sábado, 8 de setembro de 2012

O CERCO DO OCIDENTE À INDÚSTRIA BRASILEIRA DE DEFESA

16/08/2012 - Mauro Santayana em seu blog

(JB) - As forças militares brasileiras só dispõem de munições para uma hora de resistência, segundo declarou o general Maynard Santa Rosa a O Globo.

No caso de uma situação de guerra, teríamos que contar com um grande esforço diplomático, a fim de ganhar tempo e mobilizar a Nação às pressas para a defesa do território.

É certo que uma ocupação militar do Brasil por uma força invasora é quase impossível, e que teríamos condições de expulsá-la depois de imensos sacrifícios da população civil, mas com a destruição de nossos centros industriais mais importantes.

Guerra quer dizer tecnologia. Desde o arco e a flecha – invenção que surgiu, segundo os antropólogos, com o neolítico – os países mais poderosos são os que se mantêm na vanguarda da produção de armamentos. Preservar a paz é preparar-se para a guerra, conforme a constatação dos romanos. Seja por nossa índole, seja por desídia, ou por confiança na sorte, o Brasil talvez seja, relativamente, o país mais indefeso do mundo.

O país procura, agora, investir na defesa, mas está sendo muito moroso. E comete um erro crasso, o de não produzir seus próprios armamentos e petrechos de combate. Estamos desnacionalizando o pouco de indústria bélica de que dispomos, com a entrada maciça de empresas estrangeiras (entre elas, e de forma agressiva, as de Israel) no parque industrial brasileiro, mediante a aquisição de firmas nacionais ou de sua associação com nossos empreendedores.

No mundo inteiro, quem comanda a produção de armamentos – direta ou indiretamente – é o Estado. No Brasil, o melhor caminho deve ser o que o governo e o Congresso estão propondo, ainda que timidamente, com a criação da Amazul.

A cada ano, devido à Amazônia e ao Pré-sal, entre outras razões, cresce a importância de a Nação aumentar – como acontece na Europa com complexos industriais militares como a EADS, a Navantia e a Finmecannica - a participação direta do Estado na indústria brasileira de defesa, e o grau de conteúdo nacional nas encomendas que estão sendo contratadas junto a empresas estrangeiras.

Não se pode admitir - como ocorre com a projetada fabricação de 2.000 blindados ligeiros Guarani no município mineiro de Sete Lagoas, pela IVECO - que apenas 60% das peças utilizadas sejam fabricadas no Brasil.

Em caso de conflito, ou mera ameaça de confronto, entre o Brasil e qualquer país da OTAN (Europa e Estados Unidos) a produção desses tanques seria descontinuada, e não teríamos como substituir o material perdido em combate.

É de se recordar o exemplo da Argentina, que ficou literalmente a ver navios – nesse, caso, britânicos – na guerra das Malvinas.

Por outro lado, há um verdadeiro cerco dos países geopoliticamente identificados como ocidentais à indústria bélica brasileira.

Todas as empresas que desenvolveram tecnologia militar nos últimos anos tiveram o seu controle adquirido por grupos internacionais recentemente.

Com isso, essas multinacionais se apossaram do conhecimento desenvolvido por técnicos e engenheiros brasileiros, e agora podem decidir a seu bel-prazer, seguindo a orientação estratégica dos governos de seus países de origem, até que limite essas empresas que antes pertenciam a empresários nacionais poderão chegar, no desenvolvimento de novas tecnologias bélicas.

A Aeroeletrônica, empresa brasileira que há mais de duas décadas se dedica ao projeto, desenvolvimento, fabricação, manutenção e suporte logístico de produtos eletrônicos para veículos aéreos, marítimos e terrestres, e que forneceu sistemas de aviônica para o Tucano 27 e o Super Tucano, da Embraer, e para o caça ítalo-brasileiro AMX, foi adquirida, em 2001, pela ELBIT, empresa israelense criada, em 1967, sob o estímulo do Ministério da Defesa de Israel.

A ARES Aeroespacial e Defesa, que estava desenvolvendo a REMAX - estação de arma estabilizada servo-controlada, para metralhadoras, destinada a equipar os blindados Guarani dos quais falamos - e outros produtos, como colimadores, indicadores visuais de rampa de aproximação, sistemas óticos de pontaria para tiro indireto de morteiros, sistemas de lançamento de torpedos, e foguetes de chaff, para defesa de navios - também teve o seu controle adquirido pela ELBIT, no final de 2010, e foi rebatizada como AEL Sistemas.

Com isso, o REMAX, desenvolvido inicialmente por técnicos do CTEX, foi substituído pelo “UT30BR”, e o contrato para o equipamento dos blindados Guarani com essas torretas automatizadas de armamento, no valor de mais de 400 milhões de reais, foi repassado para os israelenses.

Apenas três meses depois, em janeiro de 2011, Israel dava mais um passo na sua estratégia de penetração na indústria bélica brasileira, com a compra da Periscópio Equipamentos Optrônicos S.A, especializada na área de defesa e sinalização aeroportuária.

O que causa revolta no observador mais atento, é o fato de que o retorno do baixo investimento feito por multinacionais estrangeiras para a compra dessas empresas, da ordem de algumas dezenas de milhões de reais, é líquido e certo.

O lucro, várias vezes maior do que os investimentos, está assegurado por encomendas já contratadas, pela Marinha, o Exército e a Força Aérea.

Em muitos casos, nossas forças armadas já desenvolviam sistemas em parceria com as empresas que estão sendo desnacionalizadas quando elas ainda estavam sob controle local.

Empurrada pelas aquisições, a estratégia israelense no Brasil está indo de vento em popa. Em março de 2011, a AEL, controlada pela ELBIT, criou junto com a EMBRAER uma nova empresa, a HARPIA, para a fabricação de VANTS, veículos aéreos não tripulados para vigilância e ataque, do tipo utilizado pelos israelenses nos territórios palestinos e pelos norte-americanos no Paquistão e no Afeganistão.

Outra empresa israelense, a IAL – Israel Aircraft Industries, fabricante do míssil Rafael, fornece os aviões-robôs do mesmo tipo para o sistema de vigilância de fronteiras da Polícia Federal. Esses veículos telecomandados poderiam estar sendo desenvolvidos no Brasil, onde já existem empresas incipientes formadas por universitários para atuar nesse segmento da tecnologia aérea.

Assim, seja na área de blindados, na de aviônica, de optoeletrônica, como é o caso de periscópios, ou de aviões robóticos não tripulados, os israelenses – e, por meio deles, também seus aliados norte-americanos - podem monitorar, confortavelmente, da mesa de diretoria dessas empresas, cada passo que o Brasil dê nessas áreas.

Radares e helicópteros, e, agora, submarinos, são o campo de caça dos franceses, que completaram, em setembro de 2011, com o Grupo Thales, a aquisição, iniciada em 2006, de 100% do controle da brasileira OMNISYS, empresa especializada no desenvolvimento e fabricação de radares de longo alcance, sediada em São José dos Campos.

Em alguns casos a fabricação de armamentos é feita – sem subterfúgios ou hipocrisia – por empresas diretamente controladas por governos estrangeiros. Esse é o caso da DNCS, Direction des Constructions Navales, – que tem 75% de suas ações nas mãos do governo francês. Ela se associou” à Odebrecht, para construir, em Itaguaí, no Rio de Janeiro, quatro submarinos da classe Scorpéne, e mais o casco do futuro submarino nuclear brasileiro – encomendados pela bagatela de 7 bilhões de dólares.

O mais perto que já cheguei de um submersível foi quando li 20.000 léguas submarinas, de Júlio Verne. Mas, como disse Arquimedes, referindo-se à alavanca, “dêem-me um ponto de apoio e moverei o céu e a terra”, se derem a qualquer governo de um país com um mínimo de planejamento, 7 bilhões de dólares, ele certamente construirá bela fábrica de submarinos, desde que haja tempo para contratar as pessoas certas - aqui e no estrangeiro - e adquirir os componentes adequados, sem precisar dividir o controle desse ativo estratégico com ninguém.

Com uma parcela desse dinheiro, o Brasil poderia montar uma completa universidade naval, formando centenas de engenheiros especialistas na construção de belonaves, entre elas, submarinos, por ano, no lugar dos 26 brasileiros que passaram alguns meses na França, em uma escola de submergíveis, por conta do acordo.

Por aí se pode ver que os especialistas brasileiros formados no âmbito desse contrato milionário - negociado pelo então Ministro da Defesa Nelson Jobim - cabem todos em um micro-ônibus.

 Rezemos para que não aconteça um acidente.

Considerando-se, obviamente, que o Brasil ficou anos sem investir um centavo em armamentos, e que teve a sua indústria bélica desmantelada durante a tragédia neoliberal dos anos 1990, devido à ojeriza a qualquer coisa que se aproximasse de uma política industrial decente, compreende-se que o governo Lula esteve, nessa área, motivado por boas intenções.

Ocorre que a pressa não justifica a adoção de certo tipo de acordos, por parte do Brasil, principalmente quando se sabe que alguns contratos, como os assinados com os franceses, na área dos submarinos, ou com os italianos da IVECO, para a fabricação de blindados – com projeto do Exército Brasileiro - têm uma duração de 20 anos.

A Helibras, única fábrica latino-americana de helicópteros, é controlada, em mais de 75%, pela Eurocopter francesa, que por sua vez, pertence em 100% à EADS, com 15% das ações pertencentes ao governo francês. A EADS é um consórcio europeu, que conta com a participação, direta e indireta de outros governos, como o alemão e o espanhol.

Como muitos grupos de defesa multinacionais que funcionam no Brasil, a Helibras tem sido também irrigada com milionários contratos pelas Forças Armadas. É o caso da encomenda de 50 helicópteros pesados, destinados ás três forças, apesar do conteúdo nacional desses produtos ser mínimo e a da maior parte dos lucros seguir todos os anos para a Europa, infelizmente.

É fácil ver que o avanço dos franceses – assim como o dos outros países geopoliticamente classificados como “ocidentais” - sobre a indústria nacional de armamento é um processo duradouro, organizado e persistente.

No dia 12 de junho de 2012, há menos de dois meses, portanto, a OPTOVAC Mecânica e Optoeletrônica Ltda, especializada em equipamentos de optrônica e visão noturna, e parte de um seleto grupo de pequenas e médias empresas inovadoras, assim classificadas pelo Ministério da Defesa, foi também comprada – sem qualquer oposição - pela SAGEN francesa, do grupo SAFRAN, controlado em mais de 30% pelo governo daquele país.

Os ingleses, naturalmente, também não poderiam ficar de fora do processo da tomada de controle de nossas empresas de defesa e das encomendas do governo. A British Aeroespace, ou BAE Systems, acaba de fornecer três navios de patrulha oceânica para a Marinha, por quase 400 milhões de reais, em uma compra de “oportunidade”. As naves estavam antes destinadas a Trinidad-Tobago. No final de 2011, essa empresa também assinou contrato – depois do necessário nihil obstat do governo norte-americano – para modernizar um primeiro lote de 150 veículos blindados sobre lagartas M-113, utilizados em transporte de tropas, avaliados em 43 milhões de dólares. O valor pode aumentar proporcionalmente, caso o processo se estenda para toda a frota brasileira desse tipo de veículos, que chega a 350 blindados.

Na área aeroespacial, a BAE inglesa foi selecionada para fornecer os sistemas de controle eletrônico de voo do novo jato militar de transporte KC-390 da EMBRAER, e agora, como informam meios especializados, busca “parcerias estratégicas”, para participar das licitações do Sisfron - Sistema Integrado de Fronteiras e do Sisgaaz - Sistema de Monitoramento da Amazônia Azul, avaliados em 15 bilhões de dólares.

Poderíamos falar aqui também dos planos e manobras da Finmeccanica, italiana, ou da Navantia, espanhola, no Brasil, ambas com participação acionária de seus respectivos governos.

É preferível, no entanto, lembrar a diferença entre o tratamento que damos aos grupos estrangeiros de defesa – aqui representados, ás vezes, por pessoal da reserva de nossas forças armadas que já serviu no exterior - e aquele que recebem as nossas empresas quando tentam penetrar no mercado de algum país do hemisfério norte.

Nos países ditos capitalistas e de suposto “livre mercado”, a compra de armamentos, e a propriedade de empresas fabricantes de material bélico costumam ser tratados como assuntos estratégicos e de segurança nacional.

Na Europa, para comprar um projétil que seja, procura-se, primeiro, uma empresa local, depois, se a encomenda tiver de ser feita a uma empresa estrangeira, por uma questão de preço ou de escala, busca-se alguma que tenha participação acionária de algum grupo do país comprador, ou, em último caso, uma empresa que pertença a um dos enormes complexos militares controlados diretamente por governos europeus, como é o caso da EADS.

Os Estados Unidos são ainda mais curtos – e grossos – nesse aspecto. Para vender qualquer arma ao governo dos Estados Unidos ou às suas Forças Armadas, a empresa estrangeira terá que estar instalada nos Estados Unidos, onde obrigatoriamente deverá produzir a encomenda, e estar associada minoritariamente a uma empresa diretamente controlada por capitais norte-americanos.

Devido a essa postura – que deveríamos estar praticando aqui há muito tempo, se mais não fosse por uma questão de isonomia – a mera hipótese da entrada de uma empresa brasileira de tecnologia de defesa naquele mercado, como fornecedora das Forças Armadas norte-americanas, mesmo que cumprindo rigorosamente todos os requisitos a que nos referimos – acaba se transformando em uma questão nacional.

Foi o que descobriram os executivos da EMBRAER no ano passado quando, depois de se associar a uma parceira norte-americana, a Sierra Nevada Corporation, venceram uma licitação de menos de 400 milhões de dólares, para o fornecimento de 20 aviões ligeiros Super-Tucano para uso no Afeganistão e a concorrência foi anulada.

Uma campanha movida em todo o país, com o apoio de congressistas republicanos. pela Hawker Beechcraft, que tinha tido seu avião desclassificado por problemas técnicos na licitação, levou a Força Aérea norte-americana a anular a concorrência que beneficiava a Embraer.

Isso, apesar de que a fabricação do avião seria feita em território norte-americano e a maior parte das peças das aeronaves serem produzidas pelos Estados Unidos ou pelos seus parceiros do NAFTA.

Podemos imaginar o que não ocorreria no Brasil – e o escândalo que não fariam certos veículos de comunicação – caso viesse a ocorrer o mesmo por aqui, e um contrato de fornecimento de armamento norte-americano para nossas forças armadas fosse bloqueado no Congresso, devido ao pedido de uma empresa concorrente de capital 100% nacional.

A estratégia dos Estados Unidos e da Europa Ocidental, com relação ao Brasil, está cada vez mais clara:

- impedir o desenvolvimento de tecnologia nacional própria, com a compra de qualquer empresa que procurar desenvolvê-la;- associar-se à empresa que não se puder comprar, oferecendo cooperação no desenvolvimento da tecnologia, com o intuito aparente de ajudar o país a queimar etapas, mas, na verdade, para impedir que qualquer avanço se faça à sua revelia, sem a sua vigilância ou participação.
- impedir que o dinheiro gasto com o reaparelhamento das Forças Armadas chegue às mãos de empresas sob controle nacional, e que esse dinheiro não seja investido para avanços de caráter tecnológico que coloquem em risco a hegemonia de suas empresas no mercado brasileiro e no exterior.
- cooptar, com associações ou contratos de representação e de “lobby”, pessoal da reserva das forças armadas, principalmente ex-adidos militares brasileiros no exterior, para vender, como uma coisa ideologicamente natural, a associação do Brasil com empresas ocidentais para a produção de armamento, de forma a impedir que a Nação recorra a outras opções.
- impedir a reunião, coordenada, de pequenas empresas brasileiras de grande potencial tecnológico, em grandes consórcios industriais militares de inspiração ou controle público, como os que existem no Ocidente, como a Lockheed Martin, ou a própria EADS.
- Diminuir, via participação na maioria dos contratos, a realização de parcerias entre empresas brasileiras de defesa de qualquer porte e empresas não ocidentais, como as existentes nos países BRICS, e, se não puder impedir a cooperação entre uma empresa brasileira de defesa e uma congênere do BRICS, estar presente acionariamente ou como participante do projeto, do lado brasileiro, para “controlar” essa aproximação.
- estabelecer, coordenadamente, via supervisão dos métodos de produção e administração e baixos índices de conteúdo nacional, um alto grau de dependência da indústria nacional de defesa com relação aos seus “parceiros” e controladores ocidentais, tornando-se capaz de paralisar as linhas de montagem de seus armamentos em nosso país, em caso de conflito, ou de potencial conflito, entre o Brasil e esses países.

Ao enfrentar uma situação absurda e desastrosa, com a criminosa aprovação, no Governo Fernando Henrique Cardoso de emenda constitucional que transformou, para todos os efeitos, em “brasileira” qualquer empresa instalada no Brasil - mesmo que controlada por capitais públicos ou privados estrangeiros – a Presidente Dilma tem tentado fazer o que pode, na área de defesa, embora não tenha conseguido impedir que o processo de desnacionalização tenha chegado ao ponto que chegou.

Temos uma legislação perversa, que faz com que o País, do ponto de vista da defesa do capital nacional, tenha que subir ao ringue com as duas mãos atadas. Somos obrigados a concorrer com empresas que contam com descarado apoio – direto e indireto – dos governos de seus países de origem.

As agências “reguladoras” nacionais, incluindo o CADE, não fazem nenhuma distinção entre empresas de capital nacional ou estrangeiro, até mesmo quando grandes grupos autenticamente nacionais tentam se expandir, via aquisições, no mercado internacional.

E, além disso, o Brasil precisa ainda enfrentar a oposição de seus inimigos internos.

Nesse sentido, a pior herança que nos deixaram os anos 1990, foi toda uma geração de presumidos formadores de opinião que insistem em ser mais realistas que o rei, e mais neoliberais do que os executivos de Wall Street, na defesa do entreguismo e da capitulação da Nação. E isso em um mundo em que os países que mais intervêm na economia são justamente os que mais crescem, como é o caso da China, e em que os países mais poderosos são justamente os mais nacionalistas, como é o caso da própria China, dos Estados Unidos, da Alemanha e do Japão.

É nesse Brasil absurdo que alguns industriais defendem a elite paraguaia, que só nos manda armas e drogas e o mais maciço e rasteiro contrabando.

É essa mesma gente que insiste em estreitar a “parceria” com os Estados Unidos - com quem temos mais de 5 bilhões de dólares de prejuízo no comércio exterior - enquanto ataca duramente a entrada da Venezuela - que nos compra quase 5 bilhões de dólares em alimentos e manufaturados com um superávit brasileiro de mais de 3 bilhões e 200 milhões de dólares - no Mercosul.

E o pior é que ninguém pergunta aos milhares de trabalhadores, empreendedores, pecuaristas, agricultores e empresários brasileiros que produziram e venderam esses 7 bilhões de reais aos venezuelanos em 2011 o que eles pensam sobre o assunto.

Voltando à questão do cerco ocidental à indústria bélica, a entrada do BNDES no capital da AVIBRAS, no final do governo Lula, ao permitir que essa empresa honrasse a entrega de importante pedido ao Governo da Malásia, e a encomenda de um sistema ASTROS 2020 para os fuzileiros navais, apontam para a direção correta.

A criação da AMAZUL – Amazônia Azul Tecnologias e Defesa, aprovada por uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados no dia 30 de maio, para cuidar da produção do propulsor nuclear que irá equipar o futuro submarino nuclear brasileiro, também foi um passo fundamental para a independência do Brasil na área de defesa. Isso, embora já se organize a resistência de conhecidos grupos a fim de sabotar a empresa.

A AMAZUL, uma estatal, que não poderá ser vendida a nenhum grupo estrangeiro, poderá representar – se houver decisão política nesse sentido por parte do governo – um divisor de águas na política brasileira de defesa.

Ela poderá ser – e o Brasil precisa disso - a primeira de grandes empresas cem por cento nacionais, destinadas à produção de armamento. E se transformar no embrião de um grande estaleiro estatal, acoplado a uma importante escola de engenharia naval, para a Marinha, além de constituir exemplo para a criação de uma empresa desse porte também para a força terrestre.

Com complexos industriais desse nível, o Brasil estaria pronto para estabelecer parcerias com as grandes empresas estatais dos países BRICS, para desenvolver, ainda nas próximas décadas, toda uma nova geração de armamentos.

A cooperação de empresas brasileiras como a que está em curso entre a Mectron e a DENEL sul-africana para a construção de um míssil A-Darter pode quebrar um pouco da antipatia que ainda existe com relação à cooperação com a Rússia, a Índia e a China, os outros BRICS, no desenvolvimento de material de defesa.

Não se trata de recusar a tecnologia ocidental, mas sim de impedir que se tome de assalto o nosso sistema de produção de armamentos. Além disso, a subordinação do Brasil às empresas norte-americanas, européias e israelenses nos fechará o mercado de boa parte do mundo – como os próprios países árabes – que não são simpáticos a Israel ou aos Estados Unidos. Ou os próprios BRICS, com quem teremos que cooperar, caso não queiramos colocar os nossos ovos – ou nossas empresas de armamento – em uma só cesta.

Não podemos correr o risco de ficar desarmados e inermes frente a eventuais inimigos, por cooperar só com um lado do mundo, e com empresas que estão todas, política e corporativamente, ligadas entre si, até do ponto de vista acionário.

O Governo Federal está preparando novas medidas para a área bélica, que incluem maiores incentivos fiscais e de crédito para empresas que estejam baixo controle teoricamente brasileiro.

Com a aprovação, em, março, da Lei 12.958, grupos que atuam na área de infraestrutura e construção civil, como a Odebrecht (já associada à EADS), OAS, Engevix, Queiroz Galvão, Camargo Correa e Synergy, além da própria Embraer, terão vantagens tributárias e condições especiais de crédito para participar de licitações na área de defesa.

O problema é que todos esses grupos estão negociando a participação de empresas estrangeiras, todas dos Estados Unidos ou da Europa, na composição dessas novas empresas, em troca de “tecnologia”.

Estamos partindo do pressuposto de que a única maneira de ter acesso a tecnologia na indústria bélica mundial é se associar - minoritariamente, na maioria das vezes - a um parceiro mais forte, e, ainda por cima estrangeiro.

Essa é uma premissa absolutamente falsa, para não usar palavra mais forte. Com dinheiro e decisão política, qualquer um vai atrás da tecnologia, pesquisa planos, copia projetos, contrata especialistas, entre os milhares de engenheiros e cientistas estrangeiros que estão desempregados por causa da crise na Europa e nos Estados Unidos.

Ou associa-se, em igualdade de condições, com países que desenvolveram de forma autônoma a sua própria indústria de defesa, como a China e a Rússia, sem depender de associações desse tipo com os países ocidentais.

No entanto, no lugar de aproveitar a janela de oportunidade aberta pela crise para nos apropriarmos de pessoal especializado e da tecnologia que está disponível lá fora sem abrirmos mão de controlar, sozinhos, uma área que é estratégica para o país, o que estamos fazendo, e com financiamento público e benefícios fiscais?

Aprofundando a nossa dependência do Ocidente, a longo prazo, e, como já acontece nas telecomunicações, por exemplo, usando o dinheiro do BNDES para a expansão e o fortalecimento em território nacional de empresas estrangeiras – “associadas” ou não a grupos nacionais – que em última instância não tem, e nunca terão, o menor compromisso estratégico com o Brasil.

Como lembra a fábula de Jean de La Fontaine, - ou a “joint venture” do porco com a galinha para vender ovos com bacon - não existe pacto possível entre lobos e cordeiros. Em uma associação de uma construtora brasileira e um grande grupo multinacional de defesa, com eventual participação estatal, ou “golden share”, do governo de seu país de origem, não seremos nós os lobos, e eles os cordeiros.

Essas “joint ventures”, se vierem a acontecer, para o fornecimento, sem garantia de 100% de conteúdo nacional e de 100% de controle brasileiro, de armamentos que levam décadas para ser desenvolvidos e produzidos, equivalerão à entrega e capitulação de nossa indústria bélica, agora e no futuro, à Europa e aos Estados Unidos, e o Governo Dilma Roussef, por pressão, pressa ou ingenuidade, será responsabilizado perante a história se prosseguir nesse caminho.

Crédito e condições fiscais especiais devem ser entregues apenas a empresas que tenham 100% de capital nacional, com claúsulas que assegurem, se necessário, a intervenção soberana do Governo e impeçam a sua venda, como já aconteceu no passado e continua acontecendo agora, a capitais estrangeiros.

Tecnologia compra-se lá fora, quando existe dinheiro, sem ser preciso entregar uma única ação aos concorrentes.

Além disso, a presença de empresas da Europa e dos Estados Unidos na composição acionária das futuras “superbélicas” “nacionais” irá impedir que essas empresas possam comprar tecnologia dos nossos parceiros nos BRICS, como a Rússia, a China e a Índia, caso não haja interesse de países como a França ou a Itália em fornecê-la.

É preciso romper o cerco ocidental à indústria brasileira de defesa. Estamos assinando acordos que equivalem a entregar a alma ao diabo, sem nenhuma garantia de que não iremos depender de peças ou de decisões estrangeiras para a fabricação das armas que teriam que nos proteger no futuro.


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Fonte:

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Contradições do atual quadro político

05/09/2012 - Maurício Caleiro - seu blog Cinema & Outras Artes

O quadro político-ideológico brasileiro passa por um momento particularmente contraditório, em decorrência, sobretudo, de dois fenômenos correlatos:

1. A crise dos partidos de direita apeados do poder federal, representada pelo esfalecimento do DEM e pelas consequências do prolongamento artificial do serrismo;

2. A guinada conservadora do governo Dilma Rousseff, seja no campo econômico, em que as premissas neoliberais residuais, representadas pela obsessão pelo superavit primário, assomam à condição de políticas de Estado com as privatizações temporárias de longo prazo (“concessões”, na novilíngua petista); seja na seara administrativa, através da negligência para com áreas sociais fundamentais como Educação e Saúde e na truculência inaudita, incompatível com parâmetros democráticos, para lidar com greves no setor público.

Luta por hegemonia
O grande paradoxo que marca tal processo é que, no momento mesmo em que o enfraquecimento da direita proporcionou potencial de ampliação da hegemonia da chamada centro-esquerda, a administração Dilma, parcialmente liberta dos ódios pessoais e classistas que Lula despertava e visando assegurar o aumento da aprovação a seu governo, passou a incorporar pautas conservadoras - e, desde o início do mandato, a buscar uma aproximação com a mídia corporativa - como forma de promover sua identificação com as parcelas eleitorais órfãs do conservadorismo.

Tal dinâmica, por sua vez, gera agora um círculo vicioso, pelo qual a manutenção dos altos índices de aprovação da ex-militante de esquerda e candidata da aliança petista passa a se manter atrelada à sua modelagem como liderança neoconservadora. Nesse quadro, ideologia e coerência programática cedem de vez lugar ao pragmatismo eleitoral.

Guerra nada santa
Esse desenho começara a delinear-se já na campanha eleitoral, quando a batalha religiosa estimulada por Serra levou a então candidata a firmar um pacto com lideranças pentecostais e setores católicos conservadores, comprometendo-se a, se eleita, não utilizar o Estado de forma pró-ativa no que concerne a aborto e à expansão dos direitos dos homossexuais. Não obstante haver, entre os cientistas políticos, quem assegure que, ao neutralizar a fuga em massa do voto religioso, tal acordo teria sido imprescindível para a vitória nas urnas, seus efeitos estão no cerne do atual desprestígio de Dilma entre parcelas culturalmente qualificadas do eleitorado que valorizam questões ligadas à chamada biopolítica.

Ainda assim, a vitória de Dilma nas eleições, após uma batalha do tipo bem contra o mau contra Serra, trouxe alento aos setores politicamente progressistas do país. Afinal, ela encarnava a continuidade do governo Lula, cuja superioridade inconteste ante o do antecessor FHC evidenciava-se pela transformação vivenciada pelo Brasil, no relativamente curto prazo de oito anos, de um país periférico e subalterno aos EUA, com índices pornográficos de miséria, alto desemprego e uma economia em frangalhos a uma potência emergente no cenário internacional, promotor de uma acelerada redução da miséria e da pobreza, baixo desemprego e um desempenho econômico na contramão da crise mundial.

Heranças em debate
Como a própria presidente, num raro repente, fez questão de deixar claro na dura mas justa resposta que deu anteontem a FHC, ela recebeu uma herança bendita do governo Lula. A questão que se coloca, porém, é o que Dilma Rousseff fará de tal legado, já que, mesmo sem receber a “herança maldita” que FHC legou ao seu antecessor e mentor, ela, ao invés de aprofundar as conquistas deste, trabalhar para a criação de alternativas ao neoliberalismo e trazer a níveis aceitáveis a Saúde, a Educação, a segurança pública e o respeito aos Direitos Humanos no país, parece empenhada em retroceder ao economicismo mais tacanho, à privatização, ao conservadorismo nas questões comportamentais e à repressão truculenta aos movimentos grevistas.

Neste exato instante, tramam-se mudanças na CLT e, devido exclusivamente à recusa de Dilma em negociar, a greve dos professores federais se alastra por inacreditáveis 112 dias, mesmo com os docentes aceitando um aumento menor e cobrando apenas a adoção de um Plano de Carreira. A inflexibilidade da presidente agrada em cheio aos setores conservadores, mas o fato é que universidades paradas por um terço do ano, além dos transtornos a alunos, servidores e professores, custam uma fortuna aos cofres públicos – e sem dar nenhum retorno. Não pode ser considerada uma boa gestora uma presidente que, por picuinhas, permite tamanho descalabro.

Tudo somado, é danosa para o governo Dilma e para o país a ausência de uma oposição à direita digna do nome – já que a atual encontra-se duplamente massacrada, pela ausência de resposta programática ao sucesso dos governos petistas junto à população e pelo fracasso do serrismo, o qual, em conluio com parte da mídia corporativa, trocou a adoção de propostas por táticas baixas e ataques desqualificadores. Mesmo se se livrar de Serra, levará um bom tempo para a oposição conservadora se recompor.

Vácuo à esquerda
Por outro lado, a desarticulação da oposição à esquerda do governo mostra-se talvez ainda mais deletéria, pois não permite que o país disponha, na arena pública, de forças capazes de contrabalançar as inclinações conservadoras as quais o governo Dilma se vê, em nome da ampliação de sua hegemonia, atraído.

Sem esse contrapeso e de olho no voto das classes médias, a aliança petista caminha para um conservadorismo atávico, em que os programas de renda mínima e as ações afirmativas vias cotas – duas criações do capitalismo liberal – seguem, isolados, como meio de promoção de políticas inclusivas – efetivas enquanto vigentes, mas que não transformam estruturalmente a qualidade e a abrangência dos serviços sociais do Estado nem alteram a brutal assimetria entre rendimento advindo do capital (leia-se mercado financeiro) e rendimento advindo do trabalho, já que as remessas bilionárias de reservas ao exterior e os lucros dos bancos continuam intocados pelo modelo de capitalismo o qual o governo se recusa a contrariar.

Tais processos têm tornado evidente a um número cada vez maior de pessoas a guinada conservadora do governo Dilma, seu desprezo pelo social e pelo público e o caráter predatório do desenvolvimentismo a todo custo que promove, baseado no endividamento limítrofe das famílias de baixa e média renda. Dívida, na novilíngua petista, é crédito. Trata-se de um modelo que claramente privilegia o desenvolvimento econômico como condição precípua para um eventual desenvolvimento social, o que evidencia o quão frágeis são suas ligações com um programa político de centro-esquerda.

Bloco dos fanáticos
Tudo isso pouco importa para a vasta gama de apoiadores incondicionais do PT, que ou fingem não ver que o partido abandonou muitas de suas bandeiras e práticas – inclusive o saudoso hábito de escolher seus candidatos através de eleições internas – ou também mandaram às favas os escrúpulos e estão interessados apenas no prolongamento da hegemonia do partido no poder, em tantas instâncias quanto possível, à revelia de como ele o exerça, privatizando ou não, privilegiando o mercado financeiro ou humilhando o servidor público, não importa. Interessa ao bloco chapa-branca é se autocongratular histericamente pelo que se entenda por cada mínimo acerto da camarada presidenta, mesmo quando beneficia os ruralistas de extrema-direita. Stalin perde.

Para esse projeto de manutenção da hegemonia – conservador por definição – vale tudo: a crítica justa à mídia se transforma na generalização do termo “PIG” como um bode expiatório para todas as horas, mesmo que hoje sejam rotineiramente usados contra os críticos do petismo os burburinhos e as mesmas táticas desqualificadoras que caracterizam o esgoto jornalístico.

Contradições evidentes
O articulista Francisco Bosco, em coluna memorável [ver em: http://sergyovitro.blogspot.com.br/2012/09/freixo-francisco-bosco.html] sobre o significado da candidatura Freixo enquanto reflexo da insatisfação com o petismo, assinala que “O acontecimento político mais importante para a história recente do Brasil foi a eleição de Lula para presidente, em 2002 (…) Mas é preciso lembrar o que custou de resignação ao país esse projeto. Sob alguns aspectos, o lulo-petismo tem sido a continuação da modernização conservadora do Brasil. Já sabemos as virtudes e os limites desse projeto”.

Como se vê, as contradições do atual projeto político petista ficam cada vez mais evidentes e uma hora não será mais possível adorar a dois deuses antagônicos ao mesmo tempo. A guinada à direita ora comandada por Dilma cobrará o seu preço, o tratamento humilhante a professores - uma das classes mais aviltadas de trabalhadores no país -, também. Talvez não seja nestas eleições, nem na próxima, mas isso ocorrerá um dia.

Faz-se urgente, neste momento e de agora em diante, o fortalecimento e a união das forças de esquerda como forma de combater o neoconservadorismo petista, que se presta a fazer voluntariamente o jogo da direita, interessado apenas no poder pelo poder.

Fonte:

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

A obsessão do jornalismo partidário

04/09/2012 - Venício Lima (*) - Carta Maior
Artigo publicado originalmente no Observatório da Imprensa

Desde que o Ibope Inteligência começou a fazer levantamentos sobre o Índice de Confiança Social (ICS), em 2009, a mídia (meios de comunicação) foi a instituição brasileira que apresentou maior queda em sua credibilidade, atrás apenas do sistema público de saúde e das escolas públicas: de 71 pontos em 2009, chegou a 67 em 2010 e atingiu 55 pontos em 2011, vale dizer, 16 pontos a menos.


A queda acentuada de credibilidade da grande mídia não é um fenômeno que ocorre somente no Brasil. O respeitado Pew Research Center for the People and the Press divulgou recentemente resultado de levantamento sobre a credibilidade dos treze principais grupos de mídia nos Estados Unidos: nove registraram queda importante. A média positiva, que em 2010 era de 62%, caiu para 56%.

Registre-se que em 2002 o índice era de 71%, isto é, 15 pontos percentuais acima (ver em: http://www.people-press.org/2012/08/16/further-decline-in-credibility-ratings-for-most-news-organizations/ e,

neste Observatório, “Credibilidade jornalística diminuiu, revela pesquisa“ em: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/_ed709_credibilidade_jornalistica_diminuiu_revela_pesquisa).

No Brasil, as razões para a acentuada queda de credibilidade da grande mídia são várias e já tive a oportunidade de tratar da questão em outras ocasiões (ver “Pontos dos Princípios reforçam dúvidas“ em: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/pontos-dos-principios-reforcam-duvidas),

e “Ética e credibilidade de uma profissão“ em: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/_etica_e_credibilidade_de_uma_profissao).

Entre essas razões certamente está a inconteste e fartamente documentada partidarização que passou a caracterizar o “jornalismo político” que tem sido praticado nos últimos anos.

Retomo o assunto a propósito de um episódio certamente menor, mas emblemático.

Jornalismo ou oportunismo partidário
Alguns dos principais jornalões brasileiros estamparam em sua primeira página, na sexta-feira (31/8), a fotografia da presidente Dilma Rousseff lendo a resposta de duas de suas ministras a bilhete que ela mesma lhes mandou em solenidade no Palácio do Planalto, ocorrida na véspera. A foto saiu com grande destaque nas capas de O Globo, O Estado de S.Paulo, Estado de Minas e Correio Braziliense.

As matérias e colunas relativas à foto, em sua maioria, comentavam o desencontro entre a posição da presidente e o acordo que teria sido sacramentado entre as ministras de Relações Institucionais e do Meio Ambiente e parlamentares visando a aprovação de medida provisória relativa ao polêmico Código Florestal.

Algumas dessas matérias chamaram a atenção para o uso de bilhetes entre a presidente e suas ministras, prática que já foi utilizada no passado pelos ex-presidentes Getúlio Vargas e Jânio Quadros.

O Correio Braziliense, todavia, escolheu aproveitar a ocasião para atacar o ex-presidente Lula. Na capa do jornal está escrito ao lado da foto da presidenta Dilma: “A presidente não apenas é contra a censura como, ao contrário do antecessor, lê jornais”.

Na página interna (5) que trata do assunto, um box assinado pelo editor de política com o título “Uma presidente que lê jornais” diz:

O mais importante no bilhete é que Dilma reconhece a importância dos jornais impressos, ao contrário do que já afirmaram outros presidentes, incluindo aí o petista Luiz Inácio Lula da Silva. É preciso comemorar a leitura de Dilma”.

Um pouco à frente, prossegue o editor:
É bom saber que temos no maior posto de comando do país alguém que utiliza informações produzidas pelos jornais impressos para cobrar resultados dos auxiliares. Um ponto a mais para a presidente.”

O alvo é o ex-presidente
No momento em que o STF realiza o julgamento da Ação Penal nº 470 sob intensa artilharia da grande mídia que tem ignorado deliberadamente a presunção constitucional de inocência desde que estourou o escândalo no primeiro governo Lula [cf. Venício A. de Lima, Mídia: Crise Política e Poder no Brasil, Editora Perseu Abramo; 2006], a utilização do episódio do bilhete para atacar o ex-presidente, inclusive insinuando – irresponsavelmente – que ele seria a favor da censura, expressa o grau de partidarização a que chegou o jornalismo político praticado pela grande mídia.

O Brasil talvez seja hoje o único país do mundo onde a oposição sistemática da grande mídia se dirige não à presidente em exercício, mas a um ex-presidente da República.

E para isso, além de promover a atual presidente – que o ex-presidente fez eleger – também dela se utiliza para perpetrar os ataques.

Não é sem razão que despenca a credibilidade da grande mídia.

(*) Jornalista, professor aposentado da UnB e autor de, entre outros livros, Política de Comunicações: um balanço dos Governos Lula (2003-2010).
Editora Publisher Brasil, 2012.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=5759


[Sugestão de leitura adicional: "Muito leitor, pouca receita", por Luciano Martins Costa em 05/09/2012 na edição 710 do Observatório da Imprensa, em: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/muito_leitor_pouca_receita]

terça-feira, 4 de setembro de 2012

O assassinato de blogs e blogueiros

04/09/2012 - Justiça a serviço do poder - Prefeito Ducci ataca Tarso em Curitiba - por Rodrigo Vianna em seu blog Escrevinhador

Está em curso uma tentativa de sufocar e derrotar o movimento de blogueiros que, nos últimos 10 anos (e especialmente durante o processo eleitoral de 2010), mudou a correlação de força na Comunicação do Brasil.

A velha mídia – associada aos setores mais conservadores – já não fala sozinha.

Bolinhas de papel de Ali Kamel não ganham eleições, porque os blogs e redes sociais desmontam as farsas. Foi assim em 2010. Isso incomoda. E muito.

O contra-ataque está em curso. Kamel (diretor da Globo) abriu processos contra 6 blogueiros (entre eles, esse escrevinhador), logo depois da eleição em que foi derrotado ao lado de Serra. Em algumas regiões do país, a intimidação se faz à bala. Nas cidades pequenas, um blog é muitas vezes a ferramenta mais eficaz (e barata) para fazer o contraponto a lideranças locais que normalmente controlam Prefeitura, jornais e rádios.

No Rio Grande do Norte, município de Serra do Mel, o blogueiro Ednaldo Filgueira, militante do PT, foi assassinado depois de colocar na internet uma enquete, questionando a prestação de contas da Prefeitura. Assassinado! Isso foi em 2011. E até agora ninguém foi a julgamento. Mais informações você pode ler aqui: http://brasiliamaranhao.wordpress.com/2011/06/19/blogueiro-assassinado-enquete/

Agora, em Curitiba, cidade com fama de “européia”, outra enquete leva ao fechamento de mais um blog. Felizmente, o blogueiro não levou tiro. Mas o blog foi assassinado, com ajuda da Justiça (????) Eleitoral.

A vítima agora é Tarso Cabral Violin, do combativo
Blog do Tarso”.

Vítima, não! Porque ele não é de baixar a cabeça, e sei que vai seguir lutando. Mas a situação é dramática. E peço atenção de todos.

Tarso mantém um blog que faz duras críticas ao atual Prefeito de Curitiba, Luciano Ducci. Prefeito com nome de fascista. Não aceita crítica. Tarso fez enquetes com críticas ao Prefeito – que ganhou a Prefeitura de presente quando Beto Richa renunciou para concrorer ao governo. Ducci herdou de Beto Richa também a dificuldade para lidar com o contraditório. Tarso foi processado, e o TRE-PR, numa atitude estranha (pra dizer o mínimo), aplicou multa de 212 mil reais contra o blogueiro! Sim, 212 mil reais por causa de duas enquetes!

Candidatos que são flagrados fazendo propaganda fora de época muitas vezes recebem multas de 5 mil reais, e um blogueiro (que é professor de Direito) recebe multa 40 vezes maior! O que é isso?

Claro, não se trata de multa com objetivo de fazer cumprir as leis eleitorais. Não. Trata-se do uso do Judiciário para intimidação.

No Rio Grande do Norte, o blogueiro foi assassinado por capangas a mando de sabe-se lá que interesses. No Paraná a situação é mais grave: os capangas parecem atuar com a cobertura do Judiciário.

Tarso, evidentemente, não tem como pagar multa desse tamanho. Fechou o blog enquanto recorre ao TSE em Brasília. Ducci conseguiu o que queria. Tarso precisa da solidariedade dos blogueiros de todo o Brasil. Dos democratas de todo Brasil. Esse caso precisa ser levado ao CNJ e ao Supremo.

O Centro de Estudos Barão de Itararé vai se manifestar com uma nota de apoio ao Tarso. O assunto foi tema da nossa reunião de diretoria ocorrida segunda-feira em São Paulo.

O blogueiro paranaense precisa saber que não está sozinho. Todo apoio ao Tarso!

Aqui o texto do Tarso, anunciando o fechamento do blog, sob censura judicial de um TRE a serviço do Prefeito Ducci.

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01/09/2012 - Luciano Ducci extermina o Blog do Tarso - original em http://blogdotarso.com/2012/09/01/luciano-ducci-extermina-o-blog-do-tarso/

O prefeito de Curitiba Luciano Ducci, candidato a reeleição pelo PSB (com PSDB/DEMO/PSD/PTB/PPS/PP etc), exterminou o Blog do Tarso. Luciano Ducci e sua gangue almejavam há dias intimidar e censurar o Blog do Tarso, com a tentativa de aplicar multas no total de até R$ 212.820,00 (duzentos e doze mil, oitocentos e vinte reais), por causa de duas simples enquetes que o Blog divulgou.

Denuncio que os advogados responsáveis por tamanho absurdo contra um Blog elaborado por outro advogado são Ramon de Medeiros Nogueira e Cristiano Hotz, que entraram com a Representação 1174-71.2012.6.16.0001 e a Representação 1175-76.2012.6.16.0001. Uma mancha em seus currículos.

O Ministério Público opinou e a 1ª Instância da Justiça Eleitoral, por meio de sentença do juiz Marcelo Wallbach Silva, decidiu de forma sensata no sentido apenas de recomendar que as enquetes fossem divulgadas nos termos da Resolução 23.364 do Tribunal Superior Eleitoral.

Não satisfeitos, Luciano Ducci e seus advogados “pau para toda obra” recorreram para o Tribunal Regional Estadual do Paraná. Um dos advogados chegou a visitar cada magistrado em seus gabinetes do TRE para convencer pela condenação do Blog do Tarso ao pagamento da multa estratosférica. E não é que o TRE/PR, com apoio do MP, aplicou duas multas que somam o valor de R$ 106.410,00 ao editor-presidente do Blog do Tarso (que não é uma pessoa jurídica)?
Será que esses magistrados têm noção do que fizeram? Será que eles acham que estão lidando com candidatos, com partidos políticos, com grandes institutos de pesquisa e grandes meios de comunicação? Simplesmente essa sanção é uma “pena de morte” ao Blog do Tarso, um blog que é um hobby, sem fins econômicos, que existe para fazer controle popular da Administração Pública e para discutir política e o Direito.

Além de ser um absurdo que simples enquetes sejam consideradas como pesquisas.

Enquanto isso agentes públicos milionários são multados em R$ 5.000,00 pela Justiça Eleitoral, por uso de bens públicos em campanha eleitoral.

Hoje um dos maiores advogados do Direito Eleitoral do Brasil, Dr. Guilherme Gonçalves, entrou com dois embargos de declaração junto ao TRE/PR. Se não resolverem, vou recorrer ao TSE em Brasilia.

Mas, se mantidas as multas, fica aqui o último post do Blog do Tarso, no exato dia que atingiu um milhão de acessos, desde o dia 1.1.11, com uma média de 5 mil acessos ao dia nas últimas semanas.

Obrigado a todos os leitores e colaboradores, até quem sabe um dia!

Continuo no Twitter e no Facebook.

Um grande abraço,

Tarso Cabral Violin – Editor-presidente do Blog do Tarso, professor de Direito Administrativo e mestre em Direito do Estado pela UFPR

Fonte:

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Erros de Lula e Thomaz Bastos

 01/09/2012 - Por André Araujo - no site Luis Nassif online

Lula cometeu um grave erro, não há desculpas para o erro.

Quando os japoneses afundaram os dois maiores couraçados britânicos, o Repulse e o Prince of Wales em Singapura, Churchill fez um discurso pelo rádio e disse a famosa frase: "Não há desculpas para o erro, nossa derrota não tem justificativas, não há explicação para a derrota."

Nem os Presidentes dos EUA, que se arrogam o direito de ensinar Democracia para o mundo, seriam tão puros ao indicar dois Procuradores gerais e sete juizes da Suprema Corte para ter entre eles inimigos para destruí-lo. A Democracia é baseada em princípios mas também precisa funcionar.

No conflito entre princípio e realidade, esta tem preferência, arquivam-se os princípios em nome da politica, os americanos fizeram isso muitas vezes na História de sua tão festejada Democracia, fora e dentro do Pais.

A auto suficiência de Lula e a postura de "God" de seu pseudo sábio Ministro da Justiça [Márcio Thomaz Bastos] levaram a más escolhas. Alguém pode imaginar Gilmar Mendes condenando FHC ou alguém de seu governo? O caso do Procurador Geral é ainda mais grave. O Presidente da República pode indicar aquele cujo perfil lhe dá uma mínima garantia de governabilidade, a Constituição lhe dá o inequívoco poder de indicação entre todos os procuradores do quadro de carreira do Ministério Público Federal, não está sujeito a lista tríplice no âmbito federal, aliás essas listas são todas suspeitas e decorrem de jogo político interno na Instituição, não há nenhuma pureza nelas e o indicante não é obrigado a segui-las, a Lei está ao lado do governante nessa indicação.

Os Governadores dos Estados do Brasil, todos eles, quando indicam o Procurador Geral de Justiça no seu Estado buscam aquele que é mais afinado. Não escolhem inimigos presentes ou potenciais. Alckmin acaba de escolher o segundo da lista tríplice, não o mais votado, para ter alguém mais afinado com sua gestão. É seu direito e ele não é menos democrata porisso. No Estado de S.Paulo é comum o Governador não seguir a lista, ele precisa ter segurança nas suas costas, não pode nomear quem vai lhe apunhalar, a Democracia não o obriga a indicar um inimigo, César não quer Brutus a lhe cravar um punhal se puder evitar essa situação.

O anterior Procurador Geral da República [Antonio Fernando de Souza] não foi sequer neutro. Ao classificar o grupo dos 40 do mensalão mostrou-se inimigo frontal de quem o indicou. Não pode funcionar um País que cria esse nível de conflito institucional auto induzido pelo próprio Poder.

Nas indicações para a Suprema Corte americana a politização atinge seu nível máximo.

Nenhum Presidente americano indica alguém sobre o qual tenha a MÍNIMA DÚVIDA.

Eles são democráticos mas não são fanáticos da democracia e nem veem a democracia como algo teórico. A Democracia vale se funciona e para funcionar o procurador Geral NÃO PODE ser inimigo do Presidente e os juizes da Suprema Corte não podem tocar fogo às vestes de quem o indicou, ninguém se iluda com princípios em Washington, eles existem "ma non troppo", lá ninguem põe fogo às vestes e os Republicanos não mandaram Nixon para ser julgado criminalmente, Gerald Ford o ANISTIOU de todos os crimes, limpou sua barra e sua ficha e deixou o ex-presidente em paz com suas memórias biográficas.


A Democracia é o menos ruim dos regimes, não é o ideal e nunca será, não é perfeito e precisa funcionar. O caminho do Supremo neste caso do mensalão é muito ruim, é inconsequente, age como se o Supremo estivesse em um vácuo e não inserido dentro de um sistema que tem que operar dentro de um mínimo de harmonia.

O Supremo não pode desafiar o Governo em nome de princípios que ele mesmo proclama. E neste processo está sendo criativo, o "garantismo" está sendo enterrado para abrir caminho para as condenações coletivas no modelo de Nuremberg.

O Marechal Floriano Peixoto, segundo Presidente do Brasil, quando informado que seria derrotado no Supremo disse a frase lapidar:
"E quem é que garante o Supremo"?

Espero que o resultado do Supremo não encaminhe o País para uma crise, esta se dará com a efetiva prisão de qualquer dos réus do mensalão, é um impasse claro e um desafio ao Partido no poder, não importa se princípios estão em jogo, a governabilidade é algo ainda mais sério do que princípios teóricos, os americanos sabem perfeitamente disso quando agem em situações de crise, sacrificam-se alegados princípios, alguns até inventos de ocasião e preserva-se a estabilidade.

O julgamente está sendo absolutamente político, aliás já é desde o encaminhamento dos 40 réus ao Supremo, quando só três tem foro privilegiado, a opção por julgar todos em grupo FOI POLÍTICA e não técnica ou principista, a partir daí se constroem agora novas teorias da prova que diminuem consideravelmente as garantias constitucionais dos réus e aumentam o poder arbitrário do juiz, isso tambem é DECISÃO POLÍTICA.

Outras garantias constitucionais estão sendo derrubadas para poder condenar, isso TAMBÉM É POLÍTICA e não técnica, estamos caminhando sobre terreno minado, o Supremo tal qual a avestruz enfia a cabeça na areia e não pensa no dia seguinte.

Fonte:
http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/erros-de-lula-e-thomaz-bastos