11/05/2012 - blog Opinião e Notícia
por Bolívar Torres
Projeto de Lei pode abrir exploração minerária nas terras indígenas. Lideranças, no entanto, exigem que tema seja votado segundo Estatuto Indígena
(Bolívar Torres)
Depois de anos tramitando no Congresso, o Projeto de Lei 1.610, que regulamenta a exploração minerária em terras indígenas, pode ser aprovado até a primeira quinzena de julho. A previsão é que um substitutivo do texto original seja votado e encaminhado ao Senado, para depois seguir à sanção presidencial. A polêmica proposta levanta suspeitas entre lideranças indígenas, já que, pela Constituição, essas terras destinam-se à posse permanente dos índios.
Leia também: "Campanha em defesa de índios bate recorde" em: http://opiniaoenoticia.com.br/brasil/campanha-em-defesa-de-indios-bate-recorde/
No Brasil, 98,6% da área territorial dos povos indígenas estão localizadas nas Amazônia Legal. Por causa das riquezas minerais detectadas no solo, este território é justamente o mais cobiçado para a mineração. Ao contrário do que foi veiculado recentemente em alguns veículos da imprensa, a exploração de recursos minerais e hídricos no território não é proibida, mas sim condicionada à autorização das comunidades indígenas.
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Rosane Kaingang |
“Estamos sendo pressionados para dizer sim a esse projeto, e não para participar de um debate”, disse Rosane. “E se dissermos não? Nós seremos respeitados?”
O Estatuto dos Povos Indígenas
Kleber Karipuna |
Em uma audiência pública realizada na quinta-feira, dia 8 de abril, Kleber Karipuna, liderança indígena no Amapá, e Francisca Novantina Ângelo, liderança indígena no Mato Grosso, foram enfáticos ao dizer que a regulamentação da exploração mineral nas terras indígenas deve ocorrer no âmbito do Estatuto dos Povos Indígenas, parado desde 1991 na Câmara dos Deputados, e não em proposta paralela, como querem os defensores do PL 1.610.
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Francisca Novantina Ângelo |
“Se a proposta não for regulamentada e inserida dentro do Estatuto dos Povos Indígenas, ficaremos sem garantia alguma”, alerta Francisca em entrevista ao Opinião e Notícia. Segundo a liderança, o atual governo federal tem desrespeitado repetidamente a convenção 169, a Organização Internacional do Trabalho – OIT, ratificada pelo país e confirmada pelo Congresso Nacional, que determina a obrigatoriedade de serem ouvidas as populações tradicionais sempre que houver intervenção nos territórios que ocupam, sendo-lhes garantido, soberanamente, o poder de veto. “Este é o pior momento que já vi para as comunidades indígenas”, acusa. “O governo nunca respeitou a convenção. Garimpeiros estão a todo momento invadindo nossas terras, a corrupção é extrema”.
Parado há mais de duas décadas, o estatuto está sendo “desmantelado” pelo Congresso, segundo Francisca. Há dois anos, quando ela e outras lideranças indígenas trouxeram ao Congresso um Estatuto atualizado, Francisca diz ter ouvido do então deputado Michel Temer que o momento era desfavorável para discutir o texto, já que havia uma maioria “anti-indígena” na casa. “No início, nós acatamos, mas depois percebemos que era uma manobra”, afirma.
“Exploração vai acontecer em mais tempo ou menos tempo”

“Jamais se autorizaria explorar uma terra cujos habitantes não desejam esta atividade”, afirmou o deputado. “Qual o empresário que vai colocar milhões de dólares em uma comunidade que é hostil à sua decisão?”
O senador Romero Jucá (PSDB-RR), que apresentou a proposta original do Projeto de Lei (PL) 1610/96, também defende que ela seja votada de forma paralela ao Estatuto. Para o senador, que presidiu a Funai em 1986, durante o governo José Sarney, os setores que defendem uma regulamentação pelo Estatuto, “não querem a votação” e desejam apenas “postergar o projeto”.
“Este é um assunto específico da Constituição, e meu projeto está na Câmara desde 1996 para ser votado”, lembra o senador ao Opinião e Notícia. “É um assunto de interesse do país, e cada uma das comunidades indígenas vai dizer se quer ou não quer”.
Mesmo sem o Estatuto, Jucá garante que haverá “mecanismos de fiscalização” para proteger os interesses dos índios, e que “a comunidade será ouvida”.
A advogad

“Na minha opinião, um tema específico não pode ser tratado ao menos que o código geral seja definido”, avalia. “Dentro da proposta o que se busca é uma boa legislação, que haja garantias”.
Para que o Estatuto seja discutido antes da PL, Francisca Novantina Ângelo deposita sua esperança na nova presidente da FUNAI, Marta Azevedo. O diretor do Departamento de Promoção ao Desenvolvimento da Funai, Aloysio Guapindaia, porém, já declarou ao Valor Econômico que é a favor da PL 1.610.
“Acompanhamos o assunto de perto e esperamos que essa solução saia neste ano”, disse ao jornal. Procurada pelo Opinião e Notícia, a assessoria da Funai respondeu que a instituição tem “acompanhado, mas não está dando entrevistas sobre o assunto”.