07/03/2013 - A América Latina depois de Chávez
- por Luiz Inácio Lula da Silva, no blog Desenvolvimentistas
- extraído da Página de Opinião do New York Times
Essas tarefas ganharam nova importância agora que não contamos com a ajuda da energia sem limites de Chávez;
de sua profunda crença no potencial de integração das nações da América Latina;
de seu compromisso com as transformações sociais necessárias para enfrentar a miséria de seu povo.
Os projetos sociais de Chávez, especialmente nas áreas de saúde pública, moradia e educação, foram bem sucedidas na melhoria do padrão de vida de dezenas de milhões de venezuelanos.
Não é necessário concordar com tudo o que Chávez disse ou fez.
Não há como negar que ele era uma figura controversa, às vezes polarizadora, mas que nunca fugiu de um debate e para quem nenhum tópico era tabu.
Preciso admitir que senti que muitas vezes teria sido mais prudente se Chávez não tivesse dito o que disse.
Mas esta era uma característica pessoal dele que não deveria, nem de longe, diminuir suas qualidades.
É possível discordar da ideologia de Chávez e de seu estilo político que os críticos viam como autocrático.
Ele não fez escolhas políticas fáceis e nunca titubeou em suas decisões.
No entanto, nenhuma pessoa remotamente honesta, nem mesmo seu mais vigoroso adversário, pode negar a camaradagem, a confiança e mesmo o amor que Chávez sentia pelos pobres da Venezuela e pela causa da integração da América Latina.
De todos os líderes que encontrei em minha vida, poucos acreditaram tanto quanto ele na unidade de nosso continente e de seus povos diversos — indígenas, descendentes de europeus, africanos e imigrantes recentes.
Chávez foi instrumental no tratado de 2008 que estabeleceu a União das Nações Sul Americanas, uma organização intergovernamental de 12 membros que algum dia levará o continente para um modelo próximo da União Europeia.
Em 2010, a Comunidade de Estados Latino Americanos e do Caribe saiu do papel, se tornando um fórum político paralelo à Organização dos Estados Americanos. (Não inclui os Estados Unidos e o Canadá, como a OEA).
O Banco do Sul, uma nova instituição de financiamento, independente do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento, também teria sido impossível sem a liderança de Chávez.
Finalmente, ele estava vitalmente interessado em promover relações mais próximas da América Latina com a África e o mundo árabe.
Não foi o caso de Chávez, uma figura forte, dinâmica e inesquecível cujas ideias serão discutidas por décadas em universidades, sindicatos, partidos políticos e em qualquer lugar onde existam pessoas preocupadas com a justiça social, o alívio da miséria e uma distribuição mais justa de poder entre os povos do mundo.
Um mundo sem ele requer que outros líderes demonstrem a força que Chávez demonstrou, para que seus sonhos não fiquem apenas no papel.
Para manter seu legado, os simpatizantes de Chávez na Venezuela tem muito trabalho pela frente para construir e reforçar as instituições democráticas.
- Terão de ajudar a tornar o sistema político mais orgânico e transparente;
- tornar a participação política mais acessível;
- aumentar o diálogo com os partidos de oposição; fortalecer os sindicados e os grupos da sociedade civil.
A unidade venezuelana e a sobrevivência das duras conquistas de Chávez requerem isso.
A camaradagem democrática entre os líderes da América Latina e do Caribe será a melhor garantia da unidade política, econômica, social e cultural que nossos povos querem e precisam.
O caminho da unidade não tem retorno.
Mas por mais determinados que estejamos, precisamos ser ainda mais ao negociar a participação de nossas nações em fóruns internacionais como as Nações Unidas, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial.
Estas instituições, nascidas das cinzas da Segunda Guerra Mundial, não respondem suficientemente às realidades do mundo multipolar de hoje.
Carismático e idiossincrático capaz de construir amizades e de se comunicar com as massas como poucos, Chávez deixará saudade.
PS: A tradução do original em português para o inglês foi de Benjamin Legg e M. Robert Sarwark
Fonte:
http://www.desenvolvimentistas.com.br/blog/blog/2013/03/07/lula-no-ny-times-se-uma-figura-publica-morre-sem-deixar-ideais-seu-legado-chega-ao-fim/
Não deixe de ler:
- A Morte e as mortes de Hugo Chávez - Arnóbio Rocha
- A árvore das três raízes - Rafael Betencourt
- Uma grande perda para a América Latina - Mário Augusto Jakobskind
E mais:
- Hugo Chávez - Laerte Braga
- Nasce Hugo Chávez, o mito - Eduardo Guimarães
- Lições de Chávez - Beto Almeida
Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.