Por uma razão. Uma coisa é o "direito à água" constar da Declaração Final da Rio+20, reflexo de uma crescente oposição, não apenas às instituições de globalização corporativa (como a Organização Mundial do Comércio - OMC, o Fundo Monetário Internacional - FMI e o Banco Mundial - BM), mas também aos governos que tentam conciliar os interesses de grandes grupos econômicos (lucro antes de tudo) com uma necessidade vital de servir ao bem comum e outra é percebermos o desmesurado interesse que grandes corporações vêm demonstrando pelo movimentos que visam culminar com a privatização dos serviços relacionados com a extração, tratamento e distribuição de água, bem como com o tratamento de esgotos.
Embora queiramos reiterar nossa preocupação com as conhecidas gigantes da água, como as francesas Suez e Vivendi, a norte-americana Bechtel, a alemã RWE, etc. não podemos deixar de alertar que outras celebridades transnacionais, cujos produtos tradicionais pouco ou nada têm a ver com a gestão de recursos hídricos, como Nestlé, Coca-Cola, Nike, Shell, PepsiCo, etc. há alguns anos começaram a dirigir olhares de cobiça cada vez mais intensos, às fontes de água doce do mundo. Não foi à toa que quase todas enviaram seus representantes à Conferência, participando ativamente de plenárias e encontros, nem que fosse para apenas avaliar em que grau se encontra a resistência dos povos à privatização desse bem e a vontade deles em manter sob seus controles tais suprimentos.
As antações da Agência Notisa adiante dizem respeito a esse ambiente, tanto o das lutas comunitárias tornadas mais visíveis nos encontros ocorridos na Cúpula dos Povos quanto os dos esforços velados ou manifestos de aquisição corporativa dos sistemas de água que transpareceu em alguns dos paineis e sessões governamentais verificados no Riocentro. Não o foi o caso do painel "Diálogos para o Desenvolvimento Sustentável" do qual a jornalista Zilda Ferreira - da equipe deste blog -, participou, e onde a plateia votou pelo direito à água. Para se ter uma ideia do que aconteceu e seus possíveis significados e desdobramentos, de 10 ítens incluídos nos debates, o terceiro era o direito à água. Ao final, ele, sozinho, obteve 52% de aprovação da plateia presente, como direito prioritário associado ao desenvolvimento sustentável em contraposição a todas as demais nove cláusulas que somadas alcançaram 48%. Como a votação foi por demais expressiva, até mesmo um vice-presidente da Coca-Cola e o presidente do Conselho Mundial da Água, ambos notoriamente contrários a esse direito, aparentemente não tiveram coragem de negar o inalienável direito dos povos de gerir suas águas, tanto que, num determinado instante, pareciam até velhos e ardorosos militantes dessa causa.]
20/06/2012 - Cobertura Especial da Rio + 20 pela Agência Notisa
Chefes de Estado recebem recomendações sobre acesso à água e irão decidir se serão incluídas no documento Rio+20.
AGÊNCIA NOTISA – O Painel "Diálogos para o Desenvolvimento Sustentável" discutiu questões a respeito da água e faz parte dos eventos da Rio+20, o qual propõe três requisitos para serem discutidos pelos chefes de Estado durante o Segmento de Alto Nível da Conferência.
O painel foi divido em três momentos com a apresentação do requisito mais votado pelos internautas, pela platéia presente e pelos próprios debatedores que puderam acrescentar itens e modificar o requisito.
O painel contou com o canadense David Boys, representante dos Prestadores de Serviços em Água, com o brasileiro Benedito Braga, professor da USP e presidente da Associação Internacional de Recursos Hídricos (IWRA), com o norte-americano Jeff Seabright, vice-presidente de Recursos Hídricos e Ambientais da Coca-Cola e com o francês Loïc Fauchon, presidente do Conselho Mundial de Água (WWC). A mesa também teve participantes representando África e Ásia com Albert Butare, diretor executivo da África Energy Services Group, de Ruanda, Dyborn Chibonga, diretor executivo da Associação Nacional do Malawi de Pequenos Produtores Rurais (NASFAM), e Muhammed Ynus, fundador do Banco Grameen e Prêmio Nobel da Paz de 2006, de Bangladesh.
Além desses, o painel contou com a opinião feminina de Mirna Cunningham, diretora do Fórum Permanente das Nações Unidas para População Indígenas, da Nicarágua, Shantha Sheela Nair, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, da Índia, Ania Grobicki, secretária executiva da Global Water Partnership (GWP), da Suécia e Lucia Newman, do jornal Al Jazeera, do Reino Unido, como moderadora do evento.
Todos foram unânimes sobre a importância da água para todos os âmbitos da sociedade e sobre a necessidade de o recurso ser um direto assegurado pelos governos e não uma commodity. A indiana Shantha Sheela Nair afirmou que “várias questões deixam a humanidade abismada como a fome e a guerra, mas o fato de dois bilhões de indivíduos não terem acesso ao saneamento básico não abala as pessoas”. Além disso, ela disse que “a falta de saneamento prejudica mais as mulheres, as quais precisam de água para questões relacionadas com a higiene e a saúde, revelando uma questão de gênero na problemática da escassez d’água”.
O presidente da WWC garantiu que somente um país da Europa tem em sua constituição o direito à água. Ele também informou que 60% das escolas africanas não têm água potável e banheiro. Para o francês, “é preciso garantir a segurança hídrica”. Outro ponto relevante foi apresentado por Mirna Cunningham, a qual descreveu a importância da água para a dimensão cultural, “pois é necessário preservar as culturas, principalmente aquelas que possuem um modo diferente de captação da água como os povos indígenas”. Inclusive, este ponto foi acrescentado na recomendação escolhida pelos participantes do painel.
Assim, as três recomendações que os chefes de Estado receberam foram: “Assegurar o suprimento de água por meio da proteção da biodiversidade, dos ecossistemas e das fontes de água” – a mais votada pelos internautas –, “Direito à água” – escolhida pela platéia presente no painel – e “Reforçar a importância do planejamento e do gerenciamento integrado de água e energia e uso da terra em todas as escalas” – eleita pelos palestrantes. Na última recomendação, os debatedores convidados acrescentaram os itens de duas outras recomendações. Estes itens são: “A adoção de políticas mais ambiciosas para lidar com as necessidades de água e saneamento de uma forma segura” e “A inclusão do elemento cultural como fator crucial na definição de políticas hídricas”.
Os chefes de Estado receberam estas recomendações e irão debater sobre elas, as quais podem ser acrescentadas ou não no documento final do Rio + 20.
[Da Agência Notisa: apenas o destinatário desta notícia pode utilizá-la (texto e/ou ilustração) e com crédito para a Agência Notisa] - Agência Notisa (science journalism – jornalismo científico)
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