por Catherine Bremer, da Agência Reuters
PORTO PRÍNCIPE - Barracas, receptores de satélites, laptops e cabos atravancam o jardim de um hotel parcialmente destruído no Haiti, onde os jornalistas digitam freneticamente, gritam em telefones por satélite, amaldiçoam as falhas dos geradores e correm para a beira da piscina a cada tremor secundário.
Centenas de repórteres, fotógrafos e equipes de TV chegaram ao Haiti desde o terremoto de 12 de janeiro, que matou até 200 mil pessoas no país mais pobre das Américas. Muitos usam as mesmas roupas imundas dia após dia, lavam as roupas íntimas nos três minutos de banho diário em um banheiro coletivo e dormem bem distantes das paredes, por causa do perigo representado pelos recorrentes tremores derivados do terremoto principal. Usar os banheiros rachados no subsolo do hotel pode ser uma experiência enervante.
No centro de Porto Príncipe, no outro hotel semidestruído onde a imprensa estrangeira se abriga não há água corrente, o que faz com que os jornalistas se lavem na piscina, usando apenas roupas íntimas.
Outros ainda acampam na pista do aeroporto, onde a conexão com a Internet, usando grandes antenas parabólicas, é melhor. Todos sobrevivem à base de bolachas, pasta de amendoim ou rações militares, usam latrinas fétidas e dormem pouco, incomodados pelo ruído dos aviões militares e dos caminhões que movimentam as caixas com a ajuda humanitária que chega do mundo inteiro.
"A piscina tem sido uma dádiva para nós, todos estamos nos lavando nela. Toda manhã ficamos ao redor e fazemos nossas abluções - eles simplesmente jogam um pouco de cloro todo dia para limpá-la", disse o correspondente da Sky News Robert Nisbet, no hotel Oloffson.
Os desafios logísticos de cobrir uma notícia em um país com a infraestrutura em ruínas se soma ao abalo emocional decorrente de conviver com corpos em decomposição, crianças órfãs, sobreviventes com feridas abjetas e um mar de refugiados famintos.
Muitos jornalistas admitem ter chorado. A maioria distribuiu ataduras, creme antisséptico, água, comida ou dinheiro para as vítimas, e vários agiram para salvar vidas.
Um jornalista chamou uma unidade militar e se recusou a deixar um local com vítimas até que as equipes conseguissem retirar um menino com a perna gangrenada. Outro carregou morro abaixo uma menina com uma grave lesão numa perna, até entregá-la a um cirurgião.
"O pai dela chorava e chorava. Ele perdeu sua esposa no terremoto, então a menina era tudo o que lhe sobrou", disse o jornalista. "Eu simplesmente não pude deixá-la lá sabendo que ela iria morrer".
Tendas improvisadas e biscoitos de chocolate
Grande parte da mídia estrangeira que chegou ao Haiti depois do terremoto de magnitude 7 terminou alocada no hotel Villa Creole.
Os veículos de comunicação alugam quartos para manter seus equipamentos - os correspondentes dormem na grama, nos telhados ou em vans, mas raramente dentro do prédio semidestruído. O arsenal da mídia inclui os chamativos sistemas de Internet Bgan, rádios sem fio, colchões infláveis e grandes tendas.
Poucos repórteres conseguiram dormir nas primeiras noites, deitados no jardim assombrados por uivos e gritos dos feridos do outro lado do muro.
Os haitianos assediam jornalistas pedindo água, comida e máscaras cirúrgicas, ou oferecem seus serviços como motoristas ou "faz-tudo". Os repórteres pagam preços inflacionados, sabendo como o dinheiro é necessário para essas pessoas.
Mas há também momentos hilários. Na manhã de quarta-feira, um tremor de magnitude 6 tirou todos das suas tendas ao amanhecer e fez dois jornalistas saírem correndo do banheiro, pelados, na direção da beira da piscina, onde o café da manhã era servido.
Os jornalistas se empenham em redigir reportagens que atraiam ajuda e equipes médicas, e tentam confortar as vítimas. Itens rotineiros se tornam os seus bens mais preciosos: blocos de anotação, botas, máscara e lanterna. Uma profissional se gaba de um tubo de pomada de damasco, que esfrega no rosto todas as noites para disfarçar o mau cheiro e a sujeira acumulada após horas sobre uma moto, visitando locais com cenas infernais.
Num momento impulsivo, um cobiçado pacote de biscoitos de chocolate é entregue a uma dupla de órfãos famintos. Vale a pena ouvi-los rir - a primeira risada ouvida nos últimos dias.