quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Indígenas contra velhos estereótipos





*por Isabelle de Grave, da IPS
indios3 Indígenas contra velhos estereótipos
A melhor maneira de preservar uma cultura oral é através do filme. Jovens Kuikuro documentam a cultura e as lendas de seu povo. Foto: Dal Marcondes.
Nova York, Estados Unidos, 9/8/2012 – A importância dos meios de comunicação comunitários, para se contraporem a determinados estereótipos que sofrem as etnias originárias e defender seus direitos, é destacada por ocasião da celebração, hoje, do Dia Internacional dos Povos Indígenas. O tema deste ano, Meios de Comunicação Indígenas: Dando Poder às Vozes Indígenas, faz parte da Segunda Década Internacional das Populações Indígenas do Mundo (2005-2015), dedicada à ação e à dignidade. A conferência que acontece hoje na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, pretende destacar a importância da mídia indígena na luta contra os estereótipos, a projeção de sua identidade, a comunicação com o mundo exterior e sua capacidade de influir na agenda política e social.
Representações estereotipadas afligem os povos aborígenes há tempos, pois costumam apresentá-los com um grupo homogêneo arraigado no passado e incapaz de mudar dentro dos países, os quais continuam passando por cima de seus direitos para que funcionem as políticas estatais. Duncan McCue, jornalista da Corporação de Radiodifusão do Canadá (CBC) desde 1998, expressou seu desejo de que os grandes meios de comunicação compreendam a importância de atender o tema dos estereótipos dos povos indígenas.
No contexto de sua tarefa com professor-adjunto da Faculdade de Jornalismo da Universidade da província de Colúmbia Britânica, McCue criou no ano passado o curso Informando sobre Comunidades Indígenas, bem como o site riic.ca, para promover uma cobertura justa sobre as questões indígenas. “Certa vez um ancião me disse que a única forma de um indígena aparecer no noticiário era se ele ou ela estivesse dentro dos quatro D: drumming, dancing, drunk or dead (batendo tambores, dançando, bêbado ou morto)”, escreveu no site o jornalista, que é membro dos chippewas da província canadense de Ontário, uma das maiores comunidades aborígines da América do Norte.
“Os povos aborígenes estão mal representados nas notícias. Quando aparecem, costumam ser vítimas e guerreiros ou manifestantes”, pontuou MacCue à IPS. A última fotografia sobre “povos não contatados” na Amazônia peruana prova a tendência dos grandes meios de comunicação ao sensacionalismo e ao espetáculo quando informam sobre questões aborígenes. Diante deste caso, Sheila Aikman, especialista em educação e desenvolvimento da britânica Universidade de East Anglia, declarou que “a mídia local se concentrou no que considerou que era notícia ou que chamaria a atenção, pelo menos em termos de impacto visual e de nota sensacionalista”.
Se detiveram “na confirmação da existência de povos não contatados, pessoas nuas e pintadas de vermelho disparando flechas contra os aviões”, detalhou Aikman à IPS. Imagens exóticas acompanharam artigos sobre as dificuldades vividas pelo povo maschco piro, que habita a região peruana de Alto Purus. Contudo, para esta especialista em educação intercultural e movimentos indígenas, a cobertura da imprensa “se concentrou nos estereótipos mais básicos”.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, exortou os “Estados-membros e os grandes meios de comunicação a criarem e manterem oportunidades para que os povos indígenas possam articular suas perspectivas, prioridades e aspirações”. McCue considera que iniciativas como o site riic, aberto a todos os jornalistas do mundo, é um ponto de partida para melhorar a cobertura. A tarefa de melhorar a cobertura em um setor que depende do mercado, limitado por tempo e recursos e com a constante pressão de elaborar notícias que sejam vendáveis, encontra uma considerável dificuldade.
No entanto, McCue se mostra otimista. “Estou convencido de que a capacitação de jornalistas vai melhorar a cobertura sobre as questões indígenas”, afirmou. “Nosso site é escrito para jornalistas, por um jornalista e do ponto de vista de que há dificuldades diárias na hora de informar, mas que podemos adaptar nossas práticas e nossos enfoques para que se ajustem aos indígenas sobre os quais informamos, o que só vai melhorar as matérias”, enfatizou à IPS.
Além disso, há o desafio de manter a iniciativa riic, criada com poucos recursos e apoio da Knight Fellowships, da norte-americana Universidade de Stanford, e de várias comunidades aborígenes. Além de melhorar a cobertura jornalística, McCue aponta a necessidade de maior disponibilidade de empregos para os próprios indígenas do Canadá. “A situação melhorou. Há mais jovens jornalistas aborígines do que quando comecei, há 14 anos, mas ainda estamos mal representados”, ressaltou Mccue.
Além do mais, “as faculdades de jornalismo do Canadá não fazem o suficiente para incentivar os estudantes indígenas a se dedicarem a esta profissão”, acrescentou. Há opções como a Rede de Televisão dos Povos Aborígines (ATP), lançada em 1999, a primeira no mundo que oferece uma plataforma para que os povos aborígines, inuit e mestiços compartilhem suas histórias.
Ao ser consultado sobre o papel da mídia na luta pela autodeterminação dos povos aborígines, McCue opinou que, “em última instância, cabe a nós, como indígenas, honrar nossos ancestrais e seus ensinamentos, vivendo e respirando a autodeterminação todos os dias. A luta pela autodeterminação tem muitas faces, e os meios de comunicação são uma ferramenta poderosa, tanto os nossos quanto as grandes redes, para compartilhar nossas histórias, promover o entendimento e cobrar a responsabilidade dos governos e de nossas próprias autoridades”. Envolverde/IPS
Fonte: Site Envolverde
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