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quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Marina, chavismo e PT

A seguir, publicamos análises dos jornalistas Beto Almeida e José Carlos Ruy sobre algumas das recentes declarações de Marina Silva, recém-filiada no PSB e provável candidata a vice-presidente em 2014, completando a chapa de Eduardo Campos.

Da Rede Democrática
A declaração de Marina Silva considerando-se vítima de “chavismo” do PT tem sintonia com declarações, sempre conservadoras, do ministro Gilmar Mendes, que ataca o partido de Lula por semelhanças em suas políticas sociais com as venezuelanas que beneficiam evidentemente a maioria do povo e, também, uma política externa de não submissão aos EUA.

Por Beto Almeida

Hugo Chávez deixou um legado que apavora as oligarquias do mundo inteiro. Fatos: o chavismo erradicou o analfabetismo na Venezuela, que hoje tem o nível de desigualdade mais baixo da América do Sul. Convocou 23 mil médicos cubanos e hoje a Pátria de Bolívar reduziu a mortalidade infantil drasticamente, venceu a desnutrição crônica, paga o mais elevado salário mínimo da região, tem uma nova lei do trabalho, protegendo os trabalhadores da voracidade capitalista, lança satélites ao espaço e selou acordos com Rússia, China e Irã para industrializar o país, lá instalando ferrovias, fábricas de tratores, caminhões, refinarias, algo que o Brasil também necessita, urgentemente.

Não há presos políticos na Venezuela chavista, e a mídia, majoritariamente controlada por capitalistas aliados dos EUA, pratica golpismo diuturnamente, sem censura e não há jornalistas presos lá. Nos 14 anos de Chávez à frente do governo, foram realizadas 16 eleições, plebiscitos e referendos, dos quais o chavismo venceu 15, respeitando democraticamente o único resultado adverso.


O chavismo é atacado por suas qualidades, tal como Lula define os ataques recebidos pelo PT dos conservadores, nos quais se inclui Marina Silva, para o deleite da mídia oligárquica. Sua declaração apenas demonstra que as eleições de 2014 no Brasil serão plebiscitárias: ampliar a justiça social, democratizando a renda, a educação, a saúde, a terra e a informação, construindo um Brasil Nação, com inclusão, ou então, ceder aos inimigos do Chávez, ao privativismo, ao ecologismo financista imperial improdutivo, sem integração latino-americana, ou seja, um Brasil Mercado, com exclusão.


O jogo da direita: Marina quer derrotar o “chavismo” do governo


Por José Carlos Ruy

As reações e mobilizações que se seguiram à decisão do TSE, nesta quinta-feira (3), que não aceitou dar um “jeitinho” para legalizar da Rede Sustentabilidade, de Marina Silva, dão uma ideia das dificuldades que os conservadores encontrarão pela frente na eleição de 2014. 

O TSE aplicou a lei, sem ceder às pressões dos organizadores da chamada Rede, que pretendiam legalizar aquele partido sem completar o número de assinaturas de apoiadores que a lei exige. Os cartórios eleitorais impugnaram de assinaturas e, assim, faltaram 50 mil para completar as 492 mil exigidas.

A decisão foi o estopim para dois movimentos. O primeiro foi o extravasamento público de restrições que Marina Silva enfrenta dentro do próprio partido que pretende criar. Ela “comete erros de avaliação estratégica", acusou o deputado federal Alfredo Sirkis (PV-RJ), um dos dirigentes da Rede. Ele a atacou em artigo divulgado pelo Facebook na sexta-feira (4). Foi arrasador; sua descrição do modo de agir de Marina Silva faz dela uma espécie de Jânio de saias, dona do mesmo autoritarismo autocentrado e voluntarista do ex-presidente, que renunciou em 25 de agosto de 1961. 

O processo de decisão de Marina, disse Sirkis, é "caótico"; ela não faz "alianças estratégicas com seus pares". Sirkis responsabilizou a ex-senadora pelo fracasso no encaminhamento da criação e registro legal de seu partido, a Rede. Ela não entendeu, escreveu, “que o jogo seria assim”, e esta foi “uma das muitas auto complacências resultantes de uma mística de auto ilusão”. Ela só consegue “trabalhar direito com seus incondicionais”, reagindo “mal a críticas e opiniões fortes discordantes”.

Outro apoiador de primeira hora, o jornalista Ricardo Noblat, também fez uma avaliação severa. Restabelecendo-se de uma cirurgia cardíaca, ele escreveu em seu blog que pouco se conhece além de uma imagem pública que oculta a verdadeira Marina: “conservadora, preconceituosa, centralizadora". E questiona, no artigo intitulado significativamente E Marina, hein?: a “candidata disposta a se eleger presidente da República para mudar o país foi incapaz de montar um partido no prazo determinado pela lei. Dá para acreditar?”

Marina revelou-se um poço de mágoa contra a atual coalisão progressista e democrática que governa o Brasil; o foco de seu ressentimento é sobretudo o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva e a atual presidenta Dilma Rousseff. 

Na tarde deste sábado (5) Marina anunciou sua filiação ao PSB, anunciando que será candidata a vice-presidente numa chapa encabeçada pelo governador pernambucano Eduardo Campos. “Não tive outra alternativa”, explicou, dizendo que o sonho presidencial fica adiado pela urgência de lutar contra a esquerda que exerce a presidência. “A minha briga, neste momento”, teria dito perante integrantes da Rede, “não é para ser presidente da República, é contra o PT e o chavismo que se instalou no Brasil". São palavras que resumem o espírito geral da reunião em que a decisão foi tomada; na verdade, segundo as notícias, foi mais um monólogo mariniano, que terminou às 4h30 da madrugada deste sábado (5).

O noticiário dá conta também das pressões de poderosos grupos financeiros cujo objetivo é manter Marina no jogo sucessório. E inclusive o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, sai com a imagem arranhada deste arranjo patrocinado por plutocratas. Segundo as informações que circularam neste sábado (5), essas pressões cresceram desde a quinta-feira (4), depois da derrota sofrida no TSE. As pressões teriam partido dos grupos econômicos que já apoiam Marina explicitamente (a Natura e o Itaú), mas há menção também a outra fonte, sendo citado diretamente Roberto Irineu Marinho, presidente das Organizações Globo.

A raiva e o ressentimento de Marina contra a esquerda e o PT têm lá o seu peso em suas decisões e articulações. Mas o fundamental, e que dá consistência e direção às suas ações, é o apoio dos donos do dinheiro que veem nela um caminho para derrotar a esquerda e seu governo e levar de volta, ao Palácio do Planalto, o programa neoliberal partilhado por Marina Silva. Sua participação na eleição de 2014, mesmo como vice de Eduardo Campos, poderá - pensam eles - pelo menos empanar o brilho de uma vitória da esquerda ao levar a previsível vitória de Dilma Rousseff para o segundo turno. É uma clara tentativa de reduzir a legitimidade de um segundo mandato que possa aprofundar as mudanças que o país e o povo precisam.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

União Europeia promove a privatização da água no Velho Continente

Mali: rejeitemos esse desafio à civilização


Bandeira francesa junto a soldados do Exército do Mali. Foto: AFP

Por Antonio Negri*

A intervenção francesa no Mali reflete uma crise política que tende a generalizar-se na África saariana e subsaariana depois da “Primavera Árabe” do Magreb. “Manifesta-se o lado perigoso da Primavera Árabe”, escreve em manchete o New York Times, e acrescenta: “tinha razão o coronel Kadafi, quando previa que, se ele caísse, o pessoal de Bin Laden chegaria por terra e mar para ocupar as margens do Mediterrâneo”.

Mas, é isso que, realmente, impulsiona à rebelião os novos guerrilheiros nos desertos do Norte da África, ou são impulsionados por miséria cada vez mais feroz e pela lógica sempre destrutiva dos governos da ex-Françáfrica? As zonas rurais dos países do Sahel permaneceram, apesar delas mesmas, nos últimos anos, em situação de miséria profunda, que alimenta o êxodo da população e a desestabilização das grandes cidades. Frente a isso, as estatísticas macroeconômicas mostram a existência de um “falso” desenvolvimento vinculado à atual corrida pela extração de minérios em direção àqueles territórios ricos desses recursos: o Mali, por exemplo, é o terceiro produtor mundial de ouro, rico em urânio, e prevê-se que seja também muito rico em hidrocarbonetos.

O jihadismo entra nesses territórios não pelo fanatismo de alguns e não os submete a partir da ‘barbárie terrorista’ (como dizem à opinião pública ocidental), mas, sim, porque nesses países as instituições continuam a dissolver-se, dada a fragilidade econômica e civil. Por isso, o êxito dos “invasores” que não são invasores está praticamente garantido.

O Mali é só mais um país do Sahel – os demais também estão em situação crítica semelhante. A dúvida sobre o aprofundamento da crise em cada um deles depende só de alguns fatores casuais que ainda contêm o desabamento recém iniciado do “dominó”. No Mali, que em certo momento foi “vitrine da democracia”, o governo estava em crise há bastante tempo, asfixiado pela corrupção, por repetidos golpes de Estado e pela rebelião popular dos tuaregues no norte. Os tuaregues querem a independência do Azawad (vasta região desértica do norte do Mali). Essa revolta encontrou ocasião de triunfar porque, com a queda do governo do coronel Kadafi, muitos tuaregues voltaram ao seu país natal com armas (em grande e sofisticada quantidade) e equipamentos (logísticas regionais e alianças com parte do exército maliense). Deve-se ter em mente que a intervenção francesa (e da OTAN) na Líbia produziu naquele país a implosão de mil facções locais, ideológicas, étnicas, as quais, depois de Kadafi, ficaram sem qualquer autoridade capaz de ostentar força legítima.

A rebelião tuaregue armada encontrou, além disso, apoio forte e provavelmente decisivo em grupos salafistas e jihadistas que já em 2002, ao terminar a guerra civil argelina, haviam instalado os fundamentos da al-Qaeda no Magreb. Há cerca de dez anos, esses grupos vinham construindo (aproveitando a “indústria dos sequestros” e o apoio aos “traficantes’ ilegais que operam nesse amplo território) bases e redes de apoio à guerrilha. O perigo era evidente. Há três, quatro anos, está em andamento uma cooperação bilateral França-EUA para combater o que alguns chamam de “eixo Kandahar-Dakar”. Recentemente, o New York Times revelou que o Departamento de Estado investira cerca de 500 milhões de dólares nessa região, nessa estratégia de antiterrorismo. Já no início de 2012, o comando norte-americano na África, AFRICOM, deu-se conta de que boa parte das tropas malienses adestradas pelos norte-americanos haviam-se unido à revolução no norte do país.

Agora, vimos a intervenção francesa, em resposta a pedido urgente do governo de Bamako (ou do que resta dele) formalmente apoiado por extensa coalizão de países africanos e governos europeus. Mas a guerra francesa já parece estender-se como mancha de azeite para grande número de países vizinhos. O que se viu acontecer na Argélia na última semana, quando a gentil intervenção daquele governo e de seu exército já produziu centenas de assassinatos, é só o começo desse amargo desenvolvimento.

Por enquanto, consolam-se a imprensa e a opinião pública francesa com a crença de que não se trataria de guerra de usura (como a guerra no Iraque ou no Afeganistão) cujos protagonistas movem-se “entre as populações”; tratar-se-ia de guerra clássica no puro deserto, guerra de posições e de movimentos. As coisas não demorarão a mudar muito. Talvez os franceses, com as tropas de outros países africanos (que permanecerão sob comando dos franceses, enquanto os EUA continuarem reticentes e resistirem a envolver-se na mudança) consigam a vitória em campo. Mas em seguida... como governar no deserto, em situação de paz que não é paz, numa “guerra nômade” que começa, em quadro de histeria frente a eventuais ataques terroristas na França continental e, sobretudo, em face da memória da vergonha colonial e do despotismo pós-colonial mantido pela potência francesa? Mas, sobretudo, como considerar, na situação atual e em situação de pós-guerra – aspectos que nos permitimos chamar “aspectos bons” da Primavera Árabe, ou, melhor dizendo, daquela “Primavera Africana” que parecia estar começando a apontar também no Sahel?

É inútil – e vale a pena repetir – culpar o extremismo de um islamismo salafista radical, quando se está sufocando a única alternativa verdadeira que realmente teria chances de concretizar-se: o amadurecimento – já iniciado nesses territórios – de elites jovens, democráticas, anticapitalistas. É necessário atacar as causas socioeconômicas dessa crise.

Se se ouvem os especialistas, dizem que, para desenvolver um programa de reconstrução e de desenvolvimento, seria necessário intervir nesses territórios nos setores agrícolas, de reflorestamento, de criação de animais, na melhoria de estradas e do transporte, no acesso à água, na promoção da energia solar e eólica, etc. E logo reiniciar os programas de produção de algodão e de cereais nessas regiões... Em resumo: tudo. Por fim e especialmente, “as populações devem beneficiar-se da renda da mineração; do ouro, para começar, primeiro produto de exportação”.

Não é solução, de fato, cômica? E na risada não aparece, evidente, o cinismo, no mínimo hipócrita, que há em tanto insistir na mesma execrável sede de dinheiro que arrasta esses governos liberais a combater terroristas pelas impiedosas terras desérticas do Sahara e do Sahel como se fossem trunfos a distribuir entre os inimigos (porque é muito difícil identificar quem é terrorista e quem é camponês pobre ou proletário metropolitano agora sublevados). Ainda mais: não lhes parecem lágrimas de crocodilo – e na Itália todos as confundem – as lágrimas que nossos democratas tanto choram?

Pesado fardo de nossa civilização, que nos obriga a intervir! Sagrada obrigação da soberania, dessa vez exercida em nome da Europa! Atenção! Até os EUA já pararam de repetir essas estupidezes, depois das terríveis derrotas no Oriente Médio! Reconheçamos, isso sim, que só modificando radicalmente nossa consciência política, só rompendo radicalmente com formas de governos harmônicas e funcionais em relação ao capital, poderemos voltar a nos orientar corretamente.

No marco da globalização, não se pode raciocinar como raciocinam os Parlamentos nos países da Europa e o Parlamento Europeu, com homens e “mídia ou imprensa-empresa” votando a favor da intervenção francesa (e foi particularmente odiosa, em Estrasburgo, a atitude belicosa dos Verdes europeus).

Gilles Kepel – talvez o maior especialista em temas árabes conhecido no Ocidente – destaca que “o que está em jogo no Mali é um desafio à civilização na época da globalização. O Sahel é, ao mesmo tempo, vítima por excelência e lugar da incandescência”.

Acrescentamos: a resistência e a guerrilha anti-imperialista naquele desesperado local despossuído e devastado são luta anticapitalista. Não gostaremos de ter de reconhecer que os islâmicos têm razão.

*sociólogo e ativista político italiano, é autor, com Michael Hardt, de Império (Record, 2001). Tradução: Vila Vudu.

Leia ainda:
- Não à intervenção colonial no Mali
- Journal du Mali: O Mali, a França e os extremistas

domingo, 3 de fevereiro de 2013

A Monsanto, além da justiça


Por Mauro Santayana*
Agricultores brasileiros, também cúmplices da agressão química contra a natureza, estão em litígio contra a Monsanto, que lhes cobrou royalties pelo uso de uma tecnologia cuja patente expirou em 2010, de acordo com a legislação brasileira. As leis nacionais estabelecem que o início da vigência de uma patente é a data de  seu primeiro registro. A Monsanto invoca a legislação norte-americana, pela qual a patente passa a vigorar a partir de seu último registro. Como sempre há maquiagem dos processos tecnológicos, a patente não expira jamais.

Os lobistas da Monsanto não tiveram dificuldades em negociar acordo vantajoso, para a empresa, com os senhores do grande agronegócio, reunidos em várias federações estaduais de agropecuária, e com a poderosa Confederação Nacional da Agricultura, comandada pela senadora Kátia Abreu. Pelo cambalacho, a Monsanto suspenderia a cobrança dos royalties até 2014, e os demandantes desistiriam dos processos judiciais.

Uma das maldições do homem é a tentativa de criar uma natureza protética, substituindo o mundo natural por outro que, sendo por ele criado, poderá, na insolência da razão técnica, ser mais perfeito.  Essa busca, iniciada ainda na antiguidade, continuou com os alquimistas, e se intensificou com as descobertas da química, a partir do século 18. O conluio entre a ciência, mediante a tecnologia e o sistema capitalista que engendrou a Revolução Industrial, amparada pelo laissez-faire, exacerbou esse movimento, que hoje ameaça a vida no planeta.

A Alemanha se tornaria, no século 19, o centro mais importante das pesquisas e da produção industrial de novos elementos a fim de substituir a matéria natural, construída nos milênios de vida no planeta, por outra, criada com vantagens para o sistema de produção industrial moderno.

Não há exemplo mais evidente desse movimento suicida do que a Monsanto. A empresa foi fundada em 1901 a fim de produzir sacarina, o primeiro adoçante sintético então só fabricado na Alemanha. Da sacarina, a empresa foi ampliando seus negócios com outros produtos sintéticos, como a vanilina e corantes, muitos deles cancerígenos. Não deixa de ser emblemático que o primeiro grande cliente da Monsanto tenha sido exatamente a Coca-Cola. É uma coincidência que faz refletir.

Não é só a Monsanto que anda envenenando as terras e as águas com seus produtos químicos. Outras empresas gigantes da química com ela competem na produção de agrotóxicos mortais. Com o controle da engenharia genética aplicada aos vegetais de consumo humano e de consumo animal, no entanto, ela tem sido a principal responsável pelos danos irreparáveis à natureza e à saúde dos animais e dos seres humanos.

Vários países do mundo têm proibido a utilização das sementes transgênicas da Monsanto, entre eles a França, que interditou o uso das sementes alteradas. No Brasil, ela tem vencido tudo, com a conivência das autoridades responsáveis, ou irresponsáveis. A Comissão Técnica de Biossegurança e o Conselho Nacional de Biossegurança  vêm dando sinal verde aos crimes cometidos pela Monsanto e outras congêneres no Brasil.

Essa devia ser uma preocupação prioritária do Parlamento, que só se movimenta com entusiasmo quando se trata das articulações internas para a eleição bianual de suas mesas diretoras.
*no JB On Line e em seu blog

-Apreensão no campo: o poder de Kátia Abreu
-Dilma refém do PMDB

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Journal du Mali: O Mali, a França e os extremistas


Por Tariq Ramadan*
O mundo observa, e a classe política francesa parece unanimemente de acordo quanto ao início de uma intervenção militar ao norte do Mali contra os “islamistas”, “jihadistas”, “extremistas”. Nada a criticar por o governo ter-se engajado sozinho, mas a decisão de iniciar ação militar foi considerada “justa”. O presidente francês, François Hollande (acima), que parecia perdido no coração de governo confuso e desorientado, aplica belo polimento ao brasão e reconstrói para si a imagem de homem de Estado, de chefe de guerra, que quer “destruir o inimigo”, “impedi-lo de avançar”. E assim a França vê luzir no norte do Mali, afinal, a imagem de um presidente firme, forte, determinado, instalado em Paris.

É preciso começar pelo começo e assumir posição clara. A ideologia e as práticas das redes, grupos e grupúsculos de salafistas jihadistas e extremistas devem ser condenadas com absoluta firmeza. O modo como compreendem o Islã, o modo odioso como instrumentalizam a religião é abominável, os castigos físicos e corporais são absolutamente inaceitáveis.

Mais uma vez, a consciência muçulmana contemporânea internacional deve manifestar-se alto e forte para dizer e repetir que aquela compreensão e aquela aplicação do Islã são traição, são horrendas, são vergonhosas. Os primeiros a oporem-se àquilo têm de ser os muçulmanos, pessoalmente, e as sociedades majoritariamente muçulmanas. Politicamente, intelectualmente e com toda a força da consciência e do coração, sem restrições, sem concessões.

A essa firme posição de princípio, é preciso acrescentar a análise geoestratégica, e não confundir a clara posição moral, de um lado; com uma posição política ingênua, binária, simplista. Ser contra os extremistas jihadistas não implica, não, de modo algum, aceitar sem protesto a política francesa naquela região.

A expressão “estão conosco ou estão contra nós” de George W. Bush é falsa nos fundamentos e perigosa tanto na substância como nas consequências. Por trás do engajamento “nobre” da França ao lado dos povos africanos ameaçados, há algumas questões que têm de ser expostas e explicadas com clareza.

O ocidente em geral e a França em particular esqueceram aqueles povos durante décadas, sob ditaduras na Tunísia, no Egito e na Líbia, antes de porem-se a entoar loas a “revoluções”, à “primavera árabe” e à liberdade. Na Líbia, a intervenção humanitária encobriu aspectos sombrios, odores de interesses petroleiros e econômicos mal dissimulados, quando não declarados.

Poucos meses adiante, a França intervém no Norte do Mali para o bem do povo, com a única intenção declarada de proteger aquele país “amigo” do perigo dos extremistas aliados a rebeldes tuaregues. É o que dizem. Em todas as exposições políticas e midiáticas dos fatos, faltam dados econômicos e geoestratégicos – o que é grave. Nada se diz da história longa, nem da história recente, das alianças da França com vários e sucessivos governos do Mali. Tudo se passa como se a França não fizesse outra coisa além de exprimir solidariedades políticas gratuitas aos povos, generosamente, sem outra intenção ou projeto.

De fato, nos bastidores dos recentes tumultos políticos jamais deixou de haver o dedo da França, que interveio, que pressionou, que descartou os atores malineses que a perturbavam (fossem políticos ou militares), que fez alianças úteis, que participou de reuniões do governo e também de reuniões em territórios tribais, em espaços civis e militares. Amadou Toumani Touré, derrubado por um golpe de Estado dia 22/3/2012, foi enormemente fragilizado e acabou isolado após a queda do coronel Kadafi.

Parece ter pago o preço político que lhe foi imposto por suas políticas favoráveis ao Norte e por suas ideias sobre a atribuição de futuros mercados de exploração do petróleo. Os laços (várias vezes difíceis) entre a França e a organização separatista “Movimento Nacional para a Libertação do Azawad” (MNLA) não são segredo; aqueles laços levaram a que se instalasse uma fratura entre o sul e o norte do Mali, bem útil para os que se programavam para explorar riquezas minerais muito promissoras. A presença da Al-Qaeda no Magreb Islâmico e a aliança que fez com as tribos tuaregues no Norte são já há três anos, e ainda mais agora, como se vê, fatores que explicam também, mas nada explicam sozinhos, a presença militar francesa na região – a qual foi afinal oficializada depois de declarada “a guerra”, há poucos dias.

O governo francês e os executivos da transnacionais de petróleo e gás sempre minimizaram o mais possível as descobertas de recursos minerais na região do Sahel entre a Mauritânia, o Mali, o Niger e a Argélia. Em certo momento, falou-se de um “milagre malinês”. Mas fato é que os dados são bem mais conhecidos e comprovados do que fazem crer as “declarações”.

Jean François Arrighi de Casanova, diretor da Total francesa para o norte da África, não hesitou em falar de “um novo Eldorado”, ante a descoberta de gigantescas jazidas de petróleo e gás. Há naquela área nada menos que cinco bacias muito promissoras. A bacia de Touadenni, na fronteira com a Mauritânia, já revelou a importância de seus recursos. A essa se acrescentam as bacias de Tamesna e de Lullemeden (na fronteira com o Niger), a bacia de Nara (perto de Mopti) e a bacia de Gao.

A Autoridade para Pesquisa de Petróleo [orig. Autorité pour la Recherche Pétrolière (AUREP)] confirma o potencial do subsolo do norte do Mali (essencialmente, são reservas de gás e petróleo). O Mali, a Mauritânia, a Argélia e o Niger são os primeiros afetados e – com a queda do coronel Kadafi – as perspectivas de exploração abriram-se para empresas francesas (à frente delas, a Total), italianas (ENI) e argelinas (Sipex, filial de Sonatrach) que já investiram mais de 100 milhões de dólares (segundo estimativas) em estudos e sondagens, apesar das dificuldades devidas à aridez da região e à segurança precária.

O amigo povo malinês vale bem que a França o defenda, seu sangue, sua liberdade e sua dignidade, sobretudo se se sabe que, acessoriamente, o trabalho implicará farta sobremesa em gás e petróleo. Os recursos minerais do norte do Mali não são fantasia, nem são miragem. Miragem é, isso sim, a descolonização.

Ninguém pode negar a existência de grupos extremistas violentos e radicalizados que constroem e disseminam compreensão pervertida e inaceitável do Islã. É verdade e já o dissemos: é necessário condená-los. É preciso ver e mostrar que esses grupos adotam estratégias políticas contraditórias, além da muito suspeita tendência a aparecerem e se instalarem exatamente onde haja recursos minerais em disputa. Lá estavam, no Afeganistão (numa área imensamente rica de petróleo, gás, ouro, lítio...) e agora, outra vez... Não se entende por que os “loucos” extremistas aparecem agora instalados no Sahel malinês, para ali aplicar sua “xaria” desumana e tão pouco islâmica. No Sahel desértico!

É preciso dizer e repetir, para que não reste qualquer dúvida. Não se contesta que esses grupúsculos de islamistas existam. Mas é preciso explicar inúmeros detalhes de como seus grupos podem ter sido infiltrados (os serviços de informação USAmericanos, e também os europeus, já admitiram o uso de táticas de infiltração e de agentes provocadores ou instigadores). Os pontos onde os grupos islamistas instalaram-se e seus métodos de operação podem bem ter sido orientados, induzidos. Já se viu acontecer durante o governo de George W.Bush, vê-se agora outra vez no Mali, o quanto “terroristas” podem ser úteis.

Um chefe malinês falou de seus problemas, em nossa mais recente visita à região: “Temos ordem de exterminá-los, de destruí-los, mesmo que estejam desarmados. Não fazer prisioneiros! Fazemos de tudo para enlouquecê-los e empurrá-los para o radicalismo”. Espantosa estratégia de guerra!

O jornal Le Canard Enchaîné noticia que o aliado francês, o Qatar, teria assinado um acordo com a empresa Total – para as explorações no Sahel – e, paradoxalmente, daria também apoio logístico e financeiro a grupos radicais, como os “insurgentes do MNLA (independentistas e laicos) e os movimentos Ansar Dine, AQIM e MUJAO”. Caso tudo isso seja comprovado... haveria aí alguma contradição descabida? Ou seria modo de estimular a ação dos pirômanos extremistas, até o ponto em que se torne necessário, urgente, inadiável chamar os bombeiros (franceses)?

Uma divisão de funções, tão eficaz quanto cínica.

O mundo observa, e a recente captura de reféns na Argélia mobilizará ainda mais fortemente sentimentos nacionais em apoio à operação militar. Reféns americanos, ingleses, noruegueses, etc. e tudo em solo da Argélia: o contexto extravasa da França. O povo do Mali rejubila-se, na maioria, muitos não são ingênuos: a França amiga é mais amiga sempre de seus interesses; e o seu modo de intervir seletivamente (na Líbia ou no Mali, mas não na Síria ou na Palestina) nada tem de novidade. A política enviesada da “France-Afrique” acabou, nos dizem, e as colonizações políticas e/ou econômicas já são cinza; raiou a liberdade; “soou a hora da dignidade das nações e da democracia”! É indispensável, pois, aderir beatamente a essa hipocrisia generalizada.

É preciso denunciar os extremismos, condenar ações extremistas e a instrumentalização da religião e das culturas, mas chega afinal o dia quando se tem também de olhar cara a cara as responsabilidades. Olhar cara a cara a responsabilidade dos Estados africanos e árabes que esquecem os princípios elementares da autonomia e da responsabilidade política (além do respeito e da dignidade de seus povos). Olhar cara a cara as elites africanas e árabes, e nós todos, que somos tão altamente incapazes de propor uma visão clara da independência política, econômica e cultural. Olhar cara a cara os povos que se deixam arrastar por emoções populares e miragens de “potências amigas”. Olhar cara a cara nós mesmos, todos, políticos, intelectuais e cidadãos preocupados com manter a dignidade e a justiça nos países do Sul. É preciso olhar firmemente o espelho da nossa responsabilidade decisiva quanto ao que se passa sob nossos olhos.

A “destruição” dos extremistas jihadistas do norte do Mali não é nem promessa, nem garantia de liberdade para o povo do Mali; é, isso sim, no longo prazo, uma forma, sofisticada, de nova alienação. Contudo, nunca como hoje as forças de resistência dos países do “Sul Global” (com os movimentos políticos e engajados do norte), nunca como hoje, dizíamos, essas forças encontraram melhor oportunidade para abrir novos horizontes e abrir novas trilhas da direção da própria liberdade.

Nada se vê hoje além dessa euforia, a celebração, ou então o silêncio, a ação libertadora da França e da “comunidade internacional” que unanimemente apoia a França. Como se o Oriente Médio e a África tivessem aceito ser submissos ante os últimos cartuchos lançados por esse ocidente que agoniza, ferido por suas dívidas, suas dúvidas e as crises econômicas, políticas e identitárias que o atravessam.

O melhor serviço que a África pode prestar a ela mesma, e ao ocidente, é não curvar-se à nostalgia e aos delírios de poder do ocidente, mas resistir-lhes com dignidade, com coerência, em nome dos valores que o próprio ocidente e a própria França defendem quase tanto quanto traem, diariamente, sob o peso de suas políticas de mentira e hipocrisia, na América Latina, na África, como na Ásia.

O norte do Mali é revelador. Ali se vê em ação o que mais medo nos deve causar: um povo que canta sua liberdade política à qual aparece associado um novo desenvolvimento econômico. E há políticos ou intelectuais africanos ou árabes que aplaudem o que veem (conscientes ou inconscientes, ingênuos, arrivistas ou interesseiros).

A hipocrisia e a covardia dos interesseiros espelha a hipocrisia e a manipulação das “grandes potências”.
*via 'redecastorphoto', com tradução do coletivo Vila Vudu

Leia também:
Não à intervenção colonial no Mali

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Não à intervenção colonial no Mali


A França abusa do imperialismo mais desenfreado. Após realizar com os britânicos o massacre 'terceirizado' - e regado a bombas de urânio empobrecido - à Líbia de Kadafi em 2011, agora volta sua artilharia contra o Mali. Está prestes a fazer o mesmo com a Argélia. Para proteger interesses de seu país no noroeste africano, sobretudo ativos ambientais e commodities explorados por multinacionais francesas nas ex-colônias, o presidente François Hollande não poupa esforços e tem com isso garantido alta aprovação de seu eleitorado, o mesmo que meses após levá-lo ao Palácio do Eliseu (maio de 2012) demonstrava crescente insatisfação com o governo. Para atacar e invadir o Mali, Hollande tem contado com a preciosa ajuda da Itália do eterno 'premiê interino' Mario Monti.

O secretário de Relações Internacionais do Partido dos Comunistas Italianos (PdCI), Fausto Sorini, distribuiu nota repudiando a intervenção colonial francesa no Mali e o envolvimento da Itália nessa ação de guerra.


Via Rede Democrática*

"Somos totalmente contrários à intervenção militar francesa no Mali e à decisão do governo italiano de dar apoio “logístico” às operações bélicas e ao envio de militares ao terreno. 

A decisão assumida pelo presidente “socialista” Hollande (que tinha avalizado a decisão de Sarkozy de fazer a guera contra a Líbia) se alinha com as tradições de intervencionismo neoimperialista das classes dominantes francesas e desmente uma vocação progressista que de maneira muito apressada e incauta foi-lhe atribuída por amplos setores da esquerda italiana e europeia.

Associamo-nos à crítica clara feita ao presidente Hollande pelos comunistas franceses e pela Frente de Esquerda. A intervenção militar francesa não corresponde de nenhum modo à orientação do Conselho de Segurança da ONU e se destina a estender, e não resolver, as agudas contradições e a conflitualidade política de que a região é um ponto culminante (como se vê pelos enfrentamentos militares que também estão ligados à captura de centenas de reféns e ao massacre que se seguiu: o episódio que já envolveu a Argélia, agora com o risco de estender-se a outros países circunvizinhos, como o Niger).

O Mali é objeto de uma guerra civil onde, ao Norte do país, atuam componentes islâmcos radicais, que são uma consequência da desestabilização regional provocada pela guera contra a Líbia de Kadaff, e que foram alimentados pelo recente golpe no Mali que dividiu o país e radicalizou as facções em luta.

Nesta situação, a ONU autorizou uma intervenção pacificadora de capacetes azuis compostos exclusivamente de contingentes interafricanos; ao contrário, a intervenção unilateral francesa – que já recebeu o apoio da OTAN – se insere arbitrariamente em tal contexto com finalidades meramente neocoloniais, a retomada do controle da região e das riquezas (ouro, pedras preciosas, petróleo, urânio) de que o Mali é ditado.

O ex-presidente francês gaulista Valéry Giscard d'Estaing, em uma entrevista concedida em 13 de janeiro ao Le Monde, denuncia os riscos da intervenção e afirma que quer “pôr-se em guarda contra uma evolução da ação francesa no Mali, que seria de tipo neocolonialista”. Também os principais jornais argelinos acusam Hollande de reacender antigas veleidades coloniais da França.

A decisão do governo italiano de dar apoio político e militar “logístico” à intervenção francesa – governo demissionário que deveria estar encarregado apenas da administração! - viola o artigo 11º da Constituição, que repudia a guerra como instrumento de solução das controvérsias internacionais. É grave que não só o Pólo da Liberdade [direita] e o polo centrista, mas também a direção do Partido Democrático [centro-esquerda] – consultados por Monti [primeiro-ministro demissionário] – tenha avalizado a escolha do governo, enquanto não se vê até agora nenhuma dissociação clara em relação a Grillo [ministro das relações Exteriores].

Um motivo a mais para convencer a opinião pública que se inspira nos valores da paz da nossa Constituição de quanto é importante dar força política – e uma consistente presença no Parlamento – às forças comunistas, de esquerda e democráticas que hoje se agrupam na chapa de Ingroia. Esta lista eleitoral deverá, a partir deste acontecimento, dar impulso a uma consolidação política e programática à própria orientação contrária à guerra e por uma política externa de paz na Itália, no espírito e na lera da nossa Constituição."
*traduzido do italiano pela redação do Vermelho

Relacionadas:
-Conselho Mundial da Paz: Repúdio à intervenção militar francesa no Mali
-Argélia: Paris diz que sequestro em campo de gás foi 'ato de guerra'
-Operação francesa no Mali marca virada na presidência de Hollande

domingo, 18 de novembro de 2012

Noam Chomsky e colegas denunciam cobertura da mídia sobre Gaza

Para a grande mídia da Europa e América do Norte, e também para a do Brasil, é possível justificar a violência de Israel contra os palestinos. As imagens abaixo, de crianças atingidas pelos mísseis israelenses, e um manifesto de intelectuais liderados pelo linguista estadunidense Noam Chomsky contribuem para abrir os olhos do mundo. 

Do Vi o Mundo 
Em texto manifesto, linguistas denunciam a manipulação do noticiário pela grande imprensa para camuflar o massacre do povo palestino, apelam a jornalistas para que não sirvam de joguetes e para que as pessoas se informem pela mídia independente. Entre os signatários, Noam Chomsky. Confira a íntegra.


A cobertura da mídia sobre Gaza: nós sabemos!

Enquanto países na Europa e América do Norte relembravam as baixas militares das guerras presentes e passadas, em 11 de Novembro, Israel estava alvejando civis. Em 12 de novembro, leitores que acordavam para uma nova semana tiveram já no café da manhã o coração dilacerado pelos incontáveis relatos das baixas militares passadas e presentes.

Não havia, porém, nenhuma ou quase nenhuma menção ao fato de que a maioria das baixas das guerras modernas de hoje são civis. Era também difícil alguma menção, nessa manhã de 12 de novembro, aos ataques militares à Gaza, que continuaram pelo final de semana. Um exame superficial comprova isso na CBC do Canada, Globe and mail, na Gazette de Montreal e na Toronto Star. A mesma coisa no New York Times e na BBC.

Jovens vítimas dos mísseis de Israel. Vergonha mundial. (Reuters)
De acordo com o relato do Centro Palestino para os Direitos Humanos (PCHR, pela sigla em inglês) de domingo, 11 de Novembro, cinco palestinos, entre eles três crianças, foram assassinados na Faixa de Gaza, nas 72 horas anteriores, além de dois seguranças. Quatro das mortes resultaram das granadas de artilharia disparadas pelos militares israelenses contra jovens que jogavam futebol. Além disso, 52 civis foram feridos, seis dos quais eram mulheres e 12 crianças. (Desde que este texto começou a ser escrito, o número de mortos palestinos subiu, e continua a aumentar.)

Artigos que relatam os assassinatos destacam esmagadoramente a morte de seguranças palestinos. Por exemplo, um artigo da Associated Press publicado no CBC em 13 de novembro, intitulado “Israel estuda retomada dos assassinatos de militantes de Gaza”, não menciona absolutamente nada de civis mortos e feridos. Ele retrata as mortes como alvos “assassinados”. O fato de que as mortes têm sido, na imensa maioria, de civis, mostra que Israel não está tão engajado em “alvos” quanto em assassinatos “coletivos”. Assim, mais uma vez, comete o crime de punição coletiva.

Outra notícia de AP na CBC de 12 de novembro diz que os foguetes de Gaza aumentam a pressão sobre o governo de Israel. Traz a foto de uma mulher israelense olhando um buraco no teto de sua sala. Novamente, não há imagens, nem menção às numerosas vítimas sangrando ou cadáveres em Gaza. Na mesma linha, a manchete da BBC diz que Israel é atingido por rajadas de foguetes vindos de Gaza. A mesma tendência pode ser vista nos grandes jornais da Europa.

A maioria esmagadora das notícias enfatizam que os foguetes foram lançados de Gaza, nenhum dos quais causaram vítimas humanas. O que não está em foco são os bombardeios sobre Gaza, que resultaram em numerosas vítimas graves e fatais. Não é preciso ser um especialista em ciências da mídia para entender que estamos, na melhor das hipóteses, diante de relatos distorcidos e de má qualidade e, na pior, de manipulação propositadamente desonesta.

Além disso, os artigos que se referem à vítimas palestinas em Gaza relatam consistentemente que as operações israelenses se dão em resposta ao lançamento de foguetes a partir de Gaza e à lesão de soldados israelenses. No entanto, a cronologia dos eventos do recente surto começou em 5 de novembro, quando um inocente, aparentemente mentalmente incapaz, homem de 20 anos, Ahmad al-Nabaheen, foi baleado quando passeava perto da fronteira. Os médicos tiveram que esperar seis horas até serem autorizados a buscá-lo. Eles suspeitam que o homem pode ter morrido por causa desse atraso. Depois, em 08 de novembro, um menino de 13 anos que jogava futebol em frente de sua casa foi morto por fogo do IOF, que chegou ao território de Gaza em tanques e helicópteros. O ferimento de quatro soldados israelenses na fronteira em 10 de novembro, portanto, já era parte de uma cadeia de eventos que começou quando os civis de Gaza foram mortos.

Nós, os signatários, voltamos recentemente de uma visita à Faixa de Gaza. Alguns de nós estamos agora conectados aos palestinos que vivem em Gaza através de mídias sociais. Por duas noites seguidas, palestinos em Gaza foram impedidos de dormir pela movimentação contínua de drones, F16, e bombardeios indiscriminados sobre vários alvos na densamente povoada Faixa de Gaza . A intenção clara é de aterrorizar a população, e com sucesso, como podemos verificar a partir de relatos dos nossos amigos. Se não fosse pelas postagens no Facebook, não estaríamos conscientes do grau de terror sentido pelos simples civis palestinos em Gaza. Isto contrasta totalmente com a consciência mundial sobre cidadãos israelenses chocados e aterrorizados.

O trecho de um relato enviado por um médico canadense que esteva em Gaza, servindo no hospital Shifa ER no final de semana, diz: ” os feridos eram todos civis, com várias perfurações por estilhaços: lesões cerebrais, lesões no pescoço, tamponamento cardíaco, ruptura do baço, perfurações intestinais, membros estraçalhados, amputações traumáticas. Tudo isso sem monitores, poucos estetoscópios, uma máquina de ultra-som. …. Muitas pessoas com ferimentos graves, mas sem a vida ameaçada foram mandadas para casa para ser reavaliadas na parte da manhã, devido ao grande volume de baixas. Os ferimentos por estilhaços penetrantes eram assustadores. Pequenas feridas com grandes ferimentos internos. Havia muito pouca morfina para analgesia.”

Aparentemente, tais cenas não são interessantes para o New York Times, a CBC, ou a BBC.

Preconceito e desonestidade com relação à opressão dos palestinos não é nada novo na mídia ocidental e tem sido amplamente documentado. No entanto, Israel continua seus crimes contra a humanidade com a anuência plena e apoio financeiro, militar e moral de nossos governos, os EUA, o Canadá e a União Europeia. Netanyahu está ganhando apoio diplomático ocidental para operações adicionais em Gaza, que nos fazem temer que outra operação Cast Lead esteja no horizonte. Na verdade, os novos acontecimentos são a confirmação de que tal escalada já começou, como a contabilização das mortes de hoje que aumenta.

A falta generalizada de indignação pública a estes crimes é uma conseqüência direta do modo sistemático em que os fatos são retidos ou da maneira distorcida que esses crimes são retratados.

Queremos expressar nossa indignação com a cobertura repreensível desses atos pela mainstream mídia (grande imprensa corporativa). Apelamos aos jornalistas de todo o mundo que trabalham nessas mídias que se recusem a servir de instrumentos dessa política sistemática de camuflagem. Apelamos aos cidadãos para que se informem através de meios de comunicação independentes, e exprimam a sua consciência por qualquer meio que lhes seja acessível.

Hagit Borer, linguista, Queen Mary University of London (UK)

Antoine Bustros, compositor e escritor, Montreal (Canadá)

Noam Chomsky, linguista, Massachussetts Institute of Technology, USA

David Heap, linguista, University of Western Ontario (Canadá)

Stephanie Kelly, linguista, University of Western Ontario (Canadá)

Máire Noonan, linguista, McGill University (Canadá)

Philippe Prévost, linguista, University of Tours (França)

Verena Stresing, bioquímico, University of Nantes (França)

Laurie Tuller, linguista, University of Tours (França)

Leia ainda:
Ódio e negócios

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

A caixa-preta do nióbio

Amaury Ribeiro Jr.* 
Promotores de Justiça preparam um arsenal de documentos para abrir a caixa-preta da exploração de nióbio em Araxá. O mineral é explorado com exclusividade pela Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), de propriedade da família Moreira Salles, que fundou o Unibanco.


Privilégios
O Ministério Público de Minas Gerais pretende usar esses documentos para entender como a CBMM tem o privilégio de extrair o mineral, considerado um dos mais estratégicos do mundo, sem licitação, há mais de 40 anos.

Acordo
O Governo de Minas Gerais detém a concessão federal para explorar a jazida, mas arrendou à CBMM sem nenhum critério.


Razões
Em 1972, o Estado constituiu a Companhia Mineradora de Piroclaro de Araxá (Comipa), para gerir e explorar o nióbio, em Araxá. Como não tinha know-how, à época, definiu que arrendaria 49% da produção do nióbio para a CBMM, sem licitação.

Mudança
Depois da investigação e análises da papelada, o Ministério Público quer acabar com farra e obrigar o Governo de Minas a abrir licitação para a exploração deste que é o maior complexo mínero-industrial de nióbio do mundo.

Importância
O nióbio produzido em Araxá responde por 75% da produção mundial. A produção anual é de 100 mil toneladas da liga de ferronióbio. O mineral de Araxá tem reserva para ser explorada por mais de 400 anos.

Contrapartida
Pelo contrato atual, a CBMM concede 25% da participação nos lucros ao Governo do Estado, via Companhia Mineradora de Minas Gerais (Codemig), que incorporou a Comipa.

Sócios
Um consórcio chinês pagou US$ 1,95 bilhão por uma participação de 15% na exploração de nióbio.

Ironia
Em 2005, na CPI dos Correios, o publicitário Marcos Valério, operador do mensalão, fez uma ironia com a caixa-preta do nióbio. Ele declarou que o contrabando de nióbio é que sustentava partidos políticos.

Até Lula
Em 2003, o ex-presidente Lula passou um fim de semana em residência da CBMM em Araxá. A companhia financia projetos de ONGs ligadas a partidos.

Utilizações
O mineral é empregado na produção de aços, especialmente nos de alta resistência e baixa liga, utilizados em automóveis e tubulações para transmissão de gás sob alta pressão.

Avançado
O nióbio também é aplicado em superligas que operam a altas temperaturas, em turbinas de aeronaves a jato e em foguetes espaciais. Existem somente três minas de nióbio em todo o mundo.

Em voga
O mineral ganhou notoriedade em 2010, quando documentos do governo dos Estados Unidos foram vazados pelo site Wikileaks. Eles citavam as minas de nióbio de Araxá e Catalão (GO) no mapa de áreas estratégicas para os EUA.
*originalmente publicado na coluna do jornalista, autor de A Privataria Tucana (Geração, 2011), no Hoje em Dia

terça-feira, 26 de junho de 2012

O GOLPE NO PARAGUAI

[Equipe Educom: esta postagem complementa o que o mesmo Laerte Braga escreveu referindo-se à entrevista que o presidente Mahamoud Ahmadinejad, do Irã, concedeu a jornalistas, semana passada, no Rio, por ocasião da Rio+20]


24/06/12 - Laerte Braga (*)
blog Juntos Somos Fortes

No dia anterior ao golpe branco contra o presidente Fernando Lugo – Paraguai – um outro presidente, o do Irã, Mahamoud Ahmadinejad, em entrevista coletiva que incluiu a mídia alternativa e virtual num hotel no Rio de Janeiro, diagnosticou com precisão o que ocorre hoje no mundo (ver aí adiante: AHMADINEJAD: - "ATACAM E INVADEM OUTROS TERRITÓRIOS PARA ESCRAVIZAR OS POVOS." em http://brasileducom.blogspot.com.br/2012/06/ahmadinejad-atacam-e-invadem-outros.html).

A ordem política, econômica e militar imposta pelos EUA, ao sabor das conveniências de Israel e seus aliados e que se estende tanto aos países do Oriente Médio, como aos da África, da Ásia e América Latina, sempre contra a liberdade, os seres humanos e com claro caráter colonizador.

Em 2008 o governo de Álvaro Uribe, a partir de orientação e dados do governo de Washington, determinou o bombardeio de um acampamento no território do Equador, onde estava o chanceler das FARCs-EP (Forças Armadas Revolucionárias Colombianas – Exército Popular), Raul Reyes. Havia participado de um encontro de forças populares naquele país e se preparava para retornar aos quartéis da guerrilha. Foram assassinados, além de Reyes, dezenas de estudantes de vários países latino-americanos que lá estavam e participaram também do encontro.

A cumplicidade dos militares equatorianos ficou evidente. Se manifestou na passividade com que assistiram ao bombardeio feito pela força aérea colombiana. Evidenciou o caráter da maior parte das forças armadas dos países da América Latina. Não têm compromissos com seus países, mas são subordinadas aos norte-americanos. A esmagadora maioria dos militares brasileiros não é diferente.

Em 2009 o presidente de Honduras, Manuel Zelaya, foi deposto num golpe “constitucional”, dado pela madrugada e com cumplicidade do congresso e da corte suprema de seu país, organizado pelo senador John McCain, republicano. Foi o adversário de Obama nas eleições presidenciais de 2008.

Em todos esses momentos, o golpe contra Lugo, o bombardeio colombiano e o golpe contra Zelaya, o governo dos EUA, de imediato, reconheceu e deu “legitimidade” a essas ações.

Em 2002, semelhante tentativa foi feita na Venezuela contra o presidente Hugo Chávez. Preso numa quinta-feira retornou ao poder no domingo diante de milhões de venezuelanos que, nas ruas de Caracas e de todo o país, exigiam a sua volta. Um referendo popular, em agosto daquele ano, legitimou por maioria absoluta o governo de Chávez e Jimmy Carter, ex-presidente dos EUA e enviado da ONU como observador para o referendo foi obrigado a reconhecer a legitimidade do presidente.

No dia da prisão de Chávez a tevê norte-americana (e a GLOBO aqui, Bonner por pouco não teve um orgasmo no ar) anunciaram que “o povo exigiu a saída de Chávez".

A Colômbia hoje é presidida por Manoel Santos que foi ministro da Defesa de Uribe, é ligado ao narcotráfico (como Uribe). A denúncia foi feita pelo Departamento anti-drogas dos EUA. As forças armadas desse país são inteiramente subordinadas aos norte-americanos e seus “conselheiros”, na prática, a Colômbia é uma colônia, faz parte de um plano de controle da América do Sul denominado Grande Colômbia. Já integra o antigo projeto SIVAM – SISTEMA DE MONITORAMENTO DA AMAZÔNIA -, antes restrito ao Brasil e aos EUA, controlado por empresas privadas e forças militares brasileiras e norte-americanas. O nível de subordinação aos interesses norte-americanos é total. O alvo é a Amazônia em toda a sua extensão.

As vitórias eleitorais de presidentes considerados hostis pelos EUA deflagraram um processo de retomada da América Latina como quintal daquele país. Se já detinham o controle do México e do Canadá (chamam o Canadá de “México melhorado”) essa ordem neoliberal, globalizada por ações políticas, econômicas e militares, se faz presente em quase todo o mundo.

Os pretextos são sempre os mesmos desde tempos passados. Democracia, direitos humanos, etc, etc.

Com o desaparecimento da União Soviética os norte-americanos escancararam seus objetivos. A paz anunciada não veio, pelo contrário, a escalada militar ganhou dimensões de barbárie, a guerra foi privatizada por Bush, a violência é a palavra de ordem dos interesses nazi/sionistas comandados por Israel e com os EUA desintegrados e transformados numa grande corporação terrorista comandada por bancos e grandes empresas, principalmente a indústria armamentista e a do petróleo, vivemos o terror de Estado, o terror capitalista.

A democracia e os direitos humanos foram para o brejo em situações como as guerras do Iraque (destruído), do Afeganistão, da Líbia (mais de cinco mil ações de bombardeios aéreos e um país esfacelado), países como o Paquistão se transformando numa espécie de geléia de interesses de generais com instinto primitivo de barbárie e as chamadas potências emergentes, caso do Brasil, em políticas de equilibrismo e alianças complicadas no padrão dá e toma, ou uma vela a Deus e outra ao diabo. O precário equilíbrio, por exemplo, de democracias montadas sob a tutela e o temor de ações golpistas de militares comprometidos com os EUA, como aconteceu em 1964.
Essa boçalidade se materializa no uso de armas químicas no Iraque, no Afeganistão, na Líbia, em todos os cantos onde se faz necessário (muitos veteranos de guerra padecem de doenças provocadas pelo uso de tais armas), nas pressões econômicas, no campo de concentração de Guantánamo, no massacre constante de palestinos, na tentativa de destruir a revolução islâmica no Irã com denúncias falsas como sempre fazem e fizeram, principalmente, no controle das nações da União Européia, outro grande conglomerado de bancos e corporações.

Para países como Paraguai, o Brasil e outros, se associam a primatas conhecidos como latifundiários. Os donos da terra, hoje no chamado agronegócio.

O mundo privatizado.
Aqui, esse caráter ganhou dimensões plenas no governo do funcionário do Departamento de Estado e da Fundação Ford Fernando Henrique Cardoso. Uma espécie de “sargento Anselmo”, o célebre cabo da Marinha que infiltrado dedurou todos os companheiros. FHC chegou a sargento. Fulgêncio Batista também era sargento (felizmente muitos sargentos lutam a luta popular dentro e fora das forças armadas).

O golpe contra Fernando Lugo está dentro desse contexto. Uma das acusações contra o presidente foi a de “humilhar as forças armadas”.

Lugo ficou ao lado de trabalhadores sem terra vítimas de militares e pistoleiros do latifúndio num conflito agrário, no qual latifundiários brasileiros estão envolvidos (são os donos do Paraguai), junto com empresas como a MONSANTO e a DOW CHEMICAL – o agrotóxico nosso de cada dia.

É impossível humilhar o que não existe. Forças armadas paraguaias? Onde? Bando de generais controlados à distância pelos senhores do mundo, abertos a qualquer grande negócio no mundo do contrabando, do tráfico de drogas, de toda a sorte de estupidez e crime possíveis em função de interesses, aí, pessoais.

Uma elite medieval. Não difere muito do latifúndio brasileiro. Uns grunhem outros nem isso.

O Plano Grande Colômbia, especificamente voltado para a América do Sul tem objetivos imediatos. Derrubar os governos da Venezuela, do Equador e da Bolívia, o controle das reservas de petróleo e gás desses países, isolar o Brasil e impedir que o País consiga avanços efetivos e consolide o processo democrático (mantê-lo sempre na corda esticada, no fio da navalha). Volta do curso tucano das “coisas”, mesmo com o caráter de “capitalismo à brasileira” inventado por Lula e o domínio de tecnologias essenciais longe do alcance dos brasileiros.

Em toda a América Latina, por fim à revolução cubana, derrubar Daniel Ortega na Nicarágua e impedir que governos considerados hostis aos interesses da corporação terrorista, ISRAEL/EUA TERRORISMO “HUMANITÁRIO” S/A sejam eleitos.

A fórmula encontrada para derrubar Zelaya se manifestou agora no Paraguai.

E ainda, no Brasil, temos um chanceler de sobrenome Patriota, que vem a ser um dos mais terríveis mísseis norte-americanos. Não é o caso do chanceler, é apenas um funcionário obediente da corporação terrorista num governo de puro equilibrismo. E nem deve saber direito o que acontece, ou o que é, tamanha sua dimensão anã como diplomata.

Em relação ao golpe paraguaio, só foi possível com a debilidade de nossa política externa e a falta de informações precisas e corretas do governo.

Se a proposta da presidente Dilma de expulsar o país do MERCOSUL e adotar sanções severas for real, ótimo.

Caso contrário, breve circulando pelas ruas da cidade de Eduardo Paes os novos modelos de diligências da Wells Fargo, com espetáculos de clones/drones de Búfalo Bil em todas as paradas.

Como afirma com correção a professora Nezah Cerveira, é a “Operação Condor IV” em curso.

Há uma guerra total em curso afirma o presidente do Equador Rafael Corrêa. A resistência não será nos gabinetes fechados, via de regra cúmplices diretos ou por omissão dessa selvageria. Será nas ruas, na organização popular.

Ou, todos aprendendo inglês e treinando para carregar malas dos colonizadores. O velho “bwana” dos tempos de Tarzã.

(*) jornalista

domingo, 29 de abril de 2012

A QUEM INTERESSAM OS CONFLITOS NA AMÉRICA DO SUL?

28/04/2012 - Laerte Braga (*)
Original no blog Juntos Somos Fortes



A história real dos países latino-americanos, especialmente os sul-americanos é contada em regime de conta gotas, uma forma de fugir do oficialismo e do ufanismo que historicamente as elites buscam vender desde os bancos escolares.

E há uma explicação simples para isso. As elites econômicas (cidade e campo) da América do Sul não têm uma identidade nacional, mas reportam-se aos modelos europeu e norte-americano, vale dizer, cingem-se às normas do capitalismo internacional.


É comum, por exemplo, contar os feitos heróicos de brasileiros na guerra contra o Paraguai a pintar Solano Lopez como um ditador sem entranhas.

A realidade só é encontrada em publicações independentes que mostram que o País entrou em guerra com o Paraguai a soldo da Inglaterra – da qual estava afastada, mas o dinheiro fala mais alto – e porque o Paraguai de Solano Lopez afetava os negócios dos britânicos. O governante paraguaio implementava um programa de reforma agrária, concorria com as indústrias têxteis dos britânicos e afetava os negócios” do mate. Fomos apenas o instrumento do poder imperial da Grã Bretanha. Não houve patriotismo algum no confronto.

Para registro, os Estados Unidos, à época, já buscando hegemonia junto ao império britânico se opôs ao Brasil e a seus aliados.

Os governos e forças armadas comprados pelos ingleses.


As Ilhas Malvinas, território argentino, até hoje são mantidas sob controle militar do falido império de sua majestade Elizabeth II e num flagrante desrespeito às leis internacionais, mantêm na região submarinos com armas nucleares, aí já noutra conjuntura, a que envolve os Estados Unidos, antiga colônia britânica e hoje proprietário do outrora império “onde o sol não se põe”.

Quando Nixon disse que o Brasil arrastaria a América Latina para onde se inclinasse, estava levando em conta o nível de desenvolvimento de nosso País, seu tamanho continental e justificando o apoio de seu governo à ditadura militar que encharcou de sangue o território nacional e preserva até hoje intocada em boa parte a barbárie militar.

A exceção do movimento tenentista, que mesmo assim se dissolveu em boa parte absorvido pela ditadura Vargas, nossas forças armadas são forças auxiliares do poder maior, sem identidade, e de uma polícia maior e melhor qualificada da grande potência de hoje. Estamos no Haiti sem saber por quê, em vias de irmos à Síria para fazer não sei o quê e mantendo um fragata na frota de “paz” nas proximidades do estreito de Ormuz para garantir os interesses das companhias que transformaram os EUA em conglomerado terrorista ao lado de Israel.

Máquina de guerra
O governo de Lula não privatizou setores essenciais, mas abriu as portas do País ao nazi/sionismo no tal tratado bi-lateral de livre comércio com Israel. São os donos dos setores estratégicos dos Brasil. Governos como o do presidente Chávez, ou do presidente Evo Morales, do presidente Rafael Corrêa, de Cristina Kirchner, de Daniel Ortega não interessam ao grande irmão. Promovem a reforma agrária, o fim do analfabetismo, estabelecem políticas públicas de participação popular, constroem habitações de qualidade para as pessoas, democratizam as relações do Estado com o cidadão, a despeito de uma ou outra limitação. Abrem caminhos para uma revolução popular a partir da consciência política.

Cuba desafia os EUA desde 1959 e se mantém heroicamente a despeito de todas as tentativas golpistas e do bloqueio imposto pelo conglomerado ISRAEL/EUA TERRORISMO S/A.

A Colômbia no entanto é o caso mais grave.

Em guerra civil há anos o país está mergulhado num regime de terror e barbárie e é hoje o maior produtor de cocaína do mundo – o governo não tem interesse na paz, a guerra favorece os grupos produtores da droga e o presidente, todos são meros quadrilheiros ao lado de militares e latifundiários, os chefes dos grandes cartéis. No país são frequentes os assassinatos de lideranças de oposição, sindicalistas, camponeses, há mais de 10 mil presos políticos e milhares de assessores militares norte-americanos, que controlam polícias, forças armadas e governo, além dos grupos paramilitares formados por latifundiários e pistoleiros de grandes conglomerados, os principais controladores da produção e distribuição de droga.

O próprio jornal brasileiro (brasileiro?) O GLOBO, noticiou que o traficante Fernandinho Beira-Mar havia sido preso com as FARC-EP, para anos depois num canto de página admitir que Beira-Mar foi entregue pelos paramilitares numa tentativa de minimizar os conflitos com o Brasil em torno do bandido.

A ex-senadora Ingrid Betancourt, prisioneira de guerra durante anos das FARC-EP, quando liberada estava em perfeita integração com a guerrilha, tinha um filho com um líder guerrilheiro, filho que abandonou – fato denunciado por sua secretária – e foi tentar o prêmio Nobel da Paz patrocinada por uma indústria de cosméticos para mostrar que os anos na selva não a envelheceram.

É a história vendida pela mídia de mercado, fabricada na sociedade do espetáculo, com o objetivo de transformar o ser humano em zumbi diante de um projeto de poder que é mundial. Ao perceber que um controle como o que exercem na Colômbia – até porque o tráfico de drogas paga os custos da guerra e com sobras, já que a guerra hoje é privatizada, empresas cuidam do “negócio”, não seria possível no Brasil, os norte-americanos criaram o chamado PLANO GRANDE COLÔMBIA, que inclui parte do Brasil, a Amazônia, enquanto tentam, através de um governador provincial na Argentina, a instalação de uma base militar para controle total da América do Sul.


Na piedosa prece que Obama faz todos os dias a morte de Chávez é um pedido que a mídia dos EUA não esconde.

A Colômbia hoje é sócia do Brasil no antigo projeto SIVAM – monitoramento aéreo da Amazônia –, ao lado dos EUA e aviões de fabricação brasileira, mas capital e tecnologia norte-americanos (ao privatizar a EMBRAER FHC abriu mão de dispormos de tecnologia nossa no campo). Detêm informações estratégicas sobre nosso País, inclusive e principalmente sobre nossas reservas minerais estratégicas, caso do nióbio.

Marchamos para deixarmos de ser uma nação e caminhamos celeremente para o formato conglomerado da chamada nova ordem econômica, criada com o fim da União Soviética. Lula inventou - frase do secretário geral do PCB Ivan Pinheiro, “o capitalismo a brasileira".

Só que os donos são os norte-americanos e grupos sionistas (controlam a indústria bélica brasileira). Como leite em pó instantâneo estamos nos dissolvendo na obsessão da guerra cambial que custou o poder a Kadafi.

Um estudo das Nações Unidas feito na década de 70 mostra que a América do Sul é uma futura área de conflitos. Não são conflitos provocados pelos povos sul americanos, mas pelos interesses de elites políticas, econômicas do campo e da cidade que controlam o País sem que o governo reaja, pelo contrário, se deixa levar pela crença de potência de ilusão. Estamos sendo engolidos, tragados nessa voracidade falida do capitalismo, mas montado em milhares de ogivas nucleares.


Um Eike Batista, um Daniel Dantas, um FHC, um Serra, um Alckmin, um Aécio (já apareceu uma prima de Cachoeira nomeada pelo ex-governador do bafômetro ou corruptômetro) e os políticos que controlam, parte expressiva do Poder Judiciário, tudo isso nos transforma definitivamente numa república de bananas, onde um Brilhante Ulstra tortura, assassina e permanece impune e a mídia faz e fala o que bem entende. Um banqueiro de jogo de bicho faz tremer a república. Coloca na berlinda um governador corrupto como Sérgio Cabral e abre perspectiva para outro criminoso Anthony Garotinho, que chega em nome do “senhor.”

Que república?


Somos uma democracia consentida. O Código Florestal nos condena a sermos um futuro deserto e a reforma agrária vai para o brejo. Mas somos uma potência, só que de ilusão. Não há saída dentro do processo político vigente, dentro do jogo sujo das eleições financiadas por empresas privadas, por bancos e latifundiários. Ou vamos às ruas e viramos essa mesa para rearrumá-la segundo a vontade popular, que tem que ser despertada, está anestesiada pela mídia, ou vamos de fato virar apenas um departamento do PLANO GRANDE COLÔMBIA.


Esse é o desafio que as forças populares enfrentam. Os conflitos aqui interessam aos donos para que sejamos sempre o gado marcado que fala José Ramalho. Só isso, mais nada.

(*) Laerte Braga é jornalista e reside em Juiz de Fora. Colabora no blog Juntos Somos Fortes