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terça-feira, 4 de março de 2014

Governo Maduro neutraliza golpistas

28/02/2014 - Juan Manuel Karg (*)
- via comunicação por e-mail da Alba Movimentos
- Tradução: blog Escrevinhador

O governo da Venezuela parece ter retomado com força a iniciativa política, após a onda de protestos da oposição conservadora na última quinzena.

Convocou todas os setores sociais em uma conferência da paz nacional. Só faltou na reunião a oposição conservadora.

O governo recorreu também aos países do Mercosul, que reconheceu a democracia no país. Por sua vez, também anunciou a próxima reunião da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) para tentar construir uma posição comum contra as tentativas de desestabilização.

Qual é a estratégia da oposição conservadora para este novo cenário? Pesquisas mostram a rejeição da maioria dos venezuelanos aos protestos violentos, que nos últimos dias tem perdido peso.

A reunião convocada pelo Nicolás Maduro [foto], em Miraflores, última quarta-feira [26 fev], sob o nome de Conferência Nacional da Paz, era uma novidade política retumbante no cotidiano vertiginoso na Venezuela neste conturbado fevereiro. 

Representantes de movimentos sociais e políticos, religioso, empresarial e intelectual participaram da conferência. Apenas ficou ausente a Unidade Democrática.

O amplo consenso alcançado na reunião sobre a necessidade de ”pacificar” a situação política do país mostra um antagonismo claro para o ciclo de protestos de rua que têm sido desenvolvido contra o governo nas últimas duas semanas.

A oposição política, para evitar que fosse tirada uma foto com Maduro, acabou optando por não participar de uma conferência que fez uma análise verdadeiramente abrangente, mostrando sua mesquinhez e sectarismo.

Assim, não deixou que ouvissem a sua opinião,  que não a sua voz para o país. Foi o que fez, por exemplo, a Fedecamaras , que teve que admitir à nação que tinha cometido vários “erros” no passado.

Enquanto acontecia a conferência, em Caracas, o chanceler Elias Jaua [foto] começou, a partir de definição de políticas do governo Maduro, a fazer uma excursão ambiciosa nos países do Mercosul.

Em 24 horas, visitou a Bolívia , Paraguai , Argentina, Uruguai e Brasil. Jaua ofereceu aos países do continente ”informação em primeira mão” sobre os últimos acontecimentos.

Na conferência de imprensa realizada em Buenos Aires, ele detalhou o caráter pacífico de seu país, dizendo que “a Venezuela nunca fez uma guerra com outro país. Somos um país de pessoas de paz”.

A intenção do Jaua dar detalhes do que aconteceu, fazendo um contraponto às informações fornecidas pelos principais meios de comunicação internacionais, que, de acordo com a sua opinião, buscam ”demonizar” o governo venezuelano.

Assim, ele informou que das 14 mortes em eventos infelizes, apenas em três estavam envolvidos policiais. Esse funcionários agiram, segundo ele, fora as ordens dadas e foram afastados de seus postos e presos, sendo investigado pelo Ministério Público.

Depois de fazer esse esclarecimento, ele disse que “a nossa revolução é de uma natureza democrática e pacífica” e agradeceu o apoio do governo de Cristina Fernández Kirchner [foto].

No Uruguai, Jaua caracterizou a Unasul como “mais eficaz” e com um funcionamento mais democrático do que a OEA (Organização dos Estados Americanos).

Os dados dão razão ao ministro: em 2008 e 2010, houve duas tentativas de desestabilização na Bolívia e no Equador, que foram contidas pela Unasul. 

Assim, a Venezuela anunciou uma nova reunião da Unasul para discutir a questão.

Por sua vez, a oposição conservadora venezuelana parece aumentar sua divisão interna.

Após a prisão de Leopoldo López [foto], que é investigado pelas suas responsabilidades nos acontecimentos de 12 de fevereiro, Henrique Capriles [foto abaixo] tenta recuperar espaço, especialmente por meio de aparições na mídia.

No entanto, Capriles tem evitado convites para participar com Maduro de reuniões para a construção da paz. 

A sua ausência foi expressa tanto na Conferência Nacional para a Paz como no Conselho Federal de Governo, com a participação dos outros 22 governadores, incluindo Henri Falcón, outro líder da oposição e governador do estado de Lara.

Finalmente, temos conhecido nos últimos dias algumas pesquisas sobre os protestos.

Sem dúvida, se verifica um desgaste dos bloqueios violentos de setores da oposição conservadora.

A sondagem privada da Serviços da Consultoria Internacional quantifica 83% de rejeição da continuidade desses protestos.

É evidente que, à medida em que essas ações se tornaram método de protesto, houve uma rejeição por parte da oposição conservadora como um “atalho”.

Aparentemente, a decisão de retomar fortemente a iniciativa política, tanto nacional e internacionalmente, do governo venezuelano fez grande parte da ”classe política” perdida, vendo um refluxo das suas ações.

As articulações no âmbito da Conferência Nacional para a Paz e uma rápida reunião da Unasul são fundamentais para neutralizar os ânimos dos setores mais violentos e colocar por terra, definitivamente, mais essa tentativa de desestabilização da história da Revolução Bolivariana.

(*) Juan Manuel Karg é professor licenciado em Ciência Política da Universidade de Buenos Aires e pesquisador do Centro Cultural da Cooperação.

Fonte:
http://www.rodrigovianna.com.br/geral/governo-maduro-neutraliza-golpistas.html

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

América Latina - fim de um ciclo

12/01/2014 - Elaine Tavares em seu blogue Palavras Insurgentes

Ao se completarem dez meses da morte de Hugo Chávez, o panorama que se vislumbra na América Latina é desanimador.

A Venezuela “cria cuervos”, agarrada com a elite financeira do país que põe a economia no chão.

O Equador se rende as mineradoras e aos ditames do Banco Mundial.

O Brasil, que nunca chegou a trilhar os caminhos do socialismo, cada vez mais mergulha no pragmatismo do negócio.

Países da América Central que estavam inclinados a uma parceria com a Venezuela também se desviam.

A Bolívia, apesar de forte influência indígena, igualmente vai se rendendo às grandes empresas privadas, que formam um perigoso poder no país.

O Uruguai, que tem sido a estrela da vez, avança em reformas que muito pouco mudam a estrutura do sistema de governo.

Ao que parece, a era das transformações está encerrada e o caminho para o socialismo, que era uma promessa do líder venezuelano, está, por hora, interrompido.

Como era de se esperar, o desaparecimento de Chávez foi também o desaparecimento do motor teórico do processo “revolucionário” que começou com a chegada desse militar incomum ao poder em 1998.

Quando Chávez chegou à presidência da Venezuela o mundo estava então dominado pelo pensamento neoliberal. Parecia não haver saída desse labirinto de pensamento único.

Na América Latina apenas Cuba seguia resistindo, e o presidente venezuelano entrou no cenário com um discurso duro contra o imperialismo e o capital.

No princípio foi tratado como um anacronismo, uma falha na matrix que logo seria extirpada. Mas, no tecido social completamente roto da Venezuela a proposta de Chávez cresceu, tomou corpo e se encarnou na maioria da população desde sempre empobrecida.

Ele prometia uma revolução bolivariana, amarrada ao ideário do famoso conterrâneo que liderou as grandes guerras de independência da parte norte e leste da América Latina: Bolívar.

E o que é o bolivarianismo?

Um sistema de governo que tem como plataforma a educação gratuita para todos, soberania, fim do colonialismo político, econômico e cultural, unidade dos países latino-americanos, fim da dependência.

E foi esse sendero que o governo de Chávez foi abrindo por entre as veias da América Latina.

Seu discurso forte, seu carisma e, fundamentalmente suas ações, guinaram a Venezuela à esquerda e, com ela, começaram a girar também outros países.

O Equador, depois de fortes rebeliões indígenas, foi buscando um caminho soberano.

A Bolívia, igualmente derrubou presidentes, ardeu em rebelião e apontou novos horizontes, inauditos.

Veio uma nova Constituição na Venezuela, participativa, desde baixo. Outro duro golpe no pensamento neoliberal, no modelo ocidental, burguês.

Institucionaliza-se o poder popular, coisa inédita nestes confins.

Anunciam-se revoluções bolivarianas, cidadãs, culturais.

O imperialismo atacou, deu golpe, mas foi derrotado pela massa que já não estava mais excluída da participação.

Chávez voltou fortalecido, passou por novas eleições, sempre vencendo. Dia a dia ele falava com seu povo, lia livros, editava outros tantos, orientava estudos.

Não era um bravateiro sem estofo. Sabia o que dizia e o que estava fazendo. Não era ainda o socialismo. No máximo, um capitalismo de estado, mas prometia avançar para além. E caminhava.

Na esteira das mudanças venezuelanas a Bolívia também mudou.

Elegeu Evo Morales [foto], das fileiras indígenas e sindicais, construiu de forma participativa e popular uma nova Constituição, criou um estado Plurinacional, avançou na participação, fez assomar a cultura originária, maioria no país.

O Equador seguiu o mesmo diapasão.

Nova Constituição, outorgou direitos à natureza, estado pluricultural.

Abriu espaço para novos pensares, mais além do socialismo: o sumak kausay, uma forma de organizar a vida embasada em conceitos autóctones, dos povos antigos, coisa completamente nova para quem acreditava que o modelo europeu era o único possível.

A América Latina entrou no novo milênio ardendo em novidade e transformação.

Quando alguém fraquejava, lá vinha o Chávez com sua voz de trovão, puxando o timão mais à esquerda.

E mesmo quando ele mesmo claudicava, ou cedia ao “possível”, buscava nos autores revolucionários, nos heróis do passado, a inspiração para reavaliar e avançar.

E, assim, esses três países em especial (Venezuela, Bolívia e Equador) começaram a realizar algumas mudanças que finalmente mexiam nas estruturas.

Outros, como o Brasil, a Argentina, a Nicarágua, Honduras, Paraguai, Uruguai, principiaram a realizar reformas e a amparar pelo menos alguns pontos do bolivarianismo, como a ideia de soberania e união latino-americana.

Quando, no mês de março de 2013, o câncer venceu o comandante, as coisas já não andavam bem.

Na Venezuela era possível observar a subida da inflação e a opção do governo por uma aliança com o setor financeiro. O país não conseguia avançar no caminho do desenvolvimento endógeno, atropelado que fora ano após ano por golpes, contragolpes e ações desestabilizadoras da direita.

Apesar de todos os esforços empreendidos, o rentismo petroleiro ainda era o carro chefe da economia do país. A produção - de comida e de outros produtos de uso corrente - não deslanchou.

Continuava mais vantajoso ao empresariado nacional seguir com a importação, especulando com o dólar, criando um perigoso mercado paralelo para a moeda estadunidense.

Na Bolívia, Evo Morales passou a apostar na lógica do neodesenvolvimentismo, puxada pelo Brasil.

Projetos grandiosos com construtoras estrangeiras (brasileiras) e o crescente conflito com as comunidades indígenas.

No Equador, Rafael Correa [foto abaixo] foi mordido pela mosca azul e abraçou-se às mineradoras e as grandes empresas do petróleo.

Tem mantido fogo cerrado contra os povos indígenas, acusando-os de barrar o progresso do país e entrou de cabeça na mesma onda do “desenvolvimento” a qualquer custo.

O modelo é o mesmo do Brasil. Reforma sem vestígios de revolução.

A morte de Chávez de certa forma liberou os aliados para uma virada de timão, mais ao estilo do Brasil.

Aquilo que Lula não conseguiu, já que era frequentemente ofuscado por Chávez, Dilma logrou. Não tanto pela ação dela, mas porque agora os mandatários vizinhos estavam mais livres para fugir da rota socialista.

Daí que se configura inegável o papel de liderança que o presidente venezuelano exercia em todo o continente.

Tanto que as proposta de uma aliança com o Caribe e a construção da Unasur foram constituídas a partir de suas investidas.

A união das repúblicas latino-americanas era um sul determinado por ele e, num período de crise na região europeia assim como nos Estados Unidos, foi e continua sendo uma alternativa muito conveniente para os países da América Latina.

Mas, apesar de essas propostas seguirem vivas e atuantes, é fato que perderam força política.

Os encontros continuam, as instituições também, mas não há uma liderança capaz de articular as ações econômicas com o debate teórico.

A última reunião da Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba) foi um bom exemplo. Realizada em Caracas no último dia 17 de dezembro, não mereceu sequer uma nota nos jornais.

Falta a grandiloquência de um projeto totalizante de combate ao capitalismo.

O professor Nildo Ouriques, do Instituto de Estudos Latino-Americanos, analisa a Venezuela hoje, sob o comando de Nicolás Maduro [foto abaixo], e não tem dúvidas de que o processo revolucionário, por agora, se esgotou.

O fato de o partido do governo ter ganhado as eleições municipais agora em dezembro não diz muito. Nos pequenos municípios a política do partido está consolidada. Mas, nos grandes, não. Daí que a direita avança por aí.

Maduro não tem a força de Chávez para mudar o rumo dos acontecimentos e talvez nem mesmo Chávez pudesse fazê-lo.

Pode até ser que o bolivarianismo siga no poder por algum tempo – e é bom que siga  - mas não haverá mais mudanças radicais e o povo ficará cada vez mais fora do poder de decisão”.

Segundo Nildo, a inflação galopante que tem assolado o país e a criação de um mercado paralelo do dólar enfraquecem a economia e a tendência é de que, a seguir essa política, a situação econômica se agrave ainda mais.

O empresariado local não tem interesse na produção, está lucrando de forma astronômica com o dólar.

E, sem produção, o país segue dependente.

É um círculo vicioso e sem saída.

A menos que houvesse uma virada de curso. Mas isso não se vislumbra.

Nos demais países, a falta de um discurso forte acerca do caminho para o socialismo ou qualquer outra forma diferente de organizar a vida, coloca todo mundo - em maior ou menor grau - na posição de "humanizar" o capitalismo.

No Brasil, algumas políticas públicas asseguram renda aos mais pobres, o programa Mais Médicos surge como um importante paliativo de saúde para os fundões do país.

Mas, por outro lado, o agronegócio está cada vez mais abraçado ao governo, deitando e rolando no ataque aos indígenas e aos que pretendem colocar qualquer freio a nova expansão da monocultura.

Vive-se uma investida anti-indígena só comparada a caminhada para o norte no início do século XX.

No Uruguai, apesar de passos importantes como o ataque ao narcotráfico e a busca por uma democratização da mídia, Mujica [foto] permite a ação nefasta das papeleiras e de outras grandes crias do capital.

Na Bolívia, na última quarta-feira (18.12), chegou-se ao extremo de reprimir, com gás e força policial, uma manifestação de crianças, que marchavam por um código do menor.

No Equador, Correa está rendido às petroleiras.

Na verdade, toda a proposta de soberania e anti-colonialismo contida no bolivarianismo parece se esvair.

Os mandatários ditos “progressistas” não conseguem sair da roda da dependência. Preferem o acordo com o capital especulativo e com as mega empresas transnacionais, para tentar algum respiro do que chamam “desenvolvimento”.

Aplicam políticas compensatórias que até são importantes, a considerar a extrema pobreza que vivem as maiorias, mas que não parecem capazes de romper com o ciclo de uma quase perpétua subserviência.

O máximo que conseguem é o que já apontava Gunder Frank: o desenvolvimento do subdesenvolvimento, o que permite algumas ilhas de riqueza, um certo incremento no consumo através da liberação de crédito, mas praticamente nenhuma mudança estrutural.

Para os protagonistas de lutas importantes contra o capital, como é o caso dos bolivianos que viveram as guerras da água e do gás, esses governos, mascarados de esquerda, acabam prestando um desserviço à luta anticapitalista.

"Eles domesticam o movimento social, seguram os movimentos de luta, cooptam lideranças, disseminam uma mensagem falsa sobre as possibilidades de melhorias dentro do sistema.

Assim, retrocedemos décadas. É uma tragédia", afirma Oscar Olivera, uma das mais importantes lideranças da Guerra da Água, em Cochabamba.

Nos dias de hoje, sem a presença vigorosa de um Fidel, ou a trovejante ousadia de Chávez, o que parece avançar é a acomodação ao velho modelo de dependência e de cooperação com o capital.

Mas, ainda assim, a falta de uma alternativa também abre caminho para a construção de outro ciclo, talvez um pachakuti (o mundo de patas para cima, uma viração), como dizem os povos andinos.

Algum novo giro, uma nova tendência, uma surpresa, como foi Chávez e seu sonho bolivariano. No final dos anos 90 essa novidade veio de onde ninguém esperava.

Agora, enquanto o mundo mergulha no frisson das novas tecnologias, da inserção internética, no reino das sensações, talvez, em algum lugar não sabido, completamente inaudito, esteja brotando o que virá. As lutas não acabam, seguem seu caminho.

Os movimentos continuam protagonizando resistência e, afinal, os povos sempre aprendem quando vivenciam experiências alvissareiras, como as que afloraram na última década.

Algo novo há de aparecer.

Assim, seguimos!...

Fonte:
http://eteia.blogspot.com.br/2014/01/america-latina-fim-de-um-ciclo.html

Leituras afins:
- O fim de uma era - Fernando Brito
- Uma nova geração que resgata Marx - Michelle Goldberg 
- Burguesias nacionais? Não existem mais - Rodrigo Mendes 

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Celac: Cuba volta à região

01/02/2013 - A Celac permite a Cuba completar sua reinserção regional
- por Patricia Grogg, da IPS (Inter Press Service)
- para o site Envolverde

Havana, Cuba, 01/02/2013 – A diplomacia cubana poderá ser usada a fundo este ano para promover suas concepções sobre integração, coincidentes com as necessidades e propósitos da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), mecanismo de concertação que exclui os Estados Unidos, seu principal oponente ideológico.

Para Havana, essa independência de Washington é justamente a principal vantagem da Celac, cuja presidência rotativa será exercida até começo de 2014 pelo presidente cubano, Raúl Castro, junto com seus colegas do Chile, Sebastián Piñera (acima), e da Costa Rica, Laura Chinchilla (abaixo).

Por resolução especial, a essa troika se unirá o presidente do Haiti, Michel Martelly (acima), que este ano lidera a Comunidade do Caribe (Caricom)

A Celac reúne uma comunidade diversa, plural e tolerante, com diferentes signos políticos e ideológicos. Assim, o grande desafio, surgido mesmo antes do encontro para sua fundação, é caminhar pela concertação e pelo consenso com o objetivo principal de avançar para a integração e o crescimento. Além disso, conseguir que o social seja parte do desenvolvimento econômico.

Assumimos o compromisso de trabalhar pela paz e justiça, pelo desenvolvimento, pela cooperação, pelo entendimento e pela solidariedade entre os latino-americanos e caribenhos”, declarou Castro após assumir a presidência da Celac, não sem reconhecer que o fomento da unidade regional parte do reconhecimento da diversidade existente na área.

O bloco, que reúne os 33 países da região, encerrou, no dia 28, sua primeira cúpula formal, em Santiago, no Chile.

Sua segunda edição será dentro de um ano em Cuba, cujas autoridades acolheram a criação do bloco desde que a ideia começou a tomar forma na Cúpula da América Latina e do Caribe sobre Integração e Desenvolvimento, realizada em 2008 no Brasil.

A esse encontro, o primeiro de caráter regional sem participação de Estados Unidos e Canadá, seguiu-se outro em fevereiro de 2010 no México, onde se decidiu constituir a Celac, fundada oficialmente no encontro de Caracas, no final de 2011.

A opção de Cuba por uma integração independente dos Estados Unidos ficou evidente em junho de 2009, quando rejeitou solicitar seu reingresso na Organização dos Estados Americanos (OEA), logo que foi revogada por consenso uma resolução de 1962, que suspendia a nação caribenha desse fórum por sua identificação com o marxismo-leninismo.

Além disso, o governo de Castro reafirmou sua ativa participação nos mecanismos regionais representativos da região, incluindo o Caribe insular. “Fortalecer, expandir e harmonizar esses organismos e agrupações é o caminho escolhido por Cuba; não a peregrina ilusão de regressar a uma organização que não admite reforma e que já foi condenada pela história”, disse o presidente cubano.

Cuba pertence desde sua fundação à Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (Alba), integrada também por Venezuela, Antiga e Barbuda, Bolívia, Dominica, Equador, Honduras, Nicarágua, São Vicente e Granadinas. Mantém também estreita e ativa relação política e de colaboração com a Caricom.

A cooperação com países do Sul é um dos fortes da política externa cubana, uma estratégia na qual América Latina e Caribe estão em condições de desenvolver projetos importantes apesar dos recursos limitados.

“Todos temos vantagens e possibilidades de aportar experiência”, disse o chanceler cubano, Bruno Rodríguez, em Santiago, expondo como exemplo a assistência de seu país ao Haiti, que é especialmente forte na área da saúde.

Precisamente, Cuba impulsionará a solidariedade como conceito reitor da cooperação entre os países nessa área, afastando condicionamentos que guardam relação com uma “América Latina nova”, acrescentou o vice-ministro, Abelardo Moreno.

Enquanto o país fortalece seu entorno regional, observa-se poucas expectativas de melhoria nas relações com os Estados Unidos no começo do segundo mandato do presidente Barack Obama.

Várias pessoas que participaram da seção interativa Café 108, no site do Escritório da IPS em Cuba, concordaram que as possibilidades de mudança são escassas.
Raul Castro, presidente cubano da CELAC
Para o comentarista político Esteban Morales, a situação interna e externa dos Estados Unidos é difícil e, entre os cenários possíveis em relação a Cuba, não cabe esperar transformações na atual política.

Porém, o estudioso não descarta a possibilidade de uma via indireta, envolta “nas mudanças para a América Latina e o Caribe”.

As “maiores potencialidades se movem para os dois últimos anos, dependendo de como saírem as coisas para Obama agora”, opinou Morales.

Por seu lado, o jornalista Roberto Molina não espera nenhuma mudança “na situação entre os dois países, inimigos desde o começo dos anos 1960”.

Já o jornalista cubano residente no Canadá, Boris Caro, apontou que “Obama tem muitos temas de governo pendentes, como emigração, reforma fiscal, uma guerra e outros conflitos potenciais e uma economia cambaleante, para que Cuba seja uma prioridade em sua política externa”.

Em seu último discurso do ano passado, Castro anunciou que consagrará os maiores esforços e energias à presidência da Celac, e reiterou “uma vez mais às autoridades norte-americanas a disposição de Cuba ao diálogo respeitoso, baseado na igualdade soberana, sobretudo os problemas bilaterais”.

Fonte: Envolverde/IPS
http://envolverde.com.br/ips/inter-press-service-reportagens/a-celac-permite-a-cuba-completar-sua-reinsercao-regional/

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Lições do Sul para uma Europa em crise?

29/fev/2012 - por Rémy Herrera [*] - resisitir.info - Lisboa

Retomar a ofensiva, sair da zona euro, romper com a armadilha neoliberal  


A extrema gravidade da crise que atinge actualmente a Europa, em particular a zona euro por via das dívidas ditas "soberanas", da Grécia à Itália entre outras, leva a colocar a questão: os povos europeus não terão lições a retirar das experiências pelas quais certos países do Sul estão a passar e das estratégias anti-crise que aí foram adoptadas? Porque o que é facto é que, até ao momento, têm sido as receitas do Norte, que se supõe serem universalmente válidas, as que foram na generalidade administradas às economias do Sul – ainda que estas receitas não lhes tenham sido muito convenientes, salvo raras excepções. Mas os tempos mudaram…

A Europa em crise
As soluções neoliberais de austeridade generalizada e de destruição dos serviços públicos hoje propostas (ou melhor dizendo, impostas) para tentar salvar o capitalismo em crise e relançar o crescimento são absurdas; elas constituem a forma mais segura de agravar ainda mais esta crise e de precipitar mais rapidamente o sistema no abismo. E isto ao mesmo tempo que favorecem, por todo o lado, a subida em força das extremas-direitas, racistas, demagógicas e sempre cúmplices da ordem estabelecida.

Neste contexto, a crise que a zona euro atravessa actualmente deve ser entendida como em íntima ligação com as próprias bases do processo da construção europeia. Acreditou-se ser possível criar uma moeda única sem Estado, mesmo o de uma Europa política que na verdade não existe. Havia aqui um erro de base nesta Europa que pretendia fazer convergir à força economias extremamente diferentes sem o reforço de instituições políticas à escala regional nem a promoção de uma harmonização social nivelando por cima. É assim que, de forma lógica, esta "má Europa", voltada contra os povos, anti-social e anti-democrática, é cada vez mais abertamente rejeitada.

Continuar a acreditar num novo "compromisso keynesiano" constituiria, entretanto, alimentar ilusões. O anterior, formulado após a Segunda Guerra mundial, não foi concedido pelos grandes capitalistas, foi alcançado pelas lutas populares, múltiplas e convergentes. Hoje a alta finança, que retomou o poder, não está disposta a nenhuma concessão. O keynesianismo – que poderia de facto desejar-se – não possui nem realidade nem futuro. Doravante, são os oligopólios financeiros quem domina e quem dita a sua lei aos Estados, para fixar as taxas de juros, a criação de moeda ou, quando tal é necessário, para nacionalizar.

Ruptura?
Perante a crise sistémica e os perigos que ela comporta – incluindo o de ver chegar ao poder extremistas de direita – é tempo de as forças progressistas na Europa retomarem a ofensiva, formulando de novo propostas alternativas para uma esquerda radical e internacionalista, orientadas no sentido da reconstrução de projectos sociais e de solidariedades voltadas para o Sul em luta.

Entre os debates urgentes a iniciar figura o da saída da zona euro, nomeadamente para a Europa do Sul, sob certas condições e segundo diferentes modalidades. É evidente que uma tal decisão seria difícil de assumir pelos pequenos países como a Grécia. Constituiria uma falsidade afirmar que desta opção de ruptura não resultariam dificuldades. Mas constituiria igualmente uma falsidade afirmar-se que uma tal via conduziria à catástrofe.

E isto por três razões pelo menos. Em primeiro lugar, há importantes economias europeias que não estão na zona euro, como o Reino Unido. Depois, há países que foram violentamente atingidos pela crise e que estão em vias de recuperar, fora da zona euro, nomeadamente a Islândia. Por fim, e fora do continente europeu, há países do Sul que ousaram a decisão de romper com as regras do sistema monetário internacional actual sem que de tal decisão decorresse qualquer situação de caos. Muito pelo contrário, tem sido precisamente essa via de ruptura – temporária – com os dogmas neoliberais que lhes tem permitido autonomizar-se e recuperar.

Que lições retirar do Sul?
Numerosas experiências recentes a Sul mostraram que a reconquista de elementos de soberania nacional – monetária, entre outras – e o voluntarismo político perante os diktat dos mercados financeiros abriram margens de manobra que permitiram a esses países sair de situações económicas dramáticas provocadas em larga medida pelo próprio funcionamento – injusto e inaceitável – do sistema capitalista mundial. Pensamos aqui, por exemplo, no processo de "desdolarização" em Cuba; ou no distanciamento da Venezuela em relação ao Fundo Monetário Internacional; ou ainda na criação do Banco do Sul (Bancosur), envolvendo países da Aliança Bolivariana para as Américas (ALBA) como a Bolívia e outros, incluindo o Brasil. Mas pode igualmente citar-se o caso de um país com um governo menos radical como a Argentina, que em finais de 2001 declarou a suspensão de pagamentos e que retomou com bastante rapidez o crescimento, sem que tenha ficado isolado em relação as ligações internacionais.

Suspensão de pagamentos, desvalorização da moeda e plano de reconversão da dívida foram as medidas que salvaram a Argentina do desastre neoliberal. Não há dúvida que uma saída do euro seria mais difícil para um país como a Grécia, que possui uma base produtiva e exportadora muito mais fraca do que a da Argentina (que assenta sobre a agro-indústria e a energia); mas certamente que daí não resultaria o "fim do mundo" para o seu povo, como insistem em anunciar os media dominantes. Uma tal decisão é difícil de tomar, tendo em conta as contas públicas deficitárias e o risco de fuga de capitais; mas ela parece doravante necessária como forma de saída da armadilha neoliberal – e isto antes que a Alemanha decida ela própria a exclusão desse país!

Pensemos igualmente no Equador, cujo governo realizou uma auditoria à sua dívida externa, anulou as dívidas "odiosas" (ou seja, ilegais e/ou ilegítimas), utilizou a suspensão dos reembolsos para reduzir o peso da dívida pública e libertou dessa forma recursos para as políticas sociais e para as infraestruturas. Em todas estas experiências, em que não se verificou qualquer catástrofe, a reapropriação por parte do Estado do seu poder de decisão política sobre a economia permitiu a cada país libertar-se do atoleiro em que estava mergulhado. Como foi o caso da Malásia, depois da crise asiática de 1998, quando o governo (que não era "de esquerda") colocou limites às imposições do FMI e conduziu a política anti-crise que lhe pareceu mais conveniente.

E porque não, então, na Europa? É certo que as situações diferem de continente para continente, mas as alternativas existem, sob a forma de transições pós-capitalistas, democráticas e sociais, solidárias com o Sul. O que é necessário não é a elaboração de soluções miraculosas ou prontas-a-usar, mas o reabrir dos espaços de debate à esquerda. É portanto mais do que tempo de falar, finalmente, sem tabus nem complexos, de soluções anti-crise colocadas ao serviço dos povos europeus: saída controlada da zona euro, desvalorização monetária (ou de uma eventual nova moeda comum), restabelecimento do controlo das variações dos fluxos financeiros, redefinição do papel político dos bancos centrais, nacionalização do sistema bancário e de certos sectores estratégicos da economia, anulação parcial das dívidas públicas, redistribuição acrescida da riqueza, reconstrução dos serviços públicos, desenvolvimento da participação popular, mas também o relançamento de uma regionalização europeia progressista e aberta ao Sul… Porque, na verdade, são os povos que são soberanos, não as dívidas.

[*] Economista, Investigador do Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS)

A versão em português foi extraída de http://www.odiario.info/?p=2397
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/