quinta-feira, 23 de maio de 2013

Joaquim e seu estilo


Paulo Moreira Leite em seu Blog

Aos poucos, Joaquim Barbosa autoriza o país a identificar um estilo político.

Sabendo do risco de ser adorado pelos conservadores, que tentam enfeitá-lo com o mito de “menino pobre que mudou o Brasil”, agora reproduzido até pela revista Time (se houve tal “menino pobre” nós sabemos quem ele é, como se chama, de onde veio e o que fez, certo?),

Joaquim achou necessário  colocar-se como pessoa de esquerda.

Apenas por isso declarou que a imprensa brasileira é de “direita”.

Tempos atrás, fez questão de revelar seu voto em Lula e Dilma, lembram?

Sempre de olho no povão, xingou o Congresso e disse que temos partidos de mentirinha. Como isso é sempre chato e incomoda quem lê jornais, mandou dizer que falou como acadêmico.

O método de Joaquim Barbosa para construir seu próprio mito político já é conhecido. Consiste em quebrar regras de convívio democrático e respeito entre instituições. Depois, dá uma volta sobre o próprio passo.

Quem procura, de uns tempos para cá, conseguir um lugar na turma do gargarejo finge que não vê a coerência em determinados movimentos apenas porque são duplos.

Joaquim disse em tom de crítica:

 “O Congresso não foi criado para única e exclusivamente deliberar sobre o Poder Executivo. Cabe a ele a iniciativa da lei. Temos um órgão de representação que não exerce em sua plenitude o poder que a Constituição lhe atribui, que é o poder de legislar.”

Sob a presidência de Joaquim, o Supremo inaugurou uma fase na qual tem feito o possível para diminuir o Congresso e interferir em sua atividade.

O Congresso tentou legislar sobre royalties do petróleo. Foi impedido pelo Supremo. Tentou regulamentar a distribuição de verbas públicas e tempo na TV para partidos políticos – Gilmar Mendes assinou uma liminar. O Congresso quer resolver o que fazer com o mandato de deputados condenados no mensalão, como diz a Constituição. O Supremo manda cassar de qualquer maneira.

Já aposentado, o ex-presidente do Supremo, Ayres Britto, justifica a atuação extrajudicial do STF sem muitos pudores.

Diz que “o experimentalismo” do Supremo se explica pela “inércia do legislador.” Ou seja: com este Congresso lento, sem lideranças (quem sabe preguiçoso e corrupto, não é assim?), o STF se acha no direito de fazer mais do que a lei manda. É a Constituição à moda de Ayres Britto.

Eu acho muito estranho que alguém reclame  da omissão do Congresso semanas depois da aprovação de uma lei crucial  para o bem-estar do país -- a legislação que regula o trabalho doméstico, última herança do regime escravocrata.

Considerando que foi uma legislação criada pelos parlamentares e aprovada por eles, após pressões, manobras protelatórias e ataques de todo tipo, que se prolongaram durante anos, pergunto como alguém pode reclamar do Congresso nesses dias, como se fosse possível esquecer um avanço numa área que se encontrava estagnada desde 13 de maio de 1888.

Ou melhor: entendo perfeitamente porque se fala mal do Congresso por esses dias. Uma pena.

Há outras coisas, também.

Jornalistas que integram a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, que possui tantos profissionais respeitáveis em seu quadro de sócios e dirigentes, resolveram convidar o presidente do STF para uma palestra.

Pergunto se aquele jornalista que deveria chafurdar na lama estará na plateia.

E aquele outro, brother, que ousou perguntar pela serenidade do ministro do STF, e foi advertido que isso era visão de branco?

Podemos imaginar, desde já, o próximo release explicando, mais uma vez, que o ministro falou na ABRAJI como acadêmico, num “exercício intelectual”, numa tentativa de disfarce conhecido, pois poder não faz “análise”, nem “sociologia”, nem “psicologia”.

Poder é poder durante 24 horas do dia.

Se isso fosse verdade, não haveria motivo aceitável para um assessor do STF esclarecer opiniões privadas do seu presidente, concorda?

Não custa lembrar que movimentos temerários de aproximação com posturas autoritárias costumam fazer vítimas entre os companheiros de viagem.

Principal trombone do golpe de 64, Carlos Lacerda não demorou a perder seus direitos políticos.  Articulador civil do golpe, o Estado de S. Paulo tornou-se alvo prioritário da censura.

Depois de apoiar centros de tortura, nossos espertalhões de ontem derramam lágrimas de crocodilo quando falam sobre as revelações da Comissão da Verdade.

Aliomar Baleeiro, udenista que foi golpistas em 1954, 1956 e 1964, acabou a carreira no Supremo,  fazendo arrependidas manifestações a favor os direitos humanos e das liberdades públicas.  Tarde demais – mesmo para limpar biografias.

A questão de Joaquim é aqui e agora.

Em maio de 2013, o ambiente em torno do Supremo é outro. O debate sobre embargos irá abrir, necessariamente, uma discussão que ficou abafada durante o julgamento, em torno de falhas e contradições que ajudaram a produzir penas tão severas.

Será difícil repetir aquele ambiente de unanimidade cívica do ano passado.

Mas Joaquim vai tentar.    

http://istoe.com.br/colunas-e-blogs/colunista/48_PAULO+MOREIRA+LEITE

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Delegado da PF responderá a inquérito por apreender equipamentos de jornalista



Durante ação de desocupação de indígenas Terena, delegado Alcídio de Souza Araújo apreende computador e gravador de jornalista. Entidades de classe repudiam ação

Por Daniel Santini e Verena Glass | Repórter Brasil
 
O delegado Alcídio de Souza Araújo, da Superintendência da Polícia Federal de Mato Grosso do Sul, responderá a inquérito interno pela apreensão irregular de equipamentos do jornalista Ruy Sposati no sábado, dia 18, durante ação de desocupação de indígenas Terena em uma fazenda em Sidrolândia, no Mato Grosso do Sul. Sem apresentar ordem judicial ou dar explicações, o policial determinou a apreensão de um computador, um gravador e lentes para câmara fotográfica, todos retirados da mochila do profissional. O jornalista fazia a cobertura para a página do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), organização que acompanha questões indígenas.

A Repórter Brasil tentou ouvir o delegado, mas ele informou que não poderia dar entrevistas sem autorização do superintendente Edgar Paulo Marcon.  O superintendente, por sua vez, por meio da assessoria de imprensa, informou que ele responde a inquérito sobre o caso e não está autorizado a se pronunciar enquanto não apresentar relatório justificando o procedimento.

A apreensão foi registrada em vídeo: veja no link,  final do texto


Além de responder a inquérito na Polícia Federal, o delegado pode ter problemas em outras esferas. De acordo com o advogado do Cimi, Adelar Cupsinski, a entidade está entrando com representações contra Araújo no Ministério da Justiça, no Ministério Publico Federal (MPF) e na Ouvidoria da Polícia Federal. “As representações são por abuso de autoridade, uma vez que o delegado não tinha ordem de busca e apreensão e feriu explicitamente o direito constitucional do exercício de profissão do jornalista Ruy. Mas também estamos pedindo a abertura de investigações criminais, uma vez que a retenção ilegal do equipamento do repórter pode configurar vários outros crimes previstos no código penal. Num segundo momento, entraremos também com um processo por danos morais e materiais”, afirma Cupsinski. Clique aqui para ler a representação do Cimi.

No MPF, quem acompanha a questão envolvendo os Terena é o procurador Emerson Kalif Siqueira. A reportagem tentou contato nesta segunda-feira, 20, sem sucesso.

Direito à informação
A apreensão de equipamentos do jornalista também provocou reações entre organizações que defendem o trabalho da imprensa. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Mato Grosso do Sul acompanham a questão. O presidente da Fenaj, Celso Schröder, vê com preocupação ações contra jornalistas não só no Estado, mas em todo o país.

“Pessoas incomodadas com atividade jornalística movem-se no sentido de inibi-la, impedi-la. Essas ações têm elementos cerceadores e acontecem em vários níveis no Estado Brasileiro. No Judiciário, jornalistas enfrentam ações para tirar blogs do ar sem praticamente nenhuma possibilidade de defesa. No Executivo, há ações de agentes de estado como polícias federais e policiais militares. Em alguns casos existe uma incompreensão, uma confusão; em outros há má fé. É uma vertente com viés autoritário”, afirma.

“A ideia de impedir que a informação circule a partir de uma ação de autoridade é perigosa e precisamos reagir a isso. No Brasil está aumentando o número de morte e violência contra jornalistas. E, enquanto em outros países a violência está relacionada à cobertura de guerra ou policial, no Brasil ela aparece na área política. Quando o trabalho do jornalista é considerado impertinente, a autoridade o inibe. Isso é uma ameaça ao Estado de Direito. Se olharmos países como México, Colômbia e Honduras, estados paralelos se estabeleceram a partir da impressão que a imprensa precisava ser calada, que aquilo que se produzia não era do interesse de determinados setores”, completa, para finalizar:

“Não combatemos mau jornalismo com não jornalismo. Bom jornalismo é aquele livre. Tem que ser regrado, submetido a princípios republicanos, legais, porque ninguém está acima da lei, mas em que os jornalistas tenham liberdade para trabalhar”.

Entenda o caso

A operação em que o jornalista teve equipamentos apreendidos aconteceu na Fazenda Buriti, em Sidrolândia (MS), a cerca de 70 km de Campo Grande (MS). Conforme determinação judicial,  600 famílias Terena devem ser retiradas do local. Além da Polícia Federal, também foram destacadas para ação a Tropa de Choque da Companhia Independente de Gerenciamento de Crises (Cigcoe) e a Polícia Rodoviária Militar

Os indígenas alegam que a área faz parte da Terra Indígena Buriti, declarada em 2010 como de ocupação tradicional pelo Ministério da Justiça. Em nota sobre a reintegração em si, a assessoria de imprensa da Polícia Federal reitera a necessidade de cumprir a determinação judicial, e alega que o Cimi prejudicou as negociações. “As diversas reuniões ocorridas com lideranças indígenas em busca da solução pacífica da crise não chegaram ao resultado esperado, especialmente em razão da presença de indivíduos estranhos  à comunidade indígena, que se apresentaram como sendo representantes do CIMI e da COPAI/OAB/MS [Comissão Permanente de Assuntos Indígenas da Ordem dos Advogados do Brasil / Mato Grosso do Sul], apontados pelos próprios indígenas como os motivadores do agravamento da ocupação e os estimuladores da desobediência à ordem judicial vigente”, diz o texto. Leia na íntegra.

Não é a primeira vez que o delegado Alcídio comanda uma operação contra indígenas Terena. Em 2010, em Miranda (MS), ele esteve à frente da negociação frustrada de desocupação, que resultou em uma ação violenta com uso de bombas de efeito moral e disparo de balas de borracha. O episódio também foi registrado em vídeo, confira:

Fonte: Repórter Brasil. Veja os vídeos no link.

http://reporterbrasil.org.br/2013/05/delegado-da-pf-respondera-a-inquerito-por-apreender-equipamentos-de-jornalista/

Leia também: http://www.brasileducom.blogspot.com.br/2013/05/governo-contra-os-indios.html:

terça-feira, 21 de maio de 2013

Governo contra os índios

Dalmo de Abreu Dallari*

Uma vez mais – e agora com a colaboração ativa de setores do governo federal – está em curso uma tentativa de negar cumprimento às determinações constitucionais de reconhecimento e proteção dos direitos das comunidades indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam, para entregar essas terras aos investidores do agronegócio. O dado novo é que a iniciativa ostensiva da nova investida contra os direitos indígenas vem da cúpula do governo federal, que é justamente o principal responsável pela defesa desses direitos, por expressa e muito clara determinação constitucional. É oportuno lembrar que a última tentativa de retirada da proteção desses direitos foi feita por meio de uma proposta de emenda constitucional, a PEC 215, de autoria de um deputado do estado de Roraima, que, absurdamente, pretendia transferir para o Legislativo a tarefa, essencialmente administrativa, de demarcação das áreas indígenas. Essa tentativa não prosperou, por sua evidente inconstitucionalidade e pelo reconhecimento da absoluta impossibilidade prática de incumbir o Legislativo de realizar tarefas para cuja execução ele não tem qualquer preparo nem as mínimas condições práticas.  A denúncia desse absurdo criou um obstáculo para o avanço daquela proposta.

Agora a investida dos interesses do agronegócio sobre as terras indígenas vem, surpreendentemente, da cúpula do Poder Executivo federal. Quem aparece como propositora de um novo tratamento da questão da identificação e demarcação das terras indígenas pelo governo federal é a ministra-chefe da Casa Civil, Gleise Hoffmann, que não tem a mínima familiaridade com o assunto, jamais tendo participado de qualquer atividade com ele relacionado. É também oportuno e necessário lembrar que já existe, na estrutura do governo federal um órgão especializado nas questões indígenas, que é a Funai (Fundação Nacional do Índio), criada pela Lei federal nº 5.371, de 5 de dezembro de 1967, em substituição ao antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI), que existia desde 1910. Por seu objetivo específico a Funai vem acumulando conhecimentos e experiências no trato das questões indígenas. O que tem sido denunciado há vários anos, sem qualquer efeito prático, é que, certamente por influência de poderosos interesses econômicos e, em decorrência, de poderes políticos, a Funai não tem recebido o apoio necessário para o melhor desempenho de suas tarefas, entre as quais se inclui a demarcação das áreas indígenas, intensamente cobiçadas por investidores do setor agrícola.

É pública e notória a interferência do agronegócio nessa área, já tendo sido objeto de informações pormenorizadas e de muitos comentários a atuação da senadora Kátia Abreu, cuja família é ocupante de grandes áreas rurais no estado de Tocantins e que acumula, ilegalmente, o desempenho do mandato de senadora com o exercício da presidência da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, dando indisfarçável preferência aos interesses dessa área quando eles se opõem aos interesses de todo o povo brasileiro, como ficou evidente na discussão da alteração do Código Florestal, ou a interesses de setores sociais especialmente protegidos pela Constituição, como é o caso das comunidades indígenas. Inúmeras vezes tem sido alegada a insuficiência dos meios de que dispõe a Funai para o cumprimento, pelo governo federal, da obrigação constitucional de demarcação das terras indígenas, estabelecida no artigo 231 da Constituição de 1988. O que se tem deixado muito evidente é que há anos não são dados à Funai os recursos de que ela necessita, ficando muito claro o propósito de utilizar a inoperância da Funai como pretexto para transferir a outros setores do governo (ou de fora do governo, como se viu pela PEC 215) a tarefa de reconhecimento e demarcação das áreas indígenas, com o indisfarçável objetivo de redução substancial da extensão dessas áreas.

Pela proposta agora encampada pela ministra-chefe da Casa Civil, no processo de identificação e demarcação das terras indígenas deverão ser considerados, com especial atenção, dados do Ministério da Agricultura e do Ministério das Cidades, parecendo haver a intenção de colocar em plano secundário a Funai, que se limitaria a fornecer laudos antropológicos. Um ponto que causou estranheza foi o deslocamento do assunto da área do Ministério da Justiça, ao qual a Funai está vinculada, para a Casa Civil. Nada impede que outros órgãos do governo federal sejam consultados e forneçam informações à Funai, mas esta, por sua natureza, por sua organização e pela experiência acumulada, é que deve ter a principal responsabilidade no cumprimento do encargo de dar efetividade a essa obrigação constitucional do governo da República. Espera-se que o ministro da Justiça tome conhecimento das intenções da Casa Civil e que use sua influência para que a Funai receba mais recursos e, com a colaboração de outros setores do governo, acelere o processo de demarcação das áreas indígenas.

*Dalmo de Abreu Dallari é jurista. - dallari@noos.fr
Fonte: Jornal do Brasil online
http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2013/05/10/governo-contra-os-indios/

Leia também :
http://www.unmultimedia.org/radio/portuguese/2013/05/comeca-o-forum-permanente-da-onu-sobre-questoes-indigenas/

Veja o vídeo da violência do Estado... 

Redução da maioridade penal - Parte 2

13/04/2013 - Leitura para diminuir pena?
- Por Caipira Zé do Mér em seu blog ImprenÇa

Crédito da foto: C.O.D. Library
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo acaba de autorizar a remição de pena através de leitura e estudo.

A ideia é aplicar a mesma lógica da remição de pena pelo trabalho, educando os presos.

A questão é controversa {é?}, mas não é novidade no país.

Conforme o próprio documento oficial {não acredite em mim, veja aqui}, a medida já foi implementada no Paraná, Piauí, está para ser validada em Goiás e em Santa Catarina.

A medida, em realidade, começou pontualmente por arbitrariedade de alguns juízes.

O resultado foi tão positivo que deu início a um projeto nacional e tem regras. Ou seja, não basta que o sujeito diga que leu.

Como nas escolas, o preso deverá fazer uma redação ao término de 21 dias. Será uma resenha a respeito do livro.

V – O preso participante do Projeto receberá orientações para tal, preferencialmente, através de Oficinas de Leitura, sendo cientificado da necessidade de alcançar os objetivos propostos para que haja a concessão da
remição de pena, a saber:

a) ESTÉTICA: Respeitar parágrafo; não rasurar; respeitar margem; letra cursiva e legível;
b) LIMITAÇÃO AO TEMA: Limitar-se a resenhar somente o conteúdo do livro, isto é, não citar assuntos alheios ao objetivo proposto;
c) FIDEDIGNIDADE: proibição de resenhas que sejam consideradas como plágio. {não acredite em mim, veja aqui - PDF}

Vale lembrar que a lógica utilizada é a mesma da remição de pena pelo trabalho.

Um mês de leitura equivale a menos 4 dias de pena. Isso, claro, se a resenha seguir as regras acima.

Mas antes que o pessoal indignado tenha tempo para isso, vejamos os fatos.

Qual o grau de escolaridade dos presos? {se você quer saber mais do censo penitenciário, veja o post “Redução da Maioridade Penal: Bom ou ruim? – Parte 1 - Dados“ [http://www.imprenca.com/2012/11/reducao-da-maioridade-penal-bom-ou-ruim-parte-1-dados.html] }

A verdade é que a remição de pena pelos estudos já está amplamente aceita {não acredite em mim, veja aqui}.

Então fica a dúvida: pode por trabalho, pode por estudo porque não poderia pela leitura?

É importante lembrar {por mais utópico que pareça} que a nossa constituição prevê que as penas sejam forma de reeducação do condenado e não punição pura e simples.

É isso que faz com que a pena de morte seja inconstitucional e a pena máxima seja de 30 anos {esta, em minha opinião poderia ser revista para, por exemplo, 40 anos, posto que a expectativa de vida tem subido a cada ano}.

Porque a ideia é que o preso seja recolocado na sociedade e não volte a cometer crimes.

É importante ressaltar que boa parte dos que acham que preso não é ser humano é parte considerável do problema.

Sem querer cair {mas já caindo} no dilema ovo e galinha quando boa parte da população pensa desta forma o preso que já cumpriu pena fica impossibilitado de ingressar no mercado de trabalho e acaba, por consequência, voltando a cometer crimes.

Mas ler?!

Sim, caro leitor, ler.

A sociedade brasileira já faz da leitura parte importante do processo educacional.

Senão vejamos:

Não há nos vestibulares parte importante baseada apenas e tão somente na leitura?

Não há leitura obrigatória nas escolas?

Não há campanhas públicas de incentivo à leitura?

Não há incentivo fiscal aos livros?

Então parece-me legítimo que a remição de pena seja feita através da leitura.

Ah, mas o preso vai preferir ler um livrinho a estudar, seu caipira!

Primeiro é preciso se questionar se isso é mesmo real.

Você, pensando no seu futuro, preferiria ler ou graduar-se? Ambos?

Ótimo, eu também! E o preso também!

Sempre é bom lembrar que o preso que acaba se formando tem remição ainda maior da pena:

§ 5o  O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação.(Incluído pela Lei nº 12.433, de 2011) {não acredite em mim, veja aqui}

É mais inteligente, portanto, formar-se.

Os ganhos diretos para a sociedade são diversos.

Mais gente escolarizada, maior a chance de ingresso no mercado de trabalho, reduzindo as chances do preso voltar a cometer delitos.

Além disso, o tempo remido fica atrelado ao comportamento do preso dentro dos presídios, conforme a mesma disposição:

Art. 127.  Em caso de falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar. (Redação dada pela Lei nº 12.433, de 2011) {não acredite em mim, veja aqui}

Indiretamente a remição ajuda a reduzir os custos carcerários, considerando os prejuízos causados pelas faltas graves {rebeliões, etc.}.

Diretamente a remição ajuda a cumprir o que diz a constituição ou seja, ajuda a reabilitar os presos.

Fonte:
http://www.imprenca.com/2013/04/leitura-para-diminuir-pena.html

Leia também:
- Redução da maioridade penal-Bom ou ruim? - Parte 1 - Dados - Caipira Zé do Mér

Nota:
A inserção de imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Redução da maioridade penal. Bom ou ruim? - Parte 1

06/11/2012 - Parte 1 - Dados
- Por Caipira Zé do Mér em seu blog ImprenÇa

De tempos em tempos a sociedade ganha tons de cinza {é para aproveitar o hype, liga não} e incita medidas, digamos, duvidosas, ainda que para a maioria seja algo óbvio.

Crédito: Dav’ Carton – I Love this Picture
O problema do óbvio, no entanto, quando estamos na política, é que ele em geral leva em conta coisas não-tão-óbvias e acaba por cair no poço fundo do clichê {normalmente “universidade do crime”, “político corrupto é pleonasmo”, entre outras pérolas}.

Para falar de violência e, principalmente, para falar de maioridade penal, é preciso antes ter em conta alguns dados.

Aquele velho choque de realidade que costuma tirar o clichê das discussões, não é mesmo?! Pois vamos a eles…

Os dados mostram que há déficit de vagas no sistema prisional brasileiro

{não acredite em mim, veja aqui – Conselho Nacional de Justiça}

Ok, dirão os mais espertos, “vamos parar de prender, porque não há espaço prisional?”.

E a resposta vem em forma de outra pergunta: Há mesmo tanta gente precisando ser presa? Um exemplo básico, apenas para apimentar a discussão: A lei de drogas diz que usar não é passível de cadeia. Mas traficar sim.

Contudo, a lei não determina uma quantidade exata que delimite o uso do tráfico {e nem seria justo, posto que cada organismo é um e que as quantidades utilizáveis podem variar de ser humano para ser humano}.

Daí que um ser humano branco, classe média alta, parado numa blitz da lei seca, é descoberto com uma porção de cocaína e outra de maconha.

Daí que outro ser humano, negro, classe pobre, parado numa blitz da lei seca, é descoberto ao mesmo tempo, em outro canto da cidade, com uma porção de cocaína e outra de maconha. {a vida é assim, tem dessas coincidências, que bom, facilita o texto}

Caberá aos policiais decidirem quem é traficante e quem é usuário
Num mundo perfeito, ambos seriam usuários {ou ambos seriam traficantes, num mundo tragicamente perfeito}.

No mundo real, os dados mostram quê:

Segundo Timothy Ireland, representante da área educacional da Unesco no Brasil, dados do Ministério da Saúde indicam no perfil da maioria dos presos no Brasil, são de jovens entre 18 e 34 anos, pobres, negros e com baixa escolaridade, são 73,83% do total da população carcerária.

Mais da metade 66%, não chegaram a concluir o ensino fundamental. {não acredite em mim, veja aqui}

Não se preocupe, foi só uma coincidência ilustrativa. Seguimos.

A questão em questão {eu adoro quando repito essas palavras, dá um quê de não sei quê que parece chic!} são os jovens que são presos. Ou melhor, deveriam ser. Ou melhor, não deveriam. Enfim, questão confusa.

Dados da FEBEM - Fundação Casa, mostram quê:

Reincidência na Fundação Casa cai para 22%
O percentual é bem inferior aos 29% de reincidência observados até o ano passado nas unidades da antiga Febem.


O índice total de reincidência em todas as unidades da Fundação Casa é de 22%, taxa sete pontos percentuais menor em comparação à da antiga Febem. {não acredite em mim, veja aqui}

Uma simples reestruturação do sistema ‘prisional’ infanto-juvenil {na Fundação Casa são aceitos seres humanos da alta sociedade a partir de 12 e no máximo 18 anos} foi capaz de diminuir a reincidência {essa é aquela palavra difícil que, no fundo, no fundo, quer dizer: jovens que voltaram a fazer caquinha e foram pegos de novo} destes bípedes, em 7%.

Uma pesquisa pouco aprofundada, mostra o perfil dos que estão abrigados na Fundação Casa {SP}:




{não acredite em mim, veja aqui – Fundação Casa – PDF}

Vamos interpretar os slides?
51% dos internos morava só com a mãe
57% das mães eram trabalhadoras não qualificadas {e, portanto, com baixa renda familiar}

A média de idade é de 16,7 anos.

Ou seja, trocando em miúdos, estão lá os que eram filhos de mães que ganhavam pouco.

Ou seja, a grande maioria é pobre, mesmo. {Pode me chamar de gênio, mas é importante clarificar o óbvio}.

Agora quais são os dados de violência entre os jovens?

(…) Tal é o peso das causas externas que em 2010 foram responsáveis por 53,2% – acima da metade – do total de mortes na faixa de 1 a 19 anos de idade. {não acredite em mim, veja aqui – Mapa da Violência 2012 – PDF}

E daí? –  pergunta o ser humano que agora perde seu tempo com essas linhas. Pois é. Daí nada, chega de perfumaria, vamos ao que interessa: {não acredite em mim, veja aqui – Censo Penitenciário}

Oras bolas, amiguinhos, se o problema é a Juventude Transviada {EPA!}, o normal seria uma maioria de presos próximo aos 18 anos, certo?

Mas a realidade {sempre ela…} cai sobre nossos colos e nos mostra que a grande maioria dos presos está entre 29 e 34 anos.

É claro, que quando você coloca no jornal a frase: “maioria dos presos têm entre 18 e 34 anos” você não está mentindo… Só que também não está falando a verdade.

O mundo real, bem diferente daqueles casos isolados mostrados na televisão, mostra que há jovens de 16,7 anos {note o 0,7} acomodados na Fundação Casa.

E os dados prisionais mostram presos com média de idade de 30 anos.

Isso pode significar duas coisas:

Os jovens entre 17 e 28 anos são excelentes em esconder provas e, por isso, não são maioria entre os presos;

Os jovens entre 17 e 28 anos não são número relevante na produção da violência e, portanto, não justificam uma redução da maioridade penal.

Aqui falamos apenas dos dados práticos, do porquê não se justifica tal medida.

Na Parte 2, que publicaremos amanhã, falaremos dos riscos da medida.

Fonte:
http://www.imprenca.com/2012/11/reducao-da-maioridade-penal-bom-ou-ruim-parte-1-dados.html

Nota:
A inserção de imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

domingo, 19 de maio de 2013

Liberdade de expressão para os outros


Por Paulo Moreira Leite, em seu  blog:

Não é de hoje que nossos políticos descobriram que toda medida capaz de agradar os interesses da mídia é uma ótima maneira de receber um bom tratamento em reportagens e entrevistas.

Em véspera de uma campanha eleitoral, esse costume salta à vista.

Jornais e TVs protegem personalidades com as quais têm uma identidade política e ideológica.

Seria muito natural, não fosse a obsessão de nossos jornais e revistas em denunciar a “troca de favores” entre políticos como uma espécie de crime permanente de nossa vida pública.

Mas o toma lá dá cá também envolve questões que interessam à mídia como negócio.

É isso que move a discussão atual sobre direito de resposta, analisada com maestria por Jânio de Freitas em sua coluna na Folha.

Em debate no Congresso, a regulamentação do direito de resposta concentra, hoje, os últimos direitos da sociedade diante da imprensa.  Depois que o Supremo deu um brinde aos donos de jornal,  eliminando a Lei de Imprensa sem nada colocar no lugar, quem se considera prejudicado por uma reportagem deve ir à luta na Justiça Comum.

Eu acho um pouco estranho.

Com direito legítimo a usufruir de garantias especiais  – pois sua atividade envolve a liberdade de expressão e não se confunde com plantio de batatas ou venda de biscoitos –, não se compreende por que jornais e jornalistas não querem incluir personagens frequentes de sua atividade – as vítimas de  erros de informação --  neste universo diferenciado.

Levando este raciocínio às últimas consequências, uma pessoa poderia concluir que se acredita que a liberdade de imprensa existe para servir aos jornais e jornalistas – e não a toda sociedade.

Em sua última versão, que alterou a essência de um projeto original, do senador Roberto Requião, o resultado é acentuar a banalização dos erros da mídia, garantindo aos jornalistas o conforto de responder a um processo nos ritmos longos, quase infinitos, do sistema judiciário.

É errado.

Toda pessoa que já foi vítima de um erro da imprensa sabe que o direito de resposta é o único instrumento para uma pessoa esclarecer uma ofensa a sua honra e a sua imagem.

Você pode até entrar na Justiça, condenar o jornal e, se tiver sorte e bons advogados, receber um bom dinheiro.

Mas este processo levará anos para ser concluído – tempo suficiente para que a mentira finque raízes na memória  das pessoas e todos já tenham se esquecido do episódio quando a sentença for assinada.

Jânio repara que o novo projeto repete uma velha exigência, de garantir que o direito de resposta tenha o mesmo espaço e a mesma localização da noticia anterior. É a melhor garantia que só haverá reparação para notinhas, observa, com sagacidade.

A questão central no jornalismo não é espaço, mas tempo.  A atividade funciona na velocidade, que define a disputa por sua mercadoria mais importante – o furo.

Se a notícia é sempre para ontem, a correção deve ser para hoje – no mínimo.

Não é difícil. Minha experiência em redações ensina que basta uma consulta honesta e isenta às partes envolvidas que 99% das histórias podem ser esclarecidas em 24 horas.

Da mesma maneira que um editor publica uma reportagem – questionando os dados dos repórteres, conferindo versões e assim por diante –, é possível fazer a engenharia reversa da notícia e apurar se houve um erro, quando foi cometido, e garantir que o distinto público seja informado.

Um outro aspecto é interno à  profissão. Jogar uma resposta para as calendas é a melhor forma de colocar a sujeira embaixo do tapete.

E isso estimula o sentimento de impunidade,  primeiro passo para alimentar a arrogância – e novas injustiças -- de toda corporação que não precisa prestar contas de seus atos.

Numa experiência como jurado do Prêmio Esso, assisti à vitória de uma reportagem que, menos de uma semana depois de ter sido publicada, já fora desmentida em vários aspectos. Nem a foto principal  correspondia ao que estava escrito na legenda.

Ninguém sabia disso, entre os jurados, mas a informação acabou chegando a nós durante os debates, antes da premiação ser resolvida.

Candidata ao prêmio nacional, após muito debate interno a reportagem foi rebaixada. Ganhou um prêmio regional. Ou seja: bem ou mal, foi vitoriosa numa disputa daquele que era considerado o mais importante prêmio da imprensa brasileira. Chato, né?

Leia também : "O dia em que adoramos ver a TV Globo" e veja no texto de abertura como o STF ajudou enterrar o direito de resposta.

http://brasileducom.blogspot.com.br/2012/11/o-dia-em-que-adoramos-ver-tv-globo.html


sábado, 18 de maio de 2013

Banda larga democratizada será pá de cal no bloqueio à informação



Virá o momento em que informações urgentes não passarão mais pelos grandes meios para chegar ao público. Em São Paulo, a prefeitura anuncia o acesso gratuito à internet nas ruas, passo decisivo para o avanço da democratização das informações.

Laurindo Lalo Leal Filho*

 
Artigo publicado originalmente na ‘Revista do Brasil’ – edição de maio de 2013

Em 1994, o respeitável jornal inglês “The Guardian” atirou no que viu e acertou no que não viu. Em um exercício premonitório encartou numa de suas edições alguns exemplares do que poderia ser o jornal no então longínquo ano de 2004.

A novidade, além do tamanho reduzido, era a personalização das informações. Através de um banco de dados, o jornal saberia exatamente quais eram os interesses de cada um dos seus leitores os quais, através de um cartão magnético, imprimiriam um exemplar pessoal em qualquer banca.

Havia ainda o requinte de a impressão ser feita em um tipo de fibra impermeável, capaz de resistir a água das banheiras, local onde o jornal poderia ser lido com grande conforto, bem ao gosto dos ingleses.

A forma não vingou, mas o conteúdo personalizado ganhou força através de outro caminho, a internet. Com uma diferença fundamental: o fim da rígida divisão entre emissores e receptores. Papeis que agora são assumidos sem distinção por todos os envolvidos nas trocas de mensagens eletrônicas.

O resultado já pode ser percebido num ainda incipiente mas promissor crescimento da liberdade de expressão pelo mundo. Quem está se dando mal são os grandes grupos empresariais de comunicação, até aqui senhores absolutos da verdade.

Muitos já acusam o golpe, alguns discretamente, outros de forma ensandecida como certos colunistas da grande mídia que têm suas informações e opiniões contraditadas em blogs e nas redes sociais.

Um desses, “José Neumânne Pinto, foi ao Congresso pedir uma ‘lei dura’ para a internet, usando um caso de ofensa pessoal, típico no Código Penal, para restabelecer mecanismos de exceção”, como apontou o site Brasil 247.

Antes dele, nas eleições presidenciais a força da comunicação alternativa já havia sido sentida pelo candidato José Serra. Acostumado a controlar os grandes meios de comunicação com telefonemas para seus proprietários e editores e receber deles total apoio, Serra viu-se diante do contraditório exposto por diferentes blogues, chamados por ele de “sujos”. Era o reconhecimento explicito do poder da nova mídia que veio para ficar.

São inúmeras as notícias censuradas pela velha mídia e que só chegam ao conhecimento de parte do público graças a internet. Por exemplo, por qualquer critério jornalístico as mortes de oito apoiadores do presidente Maduro da Venezuela, logo após as eleições naquele país, seriam notícia. Com detalhamento das circunstâncias em que ocorreram e a completa identificação da vítimas. Mas quem se informou pelo Jornal Nacional nada ficou sabendo como bem mostrou o blogueiro Eduardo Guimarães.

Quando os temas são mais complexos a censura é ainda pior. Basta ver o debate em torno da alta de preços de alguns produtos e os riscos inflacionários. Posições diferentes daquelas que defendem a alta de juros como solução não tem vez na grande mídia.

No auge dessas discussões a ‘Globonews’, numa conversa entre os seus invariáveis comentaristas, colocou durante alguns minutos na tela a legenda implacável: “Dilema da política econômica: inflação ou juros altos”. Qualquer outra opinião estava liminarmente censurada.

A pá de cal nesse bloqueio informativo a que os brasileiros estão submetidos há décadas será dada quando a banda larga da internet se universalizar. Virá o momento em que informações urgentes não passarão mais pelos grandes meios para chegar ao público.

Aliás, quem já está ligado à rede testemunhou isso na notícia da prisão do segundo suspeito dos atentados em Boston, divulgada em primeira mão através do twitter.

Em São Paulo, a prefeitura anuncia o acesso gratuito à internet nas ruas, passo decisivo para o avanço da democratização das informações.

Com isso, parte da profecia do 'Guardian' se concretizará, com o cidadão buscando as notícias de forma personalizada mas sem a necessidade do cartão magnético. Ficam faltando, para os ingleses, computadores e celulares impermeáveis a água da banheira.

Laurindo Lalo Leal Filho, sociólogo e jornalista, é professor de Jornalismo da ECA-USP. É autor, entre outros, de “A TV sob controle – A resposta da sociedade ao poder da televisão” (Summus Editorial). Twitter: @lalolealfilho.

Fonte: Carta  Maior
http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=6095


Leia também: http://www.brasileducom.blogspot.com.br/2013/05/projeto-de-lei-da-midia-democratica-o.html


sexta-feira, 17 de maio de 2013

Judiciário trava a Reforma Agrária


Por José Coutinho Júnior
Da Página do MST

O poder Judiciário tem sido um dos principais opositores do processo de Reforma Agrária no Brasil. Além de autorizar ações violentas de despejo contra camponeses acampados e evitar ao máximo a condenação de latifundiários que cometeram crimes contra os trabalhadores rurais, o Judiciário é um dos grandes responsáveis por áreas já desapropriadas, mas que ainda não se tornaram assentamentos devido à trâmites na justiça.

De 531 áreas cujos processos tramitam no Judiciário, 237 estão paradas há anos nos tribunais por “óbice judicial”, uma ação jurídica utilizada para suspender o processo de desapropriação.

No caso das áreas de assentamentos, essa mesma ação geralmente é perpetrada pelos proprietários, ao questionarem o laudo de improdutividade de suas terras,feito pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), e alegando que o valor recebido pela desapropriação é insuficiente.

Segundo o presidente do Incra, Carlos Guedes de Guedes, em declaração ao jornal O Globo, os entraves judiciais dessas áreas custam ao órgão federal pelo menos R$ 485,5 milhões, mais da metade do orçamento anual do Instituto, de R$ 720 milhões. A meta do Incra para este ano é assentar 30 mil famílias, total que poderia ser beneficiado com os imóveis que estão parados nos tribunais.

Tais impasses fazem com que as áreas fiquem com a situação jurídica indefinida por anos. Para Nilcio Costa, militante e advogado do MST, se não fossem esses empecilhos, as desapropriações das áreas seriam rápidas.

“Sem obstáculos, ao receber a petição, o juiz deve imediatamente dar posse ao Incra. Em um ano deveria ser possível desapropriar uma área. Na prática, obviamente isso não ocorre. Há casos de áreas com mais de 10 anos no judiciário”, destaca.

Segundo Joaquim da Silva, da direção estadual do MST em Sorocaba, o Incra pouco faz para pressionar o Judiciário e agilizar a situação dessas áreas. “Na nossa avaliação, quem deveria ter essa articulação com a justiça é o Incra, já que ele é parte interessada. Mas vemos também muito corpo mole por parte dos responsáveis da instituição”.

Acampamentos

Enquanto os impasses no Judiciário continuam, mais de 150 mil famílias vivem em condições precárias nos acampamentos. Joaquim cita o caso do acampamento Santa Maria da Conquista, em Sorocaba.

“Cinquenta famílias acampam em frente à fazenda. Já tivemos oito despejos na beira da estrada. Tem uma área da companhia de luz que é bem em frente à fazenda. Então quando somos despejados da estrada vamos para essa área, e quando tem um despejo da companhia voltamos para a estrada, e por aí vai”.

A área de 700 hectares já foi desapropriada e paga pelo governo federal, mas se encontra desde 2007 na 2ª vara de Sorocaba. O proprietário contesta o laudo de improdutividade do Incra, sendo que a vistoria do instituto demonstrou que as terras estavam abandonadas há nove anos.

Uma reunião de conciliação irá ocorrer no dia 5 de junho para tentar resolver a situação do acampamento. Além desta área, o MST reivindica mais duas áreas na região: a da fazenda Sapituva, e a Ligiane, que desde de 2003 e 2004 se encontram igualmente travadas no Judiciário.

Os Sem Terra acampados vivem de trabalhos temporários e com cestas básicas distribuídas pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Joaquim conta que as famílias vivem num clima de tensão.
“É uma agonia muito forte, primeiro porque moramos debaixo de uma rede de alta tensão, que passa pela beira da estrada, de 40 mil volts. É um risco grande que corremos. Segundo porque estamos há anos nessa situação de pressionar por meio de lutas, sermos despejados e refazer o acampamento”.

As áreas citadas por Joaquim são apenas um exemplo de diversas outras situações semelhantes que acontecem por todo país, tendo como principal responsável à forma como o Poder Judiciário lida com a Reforma Agrária. “Todos os processos de vistoria do Incra são questionados, e os juízes tem sido excessivamente cuidadosos em atender os interesses e as ações dos proprietários”, afirma Nilcio.


quinta-feira, 16 de maio de 2013

Dossiê denuncia violação de Direitos Humanos no Rio de Janeiro




Por Daniel Mazola*
16/05/2013 -  Site da ABI


Lançamento do 2º Dossiê Megaeventos e Violações de Direitos Humanos no Rio de Janeiro


As obras de infraestrutura e construção de equipamentos esportivos para a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 já causaram a remoção de 3 mil famílias na cidade e mais 7 mil estão ameaçadas. O dado consta do 2º Dossiê Megaeventos e Violações de Direitos Humanos no Rio de Janeiro, divulgado ontem pelo Comitê Popular Rio da Copa e Olimpíadas.



O evento estava marcado para ocorrer no auditório do edifício-sede da Associação Brasileira de Imprensa – ABI, porém precisou ser transferido para o Clube de Engenharia em função da falta de luz e da ação de vândalos que invadiram o 7º andar do prédio, o que provavelmente causou a falta de energia no auditório e em outros andares. Gavetas foram reviradas e arrombadas, documentos espalhados pelo chão, trancas e grades foram arrombadas, a sala do ABI On Line, onde trabalham dois repórteres também foi invadida e danificada, o armário da sala foi saqueado e levaram duas máquinas fotográficas, enfim, tudo indica que foi deliberado, sabotagem, terrorismo, intimidação.

A polícia realizou duas perícias no local e colheu as digitais dos invasores, esperamos que tudo seja esclarecido e apurado devidamente, os associados e a sociedade esperam respostas. Suspeita-se que foi obra de pessoas insatisfeitas com o empenho da ABI na luta pela verdade sobre a ditadura, ou em função da posição da entidade em defesa de Atos recentes como o de ontem, denunciando governos e empresários ao lado do Comitê Popular Rio, além do Fora Marin, Fora Feliciano em defesa do Estado laico, isso tudo gera ódio dos fundamentalistas de hoje e ex-agentes da repressão.

Durante o lançamento, no Clube de Engenharia

 Orlando Santos Junior, professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Ippur/UFRJ), representante do comitê, enfatizou que  a tendência de remoção verificada na primeira edição do dossiê, lançado em abril do ano passado, tende a aumentar.

“Pelo número de famílias ameaçadas e, ainda, pela ausência de informações sobre as grandes intervenções em curso. Por exemplo, não se tem informação sobre o traçado dos BRTs [corredor exclusivo para o tráfego rápido de ônibus], que estão sendo construídos na cidade. Então, esse número tende a crescer. É um aspecto que chama a atenção”, disse.

O professor destacou, ainda, a falta de transparência nos projetos, já que os sites disponíveis hoje não trazem informações “fundamentais para que haja o controle social”, como o traçado das obras e as empresas contratadas. “Então o que o comitê está propondo não é nada além do que um conjunto de medidas que objetivam, efetivamente, assegurar os direitos humanos, assegurar os direitos da população, enfim, assegurar a democracia e a participação de todos nas decisões relativas à Copa e às Olimpíadas”.

As famílias removidas reclamam que foram levadas para locais distantes e sem estrutura. Outras denunciam que as indenizações pagas ficaram muito abaixo do valor de mercado do imóvel onde moravam. É ocaso da família de Ravel, jogador de vôlei de praia, removida da casa onde morava na comunidade Largo do Tanque, na zona oeste.

A mãe de Ravel, Rosilene Gonçalves da Silva, disse que a indenização paga foi muito abaixo do esperado e a família foi para um local mais perigoso. “Foi muito difícil para a gente, desgastante demais. Eles queriam dar R$ 18 mil para a gente sair de lá, sem ter como comprar outra moradia. Atualmente, a gente está na Estrada da Covanca. Não está como a gente gostaria que estivesse, ficou mais difícil para todo mundo, tem que chegar cedo, não pode chegar tarde, porque lá é próximo a uma área de risco, tem tiroteio”, declarou.

Falta de transparência

Os dados, segundo o Comitê, foram levantados por meio de pesquisas realizadas nas comunidades (no contato direto com os moradores), com a Defensoria Pública do Estado e em notícias veiculadas na mídia.

O dossiê aponta que 3.099 famílias já foram removidas e outras 7.843 estão ameaçadas de remoção em obras para o Mundial e os Jogos Olímpicos de 2016, como a construção do Parque Olímpico, na Barra da Tijuca, ou a implantação das linhas de BRT (transporte rápido por ônibus). O dossiê é dividido em denúncias envolvendo itens como mobilidade urbana, esporte e orçamento. Uma das principais críticas é quanto à falta de transparência. Sobre as remoções realizadas pela prefeitura, por exemplo, o dossiê afirma que “os projetos não são apresentados e não há dados oficiais das famílias ameaçadas”. E ainda que “a maioria das remoções está localizada em áreas de extrema valorização imobiliária”.

Ainda segundo o dossiê, no que diz respeito aos vendedores ambulantes e trabalhadores informais, a política de preparação da cidade para a Copa do Mundo e os Jogos de 2016 é de “exclusão e militarização”. Na seção de esporte, o documento critica as demolições do parque aquático Júlio Delamare e do estádio de atletismo Célio de Barros, previstas no edital de concessão do Maracanã, além do que se transformou o que deveria ser o legado do Pan de 2007: o Engenhão está interditado, o velódromo será demolido e o Maria Lenk, será subutilizado em 2016.

Principais pontos

O relatório das violações de direitos humanos divide-se em oito esferas ligadas ao interesse público: moradia, mobilidade, trabalho, esporte, meio ambiente, segurança pública, informação e participação e orçamento e finanças. Confira abaixo alguns pontos levantados pelo Comitê em cada uma delas.

Moradia

Nada menos do que 3 mil famílias residentes na cidade do Rio de Janeiro já foram removidas por conta da realização de projetos direta ou indiretamente ligados à Copa do Mundo e às Olimpíadas. O número pode chegar a quase 11 mil famílias expulsas, já que outras 7.800 famílias correm o risco de despejo. Em relação ao primeiro dossiê, nessa segunda versão foram reunidas informações mais específicas e atualizadas de modo a demonstrar detalhadamente as violações de direitos humanos ocorridas na cidade.

As comunidades envolvidas no processo de remoção foram divididas em quatro eixos específicos relacionados ao fator de risco: as obras viárias em curso no Rio de Janeiro; as obras de instalação e reforma de equipamentos esportivos; as obras de revitalização turística da zona portuária e as áreas de risco ou interesse ambiental.

Apesar da especificidade e das peculiaridades de cada região, o dossiê aponta padrões no trato do poder público, sobretudo o municipal, com as comunidades que se vêem envolvidas no contexto de remoção.  Esses são seis, presentes na ação do poder público no trato com as comunidades atingidas, segundo o comitê:

“(i) Completa ausência, ou precariedade de informação para as comunidades, acompanhada de procedimentos de pressão e coação, forçando os moradores a aceitarem as ofertas da prefeitura do Rio. Cabe frisar que as comunidades visitadas, sem exceção, não tivera acesso aos projetos de urbanização em suas áreas de moradia.

(ii) Completa ausência, ou precariedade de envolvimento das comunidades na discussão dos projetos de reurbanização promovidos pela prefeitura, bem como das possíveis alternativas para os casos onde são indicadas remoções.

(iii) As indenizações oferecidas são incapazes de garantir o acesso a outro imóvel situado na vizinhança próxima, tendo em vista que a prefeitura só indeniza o valor das benfeitorias e não a posse da terra, fato em geral agravado pela valorização imobiliária decorrente dos investimentos realizados pelo poder público. Tal situação não é revertida nem mesmo com o instrumento da compra assistida, o que gera um aumento no valor pago pelas indenizações em torno de 40%., mesmo assim insuficiente para a aquisição de um imóvel na mesma localidade. Resta a opção de transferência para um imóvel distante, nos conjuntos habitacionais que estão sendo construídos em geral na zona oeste, no âmbito do programa Minha Casa Minha Vida.

(iv) Deslegitimação das organizações comunitárias com agentes dos processos de negociação, sempre individualizados por famílias, buscando enfraquecer a capacidade de negociação dos atingidos com o poder público.

(v) Desrespeito à cidadania através de ameaças, pressão e coação.

(vi) Utilização da Justiça como ferramenta contra o cidadão. Nas ações judiciais promovidas pela procuradoria do município, o poder público tem sido “uma máquina irresponsável de despejos”, sem compromisso com a saúde e a vida das pessoas. “A prática da procuradoria do município parece ser a de castigar todos os cidadãos que recorrem à justiça para proteger os seus direitos.”

Uma comunidade que passou por um processo emblemático de remoção foi a Comunidade do Campinho. Segundo o Comitê, o primeiro contato da administração municipal com os moradores foi em janeiro de 2011. Cinco meses depois a comunidade já estava extinta. O motivo? A construção de um mergulhão do corredor Transcarioca de BRT. O dossiê afirma que houve pressão psicológica para que os moradores aceitassem um apartamento do Minha Casa Minha Vida em Cosmos, a 60 km do local. “Há relatos, com mais de uma testemunha, do recebimento de indenizações em sacos de dinheiro pagos em negociação direta com a empreiteira responsável pela obra”, diz o dossiê.

Mobilidade urbana para quem?

É essa pergunta que faz o dossiê ao tratar das intervenções de mobilidade urbana que estão em curso por conta dos megaeventos no Rio de Janeiro. “A análise dos investimentos na cidade do Rio de Janeiro indica que estes não estão voltados para o atendimento das áreas mais necessitadas e que apresentam os piores indicadores de mobilidade. Pior do que uma infraestrutura mal construída ou mal distribuída pelo território da cidade, constata-se que muitas comunidades têm sido removidas compulsoriamente ou sofrido ameaça de remoções por conta da construção da infraestrutura de transporte para Copa e Olimpíadas. Isto, por si só, constitui uma violação ao direito à moradia garantido em diversos tratados internacionais”, afirma.

Ou seja, além dos investimentos em mobilidade urbana beneficiarem as áreas que já contam com as melhores alternativas nesse aspecto, a população carente tem que lidar com o ônus das remoções.

“Através das propagandas oficiais e da mídia em geral, o poder público tem prometido uma ‘revolução nos transportes’, construindo as vias Transcarioca, Transolímpica e Transoeste (todas BRTs), e o metrô Lagoa-Barra (alongamento da linha 1) – todos ligados à realização da Copa e dos Jogos olímpicos. Por outro lado, a população clama por serviços de transporte de massa em outras direções e para outras regiões da cidade. Ou seja, enquanto hoje o serviço de transporte coletivo oferecido à população se configura como caro, precário e insuficiente para  a demanda existente, o cenário que se desenha para o futuro é o de investimentos em transporte que, ao invés de atenderem à demanda existente, tornam possível a ocupação de áreas vazias ou pouco densas, visando e promovendo a valorização imobiliária e a expansão irracional da malha urbana”, analisa o documento do Comitê Popular. O dossiê também aponta para uma forte concentração dos investimentos na cidade do Rio de Janeiro, em detrimento das outras 20 cidades que compõe a área metropolitana da capital; dentro da capital, os investimentos estão maciçamente direcionados à Barra da Tijuca e à zona sul, as áreas mais nobres do Rio.

Destaca-se também os constantes aumentos das tarifas de transporte.

Trabalho

Tido como um dos grandes fatores legitimadores da realização dos megaeventos, o impacto da Copa e das Olimpíadas no trabalho é analisado pelo dossiê do Comitê Popular.

O primeiro aspecto apontado pelo comitê é que nas obras ligadas aos megaeventos é comum ocorrer a chamada precarização do trabalho. Prazos exíguos, omissão de fiscalização pelos órgãos públicos competentes, o contexto de exceção que permite licitações feitas a toque de caixa, além das pressões exercidas por órgãos como o COI e a FIFA ajudam a criar este cenário. Só o Maracanã, aponta o dossiê, já passou por duas paralisações relacionadas a condições de trabalho.

A repressão ao comércio informal também se agravou no contexto dos megaeventos, afirma o Comitê. Segundo documento da Streetnet International, articulação de coletivos de vendedores informais de todo o planeta, há 60 mil vendedores ambulantes trabalhando no Rio de Janeiro em risco por conta da realização dos jogos. Os ambulantes não poderão se beneficiar do contexto da Copa e das Olimpíadas, uma vez que estão proibidos de trabalharem próximos aos locais vinculados às competições. “Também está prevista a repressão, com prisão e apreensão de mercadorias, de qualquer pessoa que comercialize material que faça referência aos símbolos dos eventos e de seus patrocinadores. Nessa mesma direção, está proibida a venda de qualquer souvenir dos eventos aos turistas produzido pelos trabalhadores informais. Ou seja, só poderão vender mercadorias com símbolos dos eventos as empresas licenciadas pela FIFA e pelo COI”, diz o texto. Isto está inclusive garantido pelo artigo 11 da Lei Geral da Copa (12.663/2012).

Esporte

“O futebol no Brasil está vivendo um momento bastante complicado. Os estádios históricos estão sendo destruídos para renascer em forma de centros de consumo e turismo, por vezes com jeito de shopping-center. Os ingressos dos campeonatos nacionais e estaduais estão cada vez mais caros, fora do alcance do torcedor ‘tradicional’. A média de público nos estádios está em plena queda”, analisa o dossiê do Comitê Popular.

A concessão do Maracanã, com a consequente demolição de praças esportivas essenciais como o Parque Aquático Júlio Delamare, o Estádio de Atletismo Célio de Barros e a consolidação do projeto olímpico na Barra da Tijuca são os principais fatores contestados pelo dossiê.

A chamada elitização do público do futebol também é destacada pelo dossiê. “Percebe-se um decréscimo de 732.160 torcedores nos estádios da primeira divisão do campeonato brasileiro de futebol, entre 2011 e 2012, o que representa uma queda de 13%. Ao mesmo tempo, os custos dos ingressos subiram 9% e a arrecadação geral aumentou em 3%. Esses números podem indicar que menos brasileiros têm acesso aos estádios. Isso pode estar ocorrendo em função das obras, em andamento nos grandes estádios visando a Copa do mundo nas principais cidades do país, como é o caso do Rio de Janeiro”, aponta o documento.

Segundo o Dossiê, é possível analisar esse contexto como o de imposição de um modelo de futebol empresarial. Nele “estimula-se a venda do espetáculo aos ‘clientes’, que vão aos estádios para ter uma experiência de entrenimento e não uma participação ativa, identitária e afetiva com o evento. Sem dúvida, os números indicam que os que frequentam os estádios desembolsam cada vez mais dinheiro”.

Além disto, destaca-se também a destruição do legado do Pan-2007 pelo projeto das Olimpíadas de 2016 como ocorreu com o Velódromo, o Parque Aquático Maria Lenk e, mais recentemente, o estádio do Engenhão.

Meio ambiente

O documento aponta que, apesar do discurso oficial afirmar veementemente a preocupação ambiental, na prática ocorre o inverso. A construção dos corredores viários Transcarioca, Transolímpica e Transoeste são alguns exemplos.

No caso do primeiro projeto, por exemplo, o dossiê critica o aterramento da lagoa de Jacarepaguá. Estavam previstos, para mitigar o efeito do aterramento, dois programas pelo estado do Rio: o Programa de Monitoramento da Fauna Existente e o Programa de Compensação Ambiental. Nenhum deles foi realizado.

Segurança pública

“No Rio de Janeiro, que vem servindo de laboratório no tema da segurança pública, defende-se a necessidade de medidas extraordinárias de segurança. Mas cabe perguntar o que está sendo segurado, como, onde, e quais serão os efeitos de curto, médio e largo prazo das medidas que estão sendo adotadas”, pontua o dossiê.

Os fatos de a segurança durante os jogos ser feita por agentes privados contratados pela FIFA, bancados com dinheiro público, de o governo brasileiro pretender investir R$ 80 milhões em câmeras de vigilância nos estádios e não haver garantias de que as imagens coletadas pela FIFA sejam apagadas depois do evento, são criticados. O dossiê também vê essas ações como pretexto para aprofundar a mudança do modelo de segurança pública para o predomínio da segurança privada.

“Como um experimento para controlar as massas e extirpar ameaças, os megaeventos deixarão um saber governamental sobre as novas configurações da cidade. Esse saber não é neutro ou despolitizado, mas contextualizado dentro de um complexo cultural que identifica ameaças particulares que são socialmente construídas. A montagem do aparelho para proteger os interesses associados aos megaeventos pode ser adotada e utilizada para proteger os mesmos interesses pós-evento”, afirma o Comitê.

Informação e participação

O Comitê destaca ainda a negligência com respeito ao direito à informação e participação popular nos assuntos de interesse público durante os preparativos da Copa. Como exemplo, cita as remoções ocorridas nas comunidades Vila Harmonia, Recreio II, Restinga, Sambódromo, Campinho e Metrô-Mangueira. Todas as comunidades foram avisadas das remoções de suas casas algumas horas antes do despejo. E diz que não houve apresentação de justificativas plausíveis em grande parte das remoções nem os detalhes dos projetos foram publicados.

No aspecto orçamentário aponta também falta de transparência. “A divulgação de aumento de gastos frequentemente ocorre muito tempo após ter sido efetuado e, mesmo assim, nem todos os valores são publicados. No caso da preparação para os Jogos Olímpicos, há apenas uma estimativa inicial de orçamento constando no dossiê de candidatura, mas os gastos poderiam efetivamente alcançar quase o dobro dessa estimativa, segundo depoimento do presidente da Autoridade Pública Olímpica, em 2012.”

Orçamentos e finanças

O dossiê chama atenção para o valor total de investimentos para a realização da Copa do Mundo no Rio de Janeiro, que já sofreu um aumento de 95% tendo como base os valores da Matriz de Responsabilidades. Os R$ 2,2 bilhões previstos inicialmente tornaram-se quase R$ 4,2 bilhões. E contesta a informação de que os Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio de Janeiro em 2016 custarão cerca de US$ 12,5 milhões, elencando 21 projetos municipais ligados, ao menos no discurso, às Olimpíadas cuja soma de orçamento alcança nada menos do que R$ 22,6 bilhões.

“Chama atenção o fato das decisões relativas a esses investimentos não passarem por uma ampla discussão democrática, envolvendo todos os segmentos sociais, colocando em pauta o projeto de cidade que está construído”, conclui o documento, criticando, mais uma vez, a concentração de investimento público em áreas nobres.

O blog Copa Pública é uma experiência de jornalismo cidadão que mostra como a população brasileira tem sido afetada pelos preparativos para a Copa de 2014 – e como está se organizando para não ficar de fora.

BAIXE o dossiê Megaeventos e Violações de Direitos Humanos no Rio de Janeiro – 2ª edição revisada e atualizada:http://bit.ly/DossieRio2013.

*Daniel Mazola é conselheiro da ABI e secretário da Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos da institução. 

**Com informações da EBC, jornal O Estado de S. Paulo e revista Carta Capital.

Fonte: publicado originalmente no site da ABI, com fotos que não reproduzimos por motivos técnicos

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Feliciano é hostilizado por ser evangélico, diz Marina Silva

Do site de CartaCapital
A ex-senadora Marina Silva defendeu o deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP), presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. “Não gosto como este debate (sobre legalização do aborto e casamento gay) vem sendo conduzido. Hoje, se tenta eliminar o preconceito contra gays substituindo por um preconceito contra religiosos”, disse a senadora na noite desta terça-feira 14, segundo informações do site do jornal Diário de Pernambuco. “Feliciano está sendo mais hostilizado por ser evangélico que por sua declarações equivocadas.”

Ainda segundo o site do jornal, Marina disse que Feliciano entra neste “jogo de injustiças” e pode se tornar uma das vítimas nesta "inversão de valores". Ela também disse que gostaria de ver um ateu ser julgado pelo que disse e não pelo fato de ser ateu.

As declarações foram feitas durante uma palestra na Universidade Católica de Pernambuco. Atualmente, Marina roda o Brasil buscando apoio para formar a Rede, partido que deve abrigar sua candidatura à Presidência da República em 2014.

Feliciano causou diversas polêmicas com seus comentários e vem sendo alvo de críticas desde sua eleição à presidência da comissão. Em um discurso durante um congresso evangélico, ele afirmou que a Aids era o “câncer gay”. “A própria ciência revela o predomínio de infecção por esta doença em pessoas manifestamente homossexuais, tanto é verdade que quando se doa sangue na entrevista se for declinada a condição de homossexual essa doação é recusada”, sustentou mais tarde também em seu site.

Em 2011, publicou no Twitter que os descendentes de africanos seriam pessoas amaldiçoadas. “A maldição que Noé lança sobre seu neto, Canaã, respinga sobre o continente africano, daí a fome, pestes, doenças, guerras étnicas!”

Tragédia expõe debilidade de trabalhadoras têxteis de Bangladesh


por Suvendrini Kakuchi, da IPS

Derrocada de prédio, a 24 de abril, matou mais de mil trabalhadores e mostrou miséria dos trabalhadores do setor têxtil no Bangladesh

Daca, Bangladesh, 14/5/2013 – Até um mês atrás, a jovem Shapla era apenas mais uma empregada de uma fábrica da localidade de Savar, nos arredores da capital de Bangladesh. Atualmente, é uma sobrevivente com incapacidade de um dos piores acidentes da indústria têxtil deste país. A queda do grande Rana Plaza, um prédio com cinco fábricas, enterrou, no dia 24 de abril, uma enorme quantidade de trabalhadoras e trabalhadores sob um bloco de concreto e vidro. Havia quase mil mortes registradas, mas as buscas nos escombros prosseguiam.

“Fico desesperada pelo futuro”, declarou Shapla, de 18 anos. Um sentimento compartilhado por centenas de mulheres que, como ela, perderam algum membro naquele dia fatídico. Esta jovem mãe se recupera em um hospital de Daca da amputação de suas mãos. É considerada uma das “felizardas” por sobreviver à queda, mas ela resiste em ver um lado bom da tragédia, pois agora seguramente estará impedida de encontrar trabalho.

As mulheres, que constituem 80% da força de trabalho da pujante indústria do vestuário deste país, foram as mais afetadas pela tragédia. Também representam 80% das pessoas que morreram ou ficaram feridas no desastre. “Elas têm uma forte desvantagem social e econômica”, apontou Mashud Khatun Shefali, fundadora e diretora do Nari Uddung Kendra (Centro de Iniciativas de Mulheres).

Esta organização, dedicada a defender melhores condições de trabalho, ajuda as sobreviventes a superar o trauma do acidente, explicou Shefali. Algumas “ficaram tão mal que dizem que jamais voltarão a trabalhar em uma fábrica. Elas precisam de reabilitação física e psicológica de longo prazo, e que suas famílias e a sociedade as aceitem como pessoas com incapacidades”, destacou.

Bangladesh, onde a pobreza afeta 49% de seus 150 milhões de habitantes, desempenha há uma década um papel crucial no comércio internacional, ao oferecer uma vasta mão de obra barata. A indústria têxtil local é a terceira maior do mundo, atrás de China e Vietnã, com US$ 20 bilhões por ano, que representam 80% da entrada de divisas estrangeiras no país.

Grandes firmas do Ocidente ou de ricos países asiáticos, como Japão e Coreia do Sul, começaram a mudar seus centros de produção para Bangladesh quando os velhos polos produtivos, como Tailândia, aumentaram os salários. Companhias como Gap, Primark, HMV, Walmart, Sears e American Apparel produzem aqui roupa barata em massa, que depois é vendida aos países importadores.

Mais de cinco mil fábricas, com 3,5 milhões de trabalhadores lotando altos prédios em Daca e arredores, funcionam de forma ininterrupta. O quadro das empresas, das grandes e das pequenas, é principalmente de mulheres jovens de zonas rurais que emigram para a cidade esperando obter a capacitação à qual não têm acesso nas regiões agrícolas. Na cidade costumam morar juntas em lugares pequenos e dividir o banheiro e os alimentos.

Analfabetas e sem formação, as trabalhadoras têxteis têm poucos meios para conseguir uma renda estável. Sua vulnerabilidade as converte em presas fáceis dos empresários, os quais argumentam que, para continuarem “competitivos” no mercado mundial, devem gastar o menos possível com mão de obra.

Shefali contou que as jovens costumam começar como aprendizes e não recebem um salário, mas um pagamento que pode ser de apenas um dólar ao mês. Com o tempo passam a operar máquinas mais complexas e a ganhar um salário regular, disse a ativista. A maioria das mulheres costura, lava e empacota a roupa pelo equivalente a US$ 30 ou US$ 40, trabalhando uma média de dez horas por jornada os sete dias da semana. Já os homens costumam ocupar cargos mais altos, como controle de qualidade ou gerência.

O setor do vestuário é o que oferece maior número de emprego e proporciona um salário a milhares de mulheres. Entretanto, nos últimos tempos uma série de tragédias expôs as duras condições de trabalho no setor. Em novembro morreram cerca de cem trabalhadoras no incêndio da fábrica Tazreen Fashion, nos arredores de Daca. As sobreviventes denunciaram que os gerentes as trancaram quando tentaram escapar do fogo.

No acidente de 24 de abril, os responsáveis pela fábrica ameaçaram demitir as empregadas que não se apresentassem para trabalhar, apesar da advertência sobre a segurança do prédio de oito andares, que tinha autorização de construção para apenas cinco. Uma semana antes da tragédia, começaram a aparecer grandes rachaduras nos tetos e os engenheiros alertaram que a queda era inevitável.

A negligência em matéria de segurança trabalhista é uma das muitas violações de direitos que sofrem as empregadas das fábricas. Às vezes, devem cumprir turno de 14 horas para produzir uma partida que gerará um rápido benefício aos proprietários. Alguns ativistas dizem que, em um país muçulmano com altos índices de pobreza, a indústria têxtil oferece às mulheres uma oportunidade para sair de suas casas e melhorar seu status, pois passam de trabalhadoras do lar para provedoras da família.

A professora Sharmin Huq, aposentada pela Universidade de Daca e especialista em limitações físicas, teme que a discriminação social torne mais complicada a vida das mulheres. Também disse à IPS que as generosas doações que chegam de países como Alemanha e Estados Unidos para ajudar os sobreviventes devem ser canalizados para “a grande quantidade de trabalhadoras afetadas e ajudá-las a recomeçarem suas vidas”.

O capitalismo selvagem

Zahangir Kabir, proprietário da Rahman Apparels, com sede em Daca, reconhece que as condições de trabalho do setor têxtil são muito duras, mas argumentou que os empregadores são submetidos a “uma forte pressão”, e afirmou que pequenas companhias, como a sua, têm a obrigação de cumprir altos padrões comerciais e assumir perdas enormes.

Kabir tem duas fábricas, uma que costura e outra que lava jeans. Seu quadro de funcionários com 500 pessoas, na maioria mulheres, produz jaquetas e calças vendidas nos mercados europeus e norte-americanos. Mas os rígidos padrões de qualidade e prazos impostos pelas matrizes do Ocidente são difíceis de serem cumpridos em Bangladesh.

“Agitações políticas imprevistas e regulares cortes de eletricidade impedem o cumprimento dos prazos e a entrega de produtos baratos”, explicou Kabir. Os fornecedores de Bangladesh trabalham por uma prometida substanciosa renda, mas também enfrentam grandes riscos no “selvagem mercado capitalista”, afirmou. Envolverde/IPS


Fonte: Site Envolverde

http://envolverde.com.br/ips/inter-press-service-reportagens/tragedia-expoe-debilidade-de-trabalhadoras-texteis-de-bangladesh/