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quinta-feira, 6 de junho de 2013
CIMI: Novo genocídio ameaça povos indígenas do país
Dermi Azevedo - Carta Maior
De acordo com o relatório do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) sobre a violência que atinge os povos indígenas, somente entre 2003 e 2011 foram assassinados 503 índios, dos quais 273 são do povo Guarani Kaiowá.
O aumento dos casos de violência que envolvem, de um lado, latifundiários e grileiros e, de outro lado, lideranças e povos indígenas do Brasil, apontam para um novo genocídio. É o que denuncia o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), um órgão ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
De acordo com o relatório sobre a violência que atinge os povos indígenas, somente entre 2003 e 2011 foram assassinados 503 índios, dos quais 273 são do povo Guarani Kaiowá. Os índios Kaiowá chegaram a publicar uma carta que foi traduzida e divulgada em todo o mundo:
“Sabemos que seremos expulsos daqui da margem do rio pela justiça, porém não vamos sair da margem do rio. Como um povo nativo e indígena histórico, decidimos em ser mortos coletivamente aqui. Não temos outra opção: esta é a ultima decisão unânime diante do despache da Justiça”.
“Se for para a gente se entregar – afirma a carta – nós não nos entregaremos fácil. É por causa da terra que estamos aqui; nós estamos unidos com o mesmo sentimento e com a mesma palavra para morrermos na nossa terra. Esta terra é nossa mesma! Os brancos querem nos atacar. Por isso nós dizemos: morreremos pela terra! Mas a ideia da gente se matar, ou se suicidar, nós não iremos fazer. Nós morreremos, se os fazendeiros nos atacarem. Aí poderemos morrer!”.
Processos
O município de Aral Moreira, no sul do Mato Grosso do Sul, lidera as estatísticas oficiais da violência contra os indígenas; nela, vivem 43 mil indígenas Guarani Kaiowá. Dos 43 mil, 32 mil vivem nessa área. A Justiça do Mato Grosso do Sul já examina mais de 100 processos que tratam da violência que envolvem os índios e os grandes fazendeiros. Entre os Kaiowá mortos, entre 2000 e 2011, 555 Guarani Kaiowá suicidaram-se. A grande maioria enforcou-se.
De acordo com o CIMI, os conflitos pela terra, desde os anos 70, vêm representando um verdadeiro extermínio, com muitos indígenas feridos, torturados e humilhados pelos grandes latifundiários. Muitos índios tiveram que deixar sua condição de povos indígenas, para se tornarem “caboclos”, o que vem gerando a perda de territórios, para a criação dos seringais e sobretudo, a perda da identidade do povo indígena e de sua dignidade. Apesar dos crimes por encomenda, praticados por fazendeiros contra os Guarani Kaiowá, denuncia o CIMI, nenhum não-indígena cumpre pena de prisão por ter matado um índio, mesmo com provas contundentes, ou testemunhas idôneas e réus confessos.
Numa ação clandestina conta a comunidade indígena Guaiviry, no município de Aral Moreira, no Mato Grosso do Sul em 18 de novembro de 2011, os fazendeiros orientaram os capangas para chegarem atirando, a começar contra as crianças, jovens e pessoas idosas. Na invasão da terra indígena, foram utilizadas seis armas calibre 12 com balas de borracha e moedas. De acordo com a Policia Federal, as moedas usadas nos canos das armas ferem mais, têm mais impacto e são mais letais.
Em reação a esse quadro de genocídio, as redes sociais da internet criaram a campanha “Somos todos Guarani Kaiowá”. Nessa iniciativa solidária, no Facebook, os internautas acrescentaram o nome do povo Guarani Kaiowá ao seu próprio sobrenome.
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=22117
segunda-feira, 15 de abril de 2013
Bancada ruralista pressiona para tirar poderes da Funai
Agência Brasil
Brasília – Deputados da bancada ruralista prometem apertar o cerco contra a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a atribuição do órgão de auxiliar na demarcação de terras indígenas no Brasil. Entre as estratégias para pressionar o governo por mudanças, integrantes da Frente Parlamentar da Agricultura dizem já ter assinaturas suficientes - mais de 180 - para protocolar um pedido de criação de uma comissão parlamentar de inquérito para investigar a Funai, mas ainda não há definição sobre quando isso será feito.
Na semana passada o grupo contabilizou duas vitórias. Na primeira, conseguiu convocar a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, para prestar esclarecimentos na Comissão de Agricultura da Casa sobre as questões indígenas. A data da ida da ministra ao Congresso deve ser definida ainda esta semana pelo presidente comissão, deputado Giacobo (PR-PR).
Os ruralistas conseguiram ainda, na última quarta-feira (10), o apoio que faltava para a criação de uma comissão especial para apreciar e dar parecer à Proposta de Emenda à Constituição (PEC 215/2000) que inclui, nas competências exclusivas do Congresso Nacional, a aprovação de demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, a titulação de terras quilombolas, a criação de unidades de conservação ambiental e a ratificação das demarcações de terras indígenas já homologadas, estabelecendo que os critérios e procedimentos de demarcação serão regulamentados por lei. A comissão foi criada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Alves (PMDB-RN), em retribuição ao apoio que recebeu dos ruralistas para comandar a Casa.
“Nós estamos criando uma série de injustiças para aqueles que são proprietários de terras, independentemente do tamanho. O que nos preocupa é a falta de critérios e de uma condição de defesa dentro dos processos de homologação conduzidos pelos antropólogos [da Funai]”, diz o deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) que integra a Frente Parlamentar da Agricultura.
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) reagiu à criação da comissão. Em nota divulgada no site, o Cimi repudiou a decisão. “O ato do presidente da Câmara constitui-se em um atentado à memória dos deputados constituintes, ataca de forma vil e covarde os direitos que os povos indígenas conquistaram a custo de muito sangue e atende os interesses privados de uma minoria latifundiária historicamente privilegiada em nosso país”, diz o documento.
Procurada pela Agência Brasil, a Funai enviou nota classificando a PEC 215/00 como um retrocesso e uma ação contrária à efetivação dos direitos territoriais dos povos indígenas.
“A Funai acredita que tal medida, ao invés de contribuir para a redução dos conflitos fundiários decorrentes dos processos de demarcação de terras indígenas, ocasionará maior tensionamento nas relações entre particulares e povos indígenas, diante das inseguranças jurídicas e indefinições territoriais que irá acarretar”, alerta o documento.
Entre as preocupações da Funai está o fato de a PEC prever a criação de mais uma instância no procedimento administrativo de regularização fundiária de terras indígenas. “Isso tornará mais complexo e moroso o processo de reconhecimento dos direitos territoriais dos povos indígenas - se não significar sua paralisia -, com graves consequências para a efetivação dos demais diretos destes povos, como, por exemplo, garantia de políticas de saúde e educação diferenciadas, promoção da cidadania e da sustentabilidade econômica, proteção aos recursos naturais, entre outros.”
Esta semana a bancada ruralista na Câmara deve se reunir com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa. No encontro, os parlamentares vão pedir a conclusão do julgamento da Terra Indígena Raposa Serra do Sol – que ainda depende da publicação do acórdão do julgamento e dos embargos declaratórios a respeito das 19 condicionantes impostas pela Corte, em 2009, para que a demarcação da área fosse mantida em terras contínuas.
Depois que isso for feito, a polêmica Portaria 303 da Advocacia-Geral da União (AGU) pode entrar em vigor. A norma proíbe a ampliação de áreas indígenas já demarcadas e a venda ou arrendamento de qualquer parte desses territórios, se isso significar a restrição do pleno usufruto e da posse direta da área pelas comunidades indígenas. Ela também veda o garimpo, a mineração e o aproveitamento hídrico da terra pelos índios, além de impedir a cobrança, pela comunidade indígena, de qualquer taxa ou exigência para utilização de estradas, linhas de transmissão e outros equipamentos de serviço público que estejam dentro das áreas demarcadas.
As divergências da Frente Parlamentar da Agricultura em relação às atribuições da Funai também levaram o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a se comprometer a criar um grupo de trabalho para receber as manifestações dos deputados. Em 30 dias, representantes da Secretaria de Assuntos Legislativos da pasta, da Funai e parlamentares devem começar a discutir propostas que envolvem a demarcação e desapropriação de terras no país.
A Frente Parlamentar Ambientalista, presidida pelo deputado Sarney Filho (PV-MA), marcou uma reunião para a próxima quarta-feira (17). Na avaliação dos ambientalistas, os apoiadores da PEC 215 são motivados por “interesses pessoais e individuais contrariados”. “A PEC é um retrocesso absoluto, ela acaba com qualquer possibilidade de política indigenista e de política ambiental. Tirar a prerrogativa do Poder Executivo de criar unidade de conservação e reservas indígenas e passar para o Congresso é a mesma coisa de dizer que não vai ter mais”, disse Sarney Filho.
http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-04-14/bancada-ruralista-pressiona-para-tirar-poderes-da-funai
sábado, 11 de agosto de 2012
Indígenas ocupam sede da AGU em Brasília pela revogação da Portaria 303
Jornal Brasil de Fato 10/08/2012
Renato Santana
de Brasília
Lideranças ocupam a sede da AGU - Foto: Ruy Sposati |
Mais de 50 lideranças indígenas de todo país ocuparam na manhã desta sexta-feira, 10, a sede da Advocacia Geral da União (AGU) em Brasília. “Exigimos a revogação imediata da Portaria 303”, gritaram os indígenas durante ação pacífica e de protesto.
Mobilizados pela Articulação dos Povos Indígenas Brasileiros (Apib), organizações regionais como Coiab (da Amazônia brasileira), Arpin-Sul (estados ao Sul do país), Apoinme (Minas Gerais, Rio de Janeiro e estados do Nordeste), Aty Guasu e Arpipan (povos indígenas do Pantanal).
Entre as lideranças, estão Raoni Metuktire Kayapó, Megaron Txucarramãe, cacique Babau Tupinambá, Kleber Apurinã, Lindomar Terena, além de representantes de povos de todas as regiões do país. Os indígenas exigiam uma audiência com o advogado-geral da União, Luís Inácio Almeida Adams, porém não foram recebidos. As lideranças seguiram, então, para o Supremo Tribunal Federal (STF), em busca de reuniões com os ministros.
A ação realizada pelos indígenas na sede da AGU está articulada com diversas outras que foram estouradas desde ontem. Todas pedem a revogação imediata da Portaria 303. Em Tocantins, cerca de 150 indígenas ocuparam também na manhã desta sexta-feira, a sede da AGU de Palmas. O movimento reivindica a revogação imediata da Portaria 303, publicada no último dia 16 de julho.
A mobilização começou com o trancamento da Avenida Teotônio Figurado, uma das principais artérias da capital tocantinense. Seis povos se articulam na ação: Apinajé, Xerente, Krahô, Javaé, Karajá de Xambioá e Krahô-Kanela.
“Queremos que a Portaria 303 seja rasgada. É mais violação dos nossos direitos. Queremos nossas terras demarcadas para vivermos nela”, afirma Wagner Krahô-Kanela. Ele explica que cada vez mais querem “detonar” os povos indígenas.
Um dos pontos da portaria é a revisão de demarcações de terras indígenas. Para os indígenas, a demarcação precisa ser feita de acordo com as leis, não como os políticos e seus aliados do agronegócio querem.
Os indígenas exigem a presença do coordenador da AGU de Palmas para que ele ouça os povos e “veja a indignação, porque parece que o governo federal não quer nos ouvir. Não é só aqui, mas em todo país”, diz o indígena.
Para Wagner e as demais lideranças que estão à frente da ocupação, a Portaria 303 interessa aos grandes latifundiários, aos grandes empreendimentos, caso das hidrelétricas e suas barragens, estradas e exploração de recursos minerais.
“Querem fazer as obras falando em economia e desenvolvimento, mas só vemos destruição, mortes e retiradas de direitos”, ataca Wagner.
Protestos em Cuiabá
Em Cuiabá, capital do Mato Grosso, os povos indígenas também se mobilizaram em protesto pela revogação da Portaria 303. Mais de 150 índios e servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai) organizaram um ato público em frente ao órgão indigenista estatal.
Entre os povos presentes estavam os Paresi, Chiquitano, Nambikuara e Enauwenê-nawê. “Esse protesto é em repúdio e para pedir a revogação. Num prazo de sete dias, caso não haja uma resposta (positiva), vamos tomar medidas mais radicais, inclusive, fechamento de rodovias”, afirmou Ronaldo Zokezomaiake ao Diário de Cuiabá. Aliderança é Paresi da aldeia Rio Papagaio, em Sapezal.
Dois documentos foram protocolados na Funai, Ministério Público Federal (MPF) e Advocacia Geral da União (AGU) de Cuiabá.
No primeiro, intitulado: Povos indígenas do estado do Mato Grosso: manifesto público, as comunidades externam indignação e repudiam a Portaria 303 da AGU.
“A história da humanidade, que deveria ter como essência e princípio o respeito à pessoa humana, ou seja, cada povo respeitando a cultura, o espaço e a diversidade de cada povo. Mas infelizmente os tempos e as gerações não testemunham esta convivência", diz trecho do manifesto.
Em outro documento elaborado pelos indígenas, a Portaria 303 é tratada como Porcaria 303. "(...) é praticamente um ato inédito na política indigenista do Brasil recente, que explicitamente e publicamente o Governo Federal age de má fé”, escrevem os indígenas num dos trechos do texto.
Direcionado também ao Supremo Tribunal Federal (STF), o documento foi encaminhado à imprensa regional, nacional e internacional, bem como aos diversos setores da sociedade brasileira, comunidade internacional e às Nações Unidas (ONU).
Retomada no Mato Grosso do Sul
Além de protestos e ocupações, os povos protestam também contra a Portaria 303 fazendo retomadas. Cerca de 400 indígenas Guarani Kaiowá retomaram na madrugada desta sexta-feira parte de área de ocupação tradicional do tekoha Arroio Koral, município de Paranhos, Mato Grosso do Sul.
O território é motivo de conflitos fundiários e judiciais: além das violências cometidas contra os Guarani Kaiowá, a homologação recente da terra indígena foi suspensa pelo STF. O processo, no entanto, ainda não foi votado por todos os ministros e a comunidade exige celeridade na decisão.
De acordo com as lideranças do movimento de retomada, a morosidade na demarcação, homologação e extrusão dos invasores não-índios dos territórios promove a violência contra os Guarani Kaiowá. Por essa razão, decidiram fazer a retomada: com a Portaria 303, avaliam que tal quadro de não cumprimento dos direitos constitucionais deve se agravar.
“Os fazendeiros da faixa de fronteira Brasil/Paraguai, juntos com seus pistoleiros, certamente vão reagir de modo violento contra essas lideranças em manifestação”, declarou nesta manhã Tonico benites Guarani Kaiowá, que pede a presença imediata das autoridades na região e a revogação da Portaria 303 da AGU.
Efeitos da Portaria 303
Indígenas não foram recebidos pelo advogado-geral da União,
Luís Inácio Almeida Adams - Foto: Ruy Sposati
|
A portaria pretende estender condicionantes decididas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Judicial contra a Terra Indígena Raposa Serra do Sol para as demais terras indígenas. Porém, a decisão dos ministros ainda não transitou em julgado e essas condicionantes podem sofrer modificações ou serem anuladas.
Justificando “flagrante inconstitucionalidade”, juristas, como Dalmo Dallari, e setores do próprio governo federal se levantaram contra a portaria. Durante o contexto de publicação da medida, a presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Marta Azevedo, revelou estar sendo pressionada. Para o movimento indígena e indigenista, justamente pelos interesses e interessados que articularam a iniciativa da AGU.
Isso porque a Portaria 303 determina, entre outras medidas, que as terras indígenas podem ser ocupadas por unidades, postos e demais intervenções militares, malhas viárias, empreendimentos hidrelétricos e minerais de cunho estratégico, sem consulta aos povos. Por um mero instrumento, a AGU desconstrói o direito constitucional indígena de usufruto exclusivo da terra de ocupação tradicional.
Desconsidera, assim, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário desde 2004. Para os indígenas, o governo federal é cínico ao não revogar a portaria, publicada no momento em que os povos indígenas são chamados para “dialogar” sobre a promoção e a proteção dos direitos indígenas no âmbito da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) e para regulamentar a Convenção 169.
Por fim, a Portaria 303 determina a revisão das demarcações em curso ou já demarcadas que não estiverem de acordo com o que o STF decidiu para o caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol – ou melhor, ainda não decidiu.
Nota da editora do Blog: Há relatos estarrecedores de violência praticada pelos fazendeiros de Mato Grosso do Sul, principalmente da região de Dourados, contra os índios Guarani Kaiowá. No início deste ano, estive na região, mas não pude ir até às aldeias documentar, porque estava gripada.
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Renato Santana
quarta-feira, 25 de julho de 2012
Indígenas de Cauca dão uma lição ao mundo
Nos últimos dias assomou nos noticiários brasileiros a notícia de que um grupo de índios colombianos havia ocupado uma base militar na cidade de Toríbio, região de Cauca, expulsando dali o exército. As notas falavam que os indígenas já estariam cansados de viver sob o fogo cruzado das forças do Estado e da guerrilha comandada pelas Forças Armadas Revolucionárias Colombianas, as Farcs. Mas, a notícia, assim, solta, não dá conta do longo processo de luta e resistência das comunidades originárias daquela estratégica região. Como sempre, falta a imprensa brasileira o devido cuidado com a contextualização dos fatos.
A reportagem é de Elaine Tavares no sítio Instituto de Estudos Latino-Americanos – IELA, 17-07-2012, vinculado à Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC.
A zona de Cauca é considerada um importante e estratégico corredor que liga a região amazônica ao oceano pacífico, com passagem também para o Equador e, por isso, desde muitos anos vem sendo disputada pelo Estado e pelas FARCs. Além disso, sempre é bom lembrar que a situação de guerra civil na Colômbia tampouco é de hoje. Isso começou no longínquo ano de 1948 quando Jorge Gaitán, um político liberal e progressista, às vésperas de ganhar a eleição presidencial, foi assassinado, levando o povo a uma explosiva revolta que foi violentamente reprimida pelas forças reacionárias, mandantes do crime. Desde aí, a população acabou sendo obrigada a se armar, para enfrentar as forças do exército como também os inúmeros grupos de bandoleiros que se aproveitaram do caos para roubar e saquear.
Essa situação de insegurança e de profunda violência também gerou – já na década de 60 - as forças revolucionárias que, com inspiração marxista, buscaram organizar o povo para uma reação organizada e ordenada de tomada do poder. Mas, a América Latina vivia a surpreendente revolução cubana e a reação dos Estados Unidos foi imediata. Não haveria de permitir que outro foco socialista nascesse nas terras de baixo. Não foi à toa que desde os anos 60 as ditaduras pipocaram por todo o continente.
Ao longo dos anos, com a ajuda militar e tática dos Estados Unidos as forças conservadoras seguiram dominando a Colômbia, enfrentando a persistente reação revolucionária. Esse processo que segue até hoje tem causado profundas feridas no corpo social. Lá se vão mais de 60 anos de conflitos e combates nos quais vão sendo ceifadas as vidas das gentes. Não bastasse essa realidade explosiva, ainda existem no país os chamados paramilitares, que são grupos de combate à guerrilha, geralmente formados por militares e mercenários que também impõem o terror. A eles se somam os narcotraficantes financiados pelo sistema internacional que igualmente investem em milícias armadas. No meio de tudo isso está o povo, as gentes que querem viver em paz.
A região de Cauca é um desses lugares assolado pelos grupos armados, justamente por sua localização estratégica. E ali, vivem comunidades indígenas que, nesses anos a fio, também entregaram seus filhos, ora ao exército, ora à guerrilha e que cotidianamente sofrem a ação das lutas entre essas forças armadas. São pelo menos 570 mil hectares de terras comunais, onde tradicionalmente essas comunidades plantam e criam seus animais.
A guerra civil, que teve seu espocar em 1948, aos poucos foi perdendo a sua própria memória. Geração após geração se viu enredada nos conflitos e na batalha diária pela sobrevivência. Muitos dos que viveram os primeiros momentos do conflito morreram no caminho, e os motivos da revolta foram ficando obscurecidos. Já faz tempo que a Colômbia busca um caminho para a paz, mas não tem conseguido pavimentar essa estrada. Primeiro porque o poder econômico aliado aos Estados Unidos não tem a menor intenção de permitir que os aliados saiam do poder. Por outro lado a guerrilha não avança mais do que a perpétua resistência. E no meio desse fogo cruzado estão as pessoas comuns.
Os indígenas colombianos tem uma longa história de resistência e de luta. Primeiro contra o opressor colonial e agora contra o Estado terrorista. A região de Cauca, particularmente, é muito aguerrida. Desde o ano de 1971 a população indígena organizou o Conselho Regional Indígena de Cauca, o CRIC, entidade que tem sido protagonista de muitas lutas, chegando também a organizar um grupo armado de autodefesa que acabou depondo as armas em 1991 em um dos acordos de paz. Assim como todos os colombianos eles precisavam defender suas vidas. Desde a organização do CRIC os indígenas passaram a reivindicar direitos que estavam perdidos nas contas da guerra: terra, educação, saúde, proteção da natureza da mão destruidora das mineradoras.
A ação de expulsão do exército de suas terras, assim como a de qualquer outro grupo armado – sejam as FARCs, os paramilitares ou os narcotraficantes – está amparada na decisão comunitária de dar um basta a desaparição sistemática das gentes. “Queremos semear a paz telúrica no nosso território e colhe-la na vida comunitária”, dizem. Mas essa paz de que falam não é a paz dos vencedores de plantão, que significa a morte ou a submissão da comunidade seja ao exército ou à guerrilha. A eles não interessa dominar o espaço, mas sim conservar a terra para as próximas gerações.
Mais uma vez os indígenas estão dizendo a sua palavra, sempre ignorada nesses mais de 500 anos. A forma de organizar a vida pleiteada pelas comunidades indígenas não encontra parâmetros na forma imperial/capitalista – como quer o governo, nem na forma socialista, de matriz europeia – como quer a guerrilha. Os indígenas querem viver a sua vida baseada na lógica dos seus ancestrais, com autonomia e autogoverno. Eles querem o direito de impor a sua justiça comunitária, de definir sua economia, sua educação, saúde. Querem o direito de conservar, proteger e gerir os recursos naturais de seu território. Por isso eles derrubaram os portões do exército e as tendas da guerrilha. “Tanto um como outro nos expropria, nos tira a vida e não nos garante o direito de viver segundo nossa vontade autônoma. Uns trazem a guerra e outros querem nos dizer como resistir. Ambos nos negam como povo”, afirmam.
A reportagem é de Elaine Tavares no sítio Instituto de Estudos Latino-Americanos – IELA, 17-07-2012, vinculado à Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC.
A zona de Cauca é considerada um importante e estratégico corredor que liga a região amazônica ao oceano pacífico, com passagem também para o Equador e, por isso, desde muitos anos vem sendo disputada pelo Estado e pelas FARCs. Além disso, sempre é bom lembrar que a situação de guerra civil na Colômbia tampouco é de hoje. Isso começou no longínquo ano de 1948 quando Jorge Gaitán, um político liberal e progressista, às vésperas de ganhar a eleição presidencial, foi assassinado, levando o povo a uma explosiva revolta que foi violentamente reprimida pelas forças reacionárias, mandantes do crime. Desde aí, a população acabou sendo obrigada a se armar, para enfrentar as forças do exército como também os inúmeros grupos de bandoleiros que se aproveitaram do caos para roubar e saquear.
Essa situação de insegurança e de profunda violência também gerou – já na década de 60 - as forças revolucionárias que, com inspiração marxista, buscaram organizar o povo para uma reação organizada e ordenada de tomada do poder. Mas, a América Latina vivia a surpreendente revolução cubana e a reação dos Estados Unidos foi imediata. Não haveria de permitir que outro foco socialista nascesse nas terras de baixo. Não foi à toa que desde os anos 60 as ditaduras pipocaram por todo o continente.
Ao longo dos anos, com a ajuda militar e tática dos Estados Unidos as forças conservadoras seguiram dominando a Colômbia, enfrentando a persistente reação revolucionária. Esse processo que segue até hoje tem causado profundas feridas no corpo social. Lá se vão mais de 60 anos de conflitos e combates nos quais vão sendo ceifadas as vidas das gentes. Não bastasse essa realidade explosiva, ainda existem no país os chamados paramilitares, que são grupos de combate à guerrilha, geralmente formados por militares e mercenários que também impõem o terror. A eles se somam os narcotraficantes financiados pelo sistema internacional que igualmente investem em milícias armadas. No meio de tudo isso está o povo, as gentes que querem viver em paz.
A região de Cauca é um desses lugares assolado pelos grupos armados, justamente por sua localização estratégica. E ali, vivem comunidades indígenas que, nesses anos a fio, também entregaram seus filhos, ora ao exército, ora à guerrilha e que cotidianamente sofrem a ação das lutas entre essas forças armadas. São pelo menos 570 mil hectares de terras comunais, onde tradicionalmente essas comunidades plantam e criam seus animais.
A guerra civil, que teve seu espocar em 1948, aos poucos foi perdendo a sua própria memória. Geração após geração se viu enredada nos conflitos e na batalha diária pela sobrevivência. Muitos dos que viveram os primeiros momentos do conflito morreram no caminho, e os motivos da revolta foram ficando obscurecidos. Já faz tempo que a Colômbia busca um caminho para a paz, mas não tem conseguido pavimentar essa estrada. Primeiro porque o poder econômico aliado aos Estados Unidos não tem a menor intenção de permitir que os aliados saiam do poder. Por outro lado a guerrilha não avança mais do que a perpétua resistência. E no meio desse fogo cruzado estão as pessoas comuns.
Os indígenas colombianos tem uma longa história de resistência e de luta. Primeiro contra o opressor colonial e agora contra o Estado terrorista. A região de Cauca, particularmente, é muito aguerrida. Desde o ano de 1971 a população indígena organizou o Conselho Regional Indígena de Cauca, o CRIC, entidade que tem sido protagonista de muitas lutas, chegando também a organizar um grupo armado de autodefesa que acabou depondo as armas em 1991 em um dos acordos de paz. Assim como todos os colombianos eles precisavam defender suas vidas. Desde a organização do CRIC os indígenas passaram a reivindicar direitos que estavam perdidos nas contas da guerra: terra, educação, saúde, proteção da natureza da mão destruidora das mineradoras.
A ação de expulsão do exército de suas terras, assim como a de qualquer outro grupo armado – sejam as FARCs, os paramilitares ou os narcotraficantes – está amparada na decisão comunitária de dar um basta a desaparição sistemática das gentes. “Queremos semear a paz telúrica no nosso território e colhe-la na vida comunitária”, dizem. Mas essa paz de que falam não é a paz dos vencedores de plantão, que significa a morte ou a submissão da comunidade seja ao exército ou à guerrilha. A eles não interessa dominar o espaço, mas sim conservar a terra para as próximas gerações.
Mais uma vez os indígenas estão dizendo a sua palavra, sempre ignorada nesses mais de 500 anos. A forma de organizar a vida pleiteada pelas comunidades indígenas não encontra parâmetros na forma imperial/capitalista – como quer o governo, nem na forma socialista, de matriz europeia – como quer a guerrilha. Os indígenas querem viver a sua vida baseada na lógica dos seus ancestrais, com autonomia e autogoverno. Eles querem o direito de impor a sua justiça comunitária, de definir sua economia, sua educação, saúde. Querem o direito de conservar, proteger e gerir os recursos naturais de seu território. Por isso eles derrubaram os portões do exército e as tendas da guerrilha. “Tanto um como outro nos expropria, nos tira a vida e não nos garante o direito de viver segundo nossa vontade autônoma. Uns trazem a guerra e outros querem nos dizer como resistir. Ambos nos negam como povo”, afirmam.
Assim, as comunidades ligadas ao CRIC tem uma pauta simples, de quatro pontos:
1 - Que saiam todos os grupos armados do seu território
2 - Que respeitem a sua forma de organizar a vida
3 – Que deixem a eles o cuidado de seus recursos naturais
4 – Que não se aproveitem mais do seu sofrimento e tampouco falem sobre sua resistência.
Os indígenas de Cauca querem ser reconhecidos como comunidade autônoma e capaz. Já basta da mesma velha cantilena de que as gentes originárias precisam de proteção e tutelagem. Manter essa visão é estagnar no pior momento do mundo medieval. A esquerda e os intelectuais precisam entender de uma vez por todas que para compreender o mundo indígena é preciso se desvestir da episteme ocidental/eurocêntrica e olhar o mundo sob outra ótica, outra episteme, autóctone. Esse exercício de humildade e de respeito é hoje, na América Latina, uma obrigação. As gentes de Cauca estão ensinando. Quem tiver ouvidos para ouvir, que ouça.
1 - Que saiam todos os grupos armados do seu território
2 - Que respeitem a sua forma de organizar a vida
3 – Que deixem a eles o cuidado de seus recursos naturais
4 – Que não se aproveitem mais do seu sofrimento e tampouco falem sobre sua resistência.
Os indígenas de Cauca querem ser reconhecidos como comunidade autônoma e capaz. Já basta da mesma velha cantilena de que as gentes originárias precisam de proteção e tutelagem. Manter essa visão é estagnar no pior momento do mundo medieval. A esquerda e os intelectuais precisam entender de uma vez por todas que para compreender o mundo indígena é preciso se desvestir da episteme ocidental/eurocêntrica e olhar o mundo sob outra ótica, outra episteme, autóctone. Esse exercício de humildade e de respeito é hoje, na América Latina, uma obrigação. As gentes de Cauca estão ensinando. Quem tiver ouvidos para ouvir, que ouça.
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terça-feira, 22 de novembro de 2011
O Brasil quer acabar com os índios?
22/11/2011
Dora Martins*
Uma nota, pequena, sem destaque, no Caderno "Ciência", da Folha de São Paulo de 11 de novembro, diz que o Senado Federal, através da Comissão de Constituição e Justiça, irá por em votação proposta de emenda à Constituição, PEC 215, que, com um jeito deslavado, quer mesmo acabar com as terras dos indígenas brasileiros e quiçás, quer acabar com todos eles.
Pela tal emenda pretende-se que seja o Congresso Nacional o competente para "aprovar a demarcação das terras ocupadas pelos indígenas e ratificar as demarcações já homologadas". Desse jeito, querem os senhores senadores e deputados deste Brasil rever tudo o que já foi feito em termos de reconhecimento do que são e onde estão as terras dos índios. Tal poder hoje, pela Constituição Federal, é exclusivo da nossa Presidente da República.
A nota termina de forma triste, senão risível, ao dizer que os deputados que defendem a Emenda e os empresários ruralistas, especialmente os de Roraima, estão inconformados, porque, segundo eles, "metade do território roraimense, por exemplo, foi "perdido" para os índios, ficando "inviabilizado" para a agropecuária.
Ora, à parte do equívoco histórico, que não vê que o indígena é dono destas terras brasilis bem antes de o agronegócio aqui chegar, há que se atentar que existem outras onze propostas de emendas à constituição que seguem o mesmo caminho dessa de n. 215.
A questão do índio brasileiro precisa levar gente para a rua, suscitar debates e acontecer na mídia No último dia 28 de outubro, foi baixada Portaria Interministerial de número 419, assinada pelos ministros da Justiça, Meio Ambiente, Saúde e Cultura, pela qual se regulamenta, de acordo com os interesses do governo, a atuação da Funai, da Fundação Cultural Palmares (FCP), do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e do Ministério da Saúde na elaboração de pareceres em processos de licenciamento ambiental de competência federal, a cargo do Ibama.
A portaria acaba por reduzir prazos para a tramitação de tais processos e, poderá assim permitir que concessões de licenças ambientais sejam dadas, no afogadilho, a grandes e ávidos projetos econômicos que envolvem construção de hidrelétricas, mineração, rodovias e expansão da agricultura e pecuária em regiões onde habitam o povo indígena.
A justificativa de que a lentidão para a aprovação de tais concessões impede o progresso e o desenvolvimento do país é falácia para esconder o desrespeito e o avanço destruidor sobre bens e patrimônios nacionais. O índio brasileiro precisa sobreviver e viver em suas terras.
Quando leio este texto, ainda não se sabe o destino do corpo do cacique Nisio Gomes, executado, há dois dias, em 18 de novembro, em meio ao seu povo, os Guarani Kaiowá, que lutam para ocupar suas terras, no Mato Grosso do Sul. A população indígena desse estado vem sendo vítima de violências constantes e, tudo indica, que o que se quer é o seu total extermínio. O cacique Nisio foi executado por pistoleiros, com vários tiros e agressões, diante de seus familiares. Seu corpo foi levado numa camionete, não se sabe para onde. Talvez para distante de suas terras, com o fim de impedir que seja ele enterrado onde estão suas raízes e sua história. A ação dos poderosos extrapola a sanha do poder econômico e fere fundo os direitos humanos fundamentais.
A continuar assim o Brasil ainda irá chorar por não ter passado, nem história para contar. A presidenta Dilma precisa voltar seus olhos, com urgência e sinceridade, para a questão indígena sob pena de ostentar em seu governo a triste marca do descaso, da violência e do extermínio do povo mais brasileiro deste país.
Dora Martins é Integrante da Associação Juízes para a Democracia.
Fonte:Brasil de Fato
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