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segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Celac: Cuba volta à região

01/02/2013 - A Celac permite a Cuba completar sua reinserção regional
- por Patricia Grogg, da IPS (Inter Press Service)
- para o site Envolverde

Havana, Cuba, 01/02/2013 – A diplomacia cubana poderá ser usada a fundo este ano para promover suas concepções sobre integração, coincidentes com as necessidades e propósitos da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), mecanismo de concertação que exclui os Estados Unidos, seu principal oponente ideológico.

Para Havana, essa independência de Washington é justamente a principal vantagem da Celac, cuja presidência rotativa será exercida até começo de 2014 pelo presidente cubano, Raúl Castro, junto com seus colegas do Chile, Sebastián Piñera (acima), e da Costa Rica, Laura Chinchilla (abaixo).

Por resolução especial, a essa troika se unirá o presidente do Haiti, Michel Martelly (acima), que este ano lidera a Comunidade do Caribe (Caricom)

A Celac reúne uma comunidade diversa, plural e tolerante, com diferentes signos políticos e ideológicos. Assim, o grande desafio, surgido mesmo antes do encontro para sua fundação, é caminhar pela concertação e pelo consenso com o objetivo principal de avançar para a integração e o crescimento. Além disso, conseguir que o social seja parte do desenvolvimento econômico.

Assumimos o compromisso de trabalhar pela paz e justiça, pelo desenvolvimento, pela cooperação, pelo entendimento e pela solidariedade entre os latino-americanos e caribenhos”, declarou Castro após assumir a presidência da Celac, não sem reconhecer que o fomento da unidade regional parte do reconhecimento da diversidade existente na área.

O bloco, que reúne os 33 países da região, encerrou, no dia 28, sua primeira cúpula formal, em Santiago, no Chile.

Sua segunda edição será dentro de um ano em Cuba, cujas autoridades acolheram a criação do bloco desde que a ideia começou a tomar forma na Cúpula da América Latina e do Caribe sobre Integração e Desenvolvimento, realizada em 2008 no Brasil.

A esse encontro, o primeiro de caráter regional sem participação de Estados Unidos e Canadá, seguiu-se outro em fevereiro de 2010 no México, onde se decidiu constituir a Celac, fundada oficialmente no encontro de Caracas, no final de 2011.

A opção de Cuba por uma integração independente dos Estados Unidos ficou evidente em junho de 2009, quando rejeitou solicitar seu reingresso na Organização dos Estados Americanos (OEA), logo que foi revogada por consenso uma resolução de 1962, que suspendia a nação caribenha desse fórum por sua identificação com o marxismo-leninismo.

Além disso, o governo de Castro reafirmou sua ativa participação nos mecanismos regionais representativos da região, incluindo o Caribe insular. “Fortalecer, expandir e harmonizar esses organismos e agrupações é o caminho escolhido por Cuba; não a peregrina ilusão de regressar a uma organização que não admite reforma e que já foi condenada pela história”, disse o presidente cubano.

Cuba pertence desde sua fundação à Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba), integrada também por Venezuela, Antiga e Barbuda, Bolívia, Dominica, Equador, Honduras, Nicarágua, São Vicente e Granadinas. Mantém também estreita e ativa relação política e de colaboração com a Caricom.

A cooperação com países do Sul é um dos fortes da política externa cubana, uma estratégia na qual América Latina e Caribe estão em condições de desenvolver projetos importantes apesar dos recursos limitados.

“Todos temos vantagens e possibilidades de aportar experiência”, disse o chanceler cubano, Bruno Rodríguez, em Santiago, expondo como exemplo a assistência de seu país ao Haiti, que é especialmente forte na área da saúde.

Precisamente, Cuba impulsionará a solidariedade como conceito reitor da cooperação entre os países nessa área, afastando condicionamentos que guardam relação com uma “América Latina nova”, acrescentou o vice-ministro, Abelardo Moreno.

Enquanto o país fortalece seu entorno regional, observa-se poucas expectativas de melhoria nas relações com os Estados Unidos no começo do segundo mandato do presidente Barack Obama.

Várias pessoas que participaram da seção interativa Café 108, no site do Escritório da IPS em Cuba, concordaram que as possibilidades de mudança são escassas.
Raul Castro, presidente cubano da CELAC
Para o comentarista político Esteban Morales, a situação interna e externa dos Estados Unidos é difícil e, entre os cenários possíveis em relação a Cuba, não cabe esperar transformações na atual política.

Porém, o estudioso não descarta a possibilidade de uma via indireta, envolta “nas mudanças para a América Latina e o Caribe”.

As “maiores potencialidades se movem para os dois últimos anos, dependendo de como saírem as coisas para Obama agora”, opinou Morales.

Por seu lado, o jornalista Roberto Molina não espera nenhuma mudança “na situação entre os dois países, inimigos desde o começo dos anos 1960”.

Já o jornalista cubano residente no Canadá, Boris Caro, apontou que “Obama tem muitos temas de governo pendentes, como emigração, reforma fiscal, uma guerra e outros conflitos potenciais e uma economia cambaleante, para que Cuba seja uma prioridade em sua política externa”.

Em seu último discurso do ano passado, Castro anunciou que consagrará os maiores esforços e energias à presidência da Celac, e reiterou “uma vez mais às autoridades norte-americanas a disposição de Cuba ao diálogo respeitoso, baseado na igualdade soberana, sobretudo os problemas bilaterais”.

Fonte: Envolverde/IPS
http://envolverde.com.br/ips/inter-press-service-reportagens/a-celac-permite-a-cuba-completar-sua-reinsercao-regional/

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

domingo, 24 de janeiro de 2010

A volta dos mortos vivos

por Laerte Braga, jornalista e analista político
O presidente eleito do Chile, Sebastián Piñera, criticou a decisão do presidente Hugo Chávez, da Venezuela, de estatizar uma rede de supermercados francesa. Chávez tomou a atitude diante da política de remarcação sistemática e abusiva de preços.

É uma pequena amostra do que vai ser o governo do novo Uribe, o chileno. Pinochet saindo da tumba e assombrando o país. Piñera tem um papel a cumprir no jogo político da América Latina. É a reação das forças de direita e com amplo apoio do governo dos Estados Unidos. O cerco a governos populares como o da Venezuela, do Equador, da Bolívia, do Paraguai e do Uruguai na América do Sul e de Daniel Ortega e Raul Castro, Nicarágua e Cuba, na América Central.

Cerco político e militar. São treze as bases militares dos EUA ao redor da Venezuela.

Há um raciocínio em Washington que é implícito aos norte-americanos desde George Washington. O da escolha do aliado naquele que se submete, pouco importa que seja ligado ao tráfico de drogas, caso de Álvaro Uribe na Colômbia, ou um empresário trapaceiro, caso de Sebastián Piñera no Chile.

Quando o embaixador dos Estados Unidos no Brasil, no governo do ditador Garrastazu Médici disse a Nixon que as violações de direitos humanos eram sistemáticas nos cárceres da ditadura, Nixon respondeu que era uma pena, mas “Médici é um bom aliado”.

A tortura como prática rotineira da ditadura, toda a sorte de barbárie perpetrada pelos militares e seus acólitos, isso pouco importava aos EUA. E continua não importando, acontece desde julho em Honduras. Importa que os interesses norte-americanos sejam preservados e os governos sejam submissos.

Caso contrário são inimigos, rotulados de “terroristas” e daí para pior.

A jóia da coroa é o Brasil. Lula não é um inimigo dos EUA, mas é um obstáculo em muitas situações e por essa razão Barack Obama, ou qualquer outro que lá estivesse, vai investir fundo na eleição de 2010, como sempre fizeram. O preferido de onze entre dez norte-americanos é o governador de São Paulo, José Collor Serra.

Não vai hesitar em acabar de privatizar o que resta para ser privatizado, PETROBRAS inclusive, como vai passar a escritura e um nova reforma ortográfica, essa para mudar a grafia da palavra Brasil. Vai virar BRAZIL.

O sonho dos governos norte-americanos são bases militares em território brasileiro. Uma próxima a Amazônia, ou na própria Amazônia, para facilitar o processo de ocupação e outra no sul, abrindo caminho para o controle total do País.

Qualquer especialista em meio-ambiente pode explicar os efeitos imediatos e as conseqüências dos testes nucleares feitos pela França no atol de Mururoa. Foram quarenta e seis testes atmosféricos e cento e cinqüenta subterrâneos. Entre 1966 e 1974.

Em 1995 a França tentou retomar os testes. Os protestos em todo o mundo acabaram por levar o governo francês a recuar em sua intenção.

Cada uma das guerras que os norte-americanos travam em função de seus interesses implica em testes com armamentos novos. Armas químicas (agente laranja no Vietnã, por exemplo), biológicas, armas de efeito e padrão ainda desconhecidos e lógico, tecnologia de armas nucleares bem mais avançada o que permite que esses artefatos imensos no passado, caibam hoje dentro de uma mala de porte médio.

Não há preocupação nem com seus próprios soldados. Usam balas de urânio empobrecido (Iraque, Afeganistão). A GLOBO não noticia, está preocupada com a declaração da sister Cláudia – “não queria dormir com o Eliéser” –, mas é assustador o número de veteranos de guerra dos EUA padecendo de doenças provocadas pelos armamentos e balas de urânio empobrecido. Distúrbios de toda a ordem, inclusive psíquicos.

A idéia que o terremoto que abalou e destruiu o Haiti possa ter sido conseqüência de testes com armas nucleares na região não é nem despropositada ou descabida. É possível. Ou armas que chamam de última geração, as tais que o sangue do inimigo aparece verde na telinha.

Uma dessas partículas dos testes franceses, qualquer que seja, no Atol de Mururoa, trazida pelo vento, leva, pelo menos 200 anos para se decompor. O efeito é letal.

O alerta partiu do governo chinês, foi feito publicamente pelo presidente da Venezuela Hugo Chávez e Washington sequer cogitou de desmentir, resolveu não levar em consideração, a velha tática de desqualificar o adversário, rotular e assim evitar a discussão do assunto.

Na guerra Irã versus Iraque, quando os EUA financiaram o governo do então “aliado” Saddam Hussein para tentar acabar com a revolução islâmica e popular iraniana, o uso de armas químicas e biológicas fornecidas a Saddam foi denunciado em todos os cantos do mundo.

Como na guerra do Brasil com o Paraguai, apresentada como página de heroísmo de nossa história. Conflito montado, dirigido e produzido por Londres, à época, com a recomendação que aquele país fosse varrido do mapa. Genocídio puro e simples. O Paraguai era o principal competidor do chamado Reino Unido, onde o sol não se punha (colônias em todos os cantos do mundo), na exportação de mate e tecidos.

É corriqueira essa história.

Sebastián Piñera foi colaborador do regime do ditador Pinochet. É empresário desses em que a iniciativa privada é financiada e paga pelo dinheiro público. Tipo Ermírio de Moraes que quando quebra vende as ações, não o controle acionário, mas parte das ações do “negócio” para o governo via BNDES e depois se arrosta gerador de “progresso”, “empregos”, etc.

São mortos vivos saindo das catacumbas. No Brasil reagem ao Plano Nacional de Direitos Humanos e hoje o jurista (putz, é o fim da picada, o cara é mestre em ensinar a sonegar) Ives Gandra Martins, no jornal (venal) FOLHA DE SÃO PAULO, o tal que chamou a ditadura de ditabranda e emprestava seus caminhões para que corpos de presos políticos mortos na tortura fossem desovados e dados como atropelados, mas hoje o jurista desancou “guerrilheiros pretéritos”.

Múmia. Guerrilha transcende à compreensão de gente como o “jurista” Ives Gandra. A reação dos franceses à ocupação de seu país pela Alemanha se deu pela guerrilha, por operações típicas de guerrilha. O comandante da resistência era o general Charles De Gaulle. Na visão do “jurista”, “guerrilheiro pretérito”.

O fenômeno não se atém apenas à América Latina. Sílvio Berlusconi é um caso europeu. Fascismo explícito, diferente do de Sebastián Piñera, o chileno. Com suas declarações criticando Chávez começa a mostrar a que veio, antes mesmo da posse.

É fechar a janela, colocar tranca nas portas, arrumar dentes de alho e uma cruz para espantar esse tipo de gente.

E depois dizem que Drácula é imaginação. E nem é bem Drácula. É Frankenstein, gerado em laboratório. Produzido em série com a inscrição “made in USA”.

São mortos vivos voltando a assombrar a América Latina especificamente.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Chile: duas visões sobre a eleição de domingo

O descanso do condor

do Oleo do Diabo
Arriscado usar, numa crônica sobre política latino-americana, o nome condor. Apesar de ainda ser um símbolo de liberdade e independência, a bela ave das cordilheiras andinas teve seu nome estigmatizado pela homônima operação de contra-insurgência realizada coletivamente pelas piores ditaduras da região. Mas eu insisto. Recuso-me a entregar tão facilmente um arquétipo poderoso e popular às mãos torpes de forças derrotadas. Ave mais nobre e mais livre das Américas, o condor é o maior pássaro do planeta. Suas asas têm envergadura superior a três metros, permitindo que ele voe longas distâncias sem sequer movimentá-las. O condor pode voar até trezentos quilômetros sem descanso. Mas o que isso significa perante a imensidão continental das montanhas onde ele vive? Em algum momento, o orgulhoso pássaro tem que descer e descansar.

A derrota de Eduardo Frei é o descanso do condor. Por mais competente que seja uma agremiação partidária, sempre haverá um período de cansaço, de esgotamento, de ânsia pelo novo. A esquerda chilena não foi derrotada neste domingo. Ganhou um desafio. Haveria derrota se o legado da esquerda chilena fosse um país devastado econômica e socialmente, disso resultando uma vitória eleitoral esmagadora para a oposição. Nada disso aconteceu no Chile. A esquerda entrega um país com índices solidamente positivos e perdeu por poucos milhares de votos. Saiu por cima, com dignidade e respeito. Não se radicalizou. Não caiu em armadilhas maniqueístas, realizando avanços onde devia fazê-los e mantendo políticas que achou sensato conservar.

As grandes mudanças não são necessariamente inversões. Nenhuma instância é mais dialética que a política. Todo governo é simultaneamente continuidade e superação. Ou continuidade e regresso.

É válido comparar o Chile ao Brasil. Os formuladores da campanha de Dilma Rousseff terão à sua disposição o exemplo da derrota da esquerda chilena para se precaverem contra algo semelhante por aqui.

*

A esquerda latino-americana acumulou, nos últimos anos, uma longa série de vitórias. Muito além do que os mais otimistas jamais esperavam. Quem imaginaria, dez ou quinze anos trás, que a esquerda ganharia as eleições presidenciais em quase todos os países do continente? E que a primeira década do novo século, após os trágicos anos 90, assistiriam a um declínio da miséria tão acentuado?

Essas vitórias sucessivas, todavia, são o prefácio de derrotas futuras. É a lei da vida. A derrota no Chile serve à esquerda como advertência de seu próprio declínio. Ingenuidade achar que o PT ou qualquer outro partido de esquerda governará o Brasil indefinidamente. Então achei esse poema de um chileno que ganhou o Nobel de literatura, o socialista Pablo Neruda, que fala da necessidade de cairmos de vez em quando para não perdemos a perspectiva da altura. Ou mesmo por razão nenhuma. Porque há mistérios na vida que não compreendemos e seria arrogância e loucura pretender controlar tudo o que acontece. O poema alude também às desgraças políticas (e humanas) que varreram o continente. "Os copos se enchem e voltam / naturalmente a estar vazios / e às vezes de madrugada / morrem misteriosamente. Os copos e os que beberam."

A esquerda latino-americana não perdeu no Chile, porque sua maior vitória ainda é válida. Os gritos de júbilo pela volta da democracia ainda ecoam nas escarpas de Machu Picchu. As ditaduras direitistas não voltarão mais. E se voltarem encontrarão um ambiente social e institucional muito mais preparado para enfrentá-las.

Os povos latino-americanos são pacientes e fortes. Já enfrentaram séculos de opressão, miséria e totalitarismo. Não será a eleição pontual de um conservador que abaterá o seu espírito endurecido por tantos anos de sofrimento. Sem dúvida, tudo está muito bem; e tudo - diz Neruda - está muito mal.

De qualquer forma, vinte anos no poder é um sonho ainda distante da esquerda brasileira. Lula teve oito. Ainda teremos que nos preparar muito para sermos capazes de voar tão alto e tão longe quanto o condor andino.

O Berlusconi chileno

do Blog do Emir Sader
De tanto considerar-se um país da OCDE, distanciado da América Latina, o “tigre latinoamericano”, o Chile ganhou um Berlusconi. Esse é o molde de Sebastián Piñera, recém eleito presidente do Chile, fazendo com que a direita volte ao governo – depois de ter ocupado violentamente o poder, mediante uma ditadura militar, de 1973 a 1990.

Depois dos ditadores militares que representaram os interesses da direita e dos EUA na região, o neoliberalismo projetou um outro tipo de líder da direita: o empresário supostamente bem sucedido. Roberto Campos, entre outros, já dizia que o Estado e as empresas estatais deveriam funcionar com o mesmo critério das privadas: a busca do lucro, o critério custo-benefício, a competitividade. Empresas estatais deficitárias deveriam ser fechadas ou privatizadas – junto com as rentáveis também, já que não competiria ao Estado essa função.

Berlusconi foi eleito e reeleito, entre outras imagens, por essa: o empresário mais rico, o supostamente mais bem sucedido, da Itália. “Se deu certo dirigindo suas empresas, vai dar certo no Estado” – conforme a pregação liberal. “Vai passar o Estado a limpo”, “Vai cortar os gastos inúteis” (isto é, os não rentáveis economicamente). O Estado funcionar conforme o custo-benefício significa cortar recursos para políticas sociais, paga salários dos fucionários públicos, para investimentos de infra-estrutura. Daí o sucateamento do Estado, as privatizações, a mercantilização das relações sociais.

O empresário de sucesso no mercado seria o melhor agente para “passar a limpo” o Estado, fazer o tal “choque de gestão” – que os tucanos adoram. Aqui mesmo eles já apoiaram Antonio Ermírio de Morais, contra seu atual aliado, Orestes Quércia, para o governo de São Paulo.

No Chile, José Piñera, irmão e sócio do eleito presidente do Chile, foi o introdutor das malditas “reformas laborais”, um dois eixos do neoliberalismo, com seu suposto fundamental: gastar menos com remuneração salarial e elevar a superexploração do trabalho, como outras forma de transferência de recursos para os grandes empresários.

O Grupo Piñera ficou conhecido no Chile como dos que mais fez pela introdução do cartão de crédito no Chile, porém o grosso dos seus esforços esteve concentrada na expansão da Lan Chile, com a criação da Lan Peru e a compra de outras empresas latinoamericanas de aviação. Para se assemelhar mais ainda a Berlusconi, ainda que não seja torcedor do Colo-Colo, comprou o clube, como quem compra uma fábricas de empanadas.

Piñera não esconde suas afinidades com o presidente colombiano, Uribe, com quem tratará de fazer dobradinha, tentando isolar a Equador e a Bolívia na região andina e se apresentar, junto com o Peru, como um pólo ortodoxo neoliberal, intensificando as relações de livre comércio com os EUA. Mal sabe ele que os tempos de auge do neoliberalismo já ficaram para trás, que aventurar-se por esse caminho é deixar a economia chilena ainda mais fragilizada diante dos continuados efeitos da crise internacional, ainda para um pais que tem um TLC com os EUA – eixo dessa crise.

A derrota é muito dolorosa para o povo chileno. Mesmo se não colocássemos os governos da Concertação no bloco progressista na região – porque privilegiaram o Tratado de Livre Comércio com os EUA, mantiveram uma política econômica ortodoxa -, toda a esquerda sai derrotada. Porque, apesar das debilidades dos governos da Concertação – refletido agora no voto majoritário da direita, que incorpora amplos setores populares -, a esquerda não soube construir, nas duas décadas de democratização, uma alternativa antineoliberal no Chile. O povo chileno pagará caro esse erro da esquerda, que agora tem, pelo menos, a possibilidade de colocar em questão o modelo herdado do pinochetismo.

Os momentos de balanço de derrotas como essa se prestam para as divisões, para os oportunismos, para os radicalismos verbais. A esquerda chilena pode olhar para a América Latina para ver distintas expressões de governos populares e de blocos sociais e políticos que levam a cabo esses governos, como referência, para que o Chile volte a assumir seu lugar no processo de integração regional e de construção de alternativas efetivamente de esquerda, nas terras de Allende, Neruda e Miguel Enriquez.