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segunda-feira, 22 de julho de 2013
Das manifestações de rua, o que menos se salva é o Brasil
Não se tem claramente a quem interessam as manifestações. O roteiro ainda é confuso. Quando tudo parecia se encaminhar para o civismo empulhador, igual ao de 64, eis que a mídia hegemônica entrou também no repertório das vaias, dos xingamentos e até das pedradas.
Enio Squeff* - Carta Maior
Uma questão que quase ninguém sabe responder refere-se ao futuro das manifestações no Brasil. Na França revolucionária do princípio do século XIX, um jovem capitão, instado pelas autoridades do Diretório a fazer cessar os motins de rua ( que tinham dado na queda da Bastilha), usou o método que lhe parecia mais consentâneo com o momento que ele encarava como uma guerra. Foi assim, com canhões, sua arma preferida, que Napoleão Bonaparte começou a sua ascensão vertiginosa rumo ao poder na França. Os canhonaços que pegaram a turba desprevenida, nas então estreitas ruas de Paris, causaram dezenas de mortos entre os revoltosos, mas a nova ordem burguesa estava começando a ser, por fim, solidificada na França.
No Brasil, felizmente, não se cogitam em canhões, mas o encanto da grande imprensa com as "ações cívicas" (sic) das manifestações começa cada vez mais a ceder ao temor. Já agora as sagradas propriedades privadas estão sendo atingidas. E os embuçados, apesar dos disfarces, parecem não esconder a sua origem; não são mais os bem comportados jovens de classe média. Muitos certamente provêm dos morros e das periferias das grandes cidades. Este o perigo inadivinhado.
Em princípio, a ameaça parece ainda informe. Protesta-se contra o Estado, sob a forma, por enquanto escamoteada, de ataques aos governos, mas os alvos tanto podem ser uma câmara dos vereadores, como a de Porto Alegre, ocupada até bem pouco durante oito dias por manifestantes, quanto a casa do governador do Rio, assediada por populares. Em teoria, na visão dos editores da grande imprensa, seriam protestos contra a situação - notadamente os políticos do PT, do PMDB e do PDT; mas as depredações não têm se mantido no estrito cerco ao Estado. De passagem para uma ou outra instituição estatal, alguns manifestantes devidamente encapuzados, tidos agora como "arruaceiros", atacam bancos, butiques, casas de comércio - não exatamente em conformidade com a propalada "festa cívica"que a mídia flagrou - e consagrou - no início das manifestações. Aliás, atacar a casa do governador do Rio, e não o palácio, individualiza a questão ao linchamento público. Supondo-se que o sr. Sérgio Cabral não tivesse sido eleito, mesmo assim seu afastamento físico do governo, a bordoadas, não deixaria de ser uma violência inaceitável.
Que fazer? A esta pergunta que Lênin tomou de empréstimo do livro de Tchernichevsky, os políticos e analista, ou evitam responder - por temerem seu próprio temor; ou muitos vaticinam um movimento revolucionário, por enquanto difuso, mas com amplas possibilidades de se espraiarem de Norte a Sul, de Leste e Oeste, num país continental, paradoxalmente unificado, do Oiapoque ao Chuí, na ânsia de modificar algumas coisas. Manifestações que, entrementes, não parecem ceder às palavras de Lampedusa - de que alguma coisa deve mudar para que tudo permaneça como está.
O medo generalizado, de qualquer modo, parece se centrar no fato de que a canção de protesto de Vinícius de Moraes e Antônio Carlos Jobim, que cantavam há mais de 50 anos, que "o morro não tem vez que o que ele fez já é demais" dê-se, por fim, como profetizava a canção de que "se derem vez ao morro, toda a cidade vai cantar". Não é bem de canto que se trata, como se sabe. E a ameaça surpreendente parece ser de que a "vez do morro" , ou das periferias, se alastre não como prova de que as massas não tem vez, mas de que, ao lhes ser dado um pouco, como aconteceu nos últimos anos, reclamem muito mais, como é de seu direito. Foi isso, em síntese, que constatou o presidente Lula em seu artigo no "New York Times". No fundo, porém, a grande questão já não é essa , mas até quando a extensão das manifestações exigirão bem mais do que até agora está sendo prometido. De resto, é a confusão.
Uma reação conservadora, que se estranha e que desnuda o persistente bacharelismo brasileiro, é a defesa inexplicável do mercado de trabalho dos médicos. Ao se colocar contra a contratação de médicos de outros países - especialmente dos cubanos (cujo país detém os melhores índices de saúde do Continente Sul Americano) - muitas entidades médicas, parecem mirar um mercado inexistente: se os jovens médicos, recém formados, não se mostram inclinados a encarar os cafundós do Brasil, a quem a instalação de médicos estrangeiros nesses cafundós irá prejudicar?
Sob este aspecto, os reclamos das ruas formam um compósito difícil de deslindar. Ao jovem Napoleão impunham-se duas opções: ou o morticínio para manter a ordem - que foi o que ele fez e faria muito mais, com toda a Europa - ou guardar-se de não interferir nas manifestações. Agiu como general e futuro Imperador - nem mais nem menos do que à força. No caso brasileiro, além de felizmente, não se terem napoleões à vista, tem-se uma complexidade que atinge a todos, à direita e à esquerda. Os mesmos manifestantes que atiram pedras contra a casa do governador do Rio - inimigo das organizações Globo - mostram-se igualmente dispostos a quebrar a fachada do edifício que abriga a emissora e seu complexo midiático. Ao que fica, todos os protagonistas do Brasil, estão claramente isolados no aproveitamento do clamor das ruas. Se a aprovação da presidenta Dilma despencou ( não é essa a palavra da vez para a mídia hegemônica?), o prestígio dos jornais, revistonas e estações de TV, são "democraticamente" atingidos, quando não com pedras e coquetéis molotov, quase sempre com vaias e xingamentos.
Ou seja, no começo tudo parecia à feição das forças reacionárias do país: a despolitização da política é o melhor que o obscurantismo persegue em todos os tempos, para impor a ordem que só interessa aos ditadores, monopolistas da política. Foi assim em 64: naquele ano fatídico, dizia-se que, por não serem políticos, os militares fariam um governo sem a malfadada política. O que se viu não só foi o pior - de que ainda hoje nos ressentimos - mas o mais pesaroso: a política entrou nos quartéis, sem que saibamos ainda hoje, quem realmente mandou no Brasil a partir de então. Um dado significativo, a propósito, que não mereceu grandes destaques na imprensa, foi a votação do ato de repúdio no Congresso, à espionagem norte-americana. Não por coincidência, os que votaram contra o documento, foram os representantes do agro-negócio e os chamados "Democratas", isto é, a fina flor do reacionarismo e do atraso no Brasil. Notável, porém, foi a recusa do ex-capitão Bolsonaro de assinar o ato de repúdio: como defensor do golpe de 1964, ele deixou claro a quem os militares daqueles tempos prestavam continência. Não era propriamente à bandeira brasileira.
No mais, fica-se no aguardo: não se tem claramente a quem interessam as manifestações. O roteiro ainda é confuso. Quando tudo parecia se encaminhar para o civismo empulhador, igual ao de 64, eis que a mídia hegemônica entrou também no repertório das vaias, dos xingamentos e até das pedradas. Ao contrário do que se pensava, não parece que é só a política brasileira que está no alvo das manifestações de Junho. É o Brasil, como um todo. E aí, hajam analistas e análises para explicar o fenômeno.
Enio Squeff é artista plástico e jornalista.
fonte:http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=6206
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terça-feira, 25 de junho de 2013
A grande oportunidade
O Brasil está diante de uma grande oportunidade diante da iniciativa da presidenta Dilma, que reconheceu a energia democrática que vinha das ruas. Esse movimento pode ser o motor do aprofundamento da democracia no novo ciclo político que se aproxima. Caso contrário, a direita tudo fará para que o novo ciclo seja tão excludente quanto os velhos ciclos que durante tantas décadas protagonizou. E não esqueçamos que terá a seu lado o big brother do Norte, a quem não convém um governo de esquerda estável em nenhuma parte do mundo.
Por Boaventura de Sousa Santos.
A história ensina e a atualidade confirma que não é nos períodos de mais aguda crise ou privação que os cidadãos se revoltam contra um estado de coisas injusto, obrigando as instituições e o poder político a inflexões significativas na governança. Sendo sempre difíceis as comparações, seria de esperar que os jovens gregos, portugueses e espanhóis, governados por governos conservadores que lhes estão a sequestrar o futuro, tanto no emprego como na saúde e na educação, se revoltassem nas ruas mais intensamente que os jovens brasileiros, governados por um governo progressista que tem prosseguido políticas de inclusão social, ainda que minado pela corrupção e, por vezes, equivocado a respeito da prioridade relativa do poder económico e dos direitos de cidadania.
Sendo esta a realidade, seria igualmente de esperar que as forças de esquerda do Brasil não se tivessem deixado surpreender pela explosão de um mal-estar que se vinha acumulando e que as suas congêneres do sul da Europa se estivessem a preparar para os tempos de contestação que podem surgir a qualquer momento. Infelizmente assim não sucedeu nem sucede. De um lado, uma esquerda no governo fascinada pela ostentação internacional e pelo boom dos recursos naturais; do outro, uma esquerda em oposição acéfala, paralisada entre o centrismo bafiento de um Partido Socialista ávido de poder a qualquer preço e o imobilismo embalsamado do Partido Comunista.
O Bloco de Esquerda é o único interessado em soluções mais abrangentes mas sabe que sozinho nada conseguirá.
Mas a semelhança entre as esquerdas dos dois lados do Atlântico termina aqui. As do Brasil estão em condições de transformar o seu fracasso numa grande oportunidade. Se as aproveitarão ou não, é uma questão em aberto, mas os sinais são encorajadores. Identifico os principais. Primeiro, a Presidente Dilma reconheceu a energia democrática que vinha das ruas e praças, prometeu dar a máxima atenção às reivindicações dos manifestantes, e dispôs-se finalmente a encontrar-se com representantes dos movimentos e organizações sociais, o que se recusara fazer desde o início do seu mandato. Resta saber se neste reconhecimento se incluem os movimentos indígenas que mais diretamente têm afrontado o modelo de desenvolvimento, assente na extração de recursos naturais a qualquer preço, e têm sido vítimas constantes da violência estatal e pára-estatal e de violações grosseiras do direito internacional (consulta prévia, inviolabilidade dos seus territórios).
Segundo, sinal da justeza das reivindicações do Movimento Passe Livre (MPL) sobre o preço e as condições de transportes, em muitas cidades foram anulados os aumentos de preço e, nalguns casos, prometeram-se passes gratuitos para estudantes. Para enfrentar os problemas estruturais neste setor, a Presidente prometeu um plano nacional de mobilidade urbana. Sendo certo que as concessionárias de transportes são fortes financiadoras das campanhas eleitorais, tais problemas nunca serão resolvidos sem uma reforma política profunda. A Presidente, ciente disso e do polvo da corrupção, dispôs-se a promover tal reforma, garantindo maior participação e controlo cidadão, e mais transparência às instituições. Reside aqui o terceiro sinal.
Creio, no entanto, que só muito pressionada é que a Presidente se envolverá em tal reforma. Está em vésperas de eleições, e ao longo do seu mandato conviveu melhor com a bancada parlamentar ruralista (com um poder político infinitamente superior ao peso populacional que representa) e com suas agendas do latifúndio e da agroindústria do que com os setores em luta pela defesa da economia familiar, reforma agrária, territórios indígenas e quilombolas, campanhas contra os agrotóxicos, etc. A reforma do sistema político terá de incluir um processo constituinte, e nisso se deverão envolver os sectores políticos das esquerdas institucionais e movimentos e organizações sociais mais lúcidos.
O quarto sinal reside na veemência com que os movimentos sociais que têm vindo a lutar pela inclusão social e foram a âncora do Fórum Social Mundial no Brasil se distanciaram dos grupos fascistoides e violentos infiltrados nos protestos e das forças políticas conservadoras (tendo ao seu serviço os grandes meios de comunicação), apostadas em tirar dividendos do questionamento popular. Virar as classes populares contra o partido e os governos que, em balanço geral, mais têm feito pela promoção social delas era a grande manobra da direita, e parece ter fracassado. A isso ajudou também a promessa da Presidente de cativar 100% dos direitos da exploração do petróleo para a educação (Angola e Moçambique, despertem enquanto é tempo) e de atrair milhares de médicos estrangeiros para o serviço unificado de saúde (o SUS, correspondente ao SNS português).
Nestes sinais reside a grande oportunidade de as forças progressistas no governo e na oposição aproveitarem o momento extra-institucional que o país vive e fazerem dele o motor do aprofundamento da democracia no novo ciclo político que se aproxima. Se o não fizerem, a direita tudo fará para que o novo ciclo seja tão excludente quanto os velhos ciclos que durante tantas décadas protagonizou. E não esqueçamos que terá a seu lado o big brother do Norte, a quem não convém um governo de esquerda estável em nenhuma parte do mundo, e muito menos no quintal que ainda julga ser seu.
Fonte: Carta Maior http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=22247&editoria_id=4
Leia também: http://osamigosdopresidentelula.blogspot.com.br/2013/06/governadores-e-prefeitos-aprovam.html
domingo, 3 de julho de 2011
ITAMAR FRANCO
Laerte Braga
A primeira eleição disputada pelo ex-presidente Itamar Franco foi em 1958. Candidato a vereador pelo extinto PTB de João Goulart. Vinha de lutas estudantis no Diretório Acadêmico da Faculdade de Engenharia, antes mesmo de JK criar a Universidade Federal de Juiz de Fora, em 1960.
Perdeu a eleição.
O diretório municipal do PTB de Juiz de Fora começava a despontar como um dos mais importantes do País. Nascia ali a liderança de Clodesmith Riani, líder sindical e presidente do primeiro embrião de uma central de trabalhadores. Presidente da CNTI – CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES NA INDÚSTRIA –, a mais poderosa organização sindical do Brasil, criou com outros lideres o CGT – COMANDO GERAL DOS TRABALHADORES –, logo desdobrado em comandos estaduais e comandos municipais.
Clodesmith Riani, vivo e ativo até hoje, atraiu para o PTB boa parte das lideranças estudantis da época (as que não estavam no PCB) e muitos intelectuais. Peralva de Miranda Delgado, anos depois de cassado pela ditadura militar alcançou expressivas funções na Universidade Gama Filho, no Rio. Nilo Álvaro Soares, juiz do trabalho, jornalista, Sebastião Marsicano Ribeiro, mais tarde reitor da Universidade Federal de Juiz de Fora e nessa tentativa de construir um partido à esquerda juntando movimento sindical – do qual era líder inconteste em sua cidade e no País – acabou levando Itamar para o PTB.
Em 1962, dois anos antes do golpe militar de 1964, Itamar disputou a vice-prefeitura. As eleições de prefeito e vice prefeito eram distintas. Tornou a ser derrotado, mas começou a construir ali e a partir dali o conceito de administrador sério e competente.
Ademar Resende Andrade, um engenheiro eleito pela segunda vez para a Prefeitura de Juiz de Fora levou Itamar para um setor que cuidava da água da cidade e o ex-presidente criou o DEPARTAMENTO DE AGUA E ESGOSTO, hoje CESAMA – COMPANHIA DE SANEAMENTO E MEIO AMBIENTE – proporcionando um processo de modernização e planejamento para o futuro.
E foi como prefeito, eleito em 1966, que construiu a segunda adutora e dali para a frente outras quatro cinco por outros prefeitos, a um ponto tal que a totalidade de Juiz de Fora tem água potável (apesar das tentativas de privatização do setor pelo bandido que atualmente ocupa a Prefeitura, um tucano).
A morte do ex-presidente pode facilitar o caminho. Pois o que havia de honestidade pessoal em Itamar não existe em algumas figuras do seu grupo, inclusive o prefeito atual e o ex-presidente da COPASA (companhia estadual de águas) e ex-presidente Itaipu, pai do possível candidato do grupo a prefeito, o deputado estadual Bruno Siqueira.
A eleição de Itamar para a Prefeitura de Juiz de Fora foi uma espécie de marco. Sepultou-se um ciclo em que se revezavam no governo o engenheiro Ademar Andrade e o empresário Olavo Costa.
E a candidatura de Itamar só foi possível, em 1966, numa sublegenda – artifício criado pela ditadura – por conta do apoio de Tancredo Neves junto ao diretório estadual então sob a presidência do senador Camilo Nogueira da Gama, oriundo do antigo PTB.
Foi Tancredo quem viabilizou a sublegenda. A esquerda do MDB não aceitava a outra candidatura e enxergou em Itamar a perspectiva de vitória. Lideranças sindicais como Laís Veloso, Onofre Corrêa Lima, figuras do porte de Murílio Avelar Hingel, acabaram por sensibilizar Tancredo e mostrar-lhe a necessidade de uma sublegenda para assegurar a vitória nas eleições municipais.
O governo de Itamar significou o início da história do planejamento na administração municipal em Juiz de Fora. E de tal ordem alcançou êxito, que Mário Andreazza (então ministro dos Transportes do governo militar) fez de tudo para levá-lo para a ARENA.
À época a lei que extinguiu o antigo IMPOSTO SOBRE VENDAS E CONSIGNAÇÕES e criou o IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS – ICM, o s veio depois) acabou beneficiando prefeituras em todo o País, os recursos eram mais abundantes e isso possibilitou a Itamar a realização de obras de infra estrutura e avanços na educação até então desconhecidos de grande parte da população juizforana.
O êxito foi tanto que acabou elegendo o seu sucessor com mais votos que todos os demais candidatos juntos, tanto da ARENA, como do MDB. O engenheiro Agostinho Pestana, já falecido e pai do atual deputado tucano Marcus Pestana.
O mandato era de dois anos, a ditadura queria acabar com a coincidência entre eleições municipais e eleições estaduais e federais e arbitrariamente mudou a lei. José Sarney, a lamentável figura que preside o Senado e é proprietário do Maranhão, quer coincidir tudo para ter vereadores como cabos eleitorais gratuitos, na reforma de brincadeira que estão chamando de reforma política..
Dois anos depois tarde Itamar Franco volta à Prefeitura de Juiz de Fora numa das mais dramáticas eleições da história da cidade. O favoritismo absoluto vai caindo com o curso da campanha e vence a eleição por pouco mais de 300 votos num universo total de mais de cem mil eleitores (à época, hoje 340 mil) e derrota um então desconhecido Mello Reis, vereador da ARENA.
Em 1974 Tancredo Neves, decisivo também na vitória de 1972 – onde surge a liderança do então deputado estadual Tarcísio Delgado que carrega a campanha nas costas junto com Murílio Hingel, mais tarde ministro da Educação, seduz Itamar com a candidatura ao Senado contra José Augusto da ARENA e que havia assumido a vaga na morte de Milton Campos.
Itamar vacila até o último minuto sobre se aceita ou não e ficou célebre o episódio do relógio atrasado (o presidente da Câmara Municipal, vereador Valdecir de Oliveira manda atrasar o relógio por dez minutos antes da meia noite, para dar mais tempo a Itamar para decidir se renunciava ou não para disputar o Senado).
Itamar renuncia e começa sua escalada nacional. É eleito em meio à enxurrada de vitórias do MDB em todo o País (dezessete ao todo).
Começa a afastar-se de Tancredo de olho numa eventual eleição direta para o governo do Estado em 1978. A ditadura afasta essa hipótese, transfere as diretas para 1982 e com o fim do bipartidarismo Itamar permanece no PMDB, vira candidato a governador enquanto Tancredo funda o PPP – PARTIDO POPULAR PROGRESSISTA – e com apoio de seu arqui adversário Magalhães Pinto torna-se candidato ao governo. Elizeu Resende era o candidato da ARENA, então transformada em PDS.
Ao perceber que divisão do antigo MDB favorecia a ditadura Ulisses e Tancredo vão ao STF – SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – e fundem os dois partidos, MDB e PPP. A decisão fora tomada depois do governo federal vincular o voto de cabo a rabo, manobra do ministro Leitão de Abreu.
Itamar a duras penas é convencido a tentar a reeleição para o Senado. Faz exigências que são aceitas e gera um episódio que entra para o folclore da política mineira e brasileira. Não queria outro candidato em sublegenda, acabou aceitando e impôs ser o mais votado na convenção do PMDB. Simão da Cunha, um ex-deputado da UDN é o mais votado e Renato Azeredo (íntegro, o contrário do pústula Eduardo Azeredo, seu filho), pergunta a Tancredo “como vamos fazer?” Tancredo responde – “coloque os votos do Simão para o Itamar na ata e os do Itamar para o Simão que eu converso e resolvo tudo” –. Dito e feito.
Ao perceber que suas chances para o governo estadual eram mínimas em 1990, havia sido derrotado por Newton Cardoso (quadrilheiro que fez plantão na política mineira), que a reeleição para o Senado seria duvidosa, num gesto surpreendente aceita ser vice de Collor de Mello nas eleições presidenciais de 1989.
Pela primeira vez é derrotado em Juiz de Fora. Lula vence as eleições no segundo turno na cidade de Itamar.
Vira vice-presidente e em meio à crise deflagrada com as acusações ao louco que ocupava a presidência, Collor de Mello, acaba também uma grande incógnita que José Sarney, seu ex-inimigo resolve. Pega Itamar pelo braço, leva-o à casa de Roberto Marinho (criador de Collor e proprietário do tresloucado) no Cosme Velho no Rio, oferece garantias que nada será mudado nas comunicações e no dia seguinte a GLOBO joga Collor no lixo, em poucos dias Itamar vira presidente.
Sendo um homem honesto, nunca meteu a mão no bolso de ninguém e nem em dinheiro público, não tinha base política sólida, mas um grupo complicado de figuras leais e íntegras e outras nem tanto assim, pelo contrário, na verdade um grupo de amigos, muitos deles de infância e juventude, acaba seduzido pelo maior cínico da política brasileira Fernando Henrique Cardoso, uma espécie de câncer que continua corroendo o País e hoje é objeto de adoração do simulacro de presidente, Dilma Roussef.
Itamar foi íntegro, mas não conseguiu mais que ser um projeto pessoal. Orientava-se a partir de sua própria bússola, seus instintos políticos apurados e foi responsável também por um episódio que deixou ACM com as calças às mãos.
Antônio Carlos Magalhães (outro pústula da política brasileira) governava a Bahia e fez denúncias de corrupção no governo Itamar. O então presidente o desafiou a apresentar as provas num encontro do Planalto. ACM foi e quando chegou às portas do gabinete presidencial estavam abertas, os ministros lá estavam jornalistas e possesso ACM não conseguiu mais que apresentar recortes de jornais, acabou desmontada uma das muitas farsas que protagonizou na política.
FHC foi um episódio dramático para Itamar. O ex-presidente tinha consciência do caráter de transição de seu governo e tentou reunir figuras consideradas de grande porte na política nacional em seu Ministério, além de outras de seu grupo pessoal. Chamou FHC para o Itamaraty, levou-o ao Ministério da Fazenda e o tucano, que sequer seria candidato à reeleição ao Senado (míngua de votos), mas deputado federal, no seu veneno insidioso, seu caráter deformado, sua absoluta falta de dignidade, apropriou-se do Plano Real, virou candidato a presidente num acordo que previa a candidatura de Itamar em 1998 e meteu-lhe a faca pelas costas, coisa que faz rotineiramente com quem se oponha a seus poderes divinos.
No final de sua carreira, a volta ao Senado, fica uma sensação inexplicável do apoio a José Serra no segundo turno e a virulência das críticas a Lula e ao governo de Dilma nesses seis primeiros meses (embora o governo seja uma lástima). Ligado a Aécio, foi eleito arrastado pelo ex-governador de Minas, havia feito criticas duras a FHC e Serra, capitulando no segundo turno.
Acredita-se que um dos bandidos que integraram o esquema de seu governo na Câmara, Roberto Freire, ex-pernambucano e agora paulista, tenha sido o responsável por isso. Freire foi seu líder de governo.
Em 1998, por pouco não complica o golpe de FHC, a reeleição comprada a peso de ouro, ao tentar ser o candidato do PMDB. FHC pagou um preço absurdo – dinheiro mesmo, cargos, etc – a bandidos notórios como Iris Resende, Michel Temer, etc.
E em janeiro de 1999, eleito governador de Minas decreta a moratória das dívidas do Estado e coloca em risco, mais uma vez, todo o processo neoliberal de FHC.
Como disse um jornalista o ex-presidente leva mágoas em sua morte, mas paga o preço do caráter solitário, do temperamento difícil. O exemplo que deixa é o da honestidade pessoal.
A frase “este rapaz é um bom moço, mas tem o hábito de guardar o ódio no congelador”, foi pronunciada por Tancredo Neves, logo após ser eleito governador em 1982 e ao receber as indicações para alguns cargos no governo do então senador reeleito Itamar Franco. Tancredo olha os nomes, vê apenas amigos de Itamar, o restrito círculo de Juiz de Fora, pede-lhe nomes de expressão e Itamar furioso diz aos jornalistas que Tancredo faltara com a verdade nos acordos firmados antes das eleições.
Não foi bem assim.
Em 1984 Itamar mostra sua mágoa com Tancredo e anuncia que não pretende votar no mineiro para presidente, mantém-se fiel à decisão de não aceitar eleições indiretas. A disputa entre Tancredo e Maluf estava ainda indecisa e a certa altura, quando Tancredo arremata a eleição, mostra que vai vencer, Itamar pede a Hélio Garcia que marque um encontro onde possa declarar seu voto a Tancredo.
O encontro foi marcado no aeroporto da Pampulha em Belo Horizonte e Tancredo chega cinco minutos antes do seu vôo. Cumprimenta Itamar, agradece o apoio e diz que tem que sair correndo para embarcar. Dá o troco à sua maneira.
Numa certa medida Itamar foi um solitário na política brasileira. E benfazeja lhe foi a sorte, mas muito também seus instintos.
Os escândalos de cumprimentar uma atriz sem calcinha num desfile carnavalesco no Rio, namoros, etc, foram superdimensionados pela mídia sempre à cata de besteiras para distrair a manada do principal. O governo de FHC foi tranquilamente uma espécie de Sodoma e Gomorra e a imprensa se calou, devidamente comprada.
Itamar era isso, nada além disso.
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