reprodução com base nos conhecimentos tradicionais, seja pela perda de sua sustentabilidade por fatores externos, seja pela perda de seus territórios tradicionais. Assim, como em qualquer comunidade rural brasileira, é grande o desafio de educar e manter o jovem na roça. Em algumas localidades, o desafio é enfrentado associando o conhecimento tradicional, repassado há gerações, com iniciativas inovadoras. Em nosso trabalho na Cese temos oportunidade de conhecer várias das iniciativas em temáticas como a agroecologia e a comercialização direta em feiras, o turismo comunitário, a incorporação do design em artesanatos elaborados a partir do extrativismo, a valorização de alimentos tradicionais por grandes chefes de cozinha, entre outros.

IHU On-Line – Como avalia a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC)? Como a política é desenvolvida e aplicada no Brasil? Em que medida ela tem contribuído para minimizar os efeitos das mudanças climáticas?

Augusto Santiago – É positivo que tenhamos esta política, mas questionamos o espaço que ela disponibiliza para a discussão com a sociedade e especialmente com aqueles agentes que, ao longo dos últimos 20 anos, com apoio do governo e da cooperação, vêm desenvolvendo iniciativas de desenvolvimento sustentável. Esta política não tem espaço para transformar essas iniciativas em programas de governo e massificá-las. Para provar isso basta analisar o Plano de Agricultura de Baixo Carbono, único plano setorial (1) já elaborado dentro desta política. Os recursos disponíveis estão quase todos destinados ao agronegócio. Nada é dito sobre os demais setoriais.

Analisando o PPA – Clima e Mudança Climática – Orçamento 2008-2010, a mesma tendência é observada. Lá, além do agronegócio e das indústrias, temos espaço para as pesquisas, para as emergências e para o fundo clima. Não há espaço para iniciativas inovadoras como as muitas que poderiam participar do prêmio Equatorial do Pnud, citado acima.

Uma boa iniciativa é a do Fundo Clima, porém seu primeiro edital não contemplou a necessária informação e formação da sociedade para que se participasse das discussões; preferiu focalizar uma pequena parte dos recursos para a sociedade civil implementar projetos de usos de tecnologias sociais com o mesmo formato piloto dos últimos 20 anos. A maior parte dos recursos é para adaptação das indústrias.

O desejo das organizações articuladas no DTAT – programa apoiado pela ICCO – é informar e formar para que as comunidades possam qualificar e ampliar a comunicação que fazem com a sociedade, aproximando campo e cidade, com o que vão buscar maior eficiência na incidência que já realizam. Mudanças climáticas é tema estratégico, pois mobiliza tanto as comunidades quanto a sociedade.


Nota:
(1) Plano ABC – Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura, Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono.

* Publicado originalmente no site IHU-Online, Instituto Humanitas Unisinos. (ver em: http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/511413-terras-indigenas-o-file-do-mercado-de-carbono-mundial-entrevista-especial-com-augusto-santiago )


Fonte:

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Economia verde divide a Ásia

28/6/2012 - por Marwaan Macan-Markar, da IPS (Inter Press Service)
extraído do site Envolverde

Bangcoc, Tailândia, 28/6/2012 – A cúpula Rio+20 fez ressaltar o descontentamento de ativistas e de alguns governos da Ásia com os conceitos de “economia verde” e “crescimento verde”, considerados uma fachada para manter um modelo que depreda os recursos naturais.

A Comissão Econômica e Social para a Ásia e o Pacífico (Cespap), agência regional da Organização das Nações Unidas (ONU) integrada por 58 países, é favorável a empregar esses enfoques, mas gigantes como China, Índia, Irã e Rússia são contra.

A economia verde promove transformações nas formas de produção e de consumo para atender as problemáticas ambientais, mediante a inovação tecnológica e atribuindo valor econômico aos bens naturais. Ativistas afirmam que este enfoque só reforça o atual modelo de desenvolvimento, baseado na produção e no consumo excessivos. Esta divergência ficou evidente nos dias finais da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), realizada este mês no Rio de Janeiro.

O embaixador chinês na Tailândia, Guan Mu, publicou no dia 21 uma longa coluna no jornal The Nation, de Bangcoc, destacando a importância do desenvolvimento sustentável, mas evitando sempre usar conceitos como “economia verde” ou “crescimento verde”. “A China não só encontrou o caminho para um desenvolvimento sustentável adequado às suas condições nacionais, como fez importantes contribuições ao desenvolvimento sustentável em todo o mundo”, afirmou. “A China está disposta a fortalecer a cooperação e a unir esforços com outras partes para fazer mais contribuições ao desenvolvimento sustentável global sob o princípio de responsabilidades comuns mas diferenciadas”, destacou.

No dia anterior, em Manila, ativistas liderados pela Kalikasan, uma rede de grupos ambientalistas com sede nas Filipinas, protestaram diante da embaixada dos Estados Unidos contra a economia verde porque “enriquece as corporações”. “Nós, o povo, a quem não permitem falar na Rio+20 e que vemos nossos direitos pisoteados, não nos calaremos”, afirmou durante o protesto a secretária-geral da Asia Pacific Research Network, Lyn Pano. “Fortaleceremos nossas fileiras e lutaremos de forma constante” para rechaçar a economia verde, enfatizou.

Enquanto isso, o discurso da Cespap na Rio+20 sugeria que os países da Ásia e do Pacífico estavam a favor de adotar a economia verde em seus planos. “Estamos satisfeitos pelo fato de as políticas da economia verde serem reconhecidas como uma ferramenta importante para o desenvolvimento sustentável e para a erradicação da pobreza”, afirmou a secretária-executiva da agência, Noeleen Heyzer, durante uma reunião de alto nível.

A pressa das agências da ONU, incluindo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), para adotar as políticas de economia verde ignora temores asiáticos de que “sejam usados para prejudicar o marco aceito de desenvolvimento sustentável”, alertou Shalmali Guttal (foto ao lado), pesquisadora principal do centro de estudos Focus on the Global South, com sede em Bangcoc. “Preocupa que esta seja uma tentativa dos países industrializados, os maiores poluidores do mundo, para imporem o protecionismo verde no mercado internacional”, declarou Guttal à IPS.

As nações em desenvolvimento da Ásia têm uma razão para estarem nervosas, porque este é outro esforço dos países industrializados de evitar os compromissos que assumiram de ajudar as nações do Sul a cumprirem suas metas de desenvolvimento”, ressaltou.

Os órgãos da ONU deveriam ouvir o povo, a que, supõe-se, estão ajudando”, acrescentou.

Os desacordos entre a Cespap e alguns governos da região sobre economia verde já havia ficado evidentes na sexta Conferência Ministerial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da Ásia e do Pacífico (MCED-6), realizada no Cazaquistão em outubro de 2010. O comunicado de imprensa final desse encontro teve que ser reformulado. China, Índia, Irã e Rússia objetaram a expressão “economia verde” que tinha um grande destaque no texto e inclusive no título. O comunicado a mencionava como a estratégia apoiada pelos ministros asiáticos. A Cespap foi obrigada a divulgar novo comunicado de imprensa identificando o crescimento verde como “um enfoque (a mais) de desenvolvimento sustentável”.

Para um diplomata asiático em Bangcoc que pediu para não ser identificado, “este é um tema que se tornou polêmico. A partir de então, fiscalizamos a forma com a Cespap emprega os termos crescimento verde e economia verde sem seus documentos”, contou.

No âmbito interno, a maioria dos países contribui para o desenvolvimento de alternativas baixas em carbono e investimentos em tecnologia verde. Contudo, resistimos a sermos pressionados para apoiar a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável”, afirmou o diplomata.

A Cespap estava, de fato, na vanguarda do debate sobre crescimento verde, reconhecendo-o como uma alternativa de desenvolvimento sustentável. O conceito foi promovido na MCED-5, realizada na Coreia do Sul, em 2005. Três anos depois, após a crise financeira de 2008, muitos outros também apoiaram o conceito de economia verde, desde o Pnuma até o Grupo dos 20 países industrializados e emergentes.

Os países asiáticos enfrentam a restrição de recursos, o preço do combustível sobe e isto é um impedimento ao seu desenvolvimento”, afirmou Rae Kwon Chung (foto ao lado), diretor de meio ambiente e desenvolvimento da Cespap. “A pobreza não pode ser erradicada sem se resolver essa falta de recursos. As recentes crises energética e alimentar devem desatar uma grande mudança. Os países em desenvolvimento requerem um sistema energético distinto. A economia verde é uma das estratégias para pôr em prática o desenvolvimentos sustentável”, explicou à IPS.

A necessidade dessa mudança é evidente quando se observa que para produzir um dólar a região consome três vezes mais recursos naturais do que o resto do mundo, segundo informe da Cespap divulgado pouco antes da Rio+20. Muitas economias da Ásia e do Pacífico são importadoras de recursos e matérias-primas e sensíveis às altas de preços. Em 2011, as altas dos alimentos e do petróleo afundaram na pobreza 42 milhões de pessoas, enquanto no ano anterior 19 milhões haviam tido a mesma sorte.

Grandes nações, como China e Índia, e outras menores, como Camboja e Vietnã, são elogiadas no informe por adotarem programas para “reverdecer suas economias”.

No entanto, as maiores economias regionais erguem uma bandeira vermelha quando o crescimento verde é colocado em outro contexto, como uma nova receita internacional e vinculante para o desenvolvimento sustentável do Sul global.

Isto continuará sendo um tema de divisão e as sessões da Cespap vão refletir isso. Alguns governos já disseram basta”, afirmou a fonte diplomática.

Envolverde/IPS
Fonte:
http://envolverde.com.br/ips/inter-press-service-reportagens/economia-verde-divide-asia/?utm_source=CRM&utm_medium=cpc&utm_campaign=28

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Além da Rio+20: juntos por um futuro sustentável

22/06/2012 - por José Graziano da Silva (*)
original publicado no site TERRAMÉRICA - Envolverde

Rio de Janeiro, Brasil, 22 junho de 2012 (Terramérica) - As declarações finais da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano de 1972 e a Eco 92 puseram o ser humano no centro do desenvolvimento sustentável.

No entanto, até hoje, mais de 900 milhões de pessoas ainda passam fome.

Populações pobres pelo mundo afora, especialmente nas áreas rurais, são as mais atingidas pelas crises alimentar, climática, financeira, econômica, social e energética que o mundo enfrenta hoje.

Não podemos falar em desenvolvimento sustentável enquanto aproximadamente uma em cada sete pessoas – crianças, mulheres e homens – ficam para trás, vítimas de desnutrição. Seria uma contradição. A fome e a pobreza extremas também excluem a possibilidade de um verdadeiro desenvolvimento sustentável porque os miseráveis precisam usar os recursos naturais disponíveis para conseguir comida. Para eles, suprir suas necessidades básicas é o princípio primordial de cada dia – planejar para o futuro é um luxo que eles não têm.

Paradoxalmente, mais de 70% das pessoas que passam fome no mundo dependem diretamente da agricultura, caça e pesca para sobreviver. Portanto, suas escolhas diárias ajudam a determinar como os recursos naturais do mundo são administrados. Não podemos esperar que o agricultor pobre não corte uma árvore se esta é sua única fonte de energia; não podemos pedir para o pescador artesanal deixar de pescar durante o período do defeso se esta é a única maneira de alimentar sua família.

A fome coloca em movimento um ciclo vicioso que reduz a produtividade, aprofunda a pobreza, desacelera o desenvolvimento econômico, promove a degradação dos recursos e a violência. A fome e a disputa por recursos naturais são fatores de conflitos que, mesmo quando são internos, têm impactos que frequentemente ultrapassam as fronteiras dos países. Então, há também uma ligação direta entre a segurança alimentar e segurança nacional e regional.

A busca por segurança alimentar pode ser o fio condutor que ligará os diferentes desafios que o mundo enfrenta e ajudará a construir um futuro mais sustentável. Na Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, temos uma oportunidade de ouro para explorar a convergência entre as agendas da segurança alimentar e a sustentabilidade para assegurar que isso aconteça. Ambas requerem mudanças para modelos de produção e consumo mais sustentáveis.

Para alimentar uma população mundial que superará a marca de nove bilhões de pessoas em 2050, a FAO prevê a necessidade de aumentar a produção agrícola em pelo menos 60%. Para isso, precisamos produzir mais alimentos ao mesmo tempo em que conservamos o meio ambiente. Contudo, mesmo com práticas mais sustentáveis, a pressão sobre nossos recursos naturais será extrema. Então, também temos que mudar a maneira que nos alimentamos, adotando dietas mais saudáveis e reduzindo o desperdício e perda de alimentos: todo ano, entre a colheita e o consumo, jogamos fora 1,3 bilhão de toneladas de alimentos.

Entretanto, mesmo se aumentarmos a produção agrícola em 60% até 2050, o mundo ainda terá 300 milhões de pessoas com fome daqui a quatro décadas porque, como as centenas de milhões de subnutridos hoje, eles continuarão sem os meios para ter acesso à comida que necessitam. Para eles, a segurança alimentar não é um problema de produção insuficiente, é uma questão de acesso inadequado. Para tirar esses milhões de pessoas da insegurança alimentar, precisamos investir na criação de melhores empregos, pagar melhores salários, dar-lhes maior acesso a ativos produtivos – especialmente terra e água – e distribuir renda de forma mais justa e equitativa.

Precisamos trazê-los para dentro da sociedade, complementando o apoio aos pequenos agricultores com oportunidades de geração de renda, com o fortalecimento das redes de proteção social, mutirões de trabalho e programas de transferência de renda, que contribuam para o fortalecimento de circuitos locais de produção e consumo para dinamizar as economias locais. A transição para um futuro sustentável também exige mudanças fundamentais no sistema de governança de alimentos e agricultura e uma partilha equitativa dos custos de transição e benefícios.

No passado, os mais pobres pagaram uma parcela maior dos custos de transição e receberam uma cota menor de benefícios. Este é um desequilíbrio inaceitável, que precisa mudar. Erradicar a fome e melhorar a nutrição humana, criando sistemas sustentáveis de produção e consumo de alimentos, e construir uma governança mais inclusiva e eficaz dos sistemas agrícolas e alimentares são cruciais para alcançar um mundo sustentável.

Na Rio+20, estamos numa encruzilhada. De um lado está o caminho para a degradação ambiental e o sofrimento humano; do outro está o futuro que todos queremos. A Rio+20 oferece uma oportunidade histórica que não podemos dar ao luxo de perder. Nós sabemos como acabar com a fome e gerenciar os recursos do planeta de uma forma mais sustentável. Mas precisamos de uma vontade política mais forte para fazê-lo.

Devemos olhar para Rio +20 como o início de um caminho e não como o ponto de chegada.

E essa é uma caminhada que não podemos fazer sozinhos.

Como a luta contra a fome, o desenvolvimento sustentável é uma meta com a qual cada um de nós deve contribuir – cidadãos, empresas, governos, movimentos sociais, ONGs e organismos regionais e internacionais.

Juntos, trabalhando a partir do nível local para o nível global, podemos construir o futuro que queremos.

E esse futuro precisa começar hoje.

 (*) Diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO). (foto ao lado)

Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.


Fonte: Terramérica