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sexta-feira, 19 de abril de 2013

Dia do Índio e de uma agenda de lutas

17/04/2013 - Cerca de 700 indígenas ocupam a Câmara dos Deputados
- da Redação do Brasil de Fato
- com informações do Cimi (Conselho Indigenista Missionário)

Revoltados com a criação de uma comissão especial para analisar a Proposta de Emenda à Constituição - PEC 215, que dá ao Congresso Nacional poderes para demarcar terras indígenas, cerca de 700 indígenas ocuparam o plenário da Câmara dos Deputados.

Hoje, essa atribuição é de responsabilidade do Executivo.

Cerca de 700 indígenas transferiram o Abril Indígena para uma ocupação na Câmara dos Deputados na Esplanada dos Ministérios, no Distrito Federal nesta terça-feira (16).

A decisão foi tomada pelos indígenas durante a audiência pública convocada pela frente parlamentar em defesa dos indígenas.


O objetivo das lideranças indígenas é pressionar que a Mesa Diretora da Câmara extinga uma comissão especial criada para analisar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000 que dá ao Congresso Nacional poderes para demarcar terras indígenas - responsabilidade que hoje pertence ao Executivo, por meio da Funai.

Nós não aceitamos nenhum tipo de negociação ou diálogo referente à PEC 215.

O que nós queremos é que a Comissão seja desfeita”, disse Sônia Guajajara (foto), liderança da APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).

O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB/RN) esteve presente na audiência pública depois de muita pressão do movimento indígena.

Sobre a reivindicação dos povos indígenas, apenas disse que pediria aos líderes partidários que não indicassem representantes para a comissão da PEC 215 até que a situação fosse boa para todas as partes.

Não, presidente, não aceitamos isso.

Portanto, ficaremos aqui (em ocupação ao Congresso) por tempo indeterminado”. 

Fonte:
http://www.brasildefato.com.br/node/12678

Por Antonio Fernando Araujo, do blog Educom:

Temos reproduzido aqui algumas matérias que revelam o estado precário em que se encontram, de um modo geral, não apenas as populações indígenas, mas todas - sem exceções - as comunidades tradicionais de quilombolas, ribeirinhos, pequenos agricultores e demais excluídos, quando postos frente a frente ao avanço predador que o grande capital promove sobre essa gente, suas propriedades e culturas originais, algumas delas remontando a séculos, estejam elas situadas no campo ou nos centros urbanos.

Por certo, tal precariedade está intimamente associada ao projeto de desenvolvimento que os governos - em todos os níveis e sejam de que partido for -, conceberam e entendem ser o único e o mais adequado ou oportuno ao perfil do seu município, estado ou país.

E o que temos assistido, é essa "classe política", em conjunto com a grande mídia empresarial e, mais recentemente, com parcelas do sistema judiciário, associarem-se para servir como arautos, intérpretes, promotores e executores desse modelo em que essa população e o meio-ambiente "surgem" diante deles como um estorvo ao projetos de dominação oriundos, quase sempre, das elites financeira e empresarial.

A partir daí toda sorte de arbitrariedades, preconceitos e injustiças vêm à tona, na ânsia da posse dos recursos e das riquezas de toda espécie que, porventura, encontrem-se sob a "guarda" desses povos ou comunidades e, em muitos casos, sejam até mesmo suas fontes de sobrevivência.

"Tanto o governo como os grupos de poder que financiam a maioria dos deputados querem poder dispor das terras indígenas que estão cheias de riqueza", assinalou a jornalista Elaine Tavares, no Brasil de Fato.

O que nossos indígenas promoveram anteontem (16/4) na Câmara dos Deputados - e que serviu até para que alguns deputados assustados, protagonizassem uma ridícula fuga do plenário e procurassem abrigo em seus gabinetes - nos sirva de lição.

Independentemente da etnia - mais de 300, segundo o IBGE - a que cada um pertence, entenderam que precisam se unir, estar juntos nessas causas que transcendem a origem, a localização e os costumes e cultura de cada tribo.

Diferentemente dos partidos e da militância ditos de esquerda que sequer foram capazes ainda de, em volta da mesa, conceber uma pauta, por menor que seja, de metas e lutas comuns para fazer frente àquele projeto que, em última instância, é o mesmo do capital internacional, nossos guerreiros pintaram os corpos e como parte da mesma linguagem primitiva de suas lutas ancestrais proclamaram solene, mas em tom de guerra, "não, presidente, não aceitamos isso."

Seria então a oportunidade de fazermos coro com eles? Refletir, denunciar e nos solidarizarmos com sua luta como procuramos fazer neste blog quando reproduzimos aqui esses artigos? E de forma semelhante e em uníssono, amplificamos em bom som todas as demais demandas políticas e sociais pelas quais a nação se debate e há muito vem se manifestando?

Senadora Katia Abreu, líder do agronegócio
Cabe a todos e em especial às nossas lideranças políticas e partidárias matutar, tirar uma lição do evento e apressar o passo.

O grande capital e o conjunto de suas poderosas organizações e bem nutridas instituições estão coesos e a cada dia mais e mais bem equipados.

Do lado de cá do balcão o que vemos é a fragmentação crescente de nossas forças políticas e para isso basta que uma vírgula não seja do agrado do companheiro para que toda a ideia do indispensável acúmulo de forças se desfaça como num castelo de cartas.

Não que isso não possa ser benéfico, mas historicamente tem servido mais para que se bloqueiem as possibilidades de um consenso no que possa ser útil à luta comum do que às oportunidades de se debater politicamente a pluralidade de opiniões e a partir delas construir-se uma única força, por certo, mais robusta.

Mais do que nunca, isso se tornou uma necessidade mandatória, nem que seja para que, ao menos de longe, se possa vislumbrar alguma possibilidade de êxito nos inúmeros territórios de lutas.

Estão aí postas as lições desse "Abril Indígena", versão 2013, a da covardia dos deputados fujões e a da bravura dos guerreiros indígenas que, tanto quanto esse políticos, são antes de mais nada, cidadãos brasileiros.  

Assim, não deixe de ler:
- O índio na metrópole - Andrezza Richter, Carolina Rocha Silva e Kárine Michelle Guirau
- Abril Indígena 2013: Declaração da Mobilização Indígena Nacional em Defesa dos Territórios Indígenas
- Em defesa da terra indígena - Renato Santana

E mais:
- O futuro dos índios - Guilherme Freitas entrevista Manuela Carneiro da Cunha
- Apreensão no campo - Dom Tomás Balduíno
- Era para serem outros 500 - Cristiano Navarro
- Rio de ouro e soja - Carlos Juliano Barros


Nota:
Fotos de José Cruz, Valter Campanato e Wilson Dias, todas da Agência Brasil/ABrA, extraídas do Portal Brasil de Fato. A eventual inserção de imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Em defesa da terra indígena

15/04/2013 - Abril Indígena
“Está na hora de priorizarmos a luta pela terra”
-  Por Renato Santana - Fonte: Assessoria de Comunicação - Cimi

Luziânia (GO) - Dispostos a enfrentar o que consideram uma das piores conjunturas de ataque aos direitos pela terra pós-Constituição de 1988, povos indígenas de todo o país iniciaram nesta segunda-feira, 15, o Abril Indígena 2013, que segue até sexta-feira, 19, Dia do Índio.

Nesta terça-feira, 16, cerca de 500 indígenas estarão em audiência com a Frente Parlamentar de Defesa dos Povos Indígenas[ao final 700 índios estiveram presente] a partir das 10h30h, na Câmara dos Deputados.

Lideranças, caciques, pajés, professores e professoras, vindos de comunidades às margens de rodovias, aldeias acossadas pelo agronegócio, retomadas à espera de demarcação, pretendem mais do que discutir problemas, mas reivindicar o que lhes é de direito, usurpado pela agenda política de grupos latifundiários, mineradores, madeireiros.

Muitas vezes nos deixamos enganar por conversas de gabinete. Não podemos deixar isso acontecer, porque se a gente parar para ver o que o governo federal está fazendo é tão ruim quanto aquilo que os fazendeiros, a elite agrária, fazem com a gente”, destaca Ninawá Huni Kui (foto) (AC).

O Abril Indígena deste ano acontece num período de ofensiva da bancada ruralista no Congresso Nacional e país afora, além de medidas de exceção do Palácio do Planalto.

Propostas de alterações constitucionais referentes ao direito pela terra, no Legislativo, e decreto de uso da Força Nacional contra comunidades que se opuserem à construção de grandes empreendimentos, no Executivo, hegemonizam a pauta de discussões e mobilizações dos indígenas.

Sem o que comemorar numa semana destinada a eles, os povos pretendem mostrar ao país que resistem e estão vivos, para além do folclore e dos museus.

Dos nossos últimos encontros nacionais, em que elaboramos cartas para as autoridades, nada melhorou, nada avançou. Acho que até piorou.

Vivemos lamentando nossos mortos.

Está na hora de priorizarmos de verdade a luta pela terra. Sem ela, não somos nada.

Salário daqui e de lá não substitui, só divide. Na guerra temos de rir, não chorar.

Agora não guerreamos mais entre nós, sabemos bem quem são nossos inimigos”, enfatiza cacique Babau Tupinambá (foto acima), da  Serra do Padeiro (BA).

Conforme a pauta definida pelos movimentos indígena e indigenista, a semana será dividida em discussões no Centro de Formação Vicente Cañas, em Luziânia (GO), e na Esplanada dos Ministérios, em Brasília (DF), para onde vão a partir desta terça-feira, 16, em atividades junto às Frentes Parlamentares de Defesa dos Povos Indígenas e de Direitos Humanos e Minorias, esta última criada em protesto contra a eleição do pastor Marco Feliciano (PSC/SP) para a presidência da comissão, entre outras atividades.

Perdemos as margens de diálogo com os últimos episódios no congresso e no governo.

O PL da CNPI (que criará o conselho no âmbito do que é hoje a Comissão Nacional de Política Indigenista) está prestes a sofrer um golpe, para não falar da PEC 215.

A conjuntura é delicada”, declara o integrante da CNPI, cacique Marcos Xukuru (PE).

Os povos indígenas do Nordeste sofrem com os grandes empreendimentos, caso da transposição do rio São Francisco, a seca agravada pela concentração de terras e a falta de demarcação de terras, caso dos Xukuru-Kariri, de Alagoas, que têm feito retomadas em áreas há décadas reivindicadas.

Na Bahia, os Tupinambá seguem em constantes retomadas de áreas declaradas como indígenas, gerando conflitos e violência.

Os povos indígenas estão prestes a levar um golpe, um golpe do Estado. Precisamos pensar uma estratégia conjunta. As discussões são as mesmas sempre.

Estão atrasando os grupos de trabalho, deixando de fazer os processos de demarcação. Então o governo decreta a PNGATI (Política Nacional de Gestão Ambiental em Terras Indígenas), mas rasga nossos territórios com empreendimentos, PECs.

Não podemos aceitar isso e devemos ir para a luta”, declara o vice-cacique Marcelo Entre Serras Pankararu, do sertão pernambucano.

Delegações Guarani do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul trazem relatos de vidas fora da terra, às margens de rodovias, e em áreas retomadas no meio de fazendas de soja, cana e pasto. Durante o mês de março, o jovem Denílson Guarani Kaiowá foi assassinado por fazendeiro.

Os indígenas retomaram a área, declarada como indígena, e na última semana a Justiça concedeu reintegração de posse para o fazendeiro, assassino confesso do indígena.

Na última sexta-feira, um PM reformado invadiu um tekoha – lugar onde se é – e desferiu seis disparos de arma de fogo, acertando um indígena na cabeça. Para se defender, a comunidade o desarmou e o manteve seguro até a chegada da polícia.

Levado ao hospital, o PM não resistiu e morreu a caminho do atendimento médico. O indígena atingido pelo disparo foi medicado e na sequência preso, acusado pelo homicídio.

Toda morte é sempre ruim, mas os indígenas se defenderam. Ele (PM reformado) invadiu a aldeia armado e também já tinha histórico de agressão contra os indígenas. Tudo isso, porém, é resultado da demarcação incompleta da terra e da não retirada dos ocupantes não indígenas da terra indígena”, pontua o coordenador do Cimi Regional Mato Grosso do Sul, Flávio Vicente Machado.

Nossos territórios devem estar livres. A violência não é nossa, porque não é a gente que quer tirar direitos de ninguém. Apenas queremos os nossos”, completa cacique Babau.

Porém, além da insegurança jurídica e social deixada pela falta de complemento nos processo de demarcação, outros temas envolvem os povos indígenas.

Um deles é a Portaria 303, da Advocacia Geral da União (AGU). Nela o órgão ‘orienta’ que as condicionantes da Terra Indígena Raposa Serra do Sol devem se estender a todo país.

A própria AGU questionou as tais condicionantes de Raposa Serra do Sol e no ano passado baixou a Portaria 303 dizendo que elas se estendem a todo país, isso sem essas tais condicionantes terem sido apreciadas pelo STF”, explica o secretário executivo do Cimi, Cleber Buzatto.

Críticas também foram feitas aos dez anos de PT e aliados à frente do Palácio do Planalto.

Lula comia peixe assado com a gente. Ele dizia o que iria fazer por nós, era lindo.

Lula se elegeu e os parentes cruzaram os braços, acreditando numa vitória para a gente. O resultado está aí: se aliou (Lula) com os capetas e nada aconteceu de bom para a gente.

Então precisa acabar com braços cruzados, pois eles estão abrindo a porta da casa da gente para hidrelétricas, mineradoras, fazendeiros”, analisa Nailton Pataxó Hã-hã-hãe.

Há exatamente um ano os Pataxó Hã-hã-hãe recuperavam a totalidade da Terra Indígena Caramuru-Catarina Paraguaçu, no extremo sul da Bahia, expulsando todos os invasores, grandes latifundiários de gado e monocultivos.

Demarcações de terras e PEC 215
Durante o governo Dilma Rousseff, apenas dez terras indígenas foram demarcadas no Brasil, sendo todas na região Norte – sete no Amazonas, duas no Pará e uma no Acre, ou seja, áreas que hoje não envolvem os conflitos mais encarniçados entre latifundiários invasores e comunidades indígenas.

Os dados são do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), com base nas publicações do Ministério da Justiça no Diário Oficial da União.

Uma vez que 335 terras estão em alguma das fases do procedimento de demarcação, em dezenas com demora de dez, 20 anos para a conclusão, caso da Terra Indígena Morro dos Cavalos (SC), e outras 348 reivindicadas, a quantidade recente de demarcações é abaixo do esperado pelos povos indígenas e Ministério Público Federal (MPF).

Para completar, a PEC 215 vem com grande força. Aprovada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, sob intensos protestos de comunidades indígenas, a PEC 215 teve comissão formada por decisão do deputado federal Henrique Alves (PMDB/RN) (foto), presidente da casa e eleito com o compromisso de encaminhar a PEC 215 para votação.

A proposta da bancada ruralista visa transferir do Executivo para o Legislativo o processo de demarcação e homologação de terras indígenas, quilombolas e a criação de Áreas de Proteção Ambiental.

Com a maior bancada no Congresso Nacional, controlando ¼ da Câmara, ruralistas passariam a ter influência direta nas decisões de demarcações, atendendo aos próprios interesses.

Fonte:
http://www.cimi.org.br/site/pt-br/?system=news&conteudo_id=6816&action=read

Leia também:
- Abril Indígena 2013: Declaração da Mobilização Indígena Nacional em Defesa dos Territórios Indígenas - APIB/Cimi
- Bancada ruralista pressiona para tirar poderes da Funai - Agência Brasil
- Área indígena sagrada vai virar hidrelétrica - Renée Pereira
- O futuro dos índios - Guilherme Freitas entrevista Manuela Carneiro da Cunha

E mais:
- Apreensão no campo - Dom Tomás Balduíno
- Território das comunidades tradicionais: uma disputa histórica - por Viviane Tavares
- Era para serem outros 500 - Cristiano Navarro
- Povos indígenas e o desenvolvimentismo do governo Dilma Rousseff - Roberto Antonio Liebgot
- Rio de ouro e soja - Carlos Juliano Barros

Nota:
A inserção de imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Povos indígenas e o desenvolvimentismo do governo Dilma Rousseff

Informe nº 1046 - 2012 - Conjuntura da Política Indigenista
- por Roberto Antonio Liebgot, Cimi Regional Sul - Equipe Porto Alegre
- blog do Conselho Indigenista Missionário

"Uma breve retrospectiva da política indigenista em 2012 constata a absoluta falta de disposição política, por parte do governo Dilma, para que os programas e projetos que beneficiem as comunidades indígenas sejam efetivamente executados", escreve Roberto Antonio Liebgott, Cimi Regional Sul - Equipe Porto Alegre.

Segundo ele, "tal fato estimula a cobiça de segmentos econômicos e políticos que ambicionam a exploração das terras indígenas e seus recursos ambientais, hídricos e minerais.

O desenvolvimentismo proposto pelo governo visa essencialmente fortalecer os grandes conglomerados econômicos independentemente dos povos, culturas, pessoas e do meio ambiente".

Eis o artigo.


Ao examinar a conjuntura indigenista brasileira, em 2012, salta aos olhos a intensificação de campanhas contra os direitos indígenas, protagonizadas especialmente por políticos, empresários, latifundiários e organizações ruralistas.

A Folha de S. Paulo tem publicado, no caderno Mercado, uma coluna escrita por Kátia Regina de Abreu (foto acima), senadora pelo PSD, do estado do Tocantins. A vinculação da senadora com setores empresariais e pecuaristas fica evidenciada na vigorosa campanha contra as demarcações de terras indígenas, da qual ela se tornou porta-voz.

Algumas ideias defendidas na referida coluna compõem uma plataforma claramente articulada em defesa do agronegócio.

- Kátia Abreu afirma, por exemplo, que a situação de violência contra o povo Guarani-Kaiowá será resolvida com ampliação da assistência e não com garantia de terras;
- que não se trata de um conflito entre os indígenas e o agronegócio e sim da tentativa de ONGs e da Funai de impor sua vontade;
- que o direito indígena a terra deve estar subordinado aos interesses dos setores considerados produtivos;
- que a ideia de que os índios vivem em condições abjetas, possuem poucas terras e estão entregues à própria sorte é um equívoco.

Tais afirmações são sustentadas em rasos argumentos de base quantitativa, gerados em pesquisas cujos procedimentos estão longe de resguardar parâmetros constituídos no sólido terreno dos estudos antropológicos.

Outro exemplo das investidas contra os direitos indígenas são os pronunciamentos ofensivos ou as ameaças claramente formuladas contra as comunidades indígenas por parte de grandes proprietários de terras, fazendeiros, empresários cujas alegadas propriedades estão sobrepostas à terras tradicionais de alguns povos indígenas.

É o caso, por exemplo, dos pronunciamentos do ex-garimpeiro Claudino Garbin (foto), que possui uma empresa de terraplanagem, comprou terras no Paraguai e uma propriedade de 33 hectares no entroncamento das BRs-101 e 280, em Araquari/SC.

Ele argumenta que o processo de expansão econômica não pode sofrer interferências, pois é o maior valor a se resguardar.


Diferente do que pensa o empresário, os preceitos constitucionais são, isto sim, o que se deve resguardar acima de qualquer interesse privado.

Em uma reportagem publicada no site Notícias do Dia, em 24 de novembro de 2012, Claudino Garbin afirma: "Se colocarem índios aqui, a bala vai comer solta. Que não sejam loucos". [1]

Na mesma reportagem, o deputado federal Valdir Colatto (PMDB/SC) (foto) insurge-se contra os direitos indígenas com a absurda afirmação de que a Constituição determinou que as terras deveriam ser demarcadas até cinco anos da promulgação, portanto as terras que não foram demarcadas nesse período não são indígenas e não necessitam de regulamentação.

De acordo com a tese do parlamentar, a inoperância, a morosidade, a omissão do governo anularia os direitos assegurados na Constituição. Se assim fosse, praticamente todos os direitos sociais da população brasileira seriam nulos, considerando-se que os governos raramente cumprem prazos determinados.

Os exemplos destacados mostram como se concretiza, em discursos variados, publicados em diferentes fontes, uma onda anti-indígena com argumentos racistas, preconceituosos, que apelam para uma classificação e hierarquização dos segmentos sociais para justificar que os direitos de alguns (fazendeiros, ruralistas, grandes empresários) sejam respeitados, enquanto os de outros (povos indígenas, quilombolas) sejam negligenciados.

Observam-se também no parlamento brasileiro expressões desses diversos interesses nas terras e em seus potenciais, ao considerar os projetos de lei que tentam impedir que se concretizem as demarcações.

Exemplo disso é a PEC 215/2000 que propõe que as demarcações de terras sejam autorizadas pelo Congresso Nacional. Sem contar as dezenas de outros projetos de lei apresentados por parlamentares para, de algum modo, restringir os direitos indígenas.

Orçamento indigenista contingenciado e violações dos direitos humanos
Os dados da execução do orçamento indigenista, ao longo do último ano, também demonstram o descaso do governo Dilma para com os povos indígenas. Chegamos ao final de 2012 com apenas 71,37% do orçamento indigenista liquidado, conforme dados do programa Siga Brasil/Senado Federal.

Programas e ações fundamentais para a garantia da vida dos povos indígenas tiveram uma pífia execução de seus recursos. É o caso do item Delimitação, Demarcação e Regularização de Terras Indígenas, no qual foram utilizados apenas 37,66% dos R$ 15.878.566,00 alocados para este fim.

Tal aspecto, em si, já é evidência da falta de vontade política para que se cumpram os dispositivos constitucionais que asseguram as terras a estes povos. E se considerarmos que apenas 34% das terras indígenas encontram-se registradas, vemos que, além de ser insuficiente, o orçamento para 2012 sequer foi executado pelo governo, que preferiu, mais uma vez, ceder às pressões de segmentos veementemente opostos aos direitos indígenas.

A falta de uma atuação mais decisiva por parte do governo no tocante às demarcações é demonstrada pelas 339 terras indígenas que ainda encontram-se sem nenhuma providência por parte do poder público. Fica mais clara ainda a negligência se olharmos apenas para o ano de 2012 quando apenas sete terras indígenas foram homologadas pela presidente da República.

A morosidade e negligência na condução dos processos de regularização das terras indígenas têm efeitos diretos sobre a vida de centenas de pessoas.

Não podemos deixar de observar também as crescentes demandas judiciais contra procedimentos de demarcações de terras, em curso ou até em fase de julgamento definitivo.

Normalmente as decisões têm um caráter liminar que suspendem os procedimentos demarcatórios até que o mérito seja decidido pelas instâncias superiores, no caso Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal.

Exemplo disso é a decisão do TRF da 4ª Região, que suspendeu os efeitos da Portaria Declaratória da terra indígena Mato Preto, no estado do Rio Grande do Sul. Em função destas manobras jurídicas, os processos se arrastam por décadas sem que haja uma solução para o litígio imposto.  

Há, inclusive, uma correlação entre este aspecto e o estado caótico em que se encontra a saúde dos povos indígenas. Seja porque, somente quando têm a posse da terra é que as comunidades conseguem restabelecer algumas condições culturais fundamentais, seja porque somente com a finalização do processo de demarcação as pressões e violências praticadas por setores interessados nas terras são atenuadas.

Não bastasse isso, observa-se no atual governo a continuidade de uma modalidade de discriminação cruel, que é a recusa, por parte Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), de atendimento de indígenas que não vivem em áreas demarcadas ou regularizadas.

Neste caso, os indígenas são duplamente penalizados:
primeiro, pela negligência e morosidade na condução dos processos de demarcação e,
segundo, pela desassistência praticada para conter gastos com demandas sociais, fundada sob o argumento de que os indígenas não necessitariam de atenção especial por viverem em periferias urbanas, em áreas (ainda) não reconhecidas.

Outro item da execução orçamentária de 2012 a ser considerado é o que se destina à Estruturação de Unidades de Saúde para Atendimento à População Indígena, para o qual o governo estava autorizado a gastar o montante R$ 26.650.000,00 e liquidou somente R$ 2.176.388,00 (o que corresponde a tão somente 8,17% do previsto).

Vale ressaltar que a situação da saúde indígena (gerada em grande medida pela falta de assistência adequada) é tão grave que os procuradores da República na 6ª Câmara de Revisão e Coordenação Ministério Público Federal, ao participar de uma reunião com integrantes de diferentes regiões do Brasil no mês de novembro deste ano, constataram que os índios estão morrendo hoje não por epidemias, mas por displicência do governo.

Como resposta a essa grave situação, o Ministério Público deflagrou uma campanha denominada Dia D da Saúde Indígena, na qual várias ações judiciais foram propostas exigindo do Governo Federal a adoção de medidas para tentar solucionar problemas como falta de medicamentos, ausência de água potável, transporte adequado para pacientes que vivem nas comunidades etc.

Em documento assinado por procuradores da 6ª Câmara, denuncia-se que a mortalidade de crianças indígenas, por exemplo, está acima da média nacional. A cada mil crianças indígenas nascidas vivas, 52,4 morrem na infância índice duas vezes maior que o do restante da população do país [2].

[ver também ao final - Mortalidade infantil indígena cresce 513%, segundo Cimi]

Enquanto o governo Dilma investe em grandes obras, contingenciando os recursos orçamentários imprescindíveis para assegurar dignidade e atendimento adequado à população indígena, agravam-se os problemas de saúde e precarizam-se as já escassas estruturas existentes.

Tanto é assim que, nas 4.750 aldeias mapeadas pela SESAI, existem apenas 717 postos de saúde, sendo que a maioria deles não dispõe de equipamentos e pessoal para seu efetivo funcionamento.

De acordo com a vice-procuradora-geral da República e coordenadora da Câmara das Populações Indígenas do MPF, Dra. Deborah Duprat (foto), nas aldeias indígenas está faltando tudo: médico, remédio, transporte para levar pacientes para os hospitais. O quadro é de extrema indigência.

Retomando os números da execução orçamentária de 2012, o dado mais impactante é, sem dúvida, o de Saneamento Básico em Aldeias Indígenas para Prevenção e Controle de Agravos, com previsão de R$ 67.986.192,00 dos quais foram aplicados apenas R$ 86.403,00 (o que corresponde à vergonhosa cifra de 0,13%).

Para ressaltar a displicência do Governo Federal em relação a este quesito, basta retomar dados divulgados pelo Censo 2010 do IBGE, que indicam que nas áreas indígenas registram-se os maiores déficits em redes de esgoto sanitário, se comparadas com as demais residências em diferentes regiões do país. Em apenas 2,2% das terras indígenas todos os domicílios estão ligados à rede de esgoto, rede fluvial ou fossa séptica e somente 16,3% são atendidos pela coleta de lixo.

Diante da grave situação vivida pelas comunidades e povos em todo o país, a falta de execução do orçamento previsto para a questão indígena é injustificável e se caracteriza como uma violação dos direitos humanos.
Nesta mesma direção, intensifica-se a perseguição e criminalização de lideranças indígenas que lutam pela terra, em especial nos estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Bahia, Pernambuco, Pará e Maranhão.

Somem-se a isso as dezenas de casos de agressão contra comunidades, resultando, em 2012, no assassinato de pelo menos 55 pessoas.


A omissão do governo em relação ao intenso processo de violências enfrentadas pelos Guarani-Kaiowá em Mato Grosso do Sul, e que se pode caracterizar como genocídio, é talvez o elemento mais significativo deste processo amplo de agressão aos direitos do ser humano. Os abusos contra este povo são denunciados por organizações no Brasil e no exterior.

Vale ressaltar, ainda, que o estado de Mato Grosso do Sul continuou sendo, em 2012, recordista em violências contra os povos indígenas, e ali as comunidades são obrigadas a viver em beira de estradas uma situação de miséria cercada de riquezas por todos os lados.

Realidade semelhante vive o povo Guarani no estado do Rio Grande do Sul, submetidos em maioria a uma vida em acampamentos provisórios, sem condições adequadas de saúde, de saneamento, de alimentação.

Registre-se aqui que das sete homologações de terras indígenas assinadas pela presidente da República em 2012, nenhuma se destinou a povos de Mato Grosso do Sul ou do Rio Grande do Sul.

Ao fazer esta breve retrospectiva da política indigenista em 2012 constata-se a absoluta falta de disposição política, por parte do governo Dilma, para que os programas e projetos que beneficiem as comunidades indígenas sejam efetivamente executados.

Tal fato estimula a cobiça de segmentos econômicos e políticos que ambicionam a exploração das terras indígenas e seus recursos ambientais, hídricos e minerais.

O desenvolvimentismo proposto pelo governo visa essencialmente fortalecer os grandes conglomerados econômicos independentemente dos povos, culturas, pessoas e do meio ambiente.

Há grandes desafios a serem enfrentados pelos povos e suas organizações: entre eles, o de apresentar as demandas, mobilizar-se em torno delas para que efetivamente sejam acolhidas e transformadas em políticas públicas, assegurando sua participação em todas as etapas; e o de pressionar o poder público para que as terras sejam efetivamente demarcadas, protegidas, estando na posse e usufruto assegurados aos povos e comunidades.

Sem que isso aconteça, não é possível vislumbrar o efetivo combate às violências, ao descaso, à omissão e à dependência de políticas paliativas e compensatórias.

Sem isso, na hora de discutir políticas públicas os povos indígenas serão tratados como "entraves" num modelo de desenvolvimento sem garantias, que privilegia alguns setores e penaliza muitos.

Porto Alegre (RS), 04 de janeiro de 2013.

Fonte:
http://www.dirigida.com.br/news/pt_br/2012_conjuntura_da_politica_indigenista_o_cimi/redirect_11519631.html

Notas do texto:
[1] Ver em:
http://www.ndonline.com.br/joinville/noticias/39132-donos-de-terra-de-araquari-sao-alvo-de-desapropriacao.html
[2] Ver em: http://6ccr.pgr.mpf.gov.br/institucional/clipping/edicao_especial_dia_d_saude_indigena

Veja também:
O tsunami da fome nas aldeias do Mato Grosso do Sul - Egon Heck
- Rio de ouro e soja - Carlos Juliano Barros
- Casaldáliga deveria ser papa, mas - de novo - está ameaçado de morte - Leonardo Sakamoto
- Dia do índio. Qual sociedade é composta por selvagens? - Leonardo Sakamoto
- Bispo dom Pedro Casaldáliga é ameaçado por invasores de Marãiwatsédé - Comissão Patoral da Terra
- No Mato Grosso, tensão aumenta entre xavantes e latifundiários em terra cobiçada por agronegócio - Felipe Milanez
- Mortalidade infantil indígena cresce 513%, segundo Cimi - Leonardo Sakamoto

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.