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sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

PESSOAS E FATOS DIFÍCEIS DE ENTENDER

Laerte Braga, jornalista e analista político
A mídia privada e dita grande sumiu com o noticiário sobre os documentos liberados pelo site WIKILEAKS. Não interessa contrariar os interesses norte-americanos quando essa mídia é parte do que Julian Assange chama de “tentáculos da elite norte-americana”.

É a elite que sustenta essa mídia.

A prisão de Assange é um escândalo, uma flagrante violação da liberdade de expressão. Mas, muito mais que a prisão, o conteúdo dos documentos mostra a verdadeira face dos EUA. Um conglomerado terrorista. Chantagem, extorsão, assassinatos, torturas, estupros, a barbárie com todos os requintes da tecnologia mais avançada possível.

Os documentos vazados e que revelam uma descarada intervenção nos negócios internos do Brasil, por si só, são motivo de interpelação ao governo dos Estados Unidos sobre esse tipo de atividade.

Lobby para se apossar do pré-sal a partir de braços disfarçados em institutos, coisas do gênero, compromisso assumido pelo candidato José Serra de mudar as regras que garantem à PETROBRAS os direitos sobre o pré-sal (18 trilhões de dólares), negociações para a privatização da Previdência e outros setores do Estado, enfim, aberta e traiçoeira interferência no Brasil em função de interesses colonizadores.

Domar e dominar o País para saquear, regra geral do comportamento dos norte-americanos.

Os documentos mostram que o ministro da Defesa Nelson Jobim negociou com norte-americanos situações de privilégios na sua área, criticou ministros do governo Lula (Samuel Pinheiro Guimarães e Celso Amorim) e em várias situações telegramas de embaixadores, funcionários outros, os EUA ironizaram e criticaram posições brasileiras em organismos internacionais, a última delas na Conferência de Copenhague sobre meio-ambiente.

Motivos mais que suficientes para cobrar uma explicação sobre todas essas atividades de um país que se diz amigo.

Ao contrário, a presidente eleita substitui os ministros apontados como “anti-norte-americanos”, caso de Samuel Pinheiro Guimarães e Celso Amorim e confirma o agente dos EUA Nelson Jobim no Ministério da Defesa. Ato contínuo ao vazamento de documentos ligando Jobim aos norte-americanos a presidente eleita deixou a poeira passar e agora confirma Jobim ministro da Defesa.

De quebra critica o voto do Brasil sobre as sanções propostas contra o Irã na ONU (voto do governo ao qual ela pertenceu e do qual se beneficiou sendo eleita presidente do Brasil).

E para a Secretaria Nacional de Assuntos Estratégicos exuma o cadáver político de Moreira Franco, um político envolvido em escândalos vários, corrupção a torto e direito, para dar e vender.

É difícil entender um trem desses.

Os EUA tem sido pródigos em ações terroristas pelo mundo afora (controlam a maior parte da Europa Ocidental – transformada em bases militares –), sustentam uma guerra perdida e suja no Afeganistão, governos corruptos e ligados ao narcotráfico como foi o de Álvaro Uribe na Colômbia e ressuscitam campos de concentração onde colocam “suspeitos de terrorismo”, sem qualquer respeito aos princípios internacionais de direitos humanos que usam como escudo para jornadas de barbárie e boçalidade.

O grande feito do WIKILEAKS está sendo o de mostrar ao mundo a face real dos Estados Unidos. Seus interesses, seus objetivos, principalmente a forma como agem em função desses interesses e objetivos, sem respeito a nada e a ninguém.

Têm presença no Executivo, no Legislativo e no Judiciário, permeiam o Estado brasileiro através de figuras como Nelson Jobim, deputado Henrique Alves, senador Romero Jucá, senador Eduardo Azeredo e outros invisíveis.

Controlam o comandante da Força Aérea Brasileira, brigadeiro Juniti Saito e boa parte dos militares brasileiros (um dos documentos revelados pelo WIKILEAKS mostra que “os militares latino-americanos são de fácil cooptação).

Nada acontece, ou ao contrário, Jobim é mantido ministro da Defesa.

Nelson Jobim, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal e envolvido em escândalos no processo de privatizações do governo FHC, do qual foi ministro da Justiça e notório agente de interesses dos EUA no Brasil.

O que Dilma Roussef talvez não tenha entendido é algo bem simples. Imagine que ao invés de ter sido ungida por Lula como candidata a presidente em torno de um programa e objetivos, tivesse sido candidata a deputada federal no Rio Grande do Sul, onde tem domicílio eleitoral. Teria que brigar voto a voto para ser eleita e não seria uma eleição fácil.

Ao aceitar ser candidata a presidente, sabendo que Lula elegeria um poste (afirmação de Delfim Neto) e sabendo-se um dos postes mais pesados que o presidente poderia ter escolhido, aceitou e, implicitamente, a continuidade das políticas do atual governo.

É mais fácil, no entanto, acomodar-se aos interesses das elites conservadoras e imaginar-se capaz de vôo próprio. Não percebe que está sendo engolida antes de tomar posse.

Num plano menor, mas de grande importância, difícil entender a posição do deputado Aldo Rebelo, do Partido Comunista do Brasil (PC do B), defensor intransigente da posição da bancada ruralista (latifundiários) na questão do Código Florestal. Quer alargar as fronteiras – às custas de nossas florestas – para o agronegócio e o latifúndio, em detrimento da reforma agrária.

A importância da reforma agrária não está só na divisão justa e equitativa da terra. Funde-se a aspectos maiores, à medida que anula o avanço de grandes empresas multinacionais sobre o Brasil não só na agricultura, como na tomada do subsolo rico em minerais estratégicos e fundamentais ao Brasil se é que o País tem desejo de ter futuro como nação soberana e independente.

Ou o PC do B mudou e transformou-se em sub-braço das elites que Assange fala, ou Aldo Rebelo está no lugar errado.

Fatos como esse, provocados por atitudes de pessoas que, aparentemente, estão de um lado, ou falam numa direção e agem noutra, são difíceis de compreender, sob qualquer argumento, inclusive o de comer o mingau pelas beiradas para depois alcançar os reais objetivos.

Parece aquela história surrada de meia virgindade. Não existe isso.

Há sim um processo de dolorosas concessões e submissão.

Os EUA devem explicações ao mundo inteiro sobre as práticas terroristas reveladas nos documentos vazados pelo WIKILEAKS. E ao que me consta o Brasil faz parte desse “mundo inteiro”.

Neste momento, a crise é aguda, apenas disfarçada pela mídia venal e privada, a tarefa de lutar é dos movimentos sociais (o movimento sindical está falido com raras exceções), dos partidos não comprometidos com esse processo vergonhoso que mantém uma figura repulsiva como Nelson Jobim no Ministério da Defesa (o erro começou com Lula nomeando-o).

A sobrevivência do Brasil e das conquistas alcançadas no governo Lula que permitem entrever uma nova etapa no processo político de avanços em todos os setores não passa pelo institucional, uma espécie de clube de amigos e inimigos cordiais.

Passa pela organização, formação e pressões populares, do contrário vamos mergulhar num retrocesso sem tamanho, pois os primeiros passos de Dilma começam a mostrar um grande equívoco. Ou a esperteza é tanto que escapa ao entendimento de mortais comuns.

Não se pode nem falar em PT, um partido plantado na máquina estatal e com profundas semelhanças com o PSDB (agora refundado por Aécio Neves – é verdade não é piada não).

É visível isso, Dilma não é Lula. O presidente atual é capaz de malabarismos prodigiosos em cima de seu carisma, seu prestígio, mas a presidente eleita não.

Esperar para ver? Tudo bem, vá lá um crédito de confiança. Mas com Jobim e Moreira Franco? É pouco provável.

Breve nos céus os F-18 fabricados pela BOEING e o Brasil na contramão da história. FHC vai arrancar os poucos cabelos que lhe restam ao perceber que foi eleito presidente num corpo de mulher.

Pode ser que eu esteja enganado, tomara. Mas cada dia parece mais difícil de entender.

domingo, 12 de dezembro de 2010

AS MENTIRAS SOBRE AS VERDADES

Laerte Braga, jornalista e analista político
Imagino que seja constrangedor para um “jornalista” padrão William Waack ter sua análise sobre as eleições presidenciais no Brasil, no período de pré campanha, elogiada pela secretária de Estado Hilary Clinton, afinal é uma das chefes, para depois ir tudo para a lata do lixo, pois tudo deu errado.

A análise era apenas tentativa de agradar o chefe, nada além disso.

É o que está acontecendo com os documentos do WIIKILEAKS e a forma como a mídia privada vem fazendo sua divulgação. Ao sabor do chefe, ou seja, interpreta e distorce para evitar que o distinto público conheça as verdades mostradas pelo site.

São mentiras sobre verdades, um jeito de atenuar os estragos causados pelo site àqueles que pagam e controlam a mídia privada no Brasil.

Eu penso que embaixador norte-americano em países como o Brasil não dorme sem olhar embaixo da cama se lá não está um “terrorista” da Al Qaeda. Trancar a embaixada inteira, ligar arames e cercas elétricas. Um pernilongo, por exemplo, por conta do zumbido, corre o risco de vir a ser confundido com um míssil “terrorista”.

A mídia privada e podre alerta que Brasília, segundo documentos divulgados pelo WIKILEAKS, é alvo fácil para bombardeios “terroristas” e um telegrama de um embaixador dos EUA que andou por aqui azeitando as coisas junto a gente tipo Eduardo Azeredo, o brigadeiro Saito, etc, etc, dá o sinal para esse risco. O roubo de um avião em Luziânia, nas imediações de Brasília, assim à luz do dia, foi o ponto de partida da conclusão do embaixador.

Ato contínuo sua excelência envia um memorando a Washington e despacha para a mídia (GLOBO, VEJA, FOLHA DE SÃO PAULO, RBS, ESTADO DE SÃO PAULO, VEJA, ESTADO DE MINAS, etc) a seguinte instrução – “dar ênfase ao fato, alertar a população, gerar medo e criar condições para que possamos “ajudar”.

“Boi, boi, boi da cara preta, pega essa criança que tem medo de careta”.

A mídia, amestrada, muito bem paga, começa então a despertar os brasileiros para o risco que a capital seja atacada. Que nem as tais bombas químicas e biológicas que inventaram para poder atacar, ocupar e saquear o Iraque.

Bom, para que haja um ataque “terrorista” a Brasília é preciso motivo. O Brasil nesses últimos oito anos tem pautado sua política externa por absoluta independência em relação aos EUA. O ministro Celso Amorim quando chega em New York não tira os sapatos para submeter-se a uma revista, como o fez Celso Láfer, ministro de FHC.

O País está próximo de países do Oriente Médio, inclusive o Irã, reconheceu o Estado Palestino nas fronteiras anteriores à guerra de 1967 (ou seja, apóia a decisão que foi tomada pela ONU), aproximou-se de nações africanas, principalmente as de língua portuguesa e busca a integração latino americana.

Atacar Brasília para que?

A guerra global, como a chamam, é dos Estados Unidos contra aqueles que se opõem ao controle do império sobre o mundo.

No caso específico viramos alvo, Brasília vira alvo, não de “terroristas”, mas de resistentes contra a barbárie norte-americana (revelada pelo WIKILEAKS e não noticiada pela mídia podre e privada brasileira), no momento que por aqui pisar o primeiro soldado norte-americano, os tais mariners, em missão de “ajuda”.

Hoje é alvo de Washington. Os caras estão loucos para instalar bases militares e “ajudar”.

É ridícula essa preocupação do embaixador (ridícula, mas dentro da lógica imperialista, capitalista) e vergonhosa quando repercutida pela mídia privada e podre, golpista.

Por que não publicar documentos que mostram a tortura contra prisioneiros no Iraque, no Afeganistão? Por que não defender a liberdade de expressão de Julian Assange e do WIKILEAKS?

Ou têm eles o monopólio dessa “liberdade de expressão”?

Por que não exibir entre as preocupações com liberdade, democracia, etc, os tais “assassinatos seletivos” que agentes norte-americanos e do MOSSAD cometem mundo afora?

Está tudo divulgado pelo WIKILEAKS.

O sistemático estupro de mulheres palestinas por soldados de Israel?

A cobiça manifesta dos EUA pelo nióbio brasileiro? A cumplicidade com empresas como a VALE?

É simples, estão na folha de pagamento. Fazem parte do que Julian Assange chama de “tentáculos da elite”. São criados dessa elite.

Bombardear Brasília? É o fim da picada.

Que o embaixador dos EUA pense isso e tente transformar essa paranóia em medo instalado entre os brasileiros, apenas cumpre o seu papel, mas que a mídia privada e podre tente fazer exatamente esse jogo só comprova a absoluta ausência de compromisso com a verdade dessas organizações. Terroristas midiáticos.

Que nem a bolinha de papel atirada em José Serra que se transformou num rolo de fita, que gerou uma tomografia e por pouco não vira atentado com participação da Al Qaeda, sob supervisão direta de Osama bin Laden.

Que eu me lembre, quando do ataque às torres gêmeas do World Trade Center, alguns brasileiros brincaram sobre pedir ajuda a Al Qaeda para atingir algumas figuras do Congresso, padrão Eduardo Azeredo, agora Roberto Freire, Kátia Abreu, etc. Fora isso repercutir um telegrama desses, o do embaixador, só mesmo para passar no caixa depois e pegar o extra. Não tem outra explicação, ou então, subserviência pura e simples, fim de semana na Disneylândia, coisas assim, retrato autografado de George Bush, só pode.

Sem contar, claro, o pulo do gato, por que não, por trás de tudo isso os tais F-18 que “encantaram” o brigadeiro Juniti Saito, comandante da Força Aérea Brasileira?

Será mesmo, brasileira? Falo da do brigadeiro.

Um negócio de quatro bilhões de dólares, no barato, oitocentos milhões de comissões para serem distribuídos à larga.

São as costumeiras mentiras sobre as verdades que a mídia privada e podre vive usando para iludir, alienar, e dominar os brasileiros.

Vem aí Hebe Camargo na GLOBO, dizem, dando beijinho em todos os que passarem por perto. A beijoqueira.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Perguntas que ainda ficam: 'A Operação Alemão já é um fiasco ou falta mais?'

Juracy Ventura, ativista, a partir do fórum 3setor
"Essas perguntas são antigas.

Alguém pode respondê-las?

Nem toda a força da Globo para transformar a operação num sucesso dos militares e dos governos de plantão, bem como as entrevistas de militares fardados e com 'caras e bocas' do filme 'Tropa de Elite' conseguiram fazer eu entender:

1) Para que seis mil militares para 'prender para averiguações' 20 pessoas, e 'capturar 2 bandidos'?

2) Onde estava o crime organizado? Na zona sul? Era uma tática de dissimulação?

3) Morreram só bandidos (55)? O critério é 'tomou tiro e morreu é bandido?' Tinham carteira de bandido? Confessaram antes de morrer?

4) A 'fuga' estava combinada? Não há serviço de inteligência nas forças militares? O PAC foi para preparar as rotas de fuga?

5) Os helicópteros (do estado principal e da mídia oficial do governo - concessões de TV) só tem vidro e câmaras para o Complexo do Alemão? Quase um milhar de bandidos brotando das galerias pluviais nos bairros em volta não foram registrados? Por que os poucos que correram a pé antes foram filmados, inclusive um atingido por um disparo? Ou eram atores? Ou foi combinando? Ou era tática dispersivo dos 'bandidos'?

6) Por que a Globo (emissora oficial do governo, haja visto as inúmeras entrevistas exclusivas da equipe do novo governo do Brasil que está em formação) e os militares, e os políticos insistem em tentar traçar o que os bandidos deveriam ter feito? Por exemplo: queriam que os líderes tivessem resistido heroicamente até a morte; ou que os 'soldados do tráfico' tivessem lutado até a morte em trincheiras; ou que fugir pelas galerias (se isto tiver acontecido) é coisa de 'desesperados' e derrotados etc. Só falta o Pedro Bial narrar tudo como no BBB.

7) Afinal, se os bandidos estavam lá desde o começo (será?), a Globo e os militares 'exigiam/esperavam' que eles fossem e se comportassem como burros e não questionassem o roteiro, como acontece nas eleições? Ao que me conste eles são bandidos, não burros ou idiotas.

8) Um capitão da força militar, comandado pela repórter da Globo, dá alguns passos toda hora na TV, como se fosse entrar numa tubulação de esgoto. A cena corta e aparecem drogas, armas, munições etc. Não é tudo muito 'pastiche'? Muito teatral e burlesco?

9) Não vemos mais nada sobre montagem de governo, política econômica, acertos financeiros e de poder, inflação, planos de governo, os financiadores do tráfico (usuários e políticos).

10) Qual política e tática será usada para conter a demanda? Para inflação e crédito deve ter. Para drogas não?

11) Estamos redirecionando as forças armadas para a guerra urbana e, mais grave, para cercar e dominar áreas urbanas? Vamos ter guetos?

12) Se existe tal quantidade de armamentos pesados de guerra nas mãos dos bandidos, ninguém sabe usar? São plantados? Se os bandidos disparam de longe fuzis e pistolas, por que não usam as metralhadoras pesadas, granadas e morteiros? Ninguém adquire tais artefatos para 'investimento' ou jogar dinheiro fora. Tem alguma coisa no ar. Não?

Alguém pode me ajudar?"


quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

A TOMADA DE MONTE CASTELO OU A BATALHA DE ITARARÉ

São cada vez mais fortes os indícios de que as manobras das Forças Armadas no Rio de Janeiro tem conexão com o lobby do PIG e dos setores mais conservadores de dentro e fora do governo para manter Nelson Jobim, o amigo e interlocutor dos interesses dos EUA na Esplanada dos Ministérios, à frente da pasta da Defesa após 1º de janeiro de 2011.

Por José Flávio Abelha*
Toda a mídia brasileira, com as exceções de praxe (pouquíssimas) levou o brasileiro às raias de um surto coletivo com o pânico que esparramou, via satélite, urbe et orbi. Espalhou o pânico no país em tal grau que o Brasil parou neste fim de semana, de sábado para domingo, para assistir à versão nova em cores da "Tomada de Monte Castelo". O pânico se espalhou de tal forma que, nos distritos mais longínquos, as pessoas não saíram de casa, algumas, nem as janelas abriram, com medo de bala perdida.

A invasão do chamado complexo do Alemão era uma espécie de versão com efeitos especiais do episódio italiano de Monte Castelo.

Na manhã de sábado recebi um telefonema da minha mulher que estava em Belo Horizonte, implorando para que eu não saísse da nossa casa aqui em Niterói. Perguntou-me sobre o tempo e eu informei que o céu era de brigadeiro, azul maravilhoso. Sol de rebentar mamona e o pessoal nas praias. Mas eu teria de ficar em casa ante o perigo do conflito iminente.

Disse-lhe não era possível atender ao seu pedido. Eu estava de carro, na Linha Amarela, rumo ao Rio Centro para visitar a Feira da Providência.

O telefone ficou mudo. Acho que minha mulher desmaiou.

À noitinha, fui busca-la do Santos Dummont, ambos tranqüilos, eu e o aeroporto. E tranqüi-los, eu e minha mulher, rumamos para Piratininga enfrentando o trânsito caótico com tanta gente voltando da região oceânica depois de um dia de praia.

Resumo da ópera que a mídia desejava, a anunciada Tomada de Monte Castelo, com a carnificina que os nossos comunicadores anunciavam, frustrou-se.

E o que se viu foi a repetição da famosa Batalha de Itararé. Em 1930 as tropas de Vargas não foram molestadas e, agora, as tropas das gloriosas Forças Armadas repetiram o ocorrido na naquela época.

O arsenal da bandidagem, tão decantado pela mídia, foi esquecido na retirada humilhante, afinal, o recado aos chefões do tráfico fora muito claro pelos comandantes das três armas: da aeronáutica, nossos helicópteros estão armados com foguetes mas não vamos dispara-los, da marinha, nossos tanques que rodam sobre lagartas e passam por cima de qualquer obstáculo servem para uma cobertura às forças policiais estaduais, e do exército surgiu o recado unificador e alertador: nossos homens estão portando armas de guerra mas somente serão disparadas se formos atacados.

E o conjunto de forças, de mãos dadas, sitiaram e depois entraram naquele território que era a casa do diabo: o complexo do Alemão. Enquanto isso o carioca estava curtindo um céu azul maravilhoso, um sol escaldante e um´mar calmo. Praias lotadas contrastando com o resto, a maior parte, do Brasil, apavorado, assustado, em pânico provocado pela nossa eficiente, competente e ética mídia.

Desta ameaça midiática de uma carnificina surgiram pontos que eu já andei indicando em um pequeno texto sobre os parafusos bambos da máquina chamada Brasil.
Seria bom que, passada a Batalha de Itararé, nossos homens públicos refletissem mais antes de se pronunciarem.

Uma alta autoridade judiciária mandou dizer ao Brasil que "ainda existem juízes em Berlim"...e no Rio de Janeiro também e, pela primeira vez, decretou a prisão de intocáveis advogados, os pombos-correios, os parafusos bambos.

A vaidade andou campeando ao ponto de um líder comunitário criticar as UPP's como se elas fossem a salvação da lavoura. Não são não. Elas são a abertura da estrada que vai levar a paz e a presença do Estado aos morros dominados por marginais de alta periculosidade.A finalidade é, tão somente, ganhar terreno. Elas são os pára-quedistas que primeiro saltaram no planalto central para fazer uma clareira onde avionetas, os teco-tecos, pudessem levar as primeiras ferramentas para a construção de uma pista de pouco maior. Nesta, desciam os Douglas transportando pequenos tratores e, quatro anos depois, nascia Brasília, o sonho de Dom Bosco e do Presidente Juscelino. Não fosse o cientista Sérgio Besserman Vianna explicar as verdadeiras funções das UPP's e o vaidoso líder, com uma pontinha de inveja por não ter dado palpites na engenharia dessa salvação da lavoura que o próprio Besserman havia ajudado a desenhar, teria azedado a entrevista global. De qualquer forma, saiu mal na foto.

O secretário Beltrame, com o seu ímpeto gauchesco declarou histórica a colaboração da Marinha e informou que o Exército não se pronunciara.(Nunca ouvi falar que cumprir o dever é um gesto histórico). A resposta veio no ato, dada pelo Comandante, dizendo que não lhe fora pedido nada. De imediato o governador pediu ajuda e o Presidente Lula determinou que o Ministro da Defesa fornecesse o necessário ao governador.

Corre, agora, o Secretário Bletrame o desprazer de ver um afoito vereador propor mais um feriado para marcar o "histórico" dia.

A OAB, diante da descoberta dos pombos-correios, apenas disse serem necessárias mais provas, ao contrário de dizer que está certo quem mandou prender seus associados pois são fora-da-lei, porém, o esprit de corps falou mais alto.

As ONG's caladinhas, nem tugindo nem mugindo.

Dizem, hoje, que associações na Rocinha estão com medo de uma futura invasão das forças do Bem visando colocar ordem naquela grande comunidade, como se a Rocinha fosse o melhor dos mundos e não precisasse de uma UPP

O resto é o resto e foi debitado na conta da excitação dos focas e repórteres que repetiam, à exaustão, as mesmas notícias e as TVs reprisavam as mesmas cenas. O Brasil em pânico e o carioca na praia, aproveitando o domingo de sol.

As favelas sentindo o gostinho da cláusula pétrea da Constituição que dá a todos o direito de ir e vir...sem pagar pedágio.

Muito político vendo seus currais eleitorais virarem fumaça...de pólvora.

E um Oscar para a Edith Head global que desenhou os elegantíssimos coletes a prova de balas com que os globais se apresentaram na frente da Batalha de Itararé!

E isso é só o começo. No Rio existem milhares de favelas pedindo PAZ!!!
*nascido em Minas Gerais, é autor de "A MINEIRICE" e vive na Restinga de Piratininga, em Niterói (RJ), onde é "Inspector of Ecology"

Veja ainda:
Instituto Humanitas Unisinos: Uma guerra pela regeografização do Rio de Janeiro. Entrevista especial com José Cláudio Alves
“O que está por trás desses conflitos urbanos é uma reconfiguração da geopolítica do crime na cidade”. Assim descreve o sociólogo José Cláudio Souza Alves a motivação principal dos conflitos que estão se dando entre traficantes e a polícia do Rio de Janeiro. Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por telefone, o professor analisa a composição geográfica do conflito e reflete as estratégias de reorganização das facções e milícias durante esses embates. “A mídia nos faz crer – sobretudo a Rede Globo está empenhada nisso – que há uma luta entre o bem e o mal. O bem é a segurança pública e a polícia do Rio de Janeiro e o mal são os traficantes que estão sendo combatidos. Na verdade, isso é uma falácia. Não existe essa realidade. O que existe é essa reorganização da estrutura do crime”, explica. Clique para ler a entrevista completa

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Dia D? O Alemão está dominado? Dúvidas que nos ocorrem

Por Rodrigo Brandão, da Equipe do EDUCOM
O portal de notícias das Organizações Globo, o G1, resume os acontecimentos de domingo no Complexo de Favelas do Alemão com o título "Alemão dominado", sobre foto em que aparece um policial enrolado numa bandeira do Brasil, como uma capa, "capa de super-herói" talvez... em seguida o leitor é apresentado a uma sucessão de números, relatos, fotos e vídeos que compõem um mosaico de imagens e outros elementos a impactar nossas retinas.

Recheado com as histriônicas declarações do secretário de Segurança Pública fluminense, Mariano Beltrame, do tipo "provamos que invadimos e tomamos qualquer espaço deste estado", "hoje foi o Alemão, amanhã será a Rocinha e o Vidigal" ou "o Alemão era o centro do mal e o Rio virou uma página de sua história" (frase reproduzida em 99% dos portais), todo esse banquete apreciado por setores da sociedade carioca poderia facilmente ser enquadrado no circo que a mídia habitualmente constrói nesses episódios, e que Guy Debord tão bem descreve em seu "A Sociedade do Espetáculo".

Ok, mas e a reflexão e a crítica por trás dos "fatos"? Durante a semana, Estado e mídia fizeram chegar a nós que no primeiro dia de operações na Vila Cruzeiro mais de 60 pessoas haviam morrido. Um dia depois, na noite de quinta, 25, disse a Secretaria de Segurança que o balanço da semana de incursões trazia 32 mortos. As polícias do Rio de Janeiro, o Exército e a PF diziam estar no Alemão porque 600 suspeitos de tráfico ou associação com o tráfico haviam escapado ao cerco da Vila Cruzeiro e se refugiado ali. Até a madrugada de ontem, 28, um suspeito, segundo as autoridades, se entregara. À noite, o G1 trazia este balanço: 20 presos, 3 mortos, 50 motos apreendidas, 150 quilos de cocaína e 40 toneladas de maconha apreendidos, 50 fuzis apreendidos...

Você acredita nesses números? Ou melhor, você confia em quem traz a público esses "números"? Eles fazem algum sentido? Terá a maconha se tornado a droga mais rentável para o crime no Rio de Janeiro?

Visitando fóruns de ativistas da esquerda na Web ou conversando com militantes via redes sociais, vemos um surpreendente e insuspeito regozijo com a "nova política de segurança" trazida pelo governador Sergio Cabral ao Rio de Janeiro. Ao apontarmos contradições no discurso de Cabral e seus assessores e dizermos que nem UPP - pelo menos com a superficialidade e a cosmética que marcam seu atual estágio - nem incursões militares significam a vitória sobre o crime, muito menos a "paz", somos questionados, acusados de não vermos o novo, de sermos sectários...

Que não estejamos tão isolados ou num diálogo de surdos.

Atualizando: taí uma reposta a algumas das perguntas que deixamos... ou uma pulga atrás da orelha de quem ainda não tinha
O Dia: 'Chefões do tráfico conseguem escapar'

sábado, 27 de novembro de 2010

A crise no Rio e o pastiche midiático

Por Luiz Eduardo Soares*
Sempre mantive com jornalistas uma relação de respeito e cooperação. Em alguns casos, o contato profissional evoluiu para amizade. Quando as divergências são muitas e profundas, procuro compreender e buscar bases de um consenso mínimo, para que o diálogo não se inviabilize. Faço-o por ética –supondo que ninguém seja dono da verdade, muito menos eu--, na esperança de que o mesmo procedimento seja adotado pelo interlocutor. Além disso, me esforço por atender aos que me procuram, porque sei que atuam sob pressão, exaustivamente, premidos pelo tempo e por pautas urgentes. A pressa se intensifica nas crises, por motivos óbvios. Costumo dizer que só nós, da segurança pública (em meu caso, quando ocupava posições na área da gestão pública da segurança), os médicos e o pessoal da Defesa Civil, trabalhamos tanto –ou sob tanta pressão-- quanto os jornalistas.

Digo isso para explicar por que, na crise atual, tenho recusado convites para falar e colaborar com a mídia:
(1) Recebi muitos telefonemas, recados e mensagens. As chamadas são contínuas, a tal ponto que não me restou alternativa a desligar o celular. Ao todo, nesses dias, foram mais de cem pedidos de entrevistas ou declarações. Nem que eu contasse com uma equipe de secretários, teria como responder a todos e muito menos como atendê-los. Por isso, aproveito a oportunidade para desculpar-me. Creiam, não se trata de descortesia ou desapreço pelos repórteres, produtores ou entrevistadores que me procuraram.
(2) Além disso, não tenho informações de bastidor que mereçam divulgação. Por outro lado, não faria sentido jogar pelo ralo a credibilidade que construí ao longo da vida. E isso poderia acontecer se eu aceitasse aparecer na TV, no rádio ou nos jornais, glosando os discursos oficiais que estão sendo difundidos, declamando platitudes, reproduzindo o senso comum pleno de preconceitos, ou divagando em torno de especulações. A situação é muito grave e não admite leviandades. Portanto, só faria sentido falar se fosse para contribuir de modo eficaz para o entendimento mais amplo e profundo da realidade que vivemos. Como fazê-lo em alguns parcos minutos, entrecortados por intervenções de locutores e debatedores? Como fazê-lo no contexto em que todo pensamento analítico é editado, truncado, espremido –em uma palavra, banido--, para que reinem, incontrastáveis, a exaltação passional das emergências, as imagens espetaculares, os dramas individuais e a retórica paradoxalmente triunfalista do discurso oficial?
(3) Por fim, não posso mais compactuar com o ciclo sempre repetido na mídia: atenção à segurança nas crises agudas e nenhum investimento reflexivo e informativo realmente denso e consistente, na entressafra, isto é, nos intervalos entre as crises. Na crise, as perguntas recorrentes são: (a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a explosão de violência? (b) O que a polícia deveria fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas? (c) Por que o governo não chama o Exército? (d) A imagem internacional do Rio foi maculada? (e) Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas?

Ao longo dos últimos 25 anos, pelo menos, me tornei “as aspas” que ajudaram a legitimar inúmeras reportagens. No tópico, “especialistas”, lá estava eu, tentando, com alguns colegas, furar o bloqueio à afirmação de uma perspectiva um pouquinho menos trivial e imediatista. Muitas dessas reportagens, por sua excelente qualidade, prescindiriam de minhas aspas –nesses casos, reduzi-me a recurso ocioso, mera formalidade das regras jornalísticas. Outras, nem com todas as aspas do mundo se sustentariam. Pois bem, acho que já fui ou proporcionei aspas o suficiente. Esse código jornalístico, com as exceções de praxe, não funciona, quando o tema tratado é complexo, pouco conhecido e, por sua natureza, rebelde ao modelo de explicação corrente. Modelo que não nasceu na mídia, mas que orienta as visões aí predominantes. Particularmente, não gostaria de continuar a ser cúmplice involuntário de sua contínua reprodução.

Eis por que as perguntas mencionadas são expressivas do pobre modelo explicativo corrente e por que devem ser consideradas obstáculos ao conhecimento e réplicas de hábitos mentais refratários às mudanças inadiáveis. Respondo sem a elegância que a presença de um entrevistador exigiria. Serei, por assim dizer, curto e grosso, aproveitando-me do expediente discursivo aqui adotado, em que sou eu mesmo o formulador das questões a desconstruir.

Eis as respostas, na sequência das perguntas, que repito para facilitar a leitura:
(a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a violência e resolver o desafio da insegurança?
Nada que se possa fazer já, imediatamente, resolverá a insegurança. Quando se está na crise, usam-se os instrumentos disponíveis e os procedimentos conhecidos para conter os sintomas e salvar o paciente. Se desejamos, de fato, resolver algum problema grave, não é possível continuar a tratar o paciente apenas quando ele já está na UTI, tomado por uma enfermidade letal, apresentando um quadro agudo. Nessa hora, parte-se para medidas extremas, de desespero, mobilizando-se o canivete e o açougueiro, sem anestesia e assepsia. Nessa hora, o cardiologista abre o tórax do moribundo na maca, no corredor. Não há como construir um novo hospital, decente, eficiente, nem para formar especialistas, nem para prevenir epidemias, nem para adotar procedimentos que evitem o agravamento da patologia. Por isso, o primeiro passo para evitar que a situação se repita é trocar a pergunta. O foco capaz de ajudar a mudar a realidade é aquele apontado por outra pergunta: o que fazer para aperfeiçoar a segurança pública, no Rio e no Brasil, evitando a violência de todos os dias, assim como sua intensificação, expressa nas sucessivas crises?
Se o entrevistador imaginário interpelar o respondente, afirmando que a sociedade exige uma resposta imediata, precisa de uma ação emergencial e não aceita nenhuma abordagem que não produza efeitos práticos imediatos, a melhor resposta seria: caro amigo, sua atitude representa, exatamentemídia e os governos continuarem se recusando a pensar e abordar o problema em profundidade e extensão, como um fenômeno multidimensional a requerer enfrentamento sistêmico, ou seja, se prosseguirmos nos recusando, enquanto Nação, a tratar do problema na perspectiva do médio e do longo prazos, nos condenaremos às crises, cada vez mais dramáticas, para as quais não há soluções mágicas.
A melhor resposta à emergência é começar a se movimentar na direção da reconstrução das condições geradoras da situação emergencial. Quanto ao imediato, não há espaço para nada senão o disponível, acessível, conhecido, que se aplica com maior ou menor destreza, reduzindo-se danos e prolongando-se a vida em risco.
A pergunta é obtusa e obscurantista, cúmplice da ignorância e da apatia.
(b) O que as polícias fluminenses deveriam fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas?
Em primeiro lugar, deveriam parar de traficar e de associar-se aos traficantes, nos “arregos” celebrados por suas bandas podres, à luz do dia, diante de todos. Deveriam parar de negociar armas com traficantes, o que as bandas podres fazem, sistematicamente. Deveriam também parar de reproduzir o pior do tráfico, dominando, sob a forma de máfias ou milícias, territórios e populações pela força das armas, visando rendimentos criminosos obtidos por meios cruéis.
Ou seja, a polaridade referida na pergunta (polícias versus tráfico) esconde o verdadeiro problema: não existe a polaridade. Construí-la –isto é, separar bandido e polícia; distinguir crime e polícia-- teria de ser a meta mais importante e urgente de qualquer política de segurança digna desse nome. Não há nenhuma modalidade importante de ação criminal no Rio de que segmentos policiais corruptos estejam ausentes. E só por isso que ainda existe tráfico armado, assim como as milícias.
Não digo isso para ofender os policiais ou as instituições. Não generalizo. Pelo contrário, sei que há dezenas de milhares de policiais honrados e honestos, que arriscam, estóica e heroicamente, suas vidas por salários indignos. Considero-os as primeiras vítimas da degradação institucional em curso, porque os envergonha, os humilha, os ameaça e acua o convívio inevitável com milhares de colegas corrompidos, envolvidos na criminalidade, sócios ou mesmo empreendedores do crime.
Não nos iludamos: o tráfico, no modelo que se firmou no Rio, é uma realidade em franco declínio e tende a se eclipsar, derrotado por sua irracionalidade econômica e sua incompatibilidade com as dinâmicas políticas e sociais predominantes, em nosso horizonte histórico. Incapaz, inclusive, de competir com as milícias, cuja competência está na disposição de não se prender, exclusivamente, a um único nicho de mercado, comercializando apenas drogas –mas as incluindo em sua carteira de negócios, quando conveniente. O modelo do tráfico armado, sustentado em domínio territorial, é atrasado, pesado, anti-econômico: custa muito caro manter um exército, recrutar neófitos, armá-los (nada disso é necessário às milícias, posto que seus membros são policiais), mantê-los unidos e disciplinados, enfrentando revezes de todo tipo e ataques por todos os lados, vendo-se forçados a dividir ganhos com a banda podre da polícia (que atua nas milícias) e, eventualmente, com os líderes e aliados da facção. É excessivamente custoso impor-se sobre um território e uma população, sobretudo na medida que os jovens mais vulneráveis ao recrutamento comecem a vislumbrar e encontrar alternativas. Não só o velho modelo é caro, como pode ser substituído com vantagens por outro muito mais rentável e menos arriscado, adotado nos países democráticos mais avançados: a venda por delivery ou em dinâmica varejista nômade, clandestina, discreta, desarmada e pacífica. Em outras palavras, é melhor, mais fácil e lucrativo praticar o negócio das drogas ilícitas como se fosse contrabando ou pirataria do que fazer a guerra. Convenhamos, também é muito menos danoso para a sociedade, por óbvio.
(c) O Exército deveria participar?
Fazendo o trabalho policial, não, pois não existe para isso, não é treinado para isso, nem está equipado para isso. Mas deve, sim, participar. A começar cumprindo sua função de controlar os fluxos das armas no país. Isso resolveria o maior dos problemas: as armas ilegais passando, tranquilamente, de mão em mão, com as benções, a mediação e o estímulo da banda podre das polícias.
E não só o Exército. Também a Marinha, formando uma Guarda Costeira com foco no controle de armas transportadas como cargas clandestinas ou despejadas na baía e nos portos. Assim como a Aeronáutica, identificando e destruindo pistas de pouso clandestinas, controlando o espaço aéreo e apoiando a PF na fiscalização das cargas nos aeroportos.
(d) A imagem internacional do Rio foi maculada?
Claro. Mais uma vez.
(e) Conseguiremos realizar com êxito a Copa e as Olimpíadas?
Sem dúvida. Somos ótimos em eventos. Nesses momentos, aparece dinheiro, surge o “espírito cooperativo”, ações racionais e planejadas impõem-se. Nosso calcanhar de Aquiles é a rotina. Copa e Olimpíadas serão um sucesso. O problema é o dia a dia.

Palavras Finais
Traficantes se rebelam e a cidade vai à lona. Encena-se um drama sangrento, mas ultrapassado. O canto de cisne do tráfico era esperado. Haverá outros momentos análogos, no futuro, mas a tendência declinante é inarredável. E não porque existem as UPPs, mas porque correspondem a um modelo insustentável, economicamente, assim como social e politicamente. As UPPs, vale dizer mais uma vez, são um ótimo programa, que reedita com mais apoio político e fôlego administrativo o programa “Mutirões pela Paz”, que implantei com uma equipe em 1999, e que acabou soterrado pela política com “p” minúsculo, quando fui exonerado, em 2000, ainda que tenha sido ressuscitado, graças à liderança e à competência raras do ten.cel. Carballo Blanco, com o título GPAE, como reação à derrocada que se seguiu à minha saída do governo. A despeito de suas virtudes, valorizadas pela presença de Ricardo Henriques na secretaria estadual de assistência social --um dos melhores gestores do país--, elas não terão futuro se as polícias não forem profundamente transformadas. Afinal, para tornarem-se política pública terão de incluir duas qualidades indispensáveis: escala e sustentatibilidade, ou seja, terão de ser assumidas, na esfera da segurança, pela PM. Contudo, entregar as UPPs à condução da PM seria condená-las à liquidação, dada a degradação institucional já referida.

O tráfico que ora perde poder e capacidade de reprodução só se impôs, no Rio, no modelo territorializado e sedentário em que se estabeleceu, porque sempre contou com a sociedade da polícia, vale reiterar. Quando o tráfico de drogas no modelo territorializado atinge seu ponto histórico de inflexão e começa, gradualmente, a bater em retirada, seus sócios –as bandas podres das polícias-- prosseguem fortes, firmes, empreendedores, politicamente ambiciosos, economicamente vorazes, prontos a fixar as bandeiras milicianas de sua hegemonia.

Discutindo a crise, a mídia reproduz o mito da polaridade polícia versus tráfico, perdendo o foco, ignorando o decisivo: como, quem, em que termos e por que meios se fará a reforma radical das polícias, no Rio, para que estas deixem de ser incubadoras de milícias, máfias, tráfico de armas e drogas, crime violento, brutalidade, corrupção? Como se refundarão as instituições policiais para que os bons profissionais sejam, afinal, valorizados e qualificados? Como serão transformadas as polícias, para que deixem de ser reativas, ingovernáveis, ineficientes na prevenção e na investigação?

As polícias são instituições absolutamente fundamentais para o Estado democrático de direito. Cumpre-lhes garantir, na prática, os direitos e as liberdades estipulados na Constituição. Sobretudo, cumpre-lhes proteger a vida e a estabilidade das expectativas positivas relativamente à sociabilidade cooperativa e à vigência da legalidade e da justiça. A despeito de sua importância, essas instituições não foram alcançadas em profundidade pelo processo de transição democrática, nem se modernizaram, adaptando-se às exigências da complexa sociedade brasileira contemporânea. O modelo policial foi herdado da ditadura. Ele servia à defesa do Estado autoritário e era funcional ao contexto marcado pelo arbítrio. Não serve à defesa da cidadania. A estrutura organizacional de ambas as polícias impede a gestão racional e a integração, tornando o controle impraticável e a avaliação, seguida por um monitoramento corretivo, inviável. Ineptas para identificar erros, as polícias condenam-se a repeti-los. Elas são rígidas onde teriam de ser plásticas, flexíveis e descentralizadas; e são frouxas e anárquicas, onde deveriam ser rigorosas. Cada uma delas, a PM e a Polícia Civil, são duas instituições: oficiais e não-oficiais; delegados e não-delegados.

E nesse quadro, a PEC-300 é varrida do mapa no Congresso pelos governadores, que pagam aos policiais salários insuficientes, empurrando-os ao segundo emprego na segurança privada informal e ilegal.
Uma das fontes da degradação institucional das polícias é o que denomino "gato orçamentário", esse casamento perverso entre o Estado e a ilegalidade: para evitar o colapso do orçamento público na área de segurança, as autoridades toleram o bico dos policiais em segurança privada. Ao fazê-lo, deixam de fiscalizar dinâmicas benignas (em termos, pois sempre há graves problemas daí decorrentes), nas quais policiais honestos apenas buscam sobreviver dignamente, apesar da ilegalidade de seu segundo emprego, mas também dinâmicas malignas: aquelas em que policiais corruptos provocam a insegurança para vender segurança; unem-se como pistoleiros a soldo em grupos de extermínio; e, no limite, organizam-se como máfias ou milícias, dominando pelo terror populações e territórios. Ou se resolve esse gargalo (pagando o suficiente e fiscalizando a segurança privada /banindo a informal e ilegal; ou legalizando e disciplinando, e fiscalizando o bico), ou não faz sentido buscar aprimorar as polícias.

O Jornal Nacional, nesta quinta, 25 de novembro, definiu o caos no Rio de Janeiro, salpicado de cenas de guerra e morte, pânico e desespero, como um dia histórico de vitória: o dia em que as polícias ocuparam a Vila Cruzeiro. Ou eu sofri um súbito apagão mental e me tornei um idiota contumaz e incorrigível ou os editores do JN sentiram-se autorizados a tratar milhões de telespectadores como contumazes e incorrigíveis idiotas.

Ou se começa a falar sério e levar a sério a tragédia da insegurança pública no Brasil, ou será pelo menos mais digno furtar-se a fazer coro à farsa.
*é cientista político, foi coordenador de segurança, justiça e cidadania do Rio de Janeiro (1999/2000) e secretário nacional de Segurança Pública (2003)

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Incêndios em favelas, surto racista, homofobia. Como anda o respeito (ou desrespeito) aos direitos humanos no Brasil

Primeiro, a estudante de direito Mayara Petruso, revoltada com a derrota de José Serra, pediu na internet depois do pleito de 31 de outubro que seus conterrâneos paulistanos afogassem nordestinos, para ela responsáveis pela eleição de Dilma Rousseff. Semanas depois, quatro homossexuais foram covardemente agredidos na Avenida Paulista, coração de São Paulo. Domingo, durante e após a Parada do Orgulho LGBT-Rio, jovens que namoravam na Avenida Atlântica e imediações, como o Arpoador, foram hostilizados, ameaçados e agredidos por militares do Forte de Copacabana. Um rapaz de 19 anos foi baleado. Não se trata de fatos isolados. Acontecendo nas duas metrópoles brasileiras, Rio de Janeiro e São Paulo, demonstram que apesar dos avanços vamos mal no campo dos direitos humanos. Direitos humanos que, para uma parcela da sociedade cuja cabeça é feita pela mídia, são "proteção a bandido e vagabundo". (Rodrigo Brandão, da Equipe do EDUCOM)

Incêndios em favelas e o surto racista
Do Blog do Carlos, professor de Geografia

Há certos assuntos que revolver pode ser assustador porque quanto mais se cava, mais se encontra. Um desses casos é a questão do racismo e da xenofobia que crescem em São Paulo diante de todos – imprensa, polícia, Executivo, Legislativo, Judiciário e a própria sociedade – sem que providências de verdade sejam adotadas, pois o problema só faz crescer.

É aterrador, o que vem agora. Aliás, leitores anteciparam que certa linha de pensamento sobre o assunto seria abordada neste espaço. Até porque, no antigo blog, o Cidadania.com, fora abordada episodicamente e, em seguida, abandonada por falta de convicção em sua consistência.

Tudo mudou com o surto de racismo que explodiu em São Paulo. É assustador, mas as ações concretas empreendidas contra nordestinos pobres, favelados e negros podem não estar se restringindo só a insultos pelas redes sociais da internet ou a propostas de segregação racial documentadas e “assinadas” pelos autores.

Não se pode dizer, em hipótese alguma, que os cães que ladram são os mesmos que mordem. Pode-se dizer, contudo, que por conta dos que ladram alguns podem estar sendo estimulados a morder.

Uma breve pesquisa na internet revela que em 2009 contabilizaram-se cerca de 14 incêndios em favelas. Mais


Dois títulos e um só preconceito
Por Eduardo Guimarães, do Cidadania.com

É ilegal, inconstitucional e pervertido o que fez a Folha de São Paulo na quinta (11) e na sexta-feira (12). Publicou dois textos cujos títulos denunciam seus autores. Ambos foram publicados na seção Tendências / Debates, na página A3.

Leandro Narloch (dia 11) é jornalista e autor do livro "Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil" (LeYa). Foi repórter do "Jornal da Tarde" e da revista "Veja". Seu texto tem como título “Sim, eu tenho preconceito”.

Janaina Conceição Paschoal é advogada e professora associada de direito penal na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Seu texto tem como título “Em defesa da estudante Mayara”.

Para sintetizar, excluindo o monte de bobagens preconceituosas e alguns dados – como descreveu uma leitora – “torturados”, Narloch rebelou-se contra o direito de voto aos nordestinos mais pobres difamados na internet por supostamente não entenderem de política, e Paschoal afirmou que quem inspirou Mayara a pregar assassinato de nordestinos foi Lula, argumentando para que não a punam por isso.

Não importa o que digam para tentarem dizer que não disseram o que efetivamente foi dito. Os títulos dos seus textos denotaram o que pensam. Um tem preconceito e a outra quer defender Mayara. Enfim, ambos distorcem fatos enquanto tentam dissimular o que escancaram num paradoxo absolutamente esquizofrênico.

Qual é o limite para o que um meio de comunicação pode fazer para aparecer e/ou para propugnar as idéias mais degeneradas que acalenta?

Quando a Folha ataca Lula, diz que ele é assassino, estuprador, cachaceiro, “tudo bem”. Lula é o presidente da República e, assim, tem muitos meios de reagir. Muitos mais do que supõe o jornal, como por exemplo um apoio dos “nordestinos” que vai além da idolatria e se fixa na racionalidade e na politização mais completas.

Agora, quando a Folha ajuda a difundir concordância e proteção a idéias racistas, segregacionistas, difamatórias, desumanas, assassinas, no mínimo, aí passa dos limites. De qualquer limite aceitável em uma sociedade que se pretenda civilizada.

O fato é que não se pode concordar mais com esse tipo de atitude.

Na última quinta-feira, na Câmara Municipal de São Paulo, participei de um ato público que ajudei a promover e que fiz de tudo para difundir desde a noite de 31 de outubro, quando o racismo explodiu de vez na internet. Foi um ato de desagravo aos nordestinos.

Não quis propugnar um ato de criminalização, nem de confrontação, nem de politização do problema. No Blog da Cidadania – que, conjunturalmente, encontra-se na UTI virtual por excesso de tráfego, mas que volta ao bom combate na próxima terça –, defendi que fosse um ato de solidariedade. O resultado foi que o racismo recrudesceu e ganhou roupagens de vítima daqueles que o combatem.

Penso que está na hora de o Movimento dos Sem Mídia, Organização que presido, propor atitudes de confrontação ao crime ideológico organizado. Não nos furtaremos ao papel que a história tem nos delegado.

Exército nega disparo contra jovem após Parada Gay do Rio*

RIO - O Comando Militar do Leste (CML) negou, nesta segunda-feira, qualquer envolvimento no caso do jovem Douglas, 19 anos, baleado na noite do domingo na Praia do Arpoador. Segundo o Exército, não houve registro de disparos de armas de fogo por militares de serviço no Forte de Copacabana

Nesta segunda-feira, a Polícia Civil havia solicitado ao Comando Militar do Leste uma lista contendo todos os militares que estavam em serviço na noite deste domingo. O objetivo é identificar quem baleou o estudante. O jovem e a família dele acusam um militar do Exército do Forte de Copacabana, de agressão, discriminação e de ter efetuado o disparo. A família teme sofrer represálias.

De acordo com a mãe de Douglas, a estudante de Direito Viviane, 37 anos, o filho, que é estudante do 3º ano do ensino médio, tinha saído da Parada Gay e seguido para as pedras do Arpoador com um grupo de amigos. O local é conhecido como ponto de encontro de homossexuais e estava lotado. Três militares fardados, do Forte de Copacabana, que fica ao lado, teriam chegado ao local pressionando os frequentadores a sair, mas Douglas teria sido segurado por eles.

Ainda segundo Viviane, o filho contou que os militares pediram a identidade dele e o telefone da família. Após cumprir as exigências, ele disse que os militares perguntaram se seus pais sabiam de sua presença no local e que seria homossexual. O estudante teria respondido que a mãe sabia, o que teria irritado os militares. Em seguida, o jovem teria sido agredido com um soco no rosto por um deles e depois atingido com um tiro de pistola na barriga.

À Polícia Civil, o estudante informou que estava namorando com outro rapaz quando militares começaram a ameaçar levá-los presos, junto com outras pessoas que também estavam namorando no local.

Douglas foi levado por policiais do 23º BPM (Leblon) para o Hospital Miguel Couto (HMC), na Gávea. O tiro perfurou lateralmente o abdome do jovem. O estado de saúde dele é considerado regular e não há risco de vida. A família está tentando a transferência do jovem para um hospital particular. O caso está sendo investigado pela 14ª DP (Leblon). Douglas é aguardado nos próximos cinco dias para prestar depoimento.
*do Portal Terra, via "O Dia On Line"