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segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Tempos sombrios

14/01/2014 - Tempos sombrios para os povos indígenas
- Oiara Bonilla - blogue Amazônia Real

Os ataques aos povos indígenas começaram 514 anos atrás, e sempre foram pautados pela lógica de expansão territorial e econômica do país, atingindo períodos de particular crueldade, levando ao extermínio de populações inteiras e ao desaparecimento de grande parte da diversidade sócio-cultural do país.

Hoje é possível dizer que estamos em um destes períodos.

Desde novembro do ano passado, assistimos no Brasil a uma avalanche de agressões e ataques explícitos e diretos aos povos indígenas.

A Rodovia Transamazônica (BR 230) foi construída numa época particularmente atroz para os índios.

Atravessando terras indígenas e retalhando implacavelmente a floresta, a estrada abriu brechas para a “colonização” da região, – isto é, para a extração de madeira, a criação extensiva de gado (mediante extenso desmatamento prévio) para, mais recentemente, possibilitar o plantio de soja, cana e demais commodities – hoje motores econômicos e justificativas “incontestáveis” das atrocidades mais atuais que continuam sendo cometidas.

Um dos territórios atravessados pela estrada é justamente o do povo Tenharim, que ocupou a cena nos noticiários no final do ano e continua no centro das atenções.

Atualmente, essa região, conhecida como sul do Amazonas, é campeã de desmatamento, de grilagem e de violências contra seringueiros, índios e pequenos agricultores.

Desde os anos 1970, os Tenharim estão aguardando compensações por suas terras terem sido cortadas pela estrada, e pelas mortes acarretadas ao longo do processo de sua construção.

Uma investigação aparentemente inconclusa sobre a morte mal explicada de uma das principais lideranças Tenharim, seguida do desaparecimento de três não indígenas na região provocou um levante da população local contra os índios, gerando uma onda de violências, declarações e vociferações preconceituosas e racistas sem precedentes nas ruas da cidade de Humaitá (AM).

Diversas reportagens, relatos, comentários, fotografias e vídeos (onde, por exemplo, é possível ouvir gritos de alegria e comemorações durante as ações violentas) nas redes sociais e na mídia local estamparam a brutalidade do racismo de alguns moradores não-indígenas de Humaitá.

Este fato, que poderia ser considerado como um mero caso policial, infelizmente, não deve ser tratado como um caso isolado. Ele é o último de uma série cada vez mais massiva de agressões e ações abertamente preconceituosas e violentas contra os povos indígenas no país.

Impossível não lembrar, mais uma vez, da invasão da sede da Fundação Nacional do Índio por ruralistas em Campo Grande e do discurso de uma mulher desejando aos índios: “Morram! Morram!” no contexto do Leilão da Resistência.

Organizado em dezembro de 2013 por fazendeiros e simpatizantes do agronegócio no Mato Grosso do Sul, o encontro arrecadou quase um milhão de reais para financiar milícias armadas – ou, oficialmente, “empresas de segurança privada” – destinadas a proteger as fazendas de eventuais retomadas de terra pelos Guarani, Kaiowá e Terena.

Desde o início do século XX, os Guarani e Kaiowá foram espoliados sistematicamente de suas terras e obrigados a viver em exíguas reservas, ecologicamente devastadas, sem ter nenhuma outra perspectiva a não ser servir como mão de obra barata para os mesmos latifundiários que hoje ocupam e exploram suas terras tradicionais.

Há poucos dias, também no Mato Grosso do Sul, a investigação da morte de Oziel Terena [foto] foi declarada inconclusiva pela Polícia Federal.

Em maio de 2013, o jovem indígena foi assassinado durante a reintegração de posse da Fazenda Buriti, uma das propriedades do ex-deputado Ricardo Bacha (PSDB) [foto abaixo] que incide sobre a terra indígena Buriti, declarada em 2010 como de ocupação tradicional.

No mesmo dia, proprietários de terra recusavam indenizações milionárias oferecidas pelo governo como compensação pela devolução das terras aos índios. “Vamos para o pau!”, declarou publicamente Bacha, insatisfeito com os mais de 10 milhões de reais oferecidos a ele e sua família.

Ameaças, truculência, abuso de poder, disputa judicial interminável.

A isso estão cotidianamente sujeitos os Guarani Ñandeva da terra conhecida como Yvy Katu, no município de Japorã (MS), fronteira com o Paraguai.

Eles esperam a homologação de sua terra há quase 10 anos, vivem acampados em suas próprias terras e anunciaram recentemente que resistirão até a morte à execução de reintegrações de posse ou ações de pistoleiros contra sua permanência na área.

O mesmo delegado responsável pela reintegração da Fazenda Buriti os ameaçou verbalmente na última ação realizada pela Policia Federal em Yvy Katu.

Deus abençoe vocês”, respondeu quando os índios disseram que não deixariam sua terra.

No Mato Grosso do Sul, dezenas de áreas indígenas aguardam demarcação ou homologação, em configurações semelhantes.

São inúmeros os casos, e não caberia aqui estabelecer uma lista sistemática dessa avalanche de agressões.

O que nos parece mais importante é enfatizar que as tensões e os conflitos fundiários se dão em um contexto de ataques políticos e jurídicos intensos aos povos indígenas e a seus direitos constitucionalmente garantidos.

De fato, o ano de 2013 foi também um ano de grandes ataques aos direitos indígenas no Congresso, levados a cabo principalmente pela bancada ruralista, que atualmente forma parte da base aliada do governo.

Ao menos trinta proposições sobre legislação indígena tramitam no Legislativo ou foram editadas pelo Executivo, todas afetam diretamente os povos indígenas.

Estes projetos de lei e decretos dialogam diretamente com os ataques sofridos pelos indígenas; são uma resposta positiva às demandas das oligarquias agrárias e do agronegócio, principais motores da violência contra as populações originárias.

Assim, esse verdadeiro rolo compressor – liderado e conduzido pela bancada ruralista, e praticado hoje no campo da legalidade e da ilegalidade pelo capital brasileiro e transnacional – está dando o tom da reedição da guerra de colonização.

Fonte:
http://amazoniareal.com.br/tempos-sombrios-para-os-povos-indigenas/

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

As causas da grande mobilização indígena

Quais os projetos de mineradoras, madeireiras e ruralistas para avançar sobre territórios e direitos dos índios. Como tramitam, em silêncio, no Congresso Nacional

Por Marcelo Degrazia*, no portal Outras Palavras


A Mobilização Nacional Indígena, deflagrada ao longo desta semana, é uma luta pela defesa dos direitos indígenas adquiridos e para barrar uma avalanche devastadora, liderada pela Frente Parlamentar do Agronegócio. A luta é pela terra, sua posse e uso. A convocação foi da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e envolve organizações indígenas e indigenistas de diversas partes do país, agora articuladas e em luta.

A linha do tempo vai até as caravelas de Cabral, mas vamos tomá-la a partir deste ano, para compreender melhor o contexto atual. Em 16 de abril, cerca de 300 índios ocuparam o plenário da Câmara, em protesto contra a instalação de Comissão Especial para analisar a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que torna praticamente impossível a demarcação das terras indígenas, ao tirar esta prerrogativa da Fundação Nacional do Índio (Funai) e transferi-la ao Congresso Nacional.

Na ocasião o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), prometeu não instalar a comissão antes do final de agosto. A Casa criou então um grupo de trabalho para discutir a condição dos índios no Brasil, cujo relatório seria um subsídio importante para a decisão de constituir ou não a comissão. Integraram o grupo lideranças indígenas, deputados ruralistas e parlamentares que defendem os direitos dos índios. Segundo Lincoln Portela (PR-MG), mediador do grupo, “basicamente aprovamos a rejeição da PEC 215.” A rejeição, concluindo pela inconstitucionalidade do projeto, foi por unanimidade dos presentes, já que nenhum parlamentar da frente do agronegócio compareceu às reuniões.

Na noite de 10 de setembro, contrariando o parecer do grupo de trabalho criado por ele mesmo, Henrique Eduardo Alves instituiu a Comissão Especial para analisar a PEC 215. Alves estaria atendendo compromisso assumido com a bancada ruralista durante sua campanha para a presidência da Câmara. Muitos dos 27 deputados indicados então para a Comissão Especial integram a frente do agronegócio e são autores de projetos que suprimem direitos dos índios, como veremos.

Nessa semana da Mobilização, Alves pretendia instalar a Comissão Especial, com a indicação do relator e do presidente – mas teve de recuar diante das manifestações.

A PEC 215, de 2000, é de autoria do ex-deputado Almir Sá (PRB-RR), atualmente presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Roraima. Ela estabelece a competência exclusiva do Congresso Nacional para aprovar a demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas e ratificar as demarcações já homologadas – hoje atribuições exclusivas do Executivo, que as executa por meio da Fundação Nacional do Índio (Funai). Na avaliação de organizações indígenas e indigenistas, na prática significará o fim de novas demarcações. O risco não seria apenas para o futuro, mas também para hoje, pois das 1.046 terras já demarcadas apenas 363 estão regularizadas. As demais, ainda em processo por vários fatores, ficariam com sua homologação na dependência do Congresso. “Como contamos nos dedos quantos congressistas defendem a causa indígena, com certeza nenhuma terra será demarcada”, considera Ceiça Pitaguary, líder do movimento indígena do Ceará.

“A PEC é flagrantemente inconstitucional”, afirmou Dalmo Dallari, professor de direito da Universidade de São Paulo, ao Instituto Socioambiental (ISA): ela não respeita a separação dos poderes. As demarcações e homologações são atribuições do Executivo, procedimentos de natureza administrativa; ao Legislativo compete legislar e fiscalizar. Para alguns antropólogos, o direito à ocupação dessas terras é originário, e está assegurado na Constituição – as demarcações são apenas reconhecimento desse direito pré-existente.

A opinião de Carlos Frederico Maré, professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná vai na mesma direção. Ex-presidente da Funai, ele sustenta que a demarcação é um procedimento eminentemente técnico. Em entrevista ao ISA, disse que “a Constituição não deu direito à demarcação. Deu direito à terra. A demarcação é só o jeito de dizer qual é a terra. Quando se coloca todo o direito sobre a demarcação retira-se o direito à terra, porque então ele só existirá se houver demarcação. É isso que está escrito na PEC: que não há mais direitos originários sobre a terra. Muda-se a Constituição, eliminando-se um direito nela inscrito.”

O Projeto de Lei (PL) 1.610, de 1996, de autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), dispõe sobre a exploração e o aproveitamento de recursos minerais em terras indígenas. Foi apresentado a pretexto de defender o “interesse nacional” (a ser explorado pela iniciativa privada, conforme o Código de Mineração). Se aprovado, irá se converter em lei complementar ao artigo 231 (Capítulo VIII) da Constituição. O senador pediu regime de urgência. Quer votar, portanto, sem muita discussão, e a matéria só não foi submetida à apreciação da Casa devido à mobilização em torno do tema. Na prática, talvez seja tão ou ainda mais danosa que a PEC 215. E não seria de duvidar que esta estaria sendo o boi de piranha, já que o governo mostrou-se receptivo ao PL 1.610.

Já o PL 227, de 2012, retrata cruamente um dos aspectos centrais do chamado “sequestro da democracia” pelas instituições que deveriam expressá-la. Foi proposto pelo deputado Homero Pereira (PSD-MT), ex-presidente da Frente Parlamentar do Agronegócio, a princípio com redação que visava dificultar as futuras demarcações de terras indígenas. Fazia-o diluindo atribuições da Funai e incluindo, entre as comissões encarregadas de definir novos territórios, os proprietários de terra. Já em sua origem era, portanto, anti-indígena.

Mas tornou-se muito pior, ao tramitar pela comissão de Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural da Câmara. Sem que tenha havido debate algum com a sociedade, os deputados que integram a comissão transformaram inteiramente sua redação. Converteram-no num projeto de lei que, se aprovado, revogará na prática, pela porta dos fundos, o Artigo 231 da Constituição.

Tal dispositivo trata dos direitos indígenas. Reconhece “sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”. Estabelece uma única exceção: em situações extremas, em que houvesse “relevante interesse público da União”a exclusividade dos indígenas seria flexibilizada e seus territórios poderiam conviver com outros tipos de uso. Esta possibilidade, rara, precisaria ser definida em lei complementar.

Na redação inteiramente nova que assumiu, o PL 227/2012 é transformado nesta lei complementar. E estabelece, já em seu artigo 1º, um vastíssimo leque de atividades que poderão ser praticadas nas terras indígenas. Estão incluídas mineração, construção de hidrelétricas, rodovias, ferrovias, portos, aeroportos, oleodutos, gasodutos, campos de treinamento militar e muitos outros.

Um inciso (o VIII), de redação obscura, procura ampliar ainda mais as possibilidades de violação dos territórios índios. Estabelece que é também “de relevante interesse público da União” a “legítima ocupação, domínio e posse de terras privadas em 5 de outubro de 1988”. Embora pouco claro, o texto dá margem a uma interpretação radical. A data mencionada é a da entrada em vigor da Constituição – quando foram reconhecidos os atuais direitos indígenas. Estariam legitimados, portanto, os “domínios e posses de terras privadas” existentes antes da Carta atual. Em outras palavras, a legislação recuaria no tempo, para anular na prática as demarcações que reconheceram território indígena e afastaram deles os ocupantes ilegítimos.

A PEC 237, de 2013, é de iniciativa do deputado Nelson Padovani (PSC-PR), titular do PSC na Comissão Especial da PEC 215, integrante da comissão do PL 1.610 e um dos signatários do pedido de criação da CPI da Funai, uma das estratégias da Frente para enfraquecer o órgão federal, já penalizado por redução de verbas. Essa PEC, se aprovada, tornará possível a posse indireta de terras indígenas a produtores rurais na forma de concessão. Será a porta de entrada do agronegócio aos territórios demarcados, e essa possibilidade tem tirado o sono de indígenas e indigenistas.

A portaria 303, de iniciativa da Advocacia Geral da União (AGU) em 16/07/2012, é outro dispositivo que tolhe direitos indígenas, com tom autoritário, em especial no inciso V do art. 1º, em que o usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da política de defesa nacional (!), à instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, à expansão estratégica da malha viária, à exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e ao resguardo das riquezas de cunho estratégico, a critério dos órgãos competentes (Ministério da Defesa e Conselho de Defesa Nacional), projetos esses que serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à Funai (grifo nosso).

É a pavimentação para o avanço econômico do capitalismo sem fronteiras, além de contrariar a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), de 1989, assinada pelo Brasil, a qual assegura o direito de os povos indígenas serem consultados, de forma livre e informada, antes de serem tomadas decisões que possam afetar seus bens ou direitos.

Todas essas iniciativas legais têm por objetivo possibilitar o avanço do agronegócio e da exploração de lavras minerais sobre as terras indígenas. Assim se permitiria inclusive a intrusão em territórios de nações não contatadas. Basta um simples olhar na autoria dos projetos, na trajetória negocial de seus autores e apoiadores, em suas relações comerciais com o agronegócio nacional e estrangeiro e na sua atuação articulada através de uma Frente Parlamentar para se ter certeza de que o interesse econômico é privado, setorista e excludente, em nada aparentado ao interesse nacional, do bem comum ou da União. Se há diversificação de interesses nos projetos, é na razão direta da fome, mas de lucros, do agronegócio, da bancada ruralista, das mineradoras, das madeireiras e empreiteiras.
*escritor, Marcelo Degrazia é autor de A Noite dos Jaquetas-Pretas e do blog Concerto de Letras

Leia também: Teia de interesses liga políticos a mineradoras em debate sobre novo Código 

terça-feira, 25 de junho de 2013

A grande oportunidade


O Brasil está diante de uma grande oportunidade diante da iniciativa da presidenta Dilma, que reconheceu a energia democrática que vinha das ruas. Esse movimento pode ser o motor do aprofundamento da democracia no novo ciclo político que se aproxima. Caso contrário, a direita tudo fará para que o novo ciclo seja tão excludente quanto os velhos ciclos que durante tantas décadas protagonizou. E não esqueçamos que terá a seu lado o big brother do Norte, a quem não convém um governo de esquerda estável em nenhuma parte do mundo.

 Por Boaventura de Sousa Santos.

A história ensina e a atualidade confirma que não é nos períodos de mais aguda crise ou privação que os cidadãos se revoltam contra um estado de coisas injusto, obrigando as instituições e o poder político a inflexões significativas na governança. Sendo sempre difíceis as comparações, seria de esperar que os jovens gregos, portugueses e espanhóis, governados por governos conservadores que lhes estão a sequestrar o futuro, tanto no emprego como na saúde e na educação, se revoltassem nas ruas mais intensamente que os jovens brasileiros, governados por um governo progressista que tem prosseguido políticas de inclusão social, ainda que minado pela corrupção e, por vezes, equivocado a respeito da prioridade relativa do poder económico e dos direitos de cidadania.

Sendo esta a realidade, seria igualmente de esperar que as forças de esquerda do Brasil não se tivessem deixado surpreender pela explosão de um mal-estar que se vinha acumulando e que as suas congêneres do sul da Europa se estivessem a preparar para os tempos de contestação que podem surgir a qualquer momento. Infelizmente assim não sucedeu nem sucede. De um lado, uma esquerda no governo fascinada pela ostentação internacional e pelo boom dos recursos naturais; do outro, uma esquerda em oposição acéfala, paralisada entre o centrismo bafiento de um Partido Socialista ávido de poder a qualquer preço e o imobilismo embalsamado do Partido Comunista.

O Bloco de Esquerda é o único interessado em soluções mais abrangentes mas sabe que sozinho nada conseguirá.

Mas a semelhança entre as esquerdas dos dois lados do Atlântico termina aqui. As do Brasil estão em condições de transformar o seu fracasso numa grande oportunidade. Se as aproveitarão ou não, é uma questão em aberto, mas os sinais são encorajadores. Identifico os principais. Primeiro, a Presidente Dilma reconheceu a energia democrática que vinha das ruas e praças, prometeu dar a máxima atenção às reivindicações dos manifestantes, e dispôs-se finalmente a encontrar-se com representantes dos movimentos e organizações sociais, o que se recusara fazer desde o início do seu mandato. Resta saber se neste reconhecimento se incluem os movimentos indígenas que mais diretamente têm afrontado o modelo de desenvolvimento, assente na extração de recursos naturais a qualquer preço, e têm sido vítimas constantes da violência estatal e pára-estatal e de violações grosseiras do direito internacional (consulta prévia, inviolabilidade dos seus territórios).

Segundo, sinal da justeza das reivindicações do Movimento Passe Livre (MPL) sobre o preço e as condições de transportes, em muitas cidades foram anulados os aumentos de preço e, nalguns casos, prometeram-se passes gratuitos para estudantes. Para enfrentar os problemas estruturais neste setor, a Presidente prometeu um plano nacional de mobilidade urbana. Sendo certo que as concessionárias de transportes são fortes financiadoras das campanhas eleitorais, tais problemas nunca serão resolvidos sem uma reforma política profunda. A Presidente, ciente disso e do polvo da corrupção, dispôs-se a promover tal reforma, garantindo maior participação e controlo cidadão, e mais transparência às instituições. Reside aqui o terceiro sinal.

Creio, no entanto, que só muito pressionada é que a Presidente se envolverá em tal reforma. Está em vésperas de eleições, e ao longo do seu mandato conviveu melhor com a bancada parlamentar ruralista (com um poder político infinitamente superior ao peso populacional que representa) e com suas agendas do latifúndio e da agroindústria do que com os setores em luta pela defesa da economia familiar, reforma agrária, territórios indígenas e quilombolas, campanhas contra os agrotóxicos, etc. A reforma do sistema político terá de incluir um processo constituinte, e nisso se deverão envolver os sectores políticos das esquerdas institucionais e movimentos e organizações sociais mais lúcidos.

O quarto sinal reside na veemência com que os movimentos sociais que têm vindo a lutar pela inclusão social e foram a âncora do Fórum Social Mundial no Brasil se distanciaram dos grupos fascistoides e violentos infiltrados nos protestos e das forças políticas conservadoras (tendo ao seu serviço os grandes meios de comunicação), apostadas em tirar dividendos do questionamento popular. Virar as classes populares contra o partido e os governos que, em balanço geral, mais têm feito pela promoção social delas era a grande manobra da direita, e parece ter fracassado. A isso ajudou também a promessa da Presidente de cativar 100% dos direitos da exploração do petróleo para a educação (Angola e Moçambique, despertem enquanto é tempo) e de atrair milhares de médicos estrangeiros para o serviço unificado de saúde (o SUS, correspondente ao SNS português).

Nestes sinais reside a grande oportunidade de as forças progressistas no governo e na oposição aproveitarem o momento extra-institucional que o país vive e fazerem dele o motor do aprofundamento da democracia no novo ciclo político que se aproxima. Se o não fizerem, a direita tudo fará para que o novo ciclo seja tão excludente quanto os velhos ciclos que durante tantas décadas protagonizou. E não esqueçamos que terá a seu lado o big brother do Norte, a quem não convém um governo de esquerda estável em nenhuma parte do mundo, e muito menos no quintal que ainda julga ser seu.


Fonte: Carta Maior http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=22247&editoria_id=4

Leia também: http://osamigosdopresidentelula.blogspot.com.br/2013/06/governadores-e-prefeitos-aprovam.html

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Joaquim e seu estilo


Paulo Moreira Leite em seu Blog

Aos poucos, Joaquim Barbosa autoriza o país a identificar um estilo político.

Sabendo do risco de ser adorado pelos conservadores, que tentam enfeitá-lo com o mito de “menino pobre que mudou o Brasil”, agora reproduzido até pela revista Time (se houve tal “menino pobre” nós sabemos quem ele é, como se chama, de onde veio e o que fez, certo?),

Joaquim achou necessário  colocar-se como pessoa de esquerda.

Apenas por isso declarou que a imprensa brasileira é de “direita”.

Tempos atrás, fez questão de revelar seu voto em Lula e Dilma, lembram?

Sempre de olho no povão, xingou o Congresso e disse que temos partidos de mentirinha. Como isso é sempre chato e incomoda quem lê jornais, mandou dizer que falou como acadêmico.

O método de Joaquim Barbosa para construir seu próprio mito político já é conhecido. Consiste em quebrar regras de convívio democrático e respeito entre instituições. Depois, dá uma volta sobre o próprio passo.

Quem procura, de uns tempos para cá, conseguir um lugar na turma do gargarejo finge que não vê a coerência em determinados movimentos apenas porque são duplos.

Joaquim disse em tom de crítica:

 “O Congresso não foi criado para única e exclusivamente deliberar sobre o Poder Executivo. Cabe a ele a iniciativa da lei. Temos um órgão de representação que não exerce em sua plenitude o poder que a Constituição lhe atribui, que é o poder de legislar.”

Sob a presidência de Joaquim, o Supremo inaugurou uma fase na qual tem feito o possível para diminuir o Congresso e interferir em sua atividade.

O Congresso tentou legislar sobre royalties do petróleo. Foi impedido pelo Supremo. Tentou regulamentar a distribuição de verbas públicas e tempo na TV para partidos políticos – Gilmar Mendes assinou uma liminar. O Congresso quer resolver o que fazer com o mandato de deputados condenados no mensalão, como diz a Constituição. O Supremo manda cassar de qualquer maneira.

Já aposentado, o ex-presidente do Supremo, Ayres Britto, justifica a atuação extrajudicial do STF sem muitos pudores.

Diz que “o experimentalismo” do Supremo se explica pela “inércia do legislador.” Ou seja: com este Congresso lento, sem lideranças (quem sabe preguiçoso e corrupto, não é assim?), o STF se acha no direito de fazer mais do que a lei manda. É a Constituição à moda de Ayres Britto.

Eu acho muito estranho que alguém reclame  da omissão do Congresso semanas depois da aprovação de uma lei crucial  para o bem-estar do país -- a legislação que regula o trabalho doméstico, última herança do regime escravocrata.

Considerando que foi uma legislação criada pelos parlamentares e aprovada por eles, após pressões, manobras protelatórias e ataques de todo tipo, que se prolongaram durante anos, pergunto como alguém pode reclamar do Congresso nesses dias, como se fosse possível esquecer um avanço numa área que se encontrava estagnada desde 13 de maio de 1888.

Ou melhor: entendo perfeitamente porque se fala mal do Congresso por esses dias. Uma pena.

Há outras coisas, também.

Jornalistas que integram a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, que possui tantos profissionais respeitáveis em seu quadro de sócios e dirigentes, resolveram convidar o presidente do STF para uma palestra.

Pergunto se aquele jornalista que deveria chafurdar na lama estará na plateia.

E aquele outro, brother, que ousou perguntar pela serenidade do ministro do STF, e foi advertido que isso era visão de branco?

Podemos imaginar, desde já, o próximo release explicando, mais uma vez, que o ministro falou na ABRAJI como acadêmico, num “exercício intelectual”, numa tentativa de disfarce conhecido, pois poder não faz “análise”, nem “sociologia”, nem “psicologia”.

Poder é poder durante 24 horas do dia.

Se isso fosse verdade, não haveria motivo aceitável para um assessor do STF esclarecer opiniões privadas do seu presidente, concorda?

Não custa lembrar que movimentos temerários de aproximação com posturas autoritárias costumam fazer vítimas entre os companheiros de viagem.

Principal trombone do golpe de 64, Carlos Lacerda não demorou a perder seus direitos políticos.  Articulador civil do golpe, o Estado de S. Paulo tornou-se alvo prioritário da censura.

Depois de apoiar centros de tortura, nossos espertalhões de ontem derramam lágrimas de crocodilo quando falam sobre as revelações da Comissão da Verdade.

Aliomar Baleeiro, udenista que foi golpistas em 1954, 1956 e 1964, acabou a carreira no Supremo,  fazendo arrependidas manifestações a favor os direitos humanos e das liberdades públicas.  Tarde demais – mesmo para limpar biografias.

A questão de Joaquim é aqui e agora.

Em maio de 2013, o ambiente em torno do Supremo é outro. O debate sobre embargos irá abrir, necessariamente, uma discussão que ficou abafada durante o julgamento, em torno de falhas e contradições que ajudaram a produzir penas tão severas.

Será difícil repetir aquele ambiente de unanimidade cívica do ano passado.

Mas Joaquim vai tentar.    

http://istoe.com.br/colunas-e-blogs/colunista/48_PAULO+MOREIRA+LEITE

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Ditadura do Judiciário será "legalizada"?


"Ou Congresso exerce seu poder constitucional ou haverá ditadura ‘legalizada’ por Judiciário"

Por J. Carlos de Assis*


Como um dos comentários que surgiram sobre meu artigo anterior foi o mais incisivo, vou tentar responder a ele, esperando que responda também a outros críticos. Não sei em que parte de meu artigo se encontrou uma referência a que eu tenha escrito que toda emenda parlamentar é boa. Escrevi que todo o projeto de emenda constitucional é legítimo, desde que, naturalmente, não fira cláusula pétrea. A emenda em questão, se aprovada, não fere, em seu aspecto essencial – exigência de quórum qualificado do STF para derrubar lei aprovada por quórum qualificado do Congresso -, o princípio de independência e harmonia dos poderes. Tenta-se regular um dispositivo de funcionamento interno do judiciário que tem profundas repercussões externas. A emenda é uma prevenção contra decisão eventual de um poder burocrático, não eleito, que, em certas circunstâncias, pode tomar caráter político.

A propósito, há um ensaio genial de Max Weber, “A Política como vocação”, contendo uma rigorosa exegese do poder judiciário democrático, no qual ele manifesta sua admiração pela organização burocrática (não política) do sistema, o rito rigoroso dos processos, a impessoalidade, a progressão por mérito etc etc. Na conclusão, ele próprio derruba tudo isso observando que, numa situação de convulsão, desaparece o rigor burocrático e prevalece a justiça do cadi. Em outras palavras, prevalece a decisão subjetiva em relação ao que é hoje chamado clamor público. Quem garante que uma emenda controversa, que gere protestos, não venha suscitar que tais protestos justifiquem, independentemente da maioria do poder legislativo, uma anulação judicial de emenda por suposto clamor público?

Note que os nossos ministros do Supremo são muito criativos. Buscaram na jurisprudência alemã, e a atrofiaram, a figura do “domínio do fato” para condenar, sem provas convincentes, alguns réus do mensalão. Por trás disso, como de todo o julgamento, estava a ideia do clamor público – um clamor que se materializou especialmente na mídia de direita, majoritária no Brasil segundo o ministro Joaquim Barbosa. Portanto não estou falando de suposições abstratas. Estou falando de fatos ocorridos. Será provavelmente baseados na figura do “domínio do fato” que pretenderão, se prosseguir o processo, julgar o presidente Lula. Caminha-se sutilmente para um golpe judiciário de direita, à falta de base popular para ganhar eleições por parte dos partidos de oposição.

No caso da emenda, notei que alguns comentários consideram meu artigo tendencioso em favor da maioria governista. É um equívoco. Não sou do PT, nem tenho partido. Estou tratando do tema em caráter geral. Entretanto, me parece que as críticas, sim, são tendenciosas contra a maioria governista, e, através dela, contra o Congresso. Isso reflete um tremendo preconceito contra o Legislativo e contra a democracia, justificado circunstancialmente apenas pelo fato de que agora o Governo odiado pela “mídia de direita” tem maioria no Congresso. Sim, porque a base da democracia é o legislativo. É ele, enquanto Constituinte original ou derivado, que estabelece as condições gerais de funcionamento dos demais poderes, inclusive a cláusula pétrea original de independência e harmonia, assim como os direitos individuais e coletivos.

No plano conceitual, há sim um nível de superioridade hierárquica do Legislativo pois é ele que aprova os orçamentos dos demais poderes. Também é ele que processa e julga impeachments do Presidente da República e Ministros do Supremo, além de seus próprios integrantes no caso de suspeita de falta de decoro parlamentar. Obviamente que tudo obedece a regras constitucionais estritas (feitas por ele, e não por juristas), mas o importante a assinalar, do ponto de vista da Teoria Política, é que ele só tem esse poder porque esse poder exprime a vontade do povo numa extensão maior que a do próprio Executivo, do qual apenas o chefe é escolhido por voto popular.

Antes da profunda antipatia que o Congresso atual, majoritariamente governista, inspira em certas áreas, a “mídia de direita” várias vezes tem tentado desmoralizá-lo usando expedientes tão cretinos quanto os da exibição pela TV de plenários quase vazios, para demonstrar que deputados e senadores não trabalham. Com isso procura-se ocultar o fato de que o trabalho parlamentar é sobretudo nas comissões e nos gabinetes, assim como junto às bases estaduais representadas, sendo que, nas comissões, os trabalhos só são cobertos pela mídia quando os temas ali tratados geram emoção pública.

Convém acostumar-se com o poder do Congresso, seja ele governista ou não. Ele não é feito só de homens bons, sábios e honestos; ele representa também os maus, os ignorantes, os oportunistas, os desonestos. Se falham junto aos constituintes, são cassados eleitoralmente. Isso é que é democracia, embora nem sempre seja bem entendido. Poderíamos ter outro sistema: monarquia absoluta, ditadura, timocracia. Contudo, o sistema que deu mais certo no Ocidente foi a democracia, pelo menos por enquanto. Talvez alguns preferissem o sistema de mandarinato chinês, que determinava a escala do poder pelo mérito e em alguma medida se estendeu ao sistema atual de partido único. Nos dois casos garantiu certa estabilidade ao país. Contudo, parece que gostamos muito de nossas liberdades e, como tal, temos que respeitar nossa democracia ancorada fundamentalmente no poder do Congresso.

Para encerrar, vou contar uma breve história: quando era um jovem jornalista do finado “O Jornal” do Rio de Janeiro, e a eleição militar de Geisel suscitou uma certa esperança de abertura política, meu chefe me mandou a Brasília para entrevistar os presidentes dos partidos, Ulysses e Filinto Miller, e alguns presidentes de comissões. Encantado com Brasília e com o prédio do Congresso, passei pela Tribuna da Imprensa da Câmara, por curiosidade. Falava um deputado do MDB. Levei um susto. Ele dizia algo assim: Presidente, será preciso eu jogar cadáveres nessa sala para comprovar que há tortura e mortes de presos políticos no Brasil? Fiquei estarrecido.

Olhei em volta e ninguém reagia. Os jornalistas, indiferentes, conversavam sobre outras coisas. No espanto, sequer passou pela minha cabeça fazer uma matéria daquilo. Mas ninguém fez. No dia seguinte não saiu uma linha em jornal. O que ouvi não podia existir como palavra escrita ou repetida. Na verdade, era impensável. O Congresso existia para dentro, mas não existia para fora. Os que tentaram fazê-lo existir dentro e fora foram cassados.

O Judiciário existia, em conluio criminoso com a ditadura (à exceção dos ministros Adauto Lúcio Cardoso, que renunciou ao STF diante da truculência da ditadura, e de Victor Nunes Leal, que foi cassado). O Executivo também existia, já que ele era a expressão da própria ditadura. Saí dali convencido de que sem Congresso pleno de suas prerrogativas democráticas, expressão da vontade popular, não há salvação!

J. Carlos de Assis é economista, professor de economia internacional da UEPB e autor, entre outros livros, de “A Razão de Deus” (ed. Civilização Brasileira).

http://correiodobrasil.com.br/noticias/opiniao/ou-congresso-exerce-seu-poder-constitucional-ou-havera-ditadura-legalizada-por-judiciario/606590/?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm

Fonte: Este artigo foi publicado originalmente no Correio do Brasil em 6/05/2013

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

O Congresso Nacional pode sustar decisões do STF?

07/02/13 - Nazareno Fonteles - blog PT no Parlamento






[Divulgar tudo que se apresente como peça de resistência à contrarrevolução jurídica que aos poucos e sorrateiramente vem se instalando no país, via um possível conluio entre alguns Ministros e a mídia-empresarial, é dever de primeira ordem pra quem já percebeu que essa é a maior ameaça que paira sobre a democracia brasileira e, de lambujo, sobre nossas cabeças. Se ela se concretizar, como tememos, não serão apenas 30 os condenados, mas um Partido, suas lideranças, seus aliados ideológicos e toda uma militância de esquerda que luta há décadas para dar ao Brasil uma feição mais democrática. (Equipe Educom)]

Se aquela pergunta fosse feita ao atual presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa, a resposta seria: Nããoo! Pode nããoo! 

Deduzo isso por uma frase, digna de um discípulo de Hitler, que ele disse:
"A Constituição é aquilo que o Supremo Tribunal Federal diz que é".

Mas brevemente mostro, a seguir, que a Constituição Federal (CF), em vigor no Brasil, responde o contrário: Sim! Pode sim!

De acordo com o art.49, XI da CF, o Congresso Nacional (CN) tem a competência "exclusiva" de zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes. E no art. 102, a CF diz que ao STF (Supremo Tribunal Federal) compete, precipuamente, a guarda da Constituição.

Veja que a guarda da CF não é competência exclusiva do STF, mas, apenas, sua função principal. Exatamente por isso os outros Poderes devem guardá-la também.

Aliás, no art. 23 da Constituição Federal, está expressamente dito:
"É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos 
Municípios: I - zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas...".


Noutras palavras, a guarda da CF é compartilhada, não é prerrogativa exclusiva do STF.

Por outro lado, observe que é exclusiva a competência do Congresso Nacional em preservar sua competência legislativa diante dos outros Poderes.

Logo quem decide, em última instância, se uma decisão, de qualquer órgão de outro Poder da República, interfere ou não na competência legislativa do Congresso Nacional, é o próprio CN e mais ninguém.

Por isso que o Congresso Nacional pode sustar decisões do STF e de qualquer órgão ou membro do Judiciário ou do Poder Executivo, se entender que sua competência legislativa está sendo usurpada ou violada.

Esta é a compreensão que está, de forma mais clara e incisiva, na Proposta que fiz de Emenda Constitucional, a PEC - 03/2011, já aprovada a sua admissibilidade, por unanimidade, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal.

Porém, como colocado acima, não há, fundamentalmente, necessidade dessa emenda constitucional para o Congresso Nacional tomar decisões, nesta direção, contra o Poder Judiciário.

A Soberania Popular, através da Constituinte de 87/88, já determinou, na CF de 88, que o CN tivesse essa prerrogativa exclusiva.

Mais ainda, na minha compreensão, a própria mesa do Congresso Nacional, pode sustar, preliminarmente, decisões do STF. E se for questionada sua decisão por algum de seus parlamentares, então colocará a mesma para apreciação do Plenário do Congresso Nacional.

E foi por isso que solicitei, formalmente, ao presidente do CN, a anulação, pela mesa do Congresso Nacional, do ato do STF que permitiu o abortamento de anencefálicos. 

Também é relevante salientar que não cabe ao STF questionar ou modificar um artigo da Constituição Federal.

Quem colocou o artigo na CF foi a Assembléia Nacional Constituinte ou o Congresso Nacional, ambos eleitos pelo Povo.

E não há nenhum artigo da CF que autorize o STF, através de interpretação, modificar o que nela está claramente expresso.

Como aconteceu recentemente em relação às novas regras do FPE (Fundo de Participação dos Estados) e à perda de mandato dos deputados. 

Mesmo em caso de contradição ou lacuna, o máximo que a Constituição Federal autoriza ao STF é fazer sua recomendação ao Congresso Nacional para tomar as providências e não, ao contrário, usurpar a competência legislativa do CN e dar prazos a este, como no caso do FPE.

Já pensou o CN dando prazos ao Poder Judiciário para este julgar os processos que estão, há anos, esperando uma decisão jurídica? Pois é, o respeito mútuo entre os Poderes, é o caminho da "harmonia" previsto na Constituição Federal.

Por último, manda a CF, em seu art. 103-B, §4º, com muita lucidez, que o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) fiscalize os deveres funcionais de todos os magistrados, sem fazer exceção. Logo os juízes do Supremo estão inclusos nesta fiscalização.

E por isso mesmo, a norma interpretativa, criada pelo STF para proteger seus membros da fiscalização do CNJ, deve ser sustada pelo Congresso Nacional.

Se o CNJ estivesse agindo constitucionalmente, sem seguir essa fraude hermenêutica de auto-proteção, alguns ministros do STF já teriam sido afastados por mau comportamento e violação do Estatuto da Magistratura. 

Medidas assim são parte da luta pela construção real e histórica do nosso Estado Democrático de Direito, estabelecido no art. 1º de nossa Carta Maior de 1988. 

O Congresso Nacional está, pois, desafiado, neste momento, a cumprir com seus deveres constitucionais de sustar os atos e decisões do Poder Judiciário que atentem contra sua competência legislativa, obedecendo ao que manda o art. 49, XI da CF. 

Como membro do Congresso Nacional estou fazendo meus esforços para cumprir com o meu dever.

Como diria Gandhi: "Nunca me preocupei em saber quando vou ter êxito ou se vou ter êxito. Já fico satisfeito em perseverar nos meus esforços para fazer o que sei ser o meu dever."

(*) Nazareno Fonteles é deputado federal (PT/PI), coordenador geral da Frente Parlamentar da Segurança Alimentar e Nutricional no Congresso Nacional e membro da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal.

Fonte:
http://ptnoparlamento.blogspot.com.br/2013/02/o-congresso-nacional-pode-sustar.html

Não deixe de ler:
- Imprensa e toga: a tentação do golpe - Gilson Caroni filho
- A hora de regulamentar o direito de resposta - Luis Nassif

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Por que o pessoal se surpreende com o Congresso?



por Leonardo Sakamoto*

Recebi uma cascata de mensagens pedindo para comentar a aprovação do novo Código Florestal, nesta terça, por acachapante votação na Câmara dos Deputados. Isso sem contar as emendas que, na prática, anistiam quem desmatou além da conta.
1408 300x239 Por que o pessoal se surpreende com o Congresso?Mas, caros leitores, vocês querem que eu fale o quê? Que a Câmara dos Deputados rifou o futuro das próximas gerações? Tá bom: a Câmara dos Deputados rifou o futuro das próximas gerações. Que a Câmara dos Deputados novamente se dobrou a interesses bizarros? Claro! Por que não? Vamos chover todos no molhado só para desopilar o fígado. Mas cadê a novidade? Ou alguém achou realmente que a maioria daquele pessoal gente boa se preocupa com as consequências dos seus atos para a qualidade de vida da coletividade? Há! Faz me rir. Não é de hoje que colocam o cumprimento de compromissos de campanha e os interesses individuais e econômicos à frente. Porque em última instância é disso o que estamos falando, pois meio ambiente é uma discussão sobre qualidade de vida e não sobre a preservação do bragre-cego-de-barba-albina-e-topete-escarlate.
Garantir uma legislação ambiental decente significa evitar os deslizamentos de terra que soterram centenas de pessoas nas chuvas, os assassinatos de trabalhadores rurais e sindicalistas (que ousaram ir contra o modelo de desenvolvimento vigente), a expulsão de indígenas de suas terras para dar lugar a pastos e carvoarias, a ignomínima do trabalho escravo – cujas histórias forjam meus pesadelos há muitos anos. Tudo isso está interligado. Se quiser saber a relação, pesquisa aí na ferramenta de busca do blog. Mas, não, preferimos contribuir com o ajuste do termostato do planeta para a posição “gratinar os idiotas lentamente”.
Sobre Aldo Rebelo, eu não comento mais. Quando alguém discorda dele, é porque está desinformado, foi vendido para os gringos, é um ambientalista perverso, torce para o Corinthians. Como Aldo já me chamou de vaca holandesa, então eu gostaria de ruminar meus parabéns a uma das mais importantes lideranças ruralistas deste país por ter conseguido o que queria. Se o Senado ou o Planalto não corrigirem o curso desse desastre, acreditem, a História não será leve com ele.
Mas, com todo o respeito: os culpados, de verdade, são todos vocês que estão lendo este texto agora, cujo deputado ou deputada votou a favor daquele texto construído sem a devida participação da sociedade (fui em uma das “audiências públicas” do projeto…lamentável). Acompanhei o que meu representante fez e participou dos debates ao longo de meses e votou contra. E o seu? Aliás, você se lembra em quem votou ou digitou os números só para ajudar o Miltinho, primo da Maria Rita, vizinha da sua cunhada – que é gente boa e te deu um picolé quando criança e agora está trabalhando para um candidato? Sim, a responsabilidade é sua também que botou aquela galera lá. Agora aguenta.
Ah, e quando desgraça começar a rolar, não vai pedir ajuda a Deus. Ele já está suficientemente envergonhado por ter uma bancada evangélica que fala em seu nome e – mais forte que um governo que rifa direitos para segurar seu ministro – luta pelo direito à homofobia, impedindo que nossas crianças aprendam e exerçam a tolerância nas escolas.
* Publicado originalmente no Blog do Sakamoto.
(Blog do Sakamoto)

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Deputados que votaram contra a natureza, a vida

Guardem esses nomes, eles votaram a favor dos desmatadores.  Defederam os destruidores da natureza.
Foram contra mãe Terra. Vejam a lista  dos nomes.
Como cada deputado votou a emenda 164 que anistia desmatadores http://goo.gl/al68G (por UF) http://goo.gl/mHGDt (por partido) #CodigoFlorestal  

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Presidente da Câmara diz que reforma do Código Florestal será votada em março

Nota do EDUCOM: a mudança no Código Florestal pode significar mais tragédias, na cidade e no campo, como a que atinge a Região Serrana do Rio de Janeiro. O que é preciso é respeitar este Código. (Z.F., editora política)

O novo Código Florestal brasileiro será colocado em votação na Câmara dos Deputados em março deste ano, segundo informou na última quarta-feira o novo presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), na primeira entrevista coletiva concedida após a eleição da Mesa Diretora da Casa, na noite de terça. Segundo Maia, a discussão sobre o novo Código será feita durante o mês de fevereiro.

"Há, na Câmara, acordo sobre boa parte das matérias e elas serão tratadas no devido tempo. O Código Florestal, por exemplo, temos acordo para a votação, vamos discutir durante todo o mês de fevereiro e colocá-lo na pauta de votações em março", disse.

Maia, novo presidente. Foto: Ag. Câmara
O presidente da Casa, que foi acusado durante a campanha de que, caso eleito, não manteria independência do Legislativo em relação ao Executivo, prometeu construir uma agenda de votações com prioridade para a demanda dos parlamentares.

"Vamos trabalhar para construir uma agenda do parlamento, responder demandas da sociedade a partir da representação dos deputados, essa será nossa prioridade. Mas não estamos descartando a importância de votar matérias do Executivo. Cabe a nós dar condições ao Executivo de executar, mas vamos continuar fazendo nosso trabalho com independência, autonomia e respeitando iniciativas propostas pelos deputados", afirmou.

Segundo Maia, a Câmara vai continuar uma tradição adotada há dois anos de apreciar as medidas provisórias (que trancam a pauta de votações) em sessões ordinárias e os demais projetos de lei em sessões extraordinárias. "Esta é uma prática que funciona bem no parlamento, tanto que em 2010 batemos recorde de votação de proposições nos últimos 20 anos. Foram quase 300, entre elas 20 medidas provisórias", disse.

O presidente da Câmara voltou a defender a votação da reforma política, mas ainda sem prometer prazos. "Não gosto de fazer promessas pro futuro. Se dissermos que vamos fazer uma ampla e irrestrita reforma política vamos chegar ao fim do ano frustrados. Prefiro dizer que vamos fazer ampla discussão e vamos avançar naquilo que for possível", afirmou.

Construção de anexos
Maia defendeu a construção de um novo anexo ao prédio da Câmara dos Deputados, alegando que a ampliação do espaço "para receber o povo" é necessária. Segundo o presidente da Câmara, a Casa sofre com a falta de espaço.

"Temos uma realidade na Câmara muito dura em relação aos espaços, são gabinetes pequenos, não temos salas de reuniões. No ano passado, recebemos mais de um milhão de cidadãos que passaram pelo parlamento. Temos que dar as condições para que sejam bem atendidos quando vierem", disse.

Marco Maia afirmou, ainda, que os recursos para a ampliação do anexo 4 e construção de um quinto anexo já estão garantidos. Segundo ele, R$ 220 milhões estão depositados em uma conta da Câmara dos Deputados, o que não traria despesas adicionais aos cofres públicos.
Fonte: portal Terra

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Mudança no Código Florestal é licença para novas tragédias, alertam ambientalistas

Maurício Thuswohl, na Rede Brasil Atual
RIO - Ainda sob o impacto da tragédia que já provocou mais de 800 mortes e soma quase 500 desaparecidos na Região Serrana do Rio de Janeiro, lideranças do movimento socioambientalista de todo o Brasil alertam que, se aprovadas no Congresso Nacional, as mudanças sugeridas no Código Florestal brasileiro por setores ruralistas servirão como uma espécie de licença para que ocorra em outros pontos do país o mesmo pesadelo que acometeu as cidades fluminenses de Nova Friburgo, Petrópolis, Teresópolis, Bom Jardim e Sumidouro.

Elaborado pelo deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP), o relatório que impõe mudanças no Código Florestal sugere, entre outras coisas, a redução das Áreas de Proteção Permanente (APPs) nas margens dos rios dos atuais 30 metros para apenas cinco metros. Outra mudança proposta é a permissão de supressão de vegetação nos topos de morros (acima da cota 100), assim como a flexibilização da ocupação das encostas para fins de produção agrícola. A relação do texto de Aldo com a catástrofe da Região Serrana do Rio é, portanto, clara e evidente, afirmam os ambientalistas.

"A ligação entre o desastre que aconteceu na Região Serrana e as tentativas de mudança da implementação do Código Florestal em áreas urbanas e rurais propostas pelo deputado Aldo Rebelo é que a aprovação dessas mudanças será uma espécie de licença para sacramentar o acontecimento de novas tragédias como esta que tivemos agora ou a que tivemos em Angra dos Reis e Niterói em 2010", afirma Ivan Marcelo Neves, coordenador-executivo do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais pelo Meio Ambiente (FBOMS).

Coordenador do Grupo Ambientalista da Bahia (Gambá), Renato Cunha segue a mesma linha de raciocínio: "Essa mudança no Código Florestal prevista no substitutivo do Aldo Rebelo realmente nos preocupa muito porque a flexibilização da legislação ambiental, e do Código Florestal especificamente, pode vir a agravar essas conseqüências dos desastres que vêm acontecendo - e que acaba de acontecer na Região Serrana do Rio de Janeiro - porque ele tenta flexibilizar o uso das encostas, das áreas alagadiças, das Áreas de Preservação Permanente, diminuindo esses espaços que devem ser preservados, diminuindo a questão da Reserva Legal das propriedades".

Um dos mais experientes ambientalistas brasileiros, Cunha afirma que tentar flexibilizar o Código Florestal é o oposto daquilo que realmente deveria estar sendo feito no país: "Alterar o código pode ser um marco fundamental para esses desastres virem realmente a ter conseqüências muito maiores. O que a gente tem que aprender no Brasil é a adotar políticas e legislações e planos e projetos para minimizar as causas e os efeitos dessas questões naturais que ocorrem, e não mudar a lei para beneficiar um grupo pequeno como, por exemplo, os empresários do agronegócio", critica.

Outra voz experiente do movimento socioambientalista brasileiro, o líder indígena Marcos Terena também associa a tentativa de mudar o Código Florestal à tragédia da Região Serrana do Rio: "Essa proposta que está no Congresso fere totalmente, do ponto de vista indígena, a questão do respeito à força da natureza. O exemplo clássico disso é a irresponsabilidade de setores governamentais quando permitem que pessoas que não tem onde morar, não tem onde dormir, construam suas habitações em áreas que depois se transformam em áreas de risco", diz.

Marcos Terena também faz um alerta: "A natureza não compromete a vida do ser humano, mas as pessoas constroem situações que afetam sua própria segurança, como aconteceu na Região Serrana do Rio de Janeiro. Então, essa proposta de mudança do Código Florestal que está em Brasília deve ser brecada porque se for aprovada vai aumentar a possibilidade de grandes catástrofes e trazer conseqüências muito agressivas fisicamente e espiritualmente para o povo brasileiro".

'Tragédia anunciada'
Pedro Aranha, ex-coordenador da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA) e um dos mais ativos ambientalistas do Rio de Janeiro, ressalta que, para o movimento, a tragédia na Região Serrana não foi algo inesperado: "O que a gente viu na Região Serrana foi a crônica de uma tragédia anunciada. Todo mundo sabia que um dia isso iria acontecer. Nós do movimento ambiental denunciamos há pelo menos dez anos a ocupação do Vale do Cuiabá, em Itaipava, que foi uma das áreas mais devastadas pelas águas. Mas, infelizmente, acabou acontecendo o que a gente previa. Então, a alteração do Código é dizer: olha, vão acontecer várias tragédias iguais a essa e elas vão estar permitidas na lei".

Aranha faz um alerta sobre o discurso, utilizado pelos ruralistas, de que a alteração do Código Florestal servirá apenas para sintonizar a lei com aquilo que já é realidade: "Os ruralistas dizem que querem apenas legitimar algo que já está consolidado, só que o que aconteceu agora na Região Serrana foi o ‘algo consolidado’ em Área de Preservação Permanente, ao qual eles se referem, que desabou todo e matou muita gente. Não podemos mais permitir construção irregular acima da cota 100 ou em margem de rio e ver a população ali achando que aquilo está certo e a prefeitura vir cobrar IPTU e as empresas privadas, atrás de lucros, virem logo instalar água e luz. É uma lógica do capital perverso".

A tragédia na Região Serrana repercutiu até mesmo entre os ambientalistas da Amazônia. Representante em Brasília do GTA (Grupo de Trabalho Amazônico), rede que engloba mais de 600 entidades da região, Vitor Mamede é outro que faz associação entre o ocorrido neste início de ano no Rio de Janeiro e a luta política pela alteração do Código Florestal: "Eu acredito que, devido ao fato de a proteção das encostas não ser mais considerada como Área de Proteção Permanente nessa nova proposta do Código Florestal, isso pode realmente fazer com que novas tragédias aconteçam. Outra questão muito problemática diz respeito às áreas de Reserva Legal, pois essa proposta de alteração do Código Florestal visa a beneficiar mais uma vez os grandes produtores e os agricultores patronais", diz.

Áreas urbanas
A responsabilidade dos administradores públicos também é questionada pelos ambientalistas. Ex-secretário-executivo do Ibama no Rio de Janeiro, o analista ambiental Rogério Rocco lembra que alguns estados e municípios brasileiros já adotaram leis semelhantes às propostas no relatório de Aldo Rebelo: "Os prefeitos são os maiores defensores da abolição do Código Florestal em áreas urbanas. E assim se posicionam em aliança com o mercado imobiliário, que busca a otimização máxima do território para a construção civil. As imagens registram com muita precisão que as áreas atingidas pelas chuvas na Região Serrana do Rio de Janeiro são exatamente as margens de rios, as encostas e os topos de morro, que se constituem sob o regime de preservação permanente".

Pedro Aranha segue na mesma linha de Rocco: "O que os defensores da alteração do código querem hoje é legitimar a ocupação desordenada, principalmente nos espaços urbanos, das Áreas de Preservação Permanente e das margens de rios. Essa lógica absurda que a gente vive hoje tem nas prefeituras suas grandes defensoras, porque elas querem captar os recursos do IPTU, enquanto o imposto rural vai para o governo federal e não para o município. Então, os prefeitos também querem alterar essas áreas de preservação, ocupar esses espaços", acusa.

Ivan Marcelo Neves vai ainda mais longe: "Muita coisa poderia ter sido evitada. Tem que haver responsabilização civil e criminal de alguma forma para todos que contribuíram para essa desgraça. A legislação ambiental vigente pode estar aquém do que a gente almeja para o nosso Brasil, mas ela responderia para minimizar um pouco os efeitos dessa desgraça na população e no meio ambiente como um todo. O que a gente vê é uma ação irresponsável dos legisladores, do Executivo e do Judiciário também, que muitas vezes é conivente com as irregularidades. É um arsenal de demagogia".

O secretário-executivo do FBOMS também criticou o governador Sérgio Cabral: "Estudos acadêmicos já foram enviados ao governo, como, por exemplo, um estudo feito pela PUC. Se o governador é tão preocupado com as áreas de risco como diz ser, não deveria ter baixado decreto abrindo para a especulação imobiliária em Angra dos Reis, assim como ele tem um decreto estadual de 2010 que diminui as faixas de proteção ambiental nas margens dos rios", denuncia.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Desastres causados por chuvas podem aumentar se novo Código Florestal for aprovado

Danilo Augusto, da Radioagência NP
SÃO PAULO - As tragédias causadas pelas chuvas que atingem o Brasil podem aumentar se forem aprovadas as propostas de mudanças no Código Florestal. A afirmação é do engenheiro florestal e integrante da Via Campesina, Luiz Zarref. Entre os pontos polêmicos, o texto que propõe mudanças no atual Código, de autoria do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), deixa de considerar topos de morros como áreas de preservação permanente. Esses locais foram os mais afetados por deslizamentos de terra no Rio de Janeiro.

O projeto já foi aprovado em uma Comissão Especial e está pronto para ser votado pelo Plenário. Para Zarref, a proposta de redução de 30 para 15 metros das áreas de preservação nas margens de rios provocará erosão, ampliando os alagamentos.

“Sem essa área, rapidamente uma tromba d'água se forma. Isso porque a chuva cai em uma área que está desprotegida, fato que aumenta rapidamente o nível do rio. Essas quantidades anormais de água crescem muito mais rapidamente, de que quanto se tem uma área protegida, como está no Código atual."

Ainda segundo Zarref, a tragédia que até o momento já vitimou quase 700 pessoas no Rio é um reflexo da não preservação das áreas com vegetação.

“O que aconteceu no Rio de Janeiro não é só por causa da degradação do topo do morro, de fato foi um nível de chuva muito alto. Porém, com certeza, foi agravado pela devastação, principalmente nas áreas de preservação permanente. A natureza que antes comportava até mesmo uma tempestade, hoje não comporta mais."

Zarref também enfatiza que mesmo com as áreas ocupadas irregularmente, há estudos que mostram que ainda existem soluções para o problema, sem a necessidade de remoção das famílias.

“Em algumas áreas você pode fazer trabalhos de drenagem, galerias pluviais ou até mesmo recuperação florestal. Agora existem áreas de instabilidade geológicas que de fato vai ter que ser construído juntamente com a comunidade um reassentamento das famílias. Essas famílias foram empurradas historicamente para essas regiões. A maioria dessas pessoas são pobres. Então tem que haver uma solução que respeite esse processo histórico."

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

A gramática social da tragédia

Diante dessa tragédia esperamos que nossos legisladores não cedam às pressões para alterar o Código Florestal. Os ruralistas querem tirar o topo dos morros, terra de encostas e áreas em altitude superior a 1.800 metros das APP - Áreas de Preservação Permanentes. A especulação imobiliária também pressiona por mudanças no Código Florestal, dentro da Reforma Urbana. E o relator do projeto na Câmara, deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP), já acenou em atendê-los em parte, além de outras demandas. Como a mídia não abordou esse assunto decidimos postar este artigo, de um acadêmico de fora da região mais atingida, que faz uma análise da catástrofe pontuando esse problema (Zilda Ferreira, da Equipe do EDUCOM). Adendo: amigos, atenção a mais este oportuno artigo de Laerte Braga, no pé do post.

Por Edmilson Lopes Júnior*
Câmeras de TV capturaram os diversos ângulos da tragédia que se abateu sobre a região serrana do Rio de Janeiro. As imagens do alto e de baixo mostravam cenas de destruição e pessoas desesperadas. Casas, vidas e projetos de futuro arrastados montanha abaixo pelas chuvas de janeiro. Chuvas que desde o final de semana passado traziam dor e sofrimento aos moradores mais pobres de municípios da Grande São Paulo.

As esperadas tragédias de janeiro, neste ano, ganharam uma dimensão diferente. Não ficaram circunscritas aos lugares distantes, lá nas periferias onde pobres constroem suas precárias habitações em várzeas e margens de rios. As águas derrubaram casas luxuosas em cenários nos quais se desenvolve uma indústria turística requintada, destinada ao consumo conspícuo da burguesia e da classe média alta. A lama que varreu do mapa as casas mais vulneráveis, mas também adentrou as pousadas e hotéis de luxo da região serrana fluminense. Às mortes dos que, destituídos de identidade, tornam-se números nas estatísticas oficiais, somaram-se àquelas de pessoas com nome, sobrenome e vinculação com empresas e instituições que formatam o poder no país.

Por um momento, na inenarrável dor da perda, parecemos mais próximos. O bolo amargo que teima em não descer pela garganta de cada um de nós, cada vez que revemos as cenas de destruição, pareceu germinar uma solidariedade para além das classes sociais. E isso não seria pouco em um país no qual, normalmente, como aponta-nos o sociólogo Jessé Sousa, o valor da vida humana é maior ou menor dependendo do estrato social a que o indivíduo pertence.

Mas foi só um momento. Quinta, de manhã, bem cedo, as rádios já reproduziam os discursos de especialistas ou de atores e artistas metamorfoseados em doutos geólogos a reclamar da "falta de educação" da patuléia. Essa "gente sem educação que joga garrafa pet no leito dos rios". Comparações com o Japão foram feitas. E cobranças aos governos. Estes, sempre tomados por corruptos, não fariam o dever de casa: remover o povo das encostas e retirar os habitantes das várzeas. Nas TVs, a mesma cantilena, ao vivo e a cores.

Nenhuma palavra sobre a voracidade da indústria da especulação imobiliária, que "incorpora" áreas ambientalmente frágeis e monopoliza os terrenos mais próximos das áreas onde os mais pobres têm que trabalhar. Ou da criativa destruição ambiental desenvolvida pelo turismo, merecedor costumeiro de elegias por ser o exemplo da "indústria sem chaminés". Por certo não se esperaria alguma elaboração mais profunda desses meios de comunicação sobre como a suposta "falta de educação ambiental" dos mais pobres é produzida, mas a ausência de qualquer referência aos determinantes sociais de sua vulnerabilidade ambiental é quase um escândalo.

Na manhã de ontem, um programa de TV ocupou quase todo o seu tempo com a cobertura da tragédia. Cenas da destruição da região serrana e das enchentes em São Paulo durante toda a manhã. As imagens alternavam dos locais da tragédia para o estúdio, onde uma mesa farta, com pães, sucos e frutas, era o contraponto das cenas nas quais pessoas desesperadas tentavam se salvar ou salvar algo. Em uma dessas cenas, duas senhoras idosas, cabelos brancos, com água até a altura de suas cinturas, banhavam os seus rostos. No estúdio, um médico que, em um primeiro momento pensei tratar-se de um dos BBBs, fazia perorações sobre os riscos de doenças relacionadas ao contato com a água da enchente. Como se, para aquelas senhoras, o contato com a água suja fosse uma opção...

Uma das traduções que a solidariedade provocada pela tragédia poderia expressar seria uma alteração na gramática profunda subjacente à visão que temos de nós mesmos. Dessa forma, talvez, culpássemos menos as vítimas pelas tragédias que tragam a si e aos seus. Nos principais veículos de comunicação do país, ao menos desde ontem, não é isso o que está sendo vocalizado.

Mary Douglas, a antropóloga inglesa que escreveu um exemplar ensaio intitulado "Como as instituições pensam", apontava que os eventos emergenciais não revogam os princípios que baseiam as instituições. Não tomou o Brasil como referente. Poderia tê-lo feito.
*professor de sociologia na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

Mais informações sobre a tragédia das enchentes no Blog da Raquel Rolnik:
www.raquelrolnik.wordpress.com

Laerte Braga: 'ADEQUAR O JUDICIÁRIO AO MERCADO E À GARANTIA DA PROPRIEDADE PRIVADA'

Por Laerte Braga, no blog "redecastorphoto"
O processo de ocupação e incorporação do Brasil à chamada Nova Ordem, o neoliberalismo, começa com a eleição de Fernando Henrique Cardoso. Lei de Patentes, privatizações, controle da Amazônia pelos EUA (em parceria com os “patrióticos” comandantes militares brasileiros), todo um projeto montado no que se conhece como CONSENSO DE WASHINGTON que, pelo próprio nome, explica quem é o acionista majoritário desse conglomerado.

Foi nos primeiros anos do governo FHC

Segundo o estudo do Banco Mundial, “mais especificamente a reforma do judiciário tem como alvo o aumento da eficiência e equidade na resolução de conflitos, ampliando o acesso a justiça e promovendo o desenvolvimento do setor privado”.

O deus mercado transformando as cortes de justiça (?) em sacristias dos seus interesses. Os magistrados em sacerdotes dos resorts onde bancos promovem “seminários” - boca livre - visando assegurar sua primazia em decisões judiciais das quais sejam parte, como papas dessa igreja hedionda e totalitária.

São os novos títeres.

Há todo um conjunto, por isso um processo, de adequação aos estatutos dos donos do mundo. Os grandes conglomerados. São de tal ordem gigantescos que transformaram a maior potência do mundo, os EUA, num deles. O conglomerado EUA/ISRAEL TERRORISMO S/A.

Terrorismo não é necessariamente arremeter aviões contra as torres gêmeas. Nem sempre se materializa em ações de violência explícita, tal como a conhecemos nos noticiários da GLOBO (a Fundação Roberto Marinho levou 24 milhões das verbas destinadas a obras de contenção de encostas e saneamento no Estado do Rio de Janeiro, ano passado, doação caridosa do governador Sérgio Cabral. Deve ter sido para ajudar o BBB-11).

O terror vem embutido no próprio deus mercado. Na transformação do ser humano em objeto, em mercadoria tanto no fetiche do espetáculo, como no da tragédia.

O estudo do Banco Mundial, diga-se de passagem, despertou indignação em magistrados sérios e associações do setor comprometidas com a liberdade e a Justiça. Propõe-se que o “Judiciário” seja um instrumento a mais na caminhada predadora da Nova Ordem.

A companhia mineradora de Eike Batista, por exemplo, vai causar prejuízos ambientais de tal ordem que a recuperação se torna impossível no futuro, vai gerar doenças como os transgênicos da MONSANTO. E daí? Cabe ao “Judiciário” assegurar que o progresso se construa na proteção ao “desenvolvimento do setor privado”.

Bombeiros que se virem para apagar o fogo depois.

Os estudos do Banco Mundial levam em conta a formação de blocos econômicos entre nações, caso do NAFTA (MÉXICO, EUA e CANADÁ) e propõem formas de homogeneização das leis para o setor, assegurando, por exemplo, o direito dos EUA construir um muro para impedir que mexicanos tenham os mesmos direitos que norte-americanos e impondo toda a sujeira industrial ao primo pobre (com governos corruptos e comprados), mas decisão final em cortes norte-americanas, como aconteceu no caso do lixo nuclear depositado numa cidade do México. O protesto dos cidadãos mexicanos foi julgado em New York e a empresa poluidora teve assegurado o seu direito.

Por isso a necessidade de magistrados como Gilmar Mendes, Cezar Peluso e outros mais. A necessidade de esmagar juízes independentes como o de Rodrigo de Sanctis do caso de Daniel Dantas – parte do “setor privado”, tudo em parceria com a mídia privada que em si e por si é podre, venal, é braço do modelo.

Uma das discussões preferidas dos bancos é sobre juros. O direito de extorquir. Uma das garantias que a reforma pretendida pelo Banco Mundial assegura é esse “direito”.

A extorsão vira lei, desde que, lógico, praticada pelo “setor privado” em função do “desenvolvimento econômico”.

O cidadão?

Bom, se um edifício cai em Teresópolis e mata trinta ou quarenta pessoas, óbvio, a Fundação Roberto Marinho, baluarte da iniciativa privada, não vai se sentir incomodada, afinal o grande dilema é saber o momento que um integrante transexual do BBB-11 vai se revelar aos seus brothers e sisters.

Mas os veículos de comunicação do grupo GLOBO vão acusar governos adversários e apontá-los como responsáveis.

Torna-se necessário que o cidadão comum, aquele que está no edifício, ou na casa que vai cair e matá-lo e a toda a família, entenda que está se sacrificando pelo “setor privado” (até porque a reconstrução vai ser feita por empreiteiras), pelo “desenvolvimento econômico”, no altar do deus mercado e com certeza ao acordar vai se vir no céu com Pedro Bial anunciando os “nossos heróis”.

É só assentar onde der (deve ter lugar nesse céu/inferno) é olhar para a telinha.

A Justiça garante esse direito e é até possível, dependendo do nível de submissão ou de mercadoria em que se transformou, que seja aquinhoado com algum tipo de graduação de anjo desse modelo político, econômico e social.

Quando FHC determinou ao seu ministro da Justiça que criasse a comissão para estudar a reforma do Judiciário, em seguida, colocou seu ministro no STF (Supremo Tribunal Federal), para evitar transtornos e obstáculos no caminho.

Quem? Quem?

Nelson Jobim, nosso impávido “general” ocupando, hoje, o Ministério da Defesa. Só não há uma explicação de “defesa de quem e do que” para não criar constrangimentos diplomáticos desnecessários.

No projeto de recolonização da América Latina através da ALCA – Aliança de Livre Comércio das Américas – se os norte-americanos tivessem a tecnologia do chicletes de bola, azar dos brasileiros, não poderiam produzir aqui o chicletes de bola, mas vender a matéria prima necessária, aí sim.

Repete hoje, anos depois, a canção do SUBDESENVOLVIDO – “vender borracha comprar pneu”.

“Adequar” o Poder Judiciário a esse modelo, ao mercado e garantir a “propriedade privada” é o objetivo do estudo do Banco Mundial, ainda que a ALCA não tenha conseguido se materializar nos termos pretendidos pelos norte-americanos. Hoje comem o mingau pelas beiradas, como no caso da compra de aviões para reequipar a FAB – Força Aérea Brasileirra.

A Nova Ordem tinha objetivos (e os mantém) tais como: a fusão das forças armadas em todas as Américas (do Norte, do Sul e Central) e o assunto chegou a ser discutido entre FHC e Bill Clinton. Só não prosperou porque segundo FHC era preciso fazer uma coisa de cada vez e naquele momento, tudo ao mesmo tempo poderia resultar em alguns “protestos incômodos”.

Esse nível de “adequação” seria alcançado algumas etapas à frente.

Por que o Judiciário? Óbvio; é um poder por natureza antidemocrático, frio, moldado por critérios técnicos nas instâncias inferiores (nem sempre competentes), no caso do Brasil e outros países, paquidérmico (os servidores são tratados como sub-gente), o que escancara as portas à corrupção e nas instâncias superiores é formado a partir de interesses políticos específicos (Jobim, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, etc., etc.).

Aquela conversa escrita na Constituição de “notável saber jurídico e reputação ilibada” foi para o espaço faz tempo. É só imaginar que Gilmar Mendes é ministro da mais alta corte de Justiça (o cúmulo) do Brasil...

E de quebra emprega jornalistas da GLOBO (compra o silêncio, cumpre acordos no esquema de corrupção que permeia o modelo, é intrínseco ao modelo). Mais