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domingo, 11 de setembro de 2011

Ciência sem Consciência conduz à demência

Por Jorge Leão*
Atualmente, com a hipertrofia da ideologia consumista, vive-se a ilusão de que somos máquinas de produção de bens voláteis. Em nenhum outro espaço de tempo da história da humanidade, observa-se com tanta frequência e temeridade o colapso das relações de produção, objetivadas pela busca exacerbada do domínio econômico e do lucro sem medidas.
Por isso, a natureza transformou-se em objeto de consumo. Os processos de adaptação sistêmica e transformação sinérgica, eminentemente naturais, não são respeitados pela máquina de produção global. Assim, a maior parte da população do planeta vive à margem dos mecanismos tecnológicos de domínio, sem condições de acompanhar o ritmo desenfreado de destruição que a economia capitalista imprime aos ecossistemas e aos povos excluídos dos bens advindos da produção de mercadorias.
Diante deste quadro calamitoso, o combate aos sintomas da doença não resolverá os problemas globais da Terra. A ciência médica, ainda marcada pelo dualismo cartesiano entre sujeito e objeto, também é limitada quanto às demandas urgentes do organismo mundano, que se encontra na UTI. A não ser por um processo radical de mudança de paradigma, será possível a reestruturação da organicidade planetária. Isto é, sem medicina preventiva, a demanda por farmácias aumenta em proporção geométrica, pois se fabrica com este modelo dependentes químicos e não pessoas saudáveis.
O número de doenças consideradas incuráveis aumenta a cada ano. E o ônus aos cofres públicos em escala geométrica. Infelizmente, a academia ainda não compreende que a causa da doença não se trata com mecanismos paliativos, que apenas encobrem momentaneamente o problema. Obviamente, que a conta é paga pela população, sendo que o lucro vai para a indústria de remédios.
Outro grave sintoma é que não pensamos de modo conjuntural. Isto é, a teia de relações que enriquece a indústria farmacêutica gera estreitos laços com o agronegócio e a indústria dos fast-foods. Ou seja, existe um mecanismo global de enriquecimento astronômico, alimentado pela miséria, pela fome e pela doença da população. A mesma indústria do agronegócio que financia a lógica da exportação encontra-se ligada à violência e à destruição das florestas, e às doenças crônicas advindas da alimentação à base de carne contaminada e de corantes artificiais.
O elo que une este mecanismo perverso traz consigo o fundamento de que a ciência opera a máquina e a sociedade compra os produtos no supermercado. Mas, para reverter este cruel e destruidor maquinário não é suficiente apenas o domínio da informação. Isso a indústria dos fast-foods faz de modo impecável. Será necessário um esforço conjunto, de caráter ético, político e ecológico, para religarmos a Terra aos níveis orgânicos de equilíbrio sócio-ambiental. Será necessário reverter informação em política sustentável de justa distribuição de produção e consumo ético. Aí sim, a lógica deixa de ser exclusivista e passa a ser cooperativa e solidária.
Desse modo, sem o entendimento de que a razão instrumental moderna não será jamais geradora de equilíbrio sócio-ecológico, mas uma organizadora de ideias potencialmente geradoras de conhecimento, ainda passaremos longos anos amargando a destruição do planeta e de nossos intestinos como algo inevitável.
Portanto, penso que a política social do equilíbrio ecológico deve ser o norte de nossas ações para o mundo neste novo século. Isso será uma conquista não de uma razão que calcula, mede e domina. Mas de uma intuição sensível que acolhe, escuta e coopera.
A emissão de gases poluentes não se desconecta de uma política de medicina preventiva. Assim como a destruição da floresta amazônica está ligada diretamente ao enriquecimento da indústria dos fast-foods, que vende o hambúrger enlatado com o cheiro de floresta queimada em seu “selo de qualidade”. É uma lógica perversa e aparentemente invisível, mas que penetra com muita eficácia em nossas casas pela propaganda e pela indústria das futilidades dominicais.
Assim, lutar por um novo mundo é dizer não à máquina de destruição do agronegócio, da indústria de remédios, da produção desenfreada de agrotóxicos, da violência dos matadouros, que é a mesma lógica que produz  tecnologia de ponta nas universidades para atender à indústria bélica. Portanto, a ciência não passa incólume pela morte das crianças africanas, onde desnutrição confunde-se com abandono sócio-econômico-ambiental. Em nome da ciência tem-se patrocinada genocídios ao longo da história. Agora, é chegado o tempo de dar à ciência um novo patamar de consciência. Isto é, a medicina deverá ser preventiva. A educação deverá ser formativa. E a política deverá ser justa, compreendendo que não se faz novos mundos sem ecologia, sem dignidade e paz entre os povos.
Jorge Leão*
Professor de Filosofia do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Integração com a arte permite maior compreensão da ciência

COBERTURA ESPECIAL – Feira FAPERJ Ciência, Tecnologia & Inovação
 

Projeto da UFRJ explora as funções do sistema auditivo por intermédio de instalações e intervenções artísticas.
 
Agência Notisa – O processo de entendimento da ciência e produção de conhecimento científico pode ser beneficiado e aperfeiçoado caso seja possível uma troca com a arte. É esta a premissa do grupo interdisciplinar Anatomia das Paixões, que integra o programa de pós-graduação em História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Na Feira FAPERJ Ciência, Tecnologia & Inovação, está montada uma instalação que reproduz a experiência do grupo com o ensino e apresentação diferenciada das funções auditivas do ser humano. A feira acontece até hoje (30), no Rio de Janeiro.
 
Segundo Maira Fróes, doutora em ciências biológicas (biofísica) pela UFRJ e responsável pelo projeto, as obras expostas na instalação têm como objetivo mostrar todos os níveis da apreensão auditiva, evidenciando a existência do sujeito por trás da produção científica. Como explica um painel de apresentação, a instalação é formada por “peças anatômicas post-mortem” que “são contextualizadas em anatomia artística contemporânea (preparações anatômicas combinadas a esculturas, videoarte, tecnoarte, fotografia artística, poéticas musical e literária) e cenografia (salão de dança e teatro de luz negra)”, organizadas em três cenários: figuras humanas formadas pelo entrelaçamento de fios, cujo movimento parecia uma dança, eram envoltas pelos nomes de estruturas do sistema auditivo. Ao lado delas, uma obra intitulada Hitch sobrepunha o perfil do famoso diretor de filmes de suspense Alfred Hitchcock a uma parte do crânio, expondo uma cápsula de microfone no lugar do ouvido e um alto-falante substituindo o cérebro. Por fim, o último espaço tem uma proposta de quadro negro diferente, formado por painéis sobrepostos onde são projetadas reproduções artísticas da anatomia auditiva.

A proposta da instalação é mostrar os diferentes planos da produção auditiva, que passa não só pela camada do escrutínio científico, mas também por apreensões de ordem sensível, estética, afetiva e emocional. Como explica Maira Froés, a obra Hitch, por exemplo, mostra bem as várias fases pelas quais passa o processo auditivo: uma primeira perceptual, de transmissão mecânica e eletroquímica do estímulo sonoro (representada pelo microfone), uma segunda de criação da sensação auditiva pelo córtex auditivo primário (representado pelo alto-falante) e, finalmente, uma dimensão de significação, sugerida em níveis de emoção através da figura do diretor de cinema: um dos grandes símbolos de seus filmes é sua trilha sonora marcante, a qual colocamos uma carga emocional que a liga ao suspense.
 
Através das obras expostas, o grupo Anatomia das Paixões busca mostrar que é possível a interação arte-ciência, sendo que tal colaboração ajudaria a favorecer o arrebatamento, a lógica, o insight intelectual e a criatividade. De acordo com Maira Froés, a experiência com voluntários do curso de fonoaudiologia da UFRJ comprovou esta hipótese: divididos em dois grupos – enquanto em um as aulas eram ministradas no formato tradicional, no outro havia um formato inserido na arte –, percebeu-se que aqueles do segundo sistema tinham uma compreensão mais ampla das funções auditivas, sem déficits em sua capacidade de memorização. Na visão dos organizadores da instalação, “a combinação única, intencional e não hierárquica de arte e ciência” está, então, na “raiz de uma plataforma inovadora, contemporânea, de criação e análise do conhecimento científico”.

Agência Notisa (science journalism – jornalismo científico)