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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Suíça diante de frouxos controles de mercenários

20/2/2013 - Inter Press Service (IPS)

- Reportagem extraída do site Envolverde - por Ray Smith, da IPS



Basileia, Suíça – O governo suíço apresentou um projeto de lei para regular a indústria militar privada, mas críticos afirmam que é inútil.
No dia 24 de março de 2010 foi incluída uma nova empresa no registro comercial da Basileia. Seu nome era Aegis Group Holdings AG.

Poucos meses depois, em 2 de agosto, foi informado que o grupo havia assumido o controle sobre a Aegis Defense Services Ltd., com sede em Londres.

A Aegis descreve a si mesma como “uma empresa líder” na área “de segurança privada e manejo de riscos”. Assim, fornece serviços em todo o mundo, incluindo países devastados por guerras, como Iraque e Afeganistão.

A Aegis se mudou silenciosamente para a Suíça

Foto: Ray Smith/IPS

A chegada da companhia pegou de surpresa o governo, e também o público.

A previsão é de que mais empresas militares privadas se mudarão para a Suíça tentando tirar proveito da estabilidade política do país, dos baixos impostos e de sua imagem pacífica e de neutralidade.

As companhias militares privadas legalmente não diferem de nenhum outro fornecedor de serviços de segurança, e as firmas ativas em áreas de conflito são difíceis de serem identificadas no registro comercial. O Departamento Federal de Justiça e Polícia estima que no país operam 20 dessas empresas.

A Suíça tem uma longa história de enviar agricultores pobres como mercenários para campos de batalha europeus.

No final da Idade Média, os cantões suíços assumiram o papel de mediadores. A queda do negócio dos mercenários começou no século 18 e terminou com a introdução da Constituição federal suíça em 1848. A partir de 1859, já não era permitido combater em campos de batalha estrangeiros.

Desde então a “neutralidade” se converteu em um elemento fundamental da política externa da Suíça e, de um modo mitológico, em uma peça fundamental de sua identidade coletiva.

Muitos viram a chegada da Aegis como uma ameaça à neutralidade do país. Os políticos suíços impulsionaram a criação de um novo contexto legal para o registro e a extensão de licenças para empresas de segurança privada. Josef Lang, então conselheiro nacional e uma das principais figuras do Grupo Para Uma Suíça Sem Exército, pediu uma proibição nacional para as companhias militares privadas.

A ministra da Justiça, Simonetta Sommaruga, anunciou no dia 23 de janeiro uma “proibição para as companhias mercenárias”. Afirmou que a Suíça já não serviria como base para atividades que violaram os direitos humanos. Mas, o que foi anunciado como uma “proibição” se mostrou ser uma regulação inútil.

O projeto de lei prevê a notificação e proibição de certas atividades, mas não das companhias de segurança privadas em si mesmas. Proíbe que firmas ou grupos empresariais com sede na Suíça “participem diretamente de hostilidades dentro de um conflito armado no exterior”.

Em poucas palavras, “isto significa que a nova lei permite às chamadas empresas de segurança agirem dentro de conflitos armados no exterior e participarem indiretamente das hostilidades”, disse Josef Lang (foto à direita).

Quem pensa que no fragor da batalha alguém pode diferenciar entre participação ‘direta’ e ‘indireta’, não tem ideia de como são as batalhas atuais”, acrescentou.


Ulrich Petersohn (foto), pesquisador do Centro para os Estudos sobre Segurança, disse que no direito internacional a definição de “participação direta em hostilidades” é vaga e está sujeita a debate. “E onde termina a autodefesa?”, perguntou. “Obviamente, há uma zona cinza”, acrescentou.

Petersohn também apresentou um dilema realista. “O que se aplica quando é atacado um complexo militar custodiado por pessoal de empresas militares privadas?”.

O novo projeto de lei também proíbe essas companhias de “realizarem qualquer atividade que incentive violações sérias aos direitos humanos”.
Sobre isto, Lang perguntou: “Por acaso significa que está permitido incentivar violações leves dos direitos humanos?”.

O político do Partido Verde acredita que a lei não pode obrigar a Aegis a deixar a Suíça. “Eles simplesmente prometerão não participar diretamente de hostilidades em áreas de conflito, e também nada fazer para incentivar violações sérias aos direitos humanos”.

Não está claro como as autoridades suíças poderão controlar as atividades dos mercenários no terreno.

Albert A. Stahel (foto), diretor do Instituto de Estudos Estratégicos, com sede em Wädenswil, perto de Zurique, acredita ser possível uma queda da atração que a Suíça representa para as companhias militares privadas, mas disse que as que já estão presentes no país não serão limitadas. “O Conselho Federal deveria ter proposto uma proibição clara para as empresas militares privadas, declarando expressamente que não toleramos nenhuma firma que participe de guerras”, enfatizou Stahel à IPS.

Petersohn tampouco vê uma imposição de limitações legais significativas para a Aegis. “No entanto, a arma mais afiada do projeto de lei é que podem ser apresentadas demandas com base em suspeitas”. As companhias estão ansiosas para evitar publicidade negativa, e isto pode colocá-las sob pressão, explicou.

Lang citou como exemplo a rígida regulação da Noruega. “Em lugar de proibir determinadas atividades praticamente impossíveis de serem definidas, seria mais factível aplicar um critério mais controlável. As empresas norueguesas não têm permitido a entrada de armas em outros países”, afirmou.

No plano internacional, a Suíça, junto como o Comitê Internacional da Cruz Vermelha, lançou um processo que levou, em 2008, ao Documento de Montreux. Este texto intergovernamental assinado por 44 Estados contém uma compilação de boas práticas, mas não é legalmente vinculante.

Inesperadamente, a lei proposta pelo governo suíço não adere às boas práticas sugeridas.

O Documento de Montreux promove medidas para garantir a transparência em autorizações como a do controle por parte dos órgãos parlamentares. O projeto suíço deixa fora toda medida de transparência.

No entanto, se for aprovada, a lei obrigará as companhias militares privadas que operam na Suíça a assinar o Código de Conduta Internacional para Fornecedores de Serviços de Segurança Privada (Icoc-PSP), um contexto autorregulatório já assinado por 592 empresas do setor.

Para Stahel, este enfoque é inútil, porque não há mecanismo para impor sanções. Petersohn tem esperanças de que esses códigos possam levar ao desenvolvimento de normas que impliquem certo grau de obrigatoriedade.

O Icoc-PSP é funcional principalmente para a imagem das empresas signatárias, e mantém à distância outros fornecedores de serviços.

Petersohn enfatizou que as violações ao Código, de todo modo, correm o risco de desembocar em campanhas de denúncias.

O parlamento suíço debaterá o projeto de lei, mas não se espera que o torne mais severo. “Foi dado um passo nessa direção. Porém, o copo está apenas pela metade”, disse Stahel.

Fonte: Envolverde/IPS

http://envolverde.com.br/ips/inter-press-service-reportagens/suica-diante-de-frouxos-controles-de-mercenarios/


Nota:

A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

O cerco ao WikiLeaks

Antonio Luiz M. C. Costa, editor de internacional de CartaCapital. Do website
Entre as muitas ironias que produziu, uma das mais saborosas do caso WikiLeaks é ter dado oportunidade ao jornal russo “Pravda” de zombar do sistema legal e da censura nos EUA.

Depois de comentar mensagens do WikiLeaks que mostram o governo Obama pressionando Alemanha e Espanha para encobrir torturas praticadas pela CIA no governo anterior, o colunista e editor legal David Hoffman tripudia: “agora, dado que o fundador do WikiLeaks Julian Assange enfrenta acusações criminais na Suécia, fica também evidente que os EUA têm o governo sueco e a Interpol no bolso. Claro que não sei se Assange cometeu o crime do qual é acusado. Sei é que para o ‘sistema’ legal dos EUA a verdade é irrelevante. No minuto em que Assange revelou a extensão dos crimes dos EUA e seu encobrimento para o mundo, tornou-se um homem marcado”. Aproveita também para apontar a hipocrisia de conservadores e seus porta-vozes na imprensa, que querem as penas mais rigorosas possíveis para o WikiLeaks mas não tiveram dúvidas em expor a agente dos EUA Valerie Plame quando o governo Bush júnior quis punir seu marido, o ex-embaixador Joseph Wilson, por denunciar provas forjadas para justificar a invasão do Iraque.

A coluna tem data de 3 de dezembro. O cerco começara com a ordem de captura internacional do governo sueco que colocou o australiano Assange na lista de “alerta vermelho”, os mais procurados da Interpol, a serem monitorados a cada passo. Com um pretexto inusitado para uma operação desse porte, se não surreal: o fundador do WikiLeaks teria continuado a fazer sexo com uma sueca depois da ruptura de seu preservativo e se recusado a usá-lo com outra. Não há sequer um indiciamento formal e as duas acusadoras, Sofía Wilén e Anna Ardin enviaram mensagens por SMS e Twitter alardeando seus encontros com Assange logo após o fato, falando deles em tom elogioso e festivo. A segunda é nascida em Cuba e escreveu artigos para uma publicação anticastrista, sugerindo que pode haver o dedo da CIA no caso.

Na véspera, a Amazon expulsara o site wikileaks.org de seus servidores. No mesmo dia 3, o próprio endereço foi deletado pelo provedor estadunidense everydns.com. Foi rapidamente transferido para um domínio registrado na Suíça, wikileaks.ch, mas com parte dos arquivos hospedados no provedor francês OVH que, ameaçado com “consequências” pelo ministro francês da Indústria Eric Besson, entrou na justiça com uma consulta sobre a legalidade da ação.

No dia 4, a Switch, provedor suíço do novo endereço, disse que não atenderia às pressões estadunidenses e francesas para deletá-lo, mas o sistema PayPal de pagamentos via internet, uma subsidiária do eBay, cancelou a transferência de doações ao WikiLeaks. No dia seguinte, a OVH saiu da rede e os arquivos passaram a ser hospedados pelo Partido Pirata Sueco e passou a sofrer ataques de hackers, mas centenas de “espelhos” do site se multiplicaram pelo mundo. O WikiLeaks também distribuiu a todos os interessados uma cópia encriptada do arquivo completo, cuja chave será distribuída caso algo aconteça com o site ou seu fundador.

Nos dias 6 e 7, as redes Mastercard e Visa também cancelaram as doações ao WikiLeaks – embora, como tenha notado o editor de tecnologia do Guardian, nenhuma delas tenha problemas com encaminhar doações ao Ku-Klux-Klan. Além disso, o banco suíço PostFinance encerrou a conta de Assange com o pretexto de que ele “mentiu” ao fornecer endereço no país – também ridículo, pois ele seguiu a praxe e deu o endereço de um advogado em Genebra. Com essas operações, o WikiLeaks perdeu cerca de 133 mil dólares. Ainda no dia 7, Assange apresentou-se à Scotland Yard e foi preso sem direito a fiança.

Toda essa farsa foi levada ao palco porque as atividades de Julian Assange e do WikiLeaks não são realmente ilegais. Várias decisões jurídicas dos EUA, notadamente a decisão de 1971 que deu ao New York Times o direito de publicar os “Papéis do Pentágono”, concordaram em que a liberdade de imprensa garantida pela Constituição se sobrepõe à reivindicação de segredo do Executivo. O funcionário que vazou os arquivos oficiais pode, em princípio, ser processado, não a organização que aceitou o material e a publicou.

O fato é que Julian Assange é hoje um preso político, detido sob o mesmo tipo de falso pretexto que é devidamente ridicularizado quando usado para se deter um dissidente russo, chinês ou iraniano. Fosse os segredos de algum desses países que tivesse revelado, o fundador do WikiLeaks seria candidato automático a um Nobel da Paz.

Ao serem os segredos dos EUA os que o australiano se dispõe a divulgar – e o que pode vir a ser ainda pior, de seus grandes bancos e empresas (a começar, provavelmente, pelo Bank of America), como anunciou em entrevista à Forbes –, políticos e jornalistas de Washington e de seus aliados do Ocidente passam a considerar justo e aceitável que seja perseguido e preso pela Interpol sob acusações que matariam de rir os responsáveis pelos Processos de Moscou da era stalinista.

O Ocidente tem dificuldade cada vez maior em conviver com os direitos e garantias em nome dos quais julga ter o dever de impor sua vontade ao resto do mundo. Sente cada vez mais a necessidade de leis de exceção e estados de exceção, que pouco a pouco viram regra. O mundo vai descobrindo que é ilusório confiar na Internet como garantia de liberdade de informação.

WikiLula: presidente brasileiro protesta contra prisão de Julian Assange
Redação CartaCapital

Durante evento em que foi apresentado um balanço de quatro anos do PAC, nesta quinta-feira 9, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva prestou solidariedade ao fundador do WikiLeaks, Julian Assange. O presidente protestou contra o “cerceamento à liberdade de expressão na internet” e questionou a mídia brasileira por não defender Assange, recentemente preso por uma acusação de crimes sexuais na Suécia. O WikiLeaks divulgou milhares de documentos sigilosos sobre a guerra do Afeganistão e Iraque e, na última semana, começou a vazar uma série de telegramas secretos trocados pela diplomacia dos Estados Unidos.

Leia o trecho do discurso do presidente Lula:

"Pode colocar no Blog do Planalto o primeiro protesto, então, contra [o cerceamento à] a liberdade de expressão na internet, para a gente poder protestar, porque o rapaz (Julian Assange) estava apenas colocando aquilo que ele leu. E se ele leu porque alguém escreveu, o culpado não é quem divulgou, o culpado é quem escreveu. Portanto, em vez de culpar quem divulgou, culpe quem escreveu a bobagem, porque senão não teria o escândalo que tem. Então, Wikileaks, minha solidariedade pela divulgação das coisas e meu protesto contra [o cerceamento à] da liberdade de expressão." Mais