quarta-feira, 11 de maio de 2011

Belo Monte e a Idade Média



Laerte Braga


É impossível dissociar a violência que o governo impõe para a viabilizar a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, do modelo de “capitalismo a brasileira”, definido pelo secretário geral do PCB (Partido Comunista Brasileiro) Ivan Pinheiro como a opção feita desde o governo Lula.

Saímos fora do esquema de subordinação aos EUA – hoje um conglomerado terrorista e de “negócios” – apostamos num capitalismo com toda a brutalidade que o capitalismo traz, mas que nos leve ao topo e dessa maneira nos credenciamos, por exemplo, a uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU.

O malabarismo político do ex-presidente Lula para evitar o naufrágio diante do caos gerado pelo governo FHC – a transformação do Brasil em colônia dos EUA e de empresas multinacionais, o sistema bancário, por exemplo – pode ter gerado uma série de concessões e a percepção – equivocada – que, potência de primeiro mundo nos transformaria em carro chefe de uma nova ordem mundial. Na prática um capitalismo caridoso, com cara de solidário, na realidade uma aventura perigosa e que neste momento, quando o governo Dilma Roussef se mostra aquém das expectativas, uma encruzilhada com cara de retrocesso.

Construiu, Lula, uma política externa responsável, que o transformou em líder mundial inconteste, ou no mínimo voz a ser ouvida, complicador para os negócios do conglomerado terrorista, enquanto ajeitava por aqui políticas sociais e grande empresariado nacional. Se raspado o verniz, à exceção da política externa e de conquistas sociais, o Brasil continua a ser um País das elites políticas e econômicas, o que certamente, à frente, vai nos levar de volta à condição de Maria Fumaça.

É possível que o ex-presidente tenha imaginado um grande salto e jogado suas fichas em Dilma Roussef. Só que o salto, até agora, tem sido para trás. A começar pela política externa.

Li, hoje cedo, uma pequena frase atribuída a autor desconhecido.

“Na última semana beatificamos um papa, casamos um príncipe, fizemos uma cruzada e matamos um mouro. Bem vindos à Idade Média”.

Tudo isso poderia ser resumido como um mundo onde existam 10 pessoas e apenas uma tem armas. Nove vão ter que optar pela submissão, ou correr o risco de serem mortos. O secretário geral das Nações Unidas, quem em sua constituição gerou a DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS afirmou em entrevista coletiva que “sinto-me aliviado com a morte de bin Laden”.

É evidente que aos olhos dos EUA bin Laden é diferente de Herman Goering, julgado por crimes de guerra em Nuremberg. Goering foi um dos responsáveis pelo fracasso da invasão alemã à União Soviética e isso frustrou os planos norte-americanos de matar dois coelhos de uma só cajadada. Eliminar os soviéticos e trocar a suástica de lugar. Ao invés de Berlim, Washington.

Por isso foi a julgamento, a farsa da democracia e dos direitos humanos na visão de gente como Truman, ou como Barack Obama e todos os que passaram por lá, sem exceção.

Se levarmos em conta que o objetivo foi alcançado hoje, a um custo incalculável, principalmente em vidas humanas, a estupidez e a boçalidade se instalam plenas e absolutas neste “novo mundo”.

Há uma diferença de tempo e espaço entre uma Idade Média e a de hoje que pode ser mostrada pelo poder do arsenal norte-americano, capaz de destruir o planeta cem vezes se preciso for.

Vivemos a Idade Média da Tecnologia.

Belo Monte é uma obra concebida à época da ditadura militar, aquele negócio de milagre brasileiro, ressurreta no governo Lula e que vai sendo viabilizada a ferro e fogo pelo governo Dilma.

A coté um monte de grandes empresas. Enterrados nos danos ambientais e na desnecessidade da obra, brasileiros, perspectivas de futuro, etc, etc.

Um custo de 19 bilhões segundo o governo, de 30 bilhões segundo as empresas, com oitenta por cento de um ou outro valor saindo dos cofres públicos na modalidade financiamento a prazo perdido, via BNDES – Banco do Desenvolvimento Econômico e Social –, sustentado pelo FAT – FUNDO DE AMPARO AO TRABALHADOR.

O que o diretor Woody Allen tem a ver com isso? Não sei, mas desconfio que tem.

Em entrevista coletiva após a exibição de seu filme “MEIA NOITE EM PARIS”, no festival de Cannes, entre outras coisas afirmou que pensou na idéia/título antes de ter um roteiro (Felini tinha essa característica) e que a coisa brotou espontaneamente.

“Passaram-se meses e eu não pensava em nada. E então me ocorreu que, um dia, alguém estaria andando nas ruas, um carro aparece, alguém de dentro grita entre e o leva a um lugar diferente. Tive sorte que desta vez pensei em algo. Mas poderia não ter pensado em nada e ter de mudar o título para outra coisa”.

O personagem central entra no carro e mergulha na primeira metade do século XX, início do século, reencontra Ernest Hemingway, Pablo Picasso, Salvador Dali, Cole Porter, enquanto sua noiva prefere os shoppings, as compras, as baladas, as pechinchas.

No bolso um anel pronto para o pedido de casamento.

O carro que passa, pára e manda entrar conduz Scott Fittzgerald e sua mulher Zelda.

A despeito do diretor ter dito que fez piadas com os diálogos, não seria capaz de produzir diálogos para T. S. Elliot, ou Picasso, Dali e todos que entram na trama, Allen é um crítico refinado – refinado até demais por isso às vezes imperceptível – É de New York, onde ainda sobrevive vida inteligente nos EUA, pelo menos por mais uns vinte anos –.
Mais ou menos um "tô correndo do futuro".  

O grande salto – era uma expressão de Stalin, ou dela o governante soviético se apropriou –, em se tratando de Brasil parece estar terminando num abismo/máquina do tempo que nos conduz a algo com o penhasco do Portão do Inferno.

Sanduíche misto frio, mistura de Lula (políticas sociais agora no aspecto caridoso do modelo, sem qualquer preocupação de consciência política) e FHC (política econômica, política externa e Belo Monte como símbolo dessa comédia).

Existem determinados fatos que não se explicam nunca. Moreira Franco no lugar de Samuel Pinheiro Guimarães e Anthony Patriot substituindo Celso Amorim.

Aí, quando Robert Fisk (como lembra em artigo a jornalista Ana Helena Tavares) fala a Munir Safat, na GLOBONEWS que “já fui a São Paulo e ali existem máfias pior que a AL QAEDA”, o programa termina.

É o homem máquina, o homem shopping. Não chega a ser o homem Metrópolis em sua totalidade, pois há uma certa candura no final do filme de Lang, o aperto de mão entre o trabalhador e o empresário. O escravo dos subterrâneos de Belo Monte e o consórcio financiado pelo BNDES. Teria que ter a bacia amazônica ao fundo e sumindo no longo dos tempos.  Não chega, mas é quase.

Deve ser por conta disso e de tantas coisas que Vinícius de Moraes afirmou que “o uísque é o melhor amigo do homem. É o cachorro engarrafado”.

Com certeza Aécio Neves concorda.

E de cambulhada esse sanduíche misto frio tem molho de Código Floresta no parecer mágico do deputado Aldo Rebelo.

Vem embrulhado em mistura de água e óleo – parecia né? – O pacote Dilma/GLOBO.

O filme resulta numa droga, mas os efeitos especiais servirão para ensurdecer e cegar a manada.

Breve, desfile do exército de Jesus aos gritos de “progresso, progresso, progresso”.

Sábio foi Gandhi. “Aceito o Cristo de vocês, mas não o cristianismo”. Podia ter dito sem excesso algum, o cristianismo/capitalismo de vocês.

Enfim, nos tempos atuais pontificam Bento XVI e Edir Macedo.

“Que Deus nos abençoe e aos EUA” – Barack Obama agradecendo e justificando a morte de bin Laden. E ao agronegócio, ao latifúndio, às grandes máquinas que embevecem o ser minúsculo/formiga e lota consultórios de psiquiatras, assim por diante.

É tudo culpa de bin Laden e do Irã. 

Ia me esquecendo. Moradores de um bairro de elite em São Paulo, Higienópolis, centro da capital paulista, protestaram contra uma estação do metrô por ali. Ia atrapalhar os negócios e “ficar tudo muito misturado”. O governo atento às “reivindicações populares” desviou o negócio para a área do Pacaembu.