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segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Copom sobe Selic na surdina

06/9/2013 - Por Paulo Kliass, de Paris - Jornal Correio do Brasil

Em seu 6° encontro deste ano, 27-28/ago, o Comitê deliberou mais uma vez pelo aumento da taxa SELIC

Muito pouca gente parece ter se dado conta do acontecimento.

As páginas de economia dos jornalões e os minutos de televisão preferiram não comemorar muito o fato. Afinal, parte da população já começa a perceber os prejuízos que a grande maioria sofre a cada vez que o governo resolve pelo caminho da elevação da taxa oficial de juros.

Apesar disso, o Comitê de Política Monetária (COPOM), em sua 177ª reunião ordinária, decidiu arrochar ainda mais a política monetária praticamente na surdina, quase sem nenhum alarido. Fez tudo no escurinho do cinema, quase incógnito.

Em seu sexto encontro desse ano, realizado em 27 e 28 de agosto, o Comitê deliberou mais uma vez pelo aumento da taxa SELIC. Assim, a taxa referencial de juros saiu dos 8,5% e foi para 9% ao ano. Tratava-se da quarta elevação em reuniões seguidas, em uma trajetória de alta que começou em 17 de abril desse ano. Naquela época, a SELIC estava em 7,25% e desde então passou a sofrer a espiral um novo aumento a cada 45 dias, periodicidade de reuniões do colegiado.

Mas como aquela semana estava totalmente tomada por outros fatos da conjuntura política e econômica, pouca atenção foi dada à decisão. O governo parece completamente perdido no quesito “diretrizes de política econômica”. 

Fica um pouco girando feito biruta de aeroporto, à mercê das mudanças repentinas dos ventos e sem uma linha de conduta racional e coerente a seguir.

As notícias do mundo real da economia não apresentavam nenhuma indicação de risco de descontrole das variáveis econômicas, que pudesse justificar a decisão pelo aumento dos juros oficiais. Essa alternativa não se colocava nem mesmo sob a ótica conservadora, resultado de uma suposta necessidade de promover um controle sobre um possível excesso de demanda.

Elevação da SELIC: o equívoco e o custo
Nesse caso, a estratégia de aumento da taxa oficial de juros obedeceu apenas e tão somente aos interesses da finança. Os únicos a lucrarem com essa política monetária extemporânea são os bancos e as demais instituições do sistema financeiro.

De um lado, se beneficiam pela maior remuneração que passam a receber pela aplicação de seus ativos em títulos da dívida pública. E de outro lado, ganham muito mais ainda pela elevação das taxas cobradas nas operações de crédito e empréstimo concedidas a indivíduos, famílias e empresas.

Em sumo, o que se vê é o governo estimulando e premiando a atividade parasitária do financismo em nossas terras, contra o empreendedorismo da economia real.

Ora, se a Presidenta Dilma estava insatisfeita com o quadro observado até então e reclamando que a economia não deslanchava, algum assessor tinha de lhe explicar que uma das razões para tanto era justamente o problema do elevado custo financeiro das atividades empresariais e o limite para maior nível de endividamento, atingido também pelo lado do consumo. Em tais condições, deve parecer óbvio – até para quem não estudou economia – que aumentar a taxa de juros tem o significado de um verdadeiro tiro no pé. 

Ganham os bancos e os especuladores. Perdemos todos os demais.
Por outro lado, o aumento da taxa de juros também apresenta uma fatura pesada para as próprias finanças públicas.

A taxa SELIC é a que se utiliza, como piso mínimo, para calcular a remuneração dos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional. Considerando-se que o total do estoque da dívida atual é de aproximadamente R$ 2 trilhões, conclui-se sem maiores dificuldades o tamanho da encrenca.

Esse aumento de 0,5% implicará um dispêndio adicional de R$ 10 bilhões no orçamento anual da União, apenas a título de novas despesas com juros. Ora, se a própria Presidenta elegeu o Pacto nº 1 como sendo o de austeridade fiscal, fica evidente que seus próprios auxiliares diretos já começam a descumprir suas recomendações.

Afinal, gastar recurso do Estado – supostamente escasso na atual conjuntura – com rubricas de dimensão financeira não pode ser considerado como bom sinal de rigor no controle da despesa pública.

Semana carregada: de Obama a Donadon
A conjuntura política e econômica estava bastante conturbada. A agenda estava tomada por uma série de eventos e processos de elevada sensibilidade. Terminaram por atrair mais a atenção do que essa reunião do COPOM. Já estava na pauta da política internacional a ameaça dos EUA em invadir a Síria, com a desculpa do suposto uso de armas químicas do governo de Assad contra as oposições. Ainda no plano das relações internacionais, veio à cena as “trapalhadas” dos responsáveis pela diplomacia brasileira na Bolívia, com a fuga espetacular do senador condenado pela justiça, com o auxílio e apoio do embaixador substituto.

A saia justa custou o posto do Ministro Patriota e colocou a nossa Presidenta em dificuldades frente ao Presidente Morales e aos demais parceiros. Por outro lado, vale lembrar que as denúncias de espionagem que a sociedade e o governo brasileiros estão sendo vítimas por parte dos norte-americanos tampouco haviam sido esclarecidas, com a participação direta do Presidente Obama.

Na política interna, o foco estava dividido entre dois pontos. De um lado, a negativa do STF em conceder os embargos dos condenados no caso do mensalão. De outro lado, a verdadeira vergonha nacional, patrocinada pelo plenário da Câmara dos Deputados, ao não proporcionar quórum para a cassação do deputado-presidiário Donadon.

Com uma coleção de itens tão candentes como esses, é até um pouco compreensível que “apenas mais uma reunião do COPOM” não estivesse tão à frente na lista de prioridades de cobertura e preocupação da grande imprensa.

Mas o ponto a se indagar é que até pouco tempo antes do encontro, a queixa generalizada era que a economia continuava patinando e que o Brasil não conseguia decolar para patamares mais interessantes de seu ritmo de atividade.

Mas, como costuma acontecer com certa frequência, as vozes ouvidas pelas editorias de economia dos meios de comunicação foram apenas aquelas vinculadas ao mundo do financismo. Criou-se, assim, mais uma vez o falso consenso em torno do modelito do monetarismo inescapável.

A lógica embutida no raciocínio favorável a mais essa elevação da SELIC voltava-se para os possíveis riscos derivados do movimento de desvalorização cambial. Mas isso não representava novidade alguma. Essa hipótese já estava posta na mesa há muito tempo.

Todos sabiam que o processo de valorização artificial de nossa moeda frente ao dólar norte-americano – e demais moedas estrangeiras consideradas “fortes” – estava com seus dias contados.

Além de ser extremamente perverso para nossa economia, o real valorizado combinava apenas com o interesse do capital especulativo internacional, que para cá se dirige em busca da rentabilidade estratosférica.

Mas o problema é que a equipe econômica há muito tempo se acomodou ao real sobrevalorizado. Os dividendos políticos fáceis derivados da farra dos eletrônicos chineses importados e da festa das famílias de classe média na ponte aérea para Miami devem ter falado mais alto. Valia manter a popularidade alta das pesquisas a qualquer custo.

Desvalorização cambial e a tensão no ar
No entanto, agora que a economia norte-americana começa a dar sinais de reaquecimento, a situação muda de figura. O FED (Banco Central dos EUA) cogita de um aumento na sua taxa básica de juros, depois de um longo período com taxas quase próximas a zero. Com isso, o diferencial de rentabilidade dos especuladores pelo mundo afora muda de patamar. Uma parte dos recursos sai do circuito terceiro-mundista e se volta para lá, em busca dessa alternativa de menor risco e menor remuneração.

Esse movimento de redução da enxurrada de dólares em nossa direção provoca uma tendência de desvalorização do real, no caminho de uma taxa de câmbio mais realista. Normal, é isso mesmo que se espera de uma política cambial menos fantasiosa.

O problema é que esse rearranjo provoca uma elevação de nossos preços internos, em razão da presença forte de produtos e componentes importados em nossa economia. E a inflação ameaçada, atiça os nervos dos monetaristas, que começam a clamar por elevação dos juros. O ciclo se fecha. 

E o COPOM resolve atender aos pleitos das finanças, aumentando outra vez os juros.

Mas o fato é que o governo perdeu a oportunidade de efetuar esse choque de câmbio necessário em um ambiente mais tranquilo, como até há poucos meses atrás. Agora terá de fazê-lo com mais cuidado, pois a inflação já havia iniciado um fase de alta, arriscando chegar na banda superior da meta.

De qualquer forma, existem outros mecanismos de evitar o alastramento da alta de preços provocados pela desvalorização.

E não será a elevação da SELIC a corrigir esse fato. Estão aí outros instrumentos, como o aumento do depósito compulsório dos bancos, a substituição de produtos importados mais sensíveis e a ação mais incisiva do governo junto às empresas e corporações.

Afinal, o mais importante é não se deixar amedrontar pela chantagem e pelo pânico.

Quem não se lembra da “terrível” semana da inflação do tomate, quando tudo parecia perdido, a nos orientarmos pelos editoriais dos grandes meios de comunicação. Amedrontado, o governo também havia cedido às pressões à época e aumentou a SELIC por conta disso.

Mas a safra dos hortifrutigranjeiros obedece a uma dinâmica que nada tem a ver com as decisões do COPOM. Assim, logo depois o tomate voltou aos preços de antes, até mais baixos. O pequeno detalhe é que, apesar disso, a SELIC não baixou.

As informações oriundas da economia real tampouco são muito claras para se perceber uma tendência firme de retomada das atividades no patamar exigido pelo País.

Apesar das boas notícias relativas ao PIB do segundo trimestre (crescimento de 1,5% na comparação com o mesmo período do ano passado), as estatísticas da produção industrial ainda são titubeantes. Em julho ela voltou a recuar 2%, acumulando um crescimento de apenas 0,6% ao longo de 12 meses.

Muito pouco para as nossas necessidades! Frente a esse quadro, a elevação dos juros é um das poucas decisões que o governo deve evitar sem nenhuma vacilação.

(*) Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

Fonte:
http://correiodobrasil.com.br/noticias/opiniao/copom-sobe-selic-na-surdina/642493/?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm_campaign=b20130907

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

... e o PIB subiu

30/08/2013 - Aguenta, Miriam.
- O Tombini fez o que pôde, mas não deu. O PIB subiu
- Fernando Brito - Tijolaço

O resultado divulgado agora há pouco pelo IBGE sobre o PIB não mostra que o crescimento da economia brasileira ficou acima das expectativas do “mercado”, que já ruminava com desdém uma previsão de crescimento de 1% nas contas do segundo trimestre de 2013.

Mostra que ficou MUITO acima: 1,5% de expansão, em relação ao primeiro trimestre e 3,3% em relação ao mesmo trimestre de 2012.

Num mundo em recessão, o dobro dos sinais de recuperação  que estão sendo saudados em prosa e verso pela mídia nos países desenvolvidos.

A Globo, por exemplo, soltou foguetes quando anunciou, ontem [29], uma prévia do PIB dos EUA com taxas, respectivamente, de +0,6% e + 2,5% em relação ao primeiro trimestre e ao trimestre correspondente em 2012.

E o resultado só não foi melhor porque a reversão da política de juros do Banco Central brasileiro, sob os aplausos dos comentaristas econômicos,
impôs arrocho ao crédito, aos investimentos e ao consumo das famílias, além de pressionar o governo a cortar despesas para fazer o tal superavit primário, para o qual lambem os beiços e os rentistas enchem os bolsos.

Olhe lá no gráfico e confira como o consumo das famílias e despesas governamentais foram os fatores que seguraram o PIB brasileiro de abril a 
junho.

Agora vai começar a cantilena que o terceiro trimestre vai ser pior. É possível até que não se repitam os números do segundo, mas a ascensão do PIB anual vai continuar, porque o do terceiro trimestre do ano passado – que é a base de comparação correta para o acumulado – não foi nenhuma Brastemp.

O terrorismo econômico não vai acabar, nem vai se reduzir.

Só o que pode vencê-lo é a coragem de persistir num modelo, que arranque nosso país da estagnação crônica que, até dez anos atrás, era a nossa rotina.

Não duvide que vão continuar nos acenando com monstros e fantasmas, inflação, câmbio, superavits.

A nós, porém, o perigo é nos faltar a coragem para avançar pelo caminho que tem dado certo.

Fonte:
http://tijolaco.com.br/index.php/aguenta-miriam-o-tombini-fez-o-que-pode-mas-nao-deu-o-pib-subiu/
Leia também:
http://correiodobrasil.com.br/ultimas/pib-do-2o-tri-confirma-rota-de-recuperacao/640857/?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm_campaign=b20130902

sábado, 1 de junho de 2013

As escolhas de Dilma

Por Saul Leblon - Carta Maior

As notícias que chegam dos correspondentes de Carta Maior na Europa formam um denso exclamativo de alerta.

A austeridade estala o relho do desemprego nas costas de quase 27 milhões de pessoas no continente –mais de 19 milhões só na zona do euro.

Um círculo vicioso de arrocho social, demência fiscal e privilégio às finanças escava o fundo do abismo.

Aleija o Estado; esquarteja o tecido social.

A fome está de volta numa sociedade que imaginava tê-la erradicado com a exuberância da política agrícola do pós- guerra, associada à rede de proteção do Estado social.

Quem não se lembra das montanhas de manteiga e trigo?

Inútil é a opulência quando a repartição se faz pela supremacia dos mercados desregulados.

Que meio milhão de pessoas passem fome no coração financeiro da Europa, como informa o correspondente em Londres, Marcelo Justo, nesta pág, deveria ser suficiente para afastar as ilusões na ‘solução ortodoxa’ para a crise sistêmica do capitalismo desregulado.

Mas a história não segue uma lógica moral; tampouco é imune a retrocessos.

A calibragem fina entre a barbárie e a libertação humana não está prevista nos manuais de economia.

Esse apanágio pertence à democracia.

Vale dizer, ao movimento das gigantescas massas de forças acumuladas na caldeira social de cada época.

A esquerda europeia, ao longo dos últimos 30 anos, jogou água fria no vapor.

Sua rendição histórica representa hoje o chão firme em que prospera a restauração conservadora.

A regressividade econômica se faz acompanhar da contrarrevolução sempre que a esquerda troca a resistência pela adesão à lógica cega dos mercados.

Os paralelepípedos de Paris assistem, estarrecidos, às marchas extremistas contra os direitos das minorias --num ensaio de assalto aos das maiorias, patrocinado pela tibiez do governo Hollande.

A França vive o seu ‘Maio de 68 de direita’.

Quem avisa, nesta pág, é o experiente jornalista Eduardo Febbro, correspondente de Carta Maior que tem o olho treinado na cobertura de grandes levantes sociais do Oriente Médio à América Latina.

A exceção alemã, ademais de suspeita num continente devastado, assenta-se em mecânica perversa.

Frau Merkel gaba-se de ter acrescentado 1,4 milhão de vagas ao mercado de trabalho germânico no século 21.

O feito encobre uma aritmética ardilosa.

Desde 2000, a classe trabalhadora alemã perdeu 1,6 milhão de empregos.

Vagas de tempo integral, com direitos plenos.

Substituídas por 3 milhões de contratações em regime precário, de tempo parcial.

O salário mínimo (hora/trabalho) do semi-emprego alemão só não é pior que o dos EUA de Obama.

É no alicerce das ruínas trabalhistas que repousa o sucesso das exportações germânicas, cantadas em redondilhas pelo jogral conservador aqui e alhures.

Exportando arrocho, o colosso alemão consegue vender mais do que consome internamente.

A fórmula espalha desemprego e ‘bons exemplos’ ao resto do mundo.

O ‘modelo alemão’, ademais, traz no DNA a singularidade que o torna inimitável: se todos acionarem o moedor de carne de Frau Merkel, quem vai comprar o excesso de salsicha?

O fundo do poço, enevoado neste caso pelo lusco-fusco da retomada norte-americana contrastada pela desaceleração asiática, é o ponto mais perigoso da crise. De qualquer crise.

As fragilidades estão no seu nível máximo.

E sempre surge alguém para propor que a hora é de escavar o porão com mais arrocho e desmanche social.

Roosevelt ouviu os conselhos dos ‘austeros’, em 1937, quando a economia dos EUA começava a respirar. O rebote depressivo foi tão longe que dele o país só saiu com o keynesianismo de guerra.

O próprio FMI alerta : nas condições atuais, cada unidade adicional de austeridade produz duas vezes mais decrescimento, do que no início do ‘ajuste’.

A ortodoxia acha que nada disso vale para o Brasil.

O país ingressa nesse capítulo do colapso neoliberal equilibrado em trunfos e flancos significativos.

Sua engrenagem econômica se ressente da mortífera sobrevalorização cambial que inibe exportações e transfere demanda para o exterior; as contas externas padecem, ademais, com a erosão nas cotações das commodities; o parque industrial retraído e defasado tecnologicamente é acossado pela invasão dos importados.

A determinação central, porém, é a luta pelo poder.

A disputa eleitoral de 2014 comanda o relógio dos mercados.

Os ponteiros do capital buscam candidaturas ‘amigáveis’.

Não investir na ampliação da oferta, capaz de domar a inflação, faz parte da campanha.

‘Culpa das incertezas’, justifica a mídia obsequiosa.

A mesma que encoraja a retranca aos investidores:

“Não façam agora o que poderá ser feito depois, lubrificado por ‘reformas desregulatórias’, caso a Dilma intervencionista seja derrotada”.

O BC endossa o cantochão.

Se não há investimento para atender a demanda, o equilíbrio virá pelo arrocho.

Pau nos juros.

A negociação do futuro não pode ficar restrita ao monólogo entre o mercado e o diretório do BC.

O saldo é mundialmente conhecido. As ruas da Europa dão seu testemunho.

O falso ‘remédio’ agrava a doença e calcifica o recuo do investimento.

Tudo adornado pela guarnição sabida: angu de desemprego com caroço de atrofia fiscal.

Perigosamente ilusória é a hipótese de curar essa indigestão com saltos nas grandes obras públicas.

O retrospecto não endossa a expectativa.

O Brasil já tem uma parte daquilo que as nações buscam desesperadamente (leia o artigo do economista Amir Khair, nesta pág.)

O singular trunfo brasileiro é o binômio ‘pleno emprego e demanda popular de massa’, parcialmente ancorado no Real 'forte'

Foi ele que protegeu o país da crise até agora.

É preciso erguer linhas de passagem para um novo ciclo. Mas essa é uma tarefa política e não contábil.

Se não dilatar o espaço da política na condução da economia, o governo corre o risco de perder o que já tem, sem obter o que a ortodoxia lhe promete.

Ao contrário da Europa, o Brasil tem forças sociais organizadas; suas centrais sindicais e a inteligência progressista dispõem de propostas críveis e sensatas.

Não foram desmoralizadas pela rendição ao neoliberalismo.

O governo construiu sólidas políticas sociais, ademais de estruturas de Estado para ampliá-las.

O conjunto permite à Presidenta Dilma negociar rumos e metas do desenvolvimento com a sociedade; bem como preservar seu mercado de massa com o reforço nas políticas sociais.

Acreditar que a ação do BC será suficiente para reordenar a economia no rumo dos investimentos é terceirizar o país à lógica conservadora, até agora restrita à exortação midiática.

Política é economia concentrada.

O governo Dilma tem escolhas a fazer. E legitimidade para exercê-las.

É a hora.


Fonte - Carta Maior - Blog das Frases - Saul Leblon..http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=6&post_id=1257

sábado, 30 de março de 2013

Dilma enfrenta a Pátria rentista: mídia uiva


Por Saul Leblon*
Uma dia de estupefação e revolta no circuito formado pelos professores banqueiros, os consultores e a mídia que os vocaliza.

Na reunião dos Brics, na África do Sul, nesta 4ª feira, 27 de março ,  a presidenta Dilma afirmou que não elevará a ração dos juros reivindicada pelos batalhões rentistas, a pretexto de combater a inflação.

A reação instantânea das sirenes evidencia a cepa de origem a unir o conjunto à afinada ciranda de interesses que arrasta US$ 600 trilhões em derivativos pelo planeta.

Equivale a dez voltas seguidas no PIB da Terra.

Trinta e cinco vezes o movimento das bolsas mundiais.

Os anéis soturnos desse garrote reúnem – e exercem – um poder de extorsão planetária, capaz de paralisar governos e asfixiar nações.

Gente que prefere blindar automóveis a investir em infraestrutura. O Brasil tem a maior frota de carros blindados do mundo.

E uns R$ 500 bi estocados em fundos de curto prazo; fora o saldo em paraísos fiscais.

Carros blindados, dinheiro parado, paraísos fiscais e urgências de investimento formam a determinação mais geral da luta política em nosso tempo.

Em Chipre, como lembra o correspondente de Carta Maior em Londres, Marcelo Justo, o capital a juros compunha uma bocarra equivalente a 67 bilhões de euros, uns US$ 90 bilhões de dólares.

Três vezes o PIB. De um país com população menor que a de Campinas.

A fome pantagruélica desse organismo requeria rações diárias indisponíveis no ambiente retraído da crise mundial.

A gula que quebrou Chipre é a mesma que já havia quebrado a Espanha, Portugal, Irlanda, Islândia e alquebrado o mercado financeiro dos EUA.

A falência cipriota assusta o mundo do dinheiro não por suas dimensões.

Mas porque ressoa o uivo cavernoso de uma bancarrota, só anestesiada a um custo insustentável na UTI mundial das finanças desreguladas.

No Brasil o mesmo uivo assume o idioma eleitoral ao gosto do dinheiro graúdo: ‘dá para fazer mais’.

O governo Dilma acha que sim.

Mas com a expansão do investimento produtivo. Não com arrocho e choque de juros.

O país ampliado por 12 anos de políticas progressistas na esfera da renda e do combate à pobreza, não cabe mais na infraestrutura concebida para 30% de sua gente.

A desproporção terá que ser ajustada em algum momento.

Como o foi, com viés progressista e investimento pesado, durante o ciclo Vargas.

Sobretudo no segundo Getúlio, nos anos 50.

Mas também o foi em 64.

Em versão regressiva feita de arrocho e repressão contra as reformas de base de Jango, no golpe que completa 49 anos neste 31 de março.

O que se assiste hoje guarda uma diferença política importante em relação ao passado.

Nos episódios anteriores, o conflito de classe entre as concepções antagônicas de desenvolvimento seria camuflado pela vulnerabilidade externa da economia.

Um Brasil estrangulado pelo desencontro entre a anemia das exportações e o financiamento das importações colidia precocemente com o seu teto de crescimento.

O gargalo do investimento se realimentava no funil das contas externas. E vice versa.

Era um prato cheio para o monetarismo posar de arauto dos interesses da Nação. E golpeá-la, com as ferramentas recessivas destinadas a congelar o baile.

'Quem está fora não entra; quem está dentro não sai'. 
Durante séculos, essa foi a regra do clube capitalista brasileiro.

Hoje, embora a pauta exportadora se ressinta de temerária concentração em commodities, não vem daí o principal obstáculo ao investimento.

O país dispõe de reservas recordes (US$ 370 bi). Tem crédito farto no mercado internacional. O relógio econômico intertemporal é favorável ao financiamento de um ciclo pesado de investimentos em infraestrutura.

Quem, afinal, veria risco em financiar a sétima economia do planeta, que, em menos de uma década, estará refinando a pleno vapor as maiores descobertas de petróleo do século 21?

O desencontro entre o Brasil que somos e aquele que podemos ser deslocou-se do gargalo externo, dos anos 50/60/80 para o conflito aberto entre os interesses da maioria da sociedade e os dos detentores do capital a juro.

Assim como em Chipre, na Espanha, nos EUA ou em Paris, o rentismo aqui prefere repousar num colchão de juros reais generosos, blindado por esférico monetarismo ortodoxo.

Migrar para a esfera do investimento produtivo, sobretudo de longo prazo, como requer o país agora, não integra o seu repertório de escolhas espontâneas.

Cabe ao Estado induzi-lo.

Dilma começou a fazê-lo cortando as taxas de juros.

A pátria rentista reclama:no primeiro trimestre deste ano, praticamente todas as aplicações financeiras perderam para a inflação. Ficou difícil multiplicar lucros e bônus sem botar a mão na massa da economia produtiva.

É essa prerrogativa estéril que os professores banqueiros do PSDB cobram pela boca e pelo teclado do jornalismo econômico, escandalizado com a assertiva defesa do desenvolvimento feita pela presidenta Dilma.

Presidenciáveis risonhos que se oferecem untados em molhos palatáveis às papilas monetaristas e plutocráticas vão aderir ao jogral.

“Esse receituário que quer matar o doente em vez de curar a doença está datado; é uma política superada", fuzilou Dilma.

Previsível, o dispositivo midiático tentou desqualificar o revés como se fora uma demonstração de ‘negligência com a inflação’.

Um governo que trouxe 50 milhões de pessoas para o mercado de consumo minimizaria a vigilância sobre a inflação?

Sacaria contra o futuro do seu maior patrimônio político?

A sofreguidão conservadora esmurra a própria coerência de sua análise sobre a força eleitoral do governo.

O governo Dilma optou por abortar as pressões inflacionárias imediatas com desonerações. E enfrentar o desequilíbrio estrutural com um robusto ciclo de investimentos.

Entende que o desafio da produtividade, indispensável à progressão dos ganhos reais de salários, deve ser vencido com infraestrutura e inovação. Não com arrocho, como se fez nos anos tucanos.

São lógicas dissociadas da receita rentista.

Aqui e alhures, a obsessão mórbida pela liquidez descolou-se da esfera patrimonial para a dos rendimentos financeiros. Não importa a que custo social ou político.

Sua característica fundamental é a preferência parasitária pelo acúmulo de direitos sobre a riqueza, sem o ônus do investimento físico na economia.

A maximização de ganhos se faz à base da velocidade e da mobilidade dos capitais, sendo incompatível com o empenho fixo em projetos de longa maturação em ferrovias, hidrelétricas ou portos.

Durante a década de 90, as mesmas vozes que hoje disparam contra o que classificam como ‘intervencionismo da Dilma’, colocaram o Estado brasileiro a serviço dessa engrenagem.

A ração dos juros oferecida no altar da rendição nacional chegou a 45%, em 1999.

Um jornalismo rudimentar no conteúdo, ressalvadas as exceções de praxe, mas prestativo na abordagem, impermeabilizou essa receita de Estado mínimo com uma camada de verniz naval de legitimidade incontrastável.

A supremacia dos acionistas e dos dividendos sobre o investimento –e a sociedade-- tornou-se a regra de ouro do noticiário econômico.

Ainda é.

A crise mundial instaurou a hora da verdade nessa endogamia entre o circuito do dinheiro e o da notícia.

Trata-se de uma crise dos próprios fundamentos daquilo que o conservadorismo entende como sendo ‘os interesses dos mercados’. Que a mídia equipara aos de toda a sociedade.

Dilma, de forma elegante, classificou essa ilação como uma fraude datada e vencida. De um mundo que trincou e aderna, desde setembro de 2008.

A pátria rentista uiva, range e ruge diante de tamanha indiscrição.
  • Fonte: Carta Maior- Blog das Frases por Saul Leblon*   

domingo, 30 de dezembro de 2012

Baixo crescimento, ideologia e pensamento

17.12.2012 - Luiz Carlos Bresser-Pereira - Folha de S. Paulo


O governo está fazendo uma política monetária e industrial competente, que já logrou baixar os juros, depreciar parcialmente o câmbio e, através do PAC, busca planejar e aumentar o investimentos nos setores não competitivos.

O baixo crescimento do PIB brasileiro no terceiro trimestre deixou os economistas convencionais alvoroçados.

Afinal, tinham como criticar o governo desenvolvimentista da presidente Dilma Rousseff.

Qual a crítica?
Que a baixa taxa de investimento (18% do PIB) deve-se à política industrial adotada pelo governo;

Que os empresários teriam ficado desorientados com as diversas medidas de estímulo fiscal e monetário que o governo vem tomando e teriam se tornado inseguros, teriam reduzido suas expectativas de crescimento e, assim, deixado de realizar investimentos.

Ora, isso não é explicação econômica;
Não implica pensamento, mas repetição da ideologia neoclássica e neoliberal, para a qual toda política industrial é sempre condenável porque distorceria a alocação de recursos.

É ideologia equivocada, porque a experiência secular dos países mostra que isso é falso: que política industrial geralmente é um fator de desenvolvimento econômico.

Mas, então, qual é a causa do baixo crescimento?
Em primeiro lugar, é preciso considerar que houve provavelmente erro do IBGE ao não considerar as variações de estoque em suas estimativas do PIB.

Conforme afirma com a competência de sempre Francisco L. Lopes, na Macrométrica, "a partir de 2010, os gestores e planejadores das empresas, assim como o distinto público, dentro e fora do país, resolveram acreditar que o Brasil se transformara em tigre asiático" e, por isso, aumentaram excessivamente a produção.

Em 2012, não obstante suas vendas continuem satisfatórias, reduziram a produção porque se puseram racionalmente a reduzir estoques. Mas o crescimento não é satisfatório, apesar da coragem que o governo revelou ao reduzir juros reais e ao lograr alguma desvalorização da taxa de câmbio.


Não o é porque a taxa de câmbio está longe do equilíbrio (cerca de R$ 2,70 por dólar).

O crescimento também não é satisfatório porque uma política industrial, por melhor que seja, não tem condições de sanar esse desequilíbrio fundamental da economia brasileira.

Muitos desenvolvimentistas ainda não entenderam isso e, baseados na experiência do alto crescimento do Brasil (1930-1980), acreditam nas virtudes mágicas da política industrial.


Isso também é ideologia sem base no pensamento.

A "política industrial" desse período não era apenas um sistema de incentivos à indústria (política industrial estrito senso); era também, senão principalmente, uma política macroeconômica através da qual o governo mantinha a taxa de juros real baixa e a taxa de câmbio no equilíbrio industrial, neutralizando, portanto, a "doença holandesa".

Isso se fazia por câmbios múltiplos e, nos anos 1970, por tarifas de importação e subsídios à exportação, os quais não eram mero protecionismo,
como geralmente se pensa, mas uma forma de estabelecer o imposto sobre as exportações de commodities.

Deixemos, portanto, de lado as ideologias e tratemos de pensar.

O governo está fazendo isto: uma política monetária e industrial competente, que já logrou baixar os juros, depreciar parcialmente o câmbio e, através do PAC, busca planejar e aumentar os investimentos nos setores não competitivos.

Está no caminho certo.

Fonte:
http://www.bresserpereira.org.br/Articles/2012/78.Baixo_crescimento_ideologia_pensamento.pdf

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade e, excetuando uma ou outra, inexistem no texto original.