domingo, 8 de julho de 2012

Brasil supera meta e terá 259 atletas nas Olimpíadas de Londres

8 de Julho de 2012 - original extraído do site Vermelho

Com o encerramento do Troféu Brasil de Atletismo no (1º), o Time Brasil alcançou seus números finais de vagas para os Jogos Olímpicos Londres 2012.

O Brasil será representado por 259 atletas, sendo 136 homens e 123 mulheres, em 32 modalidades, mesmo número que participou de Pequim 2008.

O número supera a meta do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), de levar 250 atletas.

Até o momento, 99 beneficiados pelo programa Bolsa-Atleta, do Ministério do Esporte, têm o passaporte carimbado para os Jogos.

Isso porque das vagas alcançadas, apenas 183 nomes estão definidos, já que algumas seleções ainda divulgarão os atletas que representarão o país nas Olimpíadas.

"Estamos muito satisfeitos por termos atingido a nossa primeira meta para os Jogos Olímpicos que se aproximam. Em Londres teremos uma delegação com ainda mais qualidade, com atletas que passaram por seletivas difíceis, algumas mais duras até que as estipuladas por algumas Federações Internacionais, como foi o caso do atletismo e da natação. Estamos confiantes de que o Brasil terá um bom desempenho em Londres", afirmou Carlos Arthur Nuzman, presidente do COB.

As seleções de basquete feminino e masculino (24 atletas), futebol masculino (18 atletas), ginástica artística (1 atleta no masculino e 5 no feminino), hipismo saltos (4 atletas) e a equipe masculina e feminina de vôlei (24 atletas) ainda definirão os atletas que representarão o país em Londres.

"A certeza é de que tivemos a melhor preparação da história, a partir de um planejamento estratégico conjunto com as confederações, que focou na qualidade desta delegação que estamos levando para Londres", analisou Marcus Vinicius Freire, superintendente executivo de esportes do COB.

"Durante o ciclo olímpico, o COB ofereceu todo o suporte para que os atletas brasileiros pudessem competir com as mesmas condições que as grandes potências do esporte. Estamos aprimorando nosso nível de serviço para dar um salto de qualidade no Rio 2016. Para Londres, nossa expectativa é de um desempenho próximo ao de Pequim em termos de medalhas, quando conquistamos 15, e uma participação maior em finais olímpicas, já que em Pequim foram 41", analisou Marcus Vinicius Freire.

A equipe brasileira chega a Londres com algumas conquistas importantes como: o retorno do basquete masculino. A última participação olímpica aconteceu em Atlanta 1996; a classificação recorde de dez pugilistas, sendo três atletas femininas nas três categorias em disputa; classificação em todas as 14 categorias do judô (inédito); classificação inédita do ciclismo BMX, com o ciclista Renato Rezende sendo o primeiro brasileiro a competir na modalidade.

Outras classificações são inéditas como: as duas equipes completas no tênis de mesa, sendo o país representado por três homens e três mulheres; três atletas da ginástica artística masculina, dois a mais que na última competição mundial - embarcam para Londres Diego Hypolito, Sergio Sassaki e mais um nome a ser definido defenderão as cores do país.

O tiro esportivo feminino também foi classificado, após 20 anos de ausência dos Jogos. Ana Luiza Ferrão vai encerrar um período de 20 anos sem uma atiradora brasileira disputando uma edição dos Jogos Olímpicos. A última a participar foi Tânia Giansante, que disputou os Jogos de Barcelona 1992.

O Brasil também se classificou em todas as armas na esgrima. Renzo Agresta, no sabre, Athos Schwantes, na espada, e Guilherme Toldo, no florete, serão os esgrimistas do Brasil em Londres.

No levantamento de peso, desde Sidney 2000, a delegação do Brasil não contava com a participação de uma atleta feminina no levantamento de peso. Em Londres, Jaqueline Ferreira representará o país.

Ginástica artística feminina
Após dez dias de preparação no Centro de Treinamento de Ginástica, o Velódromo, no Rio de Janeiro, a Confederação Brasileira de Ginástica (CBG) está mais próxima de definir as atletas que representarão o país em Londres. Das nove ginastas que participaram da última fase de treinos, sete foram convocadas para participar do período de aclimatação em Ipswich, na Inglaterra.

As ginastas Adrian Gomes, Bruna Leal, Daiane dos Santos, Daniele Hypolito, Ethiene Franco, Harumi de Freitas e Laís Souza foram as sete convocadas e seguem para a Inglaterra na terça-feira (10) para a aclimatação a 122 km de Londres. Adrian, Daniele e Bruna já estão confirmadas nas Olimpíadas. Quatro atletas disputam ainda as duas vagas remanescentes, já que apenas cinco integrarão a seleção olímpica. Foram cortadas Gabriela Soares e Letícia da Costa.

A equipe definitiva será anunciada no dia 25 de julho, dois dias antes da abertura oficial dos Jogos Olímpicos 2012. As disputas da equipe de ginástica artística feminina começam no dia 29 de julho, no North Greenwich Arena, em Londres.

Com informações do Ministério do Esporte
Fonte:
http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_secao=1&id_noticia=187740

sábado, 7 de julho de 2012

A vida privada de Assange usada para tentar ocultar o grande triunfo de WikiLeaks

01/07/2012 - por Patrick Cockburn
Original: The Independent “Patrick Cockburn: How Julian Assange's private life helped conceal the real triumph of WikiLeaks”
Traduzido pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu

A partir do momento em que Julian Assange conseguiu evitar a prisão, buscando refúgio na embaixada do Equador em Knightsbridge, escapando assim de ser extraditado para a Suécia, e provavelmente, em seguida, para os EUA, os jornalistas, colunistas e comentaristas britânicos tornaram-no alvo da mais escandalosa agressão.

Parecem babar de ódio, enquanto repetem os mais mesquinhos “exemplos” de uma pressuposta grosseria, pressuposto egoísmo e aparência pressuposta “péssima”, como se o que dizem fosse verdade e, por ser escrito pelos que escrevem, como se tratasse de crimes imperdoáveis.


O que se lê na imprensa britânica fala, uma vez mais, muito mais do convencionalismo e do instinto de manada dos formadores britânicos de opinião, do que de Assange.

O que passa sem ser noticiado, em toda a cobertura, é o quase inacreditável sucesso do fundador de WikiLeaks, que conseguiu publicar documentos do governo dos EUA, os quais, publicados, permitiram que muitos, em todo o mundo, começassem a saber como realmente agem seus governos. Que os eleitores conheçam, precisamente, esse tipo de fato é a alma da democracia, porque os eleitores têm de ser bem informados, para que consigam eleger representantes que de dediquem a fazer “governo do povo, pelo povo e para o povo”.

Graças a WikiLeaks, a opinião pública teve acesso a mais informação sobre o que fazem pelo mundo os EUA e seus aliados do que nunca antes, em toda a história da imprensa ocidental. O único momento semelhante a esse que me vem à mente foi a publicação, pelos bolcheviques vitoriosos em 1917, de tratados secretos, incluindo planos da Grã-Bretanha e da França, para ocupar o Oriente Médio [1].

Paralelo mais fácil foi a publicação dos Papéis do Pentágono, graças a Daniel Ellsberg em 1971, que revelaram as sistemáticas mentiras do governo Johnson sobre o Vietnã. Como se fez contra Assange, Ellsberg foi massacrado pela imprensa e pelo governo dos EUA, que o ameaçou com as mais severas penas.

Aspecto extraordinário da campanha contra Assange é que jornalistas, colunistas e “especialistas” sentem-se perfeitamente livres para publicar milhares de palavras sobre alegadas faltas de Assange, sem que se leia qualquer indignação contra os crimes de Estado, infinitamente mais graves, que WikiLeaks revelou ao mundo.

Os críticos e os leitores que concordam com eles deveriam, antes de falar, assistir a 17 minutos de um filme divulgado por WikiLeaks, filmado pela tripulação de um helicóptero Apache, sobre um bairro na parte leste de Bagdá, dia 12/7/2007. Mostra a tripulação do helicóptero matando, a rajadas de metralhadora, pessoas que se veem no solo, e que os soldados norte-americanos dizem supor que fossem guerrilheiros armados. Examinando o filme, não consigo ver arma alguma. O que teria sido tomado por arma, em mãos de um dos mortos, foi depois identificado como câmera de filmagem que estava sendo usada por Namir Noor-Eldeen, jovem fotógrafo da agência Reuters, morto, com o motorista também a serviço da Reuters, Saeed Chmagh. O vídeo mostra o helicóptero voltando para um segundo ataque, dessa vez contra uma caminhonete que parou para recolher os cadáveres e os feridos. O motorista dessa caminhonete também foi morto, e duas crianças foram feridas. "Há-há-há! Acertei eles!” – grita, em triunfo, um dos soldados norte-americanos. Olhem só os filhos da puta mortos!”

Eu estava em Bagdá quando a matança aconteceu e lembro que, no momento, nem eu nem outros jornalistas que lá estavam acreditamos no que o Pentágono informou, que todos eram guerrilheiros armados. Mas não havia como provar que o Pentágono mentira. Rebeldes armados não estariam conversando na esquina, com helicópteros dos EUA à vista. Logo se soube que havia um vídeo da matança, mas o Departamento de Defesa recusou-se terminantemente a divulgá-lo, nem quando se invocou a Lei da Liberdade de Informar [orig. Freedom of Information Act]. A versão oficial nunca pôde ser desmentida, até que o vídeo chegasse a WikiLeaks, enviado, parece, por um soldado dos EUA, Bradley Manning. WikiLeaks publicou o vídeo em 2010. [2]

Os telegramas diplomáticos que chegaram a WikiLeaks foram publicados adiante, no mesmo ano, em cinco jornais –The New York Times, The Guardian, Le Monde, Der Spiegel e El País – mas a resposta ao trabalho de Assange foi surpreendentemente mesquinha. Os jornalistas pareceram ter ficado furiosos por seu campo de caça privativo ter sido invadido por um nerd australiano, que fizera o trabalho que os jornalistas não haviam feito. Na Grã-Bretanha, o colunariato das empresas jornalísticas é clube notoriamente fechado, conservador e hostil a quem chegue de outros contextos culturais, com diferentes normas políticas.

Mas nem isso bastaria para explicar que toda a mídia planetária declarasse aberta a temporada de caça a Assange. Para que isso acontecesse, foi preciso que aparecessem acusações de que Assange seria autor de estupro na Suécia. Acusações de estupro destroem qualquer reputação, por mais frágeis que sejam as provas e mesmo que não haja prova alguma. Assange nunca conseguiu recuperar-se completamente daquelas acusações.

Quanto à sugestão de que ele estaria exagerando o risco de ser extraditado da Suécia para os EUA, é parte da caçada: quem, em sã consciência se exporia a algum acaso, mesmo que com 5% de probabilidades de deixar-se meter-se num voo para a Suécia que poderia levá-lo a sentença de 40 anos de cadeia nos EUA?

Muitos jornalistas e comentaristas agarraram-se ao argumento oficial de que os vazamentos teriam “posto vidas em risco”. Esse lobby começou a fracassar e a calar em 2011, quando funcionários do Pentágono tiveram de reconhecer, extraoficialmente, que não havia qualquer prova de que alguém tivesse sido ferido ou morto por causa dos vazamentos.

Resposta melhor seria que WikiLeaks nada revelou de realmente secreto; e que os documentos aos quais o cabo Manning teve acesso não eram classificados como secretos. Outro bom argumento de defesa ouvi de um diplomata dos EUA em Cabul, onde eu estava na época da publicação. Disse ele: “Não há segredo algum a ser divulgado por WikiLeaks, porque os “segredos” já foram vazados pela Casa Branca, Pentágono ou Departamento de Estado, que não souberam proteger os próprios documentos sigilosos, se fossem sigilosos”.

Na prática, os documentos publicados por WikiLeaks são exclusivamente e vastamente informativos sobre o que os EUA fazem e sobre o que os EUA pensam sobre o mundo no qual vivemos. Por exemplo, há um telegrama enviado da embaixada dos EUA em Cabul, em 2009, no qual o primeiro-ministro é descrito como “indivíduo paranoico e fraco, sem qualquer familiaridade com o básico da construção nacional”. [3]

Especialistas em Afeganistão comentaram que os defeitos de Karzai absolutamente não eram segredo ou novidade para ninguém. Deixaram de comentar que ali se ouvia a opinião de diplomatas norte-americanos experientes, falando sobre um homem que os norte-americanos e os britânicos estavam matando e morrendo, não para tirar do poder, mas para manter no poder.

Todos os governos são hipócritas, em maior ou menor medida, e há grande distância entre o que dizem em público e no privado.

Quando o povo exige transparência democrática em ações ou políticas gerais, o Estado e os governos fingem que enfrentam demandas por total transparência, que tornaria inviável qualquer governança efetiva.

A rapidez com que convertem demandas razoáveis em demandas alucinadas visa, quase sempre, a ocultar algum fracasso ou a defender o monopólio do poder.

Naquele caso, os EUA desejavam manter secreta bem mais que uma opinião negativa sobre Karzai, principal aliado local dos EUA. O real segredo que os EUA desejavam manter secreto é que não tinham qualquer parceiro confiável no Afeganistão e que, portanto, a guerra contra os Talibã tinha de ser dada por antecipadamente perdida.

Assange e WikeLeaks não desmascararam alguma incoerência, na opinião de um ou outro embaixador. Desmascararam a duplicidade de julgamentos para justificar a insistência dos EUA em prosseguir guerras fracassadas, nas quais morrem dezenas de milhares. Informações recentes mostram que esse tipo de segredo e o sigilo oficiais, com a ajuda empenhada de jornalistas “incorporados” às tropas, muitas vezes geram exatamente os resultados que se esperam deles.

No Iraque, nos meses anteriores à eleição presidencial de 2004 nos EUA, muitas embaixadas estrangeiras em Bagdá sabiam e informavam que os EUA só controlavam porções ínfimas de território, em país hostil. Mas o governo Bush conseguiu persuadir do contrário os eleitores norte-americanos: que estaria combatendo e vencendo uma batalha para instalar a democracia, contra os restos do regime de Saddam Hussein e seguidores de Osama bin Laden.

O controle da informação pelo Estado e a capacidade de manipular a informação, servindo-se para isso da imprensa-empresa, tornam sem sentido, na prática, o direito democrático de votar. Por isso os povos precisam muito de gente como Assange: para dar sentido, novamente, ao voto democrático.

Notas dos tradutores:
[1] A publicação desses tratados secretos foi dos primeiros atos do governo revolucionário bolchevique. Foram publicados dia 17/11/1917, por ordem de Trotsky, então Comissário do Povo para Assuntos Internacionais. Em 26/2/1922, o New York Times publicou matéria sobre eles em: EUROPE'S SECRET TREATIES. Em resumo acessível hoje dessas notícias, lê-se: “Desconfiança reina na Europa. Rússia revela os Tratados Secretos. Confiança nos EUA segue inabalável”.

[2] Os que não conheçam podem comprovar assistindo as cenas terríveis no vídeo que se segue:

[3] WikiLeaks “Diplomatic Cables”, Tuesday, 07 July 2009, 13:29 - S E C R E T SECTION 01 OF 03 KABUL 001767/ SIPDIS EO 12958 DECL: 07/03/2019 / TAGS PGOV, PREL, AF SUBJECT: KARZAI ON THE STATE OF US-AFGHAN RELATIONS – The Guardian, UK, em: “US embassy cables: Karzai feared US intended to unseat him and weaken Afghanistan”

Fonte:
http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2012/07/vida-privada-de-assange-usada-para.html

sexta-feira, 6 de julho de 2012

No Mato Grosso, tensão aumenta entre xavantes e latifundiários em terra cobiçada por agronegócio

06/7/2012 - por Felipe Milanez, da Carta Capital (*)
extraído do site Envolverde

No norte do Mato Grosso, um conflito entre índios e fazendeiros por uma terra homologada como indígena há 14 anos, porém quase toda invadida por latifundiários, tem ganhado proporções que perpassam a disputa local.

Nas últimas semanas, especialmente após a Rio+20 e seguida de um acórdão do Tribunal Reginal Federal que garante a posse aos índios, os ânimos foram acirrados e a iminência de violência física aumenta à medida que começa a se esgotar o prazo para o governo federal promover a retirada de não-índios da área.

O território xavante, chamado Marãiwatsédé, está no centro de um eixo de escoamento de soja e gado, onde o governo federal quer asfaltar a BR-158. O traçado ficaria fora da reserva e da Ferrovia Centro-Oeste, que liga as cidades de Campinorte (GO) e Lucas do Rio Verde (MT).

A disputa por este território expõe a dificuldade do governo em controlar os conflitos fundiários na Amazônia. Os pequenos posseiros, tradicionais inimigos dos índios na região, deram lugares aos grandes ruralistas – que se negam a deixar o território. A pressão externa tem provocado divisões internas dos Xavantes, que colocam em risco a vida das principais lideranças. “Nós vamos conseguir, tenho certeza”, diz o advogado dos fazendeiros, Luiz Alfredo Abreu, irmão da senadora Kátia Abreu (PSD-TO), uma das principais líderes dos agropecuaristas no Congresso Nacional.

Eu não tenho medo. Eu quero a terra. Eu morro pela terra”, rebate o cacique Damião Paridzané.

Liderados por Damião, os Xavante realizaram uma série de protestos durante a Rio+20, no Rio de Janeiro, no fim de junho. Auxiliados pela Operação Amazônia Nativa (Opan), foram recebidos pelo Greenpeace no navio da ONG atracado na cidade durante o encontro internacional. O ato simbólico acabou ganhando visibilidade internacional, o que irritou profundamente os fazendeiros.

Problema surgiu nos anos 60
A diáspora de Marãiwatsédé é decorrente da expulsão dos índios da região em 1966, e um dos problemas mais constrangedores do indigenismo no Brasil. Os Xavante foram levados em aviões da FAB para um outro território Xavante localizado 400 quilômetros ao sul, um aldeamento organizado por uma missão católica. Nos primeiros quinze dias, uma epidemia de sarampo matou 150 índios, e os sobreviventes fugiram para outras áreas Xavante, vivendo em uma espécie de exílio interno no País.

Após ser adquirido por uma empresa colonizadora paulista, de Ariosto da Riva, o território Marãiwatsédé passou para as mãos do Grupo Ometto e se transformou no latifúndio Suiá-Missu, com 1,8 milhão de hectares. Depois foi adquirido pela Liquigás e, em seguida, passou para as mãos da empresa italiana Agip Petrolli.

Nessa sucessão jurídica de posse, o esbulho dos Xavante passou em silêncio. Foi na Eco-92 que a situação mudou. O encontro internacional serviu para dar visibilidade, e a Agip foi constrangida, na Itália, por seus atos contrários aos direitos indígenas no Brasil. A sede da empresa decidiu devolver as terras aos índios, mas, no Brasil, o latifúndio foi invadido. Os posseiros e os fazendeiros que hoje ocupam ilegalmente a área chegaram durante esse período.

Cizânia interna faz parte dos Xavante aliar-se aos fazendeiros
Há alguns anos, os fazendeiros invasores ganharam aliados inesperados: alguns guerreiros xavantes, pintados e armados com bordunas, que há alguns anos estavam do outro lado do front. Chamados de “mercenários” pelo grupo indígena, envolve uma questão bem mais profunda de conflitos de poder dos Xavante. Visto de fora, no entanto, esse grupo de dissidentes tem sido considerado parte da “estratégia de Cortéz”, em referência ao “conquistador” espanhol do México, que fomentava divisões internas e alianças com índios rivais para a conquista dos territórios.

No caso, a briga interna acirrada nos últimos anos é entre o cacique Damião e seu irmão, Rufino, expulso da aldeia. Damião, segundo alguns sertanistas da Funai, teria ganho demasiado poder em uma má atuação do órgão indígenista para dirimir as divergências, como acumulando um cargo no órgão e o poder interno. Rufino, uma liderança também importante e que lutou, por anos, pelo retorno ao território, estaria sofrendo graves problemas de saúde – ele já teve uma perna amputada em razão de diabetes. A fragilidade física, junto da falta de espaço na aldeia, e com o território ocupado, teria sido o estopim para a aliança improvável com os posseiros.

Rufino, que também é uma liderança importante, procurou aliados xavante em outras terras indígenas, como Parabubure, São Marcos, e na aldeia Água Branca, fundada por Damião no território Pimentel Barbosa. Alguns desses índios, segundo informações de fontes do local, estariam recebendo 300 reais para participar da mobilização e teriam sido levados em ônibus fretados pelos fazendeiros. “Esses índios estão sendo usados, eles não sabem de nada, só ganharam dinheiro de fazendeiro. Eles não querem trabalhar na área”, acusa Damião.

As reivindicações de Rufino, que não foi localizado pela reportagem, não são claras. Algumas fontes afirmam que ele reivindica as terras do Parque Estadual que está sendo oferecido pelo estado do Mato Grosso, e outras que ele reivindica as terras dos cemitérios antigos.

Acirramento recente
A disputa local entre posseiros, sem terra e fazendeiro contra os índios ganhou, a partir de 2011, ares nacionais. A Confederação Nacional da Agricultura (CNA), junto da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso (Famato), passaram a ver a área como prioritária na defesa dos interesses ruralistas. Denúncias do Greenpeace sobre produção ilegal de carne na área indígena, e que seria vendida ao frigorifico JBS, numa campanha em que a ONG não levou adiante, serviu para aumentar a animosidade com os ruralistas. E houve o encontro dos Xavante com o Greenpeace durante a Rio+20.

Enquanto, no Mato Grosso, fazendeiros, posseiros e xavante aliados reunia-se com o governador do estado, em Brasília, a Funai organizava um encontro na Casa Civil com a Polícia Federal e o Incra para definir as estratégias para promover a desintrusão da área. O órgão deve cumprir a decisão do Tribunal Regional Federal de devolver a terra aos índios em 20 dias a partir da publicação do acórdão. No entanto, o advogado Abreu, dos ruralistas, diz que vai recorrer aos tribunais superiores (STJ e o STF). A favor do interesse de seus clientes ele aponta fatos novos, como a recente aliança com a divergência indígena, a tentativa de impugnação de laudo de uma antropóloga e um mapa onde a Funai aponta a existência de aldeias e cemitérios fora da área.

Evocando um costumaz argumento da “pressão internacional”, os ruralistas miram seus argumentos contra o apoio do Greenpeace e as decisões favoráveis aos índios na Justiça Federal: “Esses tribunais regionais e de primeira instancia sofrem pressão de ONGs, desse encontro internacional que foi a Rio+20, sofre a pressão e não estão isentos para julgar. Penso que só os tribunais superiores vão ter a possibilidade de julgar com isenção sem que se sintam pressionados, por esse momento historico que vive o Brasil que é a Rio+20", afirma o advogado Luiz Alfredo Abreu, que entrou no processo ano passado, após dois desastres de aviões que mataram os advogados do caso.

Ainda em 2011, na tribuna do Senado, o senador Jayme Campos (DEM) disse estar preocupado com o “aumento exacerbado” na ampliação e criação de novas reservas indígenas em Mato Grosso: “Meu Deus, onde nós vamos parar? O Mato Grosso vai acabar.” O argumento tenta restringir a capacidade da Funai de demarcar terras. “Sem o controle do Legislativo, áreas indígenas são hoje determinadas, na maioria das vezes, de acordo com a conveniência isolada de militantes sociais e antropólogos, amparados por resoluções, portarias e instruções normativas, não raro arbitrárias ou a partir de critérios dúbios, que trazem como resultado final uma reconfiguração do território brasileiro que nem sempre corresponde à realidade dos interesses nacionais”, avaliou.

Marãiwatséde é área indígena, homologada e garantida judicialmente”, afirma o assessor da presidência da Funai, Aluízio Azanha. “O governo vai cumprir a desintrusão. Primeiro, retirando os grandes fazendeiros que estão lá ilegalmente. Em seguida, os pequenos posseiros que possuem direito a reforma agrária”. A Funai também estaria se mobilizando para desarticular a divisão interna dos Xavante, que estaria sendo utilizada pelos ruralistas. “Marãiwatsédé é terra indígena mais desmatada do país. Não é possível falar em produção quando não se respeita a legislação. Isso é insustentável”, afirma Azanha.

Os xavante são os maiores latifundiários do mundo”, afirma Abreu. “Eles têm 1,5 milhão de hectares no Mato Grosso, isso dá 26 mil hectares por família”. Afirmando que a terra está demarcada irregularmente, diz que os índios, junto dos proprietários, vão entrar com recurso no Supremo. “Xavante é uma etnia que não vive na mata, só no Cerrado. As plantas medicinais, as iniciações sexuais, são tudo feito através de plantas medicinais do Cerrado”, explica.

Damião, o líder xavante, rebate. “Nós não vamos desistir do que é nosso. Eu quero é que saia fazendeiro e posseiro. Isso é que a comunidade quer”, diz Damião. “Eles usam os índios, mas a cabeça é dos fazendeiros. Aqui tá difícil, queimaram ponte, fizeram buraco na estrada para ninguém passar.” Damião tinha em torno de 8 anos quando foi transferido, junto de seu povo, e aparece nas fotografias da época, ao lado do avião da FAB. “Eu nasci e cresci em Marãiwatsédé”, diz ele. “E quero morrer em Marãiwatsédé”.

(*) Publicado originalmente no site Carta Capital.

Fonte:

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Golpe no Paraguai revela nova face da Operação Condor

05/07/2012 - Najla Passos em entrevista com Martin Almada, para Carta Maior

Em entrevista à Carta Maior, o mais importante ativista dos direitos humanos paraguaio, Martin Almada, disse que o golpe que destituiu Fernando Lugo da presidência revela a atualidade da Operação Condor, a maior ação articulada de terrorismo de estado já imposta ao povo latino-americano.

 Para Almada, essa nova Condor é muito mais abrangente do que a iniciada em 1964, no Brasil: é mais suave, global e revestida de uma capa pseudodemocrática, por meio da cooptação dos parlamentos.
(Najla Passos - Brasília)

Brasília - Em entrevista exclusiva à Carta Maior, o mais importante ativista dos direitos humanos paraguaio, Martin Almada, disse que o recente golpe que destituiu Fernando Lugo da presidência do seu país revela a atualidade da Operação Condor, considerada a maior ação articulada de terrorismo de estado já imposta ao povo latino-americano.

Prêmio Nobel da Paz alternativo, foi Almada quem descobriu, no Paraguai, na década de 90, o chamado “arquivo do terror”, que contém os principais registros conhecidos da Operação Condor, a articulação dos aparelhos repressivos do Brasil, Chile, Argentina, Paraguai e Uruguai que, a partir da década de 1960, sob a coordenação dos Estados Unidos, garantiram o extermínio das forças resistentes à implantação de um modelo econômico favorável aos interesses das oligarquias locais e das multinacionais que elas representam.

O ativista está em Brasília justamente para participar, nesta quinta (5/6), de um seminário sobre a Operação, promovido pela Comissão Parlamentar Memória, Verdade e Justiça da Câmara.

Confira a entrevista:

José López Chávez, parlamentar, um dos líderes do golpe
- Como se deu a articulação do golpe que destitui Fernando Lugo da presidência do Paraguai?
Foi uma trama muito bem montada pela direita paraguaia. E quando digo direita paraguaia, me refiro à oligarquia Vicuna, aos grandes fazendeiros, me refiro aos donos da terra, os plantadores de soja transgênica, me refiro às multinacionais, como a Cargil e a Monsanto, e também aos partidos tradicionais ligados a essas oligarquias. É um caso muito particular de golpe.

- Mas é possível compará-lo, por exemplo, com o golpe que ocorreu em Honduras?
Ao contrário do que muitos dizem, não se pode comparar. Foram golpes completamente diferentes. Em Honduras, o exército norte-americano interviu, junto com as tropas hondurenhas. A embaixada americana teve uma atuação clara. O presidente caiu em sua cama. No Paraguai, tudo foi articulado via parlamento, que é a instituição mais corrupta do país. No fundo, é claro, sem aparecer, também estava a embaixada americana. Mas sua participação se deu através das organizações não governamentais (ONGs) e dos órgãos de inteligência. Normalmente, um golpe de estado, como ocorreu em Honduras, se dá com tiroteio, bomba, pólvora, morte. No Paraguai, não houve tiroteio, não houve pólvora. O que rolou foi muito dinheiro, muitos dólares.

- E como se comportou a imprensa paraguaia?
Os meios de comunicação estavam todos a serviço do golpe. É por isso que digo que foi um golpe perfeito: quando o presidente golpista assumiu, se cantou o hino nacional com uma orquestra. E uma orquestra de câmara. Foi um golpe planificado com muita antecipação.

- E onde estava o povo, os movimentos organizados que não saíram às ruas?
O presidente Lugo cometeu muitos erros. Primeiro, quando ocorreu a morte de sete policiais e onze camponeses, eu penso, como defensor dos direitos humanos, que tanto a polícia quanto os camponeses eram inocentes. Aquele conflito foi uma trama. Os policiais usavam colete à prova de balas, mas os tiros ultrapassaram estes coletes. E nós sabemos que as armas usadas pelos camponeses são muito artesanais. Não teriam essa capacidade. O que nós imaginamos é que haviam infiltrados com armas muito potentes. E Lugo, após o conflito, fez uma declaração péssima: condenou os camponeses e prestou condolências aos familiares dos policiais. Isso caiu muito mal.

Segundo, Lugo firmou uma lei repressiva, uma lei de tolerância zero. Outro erro de Lugo foi firmar acordo com a Colômbia para assessorar a polícia paraguaia.

- Para tentar se manter no poder, ele fez concessões à direita que o desgastaram com as classes populares. É isso?
Exatamente. Então, no momento do golpe, o povo não saiu às ruas. Na verdade, foram dois motivos. Primeiro, a frustração, a indignação e o desencanto com Lugo. Segundo, no Paraguai, as pessoas com mais de 40 anos têm muito medo. Porque nós não vivemos 20 anos de ditadura. Nós vivemos 60. Então, só os jovens saíram às ruas. Aliás sempre, no Paraguai, as manifestações de ruas são protagonizadas por jovens, que tem uma coragem admirável.

- Como o senhor avalia a posição dos demais países do Mercosul e da Unasul de condenarem o golpe?
Este golpe foi um golpe ao Mercosul, um golpe à Unasul, porque Lugo tinha boas relações com o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, com o presidente da Bolívia, Evo Morales... e isso desagradava. Lugo, com todos os seus defeitos, melhorou a saúde do povo, melhorou a educação, deu alimentação nas escolas, comida, merenda. Nem tudo estava mal. Mas ao invés de premiar Lugo, o castigaram. É por isso que acreditamos que foi um golpe à unidade regional. Uma conspiração contra a unidade da região, contra a pátria grande com que sonhou Martin Bolívar para todos os latinoamericanos. Isso atenta contra todos. Pode ocorrer, amanhã, aqui, na Argentina... na Bolívia tentam um golpe de estado, no Equador também.

- Então, como na Operação Condor, é uma ameaça a toda a América Latina?
O golpe no Paraguai é a Condor se revelando. É prova que a Condor está se revelando com outro método. Uma Condor mais moderna, mais suave e mais parlamentar.

- E como o campo progressista pode reagir?
Esta reunião aqui no parlamento brasileiro para tratar da Operação Condor, por exemplo, é de extrema importância. Porque já é possível identificar três fases desta Operação. A primeira, que começou aqui no Brasil, em 1964, com a queda do presidente João Goulart, era uma Condor bilateral: Brasil-Argentina, Brasil-Paraguai, Brasil-Uruguai. A segunda, em 1975, já era uma Condor multilateral, com um acordo ratificado entre as ditaduras dos cinco países. Agora, a Condor é global. Depois dos eventos de 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos, se revelou que havia centros clandestinos de tortura americanos até na Europa. Portanto, há uma Condor global. E nós temos que entender o que é a Operação Condor, como ela funciona, quem a dirige... porque quem dirige a Condor é também quem dirige a Organização das Nações Unidas, o Pentágono, a máfia das drogas...

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=20528

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Oriente Médio: Aumenta o Clima de Tensão

28/06/2012 - Por Mário Augusto Jakobskind (*)
original publicado no site Rede Democrática

Governo de Israel usa holocausto para justificar ataque ao Irã, mas silencia sobre a existência de uma comunidade judaica no país persa.

O governo israelense de Benyamin Netanyahu pode estar mais próximo de realizar uma aventura bélica contra o Irã.

A guerra verbal que já dura algum tempo tem como pretexto uma suposta construção de artefato nuclear por Teerã.

Os sucessivos desmentidos do governo iraniano, que alega inclusive a proibição pelo Corão de o país ter uma bomba atômica, e o programa nuclear é para fins pacíficos, não tem sido levado em conta por Netanayhu ou pelo presidente estadunidense Barack Obama.

A diferença entre um e outro governo é que Washington ainda prefere aguardar os resultados das pressões econômicas para dissuadir o Irã a suspender o seu programa nuclear, enquanto Israel prefere agir militarmente.

O recente acordo político entre o direitista Likud, o partido do primeiro ministro israelense, e o centro-direitista Kadima, sob o comando de Shaul Mofaz, nomeado vice primeiro-ministro, resultou na formação de um governo de união nacional, cancelando até mesmo a antecipação das eleições gerais marcadas um dia antes para setembro. Mofaz nasceu no Irã e no governo anterior do Kadima defendeu um ataque às instalações nucleares do Irã.

Analistas políticos entendem que como acordos dessa natureza ocorrem em momentos considerados graves para Israel, é possível que o susposto “perigo iraniano” tenha pesado no entendimento, considerado praticamente impossível pouco tempo atrás, por se tratar de dois partidos rivais.

POTÊNCIA NUCLEAR
Os pretextos para o ataque são dos mais variados, mas não resistem a uma análise isenta e mais rigorosa. Enquanto Netanyahu coloca no tabuleiro o “perigo” que representa um Irã nuclear, organismos que acompanham o desenvolvimento nuclear pelo mundo, como o Instituto de Estudos Estratégicos com sede em Londres avalia que Israel possui 200 ogivas nucleares. Jane, uma empresa de defesa e informação, estima em 300 o número de ogivas nucleares, portanto equiparado à capacidade nuclear dos britânicos e franceses. As ogivas nucleares, segundo especialistas, podem atingir os continentes asiáticos e europeus.

Alguns analistas acreditam que mais do que um ataque iraniano, o governo de Israel receia que se um outro país naquela área consiga desenvolver eventualmente a bomba atômica ou mesmo um programa nuclear para fins pacíficos, Israel não reinará mais absoluto em termos militares no Oriente Médio.

Para o cientista político e linguista Noam Chomsky, Israel nuclear representa perigo para o Irã e não ao contrário. Chomsky acredita que as lideranças iranianas, do presidente Mahmoud Ahmadinejad ao aiatolá Khameney, mesmo utilizando retórica agressiva para consumo interno contra o regime sionista, não se atreveriam a atacar Israel, pois a retaliação ocidental seria avassaladora. Mas um ataque de Israel está se tornando uma possibilidade concreta.

PRETEXTO
Além do suposto “perigo nuclear” iraniano, o governo israelense utiliza também outro tipo de ameaça, chantageando a opinião pública não só de Israel como de países que ainda não superaram os traumas da II Guerra Mundial, entre os quais a própria Alemanha.

Netanyahu volta e meia se vale do que considera “possibilidade de um novo holocausto”, que seria provocado pelo Irã, para unir os israelenses e tentar convencer outras nações a apoiar uma ação militar contra as instalações nucleares.

Este argumento também não resiste a uma análise mais apurada. Ao contrário do que quer fazer crer Netanyahu, o Irã não tem intenção de “acabar com os judeus”, até porque no país persa existe uma comunidade judaica vivendo harmonicamente com os iranianos, inclusive com representação parlamentar.

TRÊS MIL ANOS
Esta comunidade, estimada em mais de 25 mil pessoas, que tem história no país persa de cerca de 3 mil anos, é oficialmente reconhecida como minoria religiosa e elegeu para o Parlamento em 2008 o doutor Ciama Moresadegh, diretor do Sapir Hospital e Charity Center.

Funcionam normalmente, em Teerã e outras cidades como Estahan, uma dezena de sinagogas, bem como muitas escolas e restaurantes judaicos, um asilo para anciãos da comunidade e um cemitério.

A comunidade judaica do Irã desfruta ainda de uma livraria com 20 mil títulos e ainda edita o jornal diário Ofogh-e-Bina, da mesma forma que um centro de pesquisa, com scholars judeus, a Central Library of Jewish Association.
 
Soldado israelense na fronteira com Gaza

Tais fatos raramente são noticiados e pouco conhecidos em Israel. O governo sionista prefere o silêncio sobre isso ou mesmo criticar os judeus que preferiram permanecer no Irã a emigrar para Israel.

Há casos inclusive de judeus iranianos que depois de passar um tempo em Israel retornaram ao país de origem porque optaram por “viver na paz e não na guerra e voltar a falar o seu idioma”, segundo revelou em recente palestra na Associação Brasileira de Imprensa o embaixador iraniano no Brasil, Mohammad Ali Ghanezadeg Ezabadi.

Uma das poucas referências sobre a comunidade judaica do Irã foi publicada na edição de 23 de fevereiro de 2009 no The New York Times, em matéria assinada por Roger Cohen sob o título “What Iran’s Jews Say” (O que dizem os judeus do Irã?). Cohen comenta inclusive que, ele mesmo, um judeu, nunca tinha sido recebido tão calorosamente, como em Teerã, onde havia uma comunidade judaica, que lá trabalhava e praticava o seu culto com relativa tranquilidade.

O mesmo articulista assinalou que em Estahan, outra grande cidade iraniana, na Praça Palestina, em frente a mesquita Al-Aqsa, viu uma sinagoga, com um cartaz na entrada com os dizeres “Congratulações da Comunidade judaica de Estaphan pelo 30° aniversario da Revolução Islâmica”.

Morris Motamed, em 2009 deputado judeu no Parlamento iraniano, confirmou a Cohen que, de fato, sentia no Irã “uma profunda tolerância com relação aos judeus”.

Argumentos como os de Cohen no The New York Times são pouco divulgados pela mídia de mercado brasileira e integralmente ignorados pelas lideranças sionistas.

VOZES DISCORDANTES
Mas mesmo em Israel há vozes discordantes em relação a uma possível ação militar contra o Irã. É o caso de Yuval Diskin, ex-chefe do Shin Bet, o serviço de segurança interno israelense, entre 2005 e 2011.

Além de enfatizar que não confia em Netanyahu ou no Ministro da Defesa, Ehud Barak, possíveis formuladores do plano de ação militar, Diskin alertou que um ataque israelense ao Irã pode “acelerar dramaticamente” o projeto nuclear iraniano.

No entender o ex-chefe do serviço de segurança interno de Israel, os líderes do país apresentam ao público um “quadro incorreto sobre a questão iraniana, tentando criar a impressão de que se Israel não agir, o Irã terá uma bomba atômica”.

Para Diskin trata-se de uma visão totalmente equivocada, pois “o que os iranianos fazem hoje devagar e silenciosamente, [depois de um ataque] terão legitimidade para fazer muito mais rápido”. Na mesma linha de pensamento crítico, o ex-chefe do Mossad, o serviço secreto israelense, Meir Dagan, considerou o plano “estúpido”.

Também o chefe do Estado-Maior do Exército israelense, general Benny Gantz, discordou de uma possível operação militar contra o Irã ao afirmar não acreditar que o Irã vá produzir armas nucleares. Entende o militar que o governo iraniano é “racional e sabe que seria um erro enorme produzir armas nucleares”. E ainda por cima, segundo ele, as sanções econômicas contra o Irã “começam a dar resultados”.

As próximas semanas podem ser decisivas. O Presidente Barack Obama já se manifestou em várias ocasiões que, no momento, é contra um ataque ao Irã, pois isso esvaziaria todos os esforços diplomáticos já feitos em prol de uma solução pacífica para o conflito.

Além disso, em plena campanha eleitoral para a sua reeleição, Obama teme também que um conflito agora poderá ter reflexos nefastos e que poderão por em risco a sua empreitada eleitoral, em função da provável subida astronômica do barril do petróleo que aconteceria com o fechamento pelos iranianos do Estreito de Ormuz, onde passam os petroleiros com o combustível para o Ocidente.

Já o governo Netanyahu, parte do lóbi sionista nos Estados Unidos vinculada à linha-dura republicana apoia uma ação militar já. Outros possibilidades que afetariam sobremaneira a Israel não se descartam. Uma delas, e que provoca maior temor, é uma reação do grupo Hezbollah, que, segundo o analista internacional e cientista político Luiz Alberto Moniz Bandeira, possui 20 mil mísseis escondidos em residências particulares em Beirute e outras cidades libanesas, e se acionados atingiriam o território israelense.

Resta saber como se comportaria a França pós Nicolas Sarkozy, agora sob o comando do socialista François Hollande, em caso de uma ação militar israelense ou mesmo numa etapa posterior se as pressões contra o Irã não produzirem resultados que levem a suspensão do programa nuclear.

A Alemanha, que ainda guarda complexo de culpa pelas atrocidades cometidas contra judeus, ciganos, homossexuais e populações da Europa Oriental que resistiram aos nazistas, de um modo geral, seja sob o comando da conservadora Angela Merckel ou mesmo o SPD, o partido social-democrata, se alinha quase que integralmente à política dos sucessivos governos israelenses.

(*) Jornalista, teve parte dos familiares assassinados na 2ª Guerra Mundial pelos nazistas na Polônia.

Fonte:
http://www.rededemocratica.org/index.php?option=com_k2&view=item&id=2210:oriente-médio-aumenta-o-clima-de-tensão