Mostrando postagens com marcador Agência Pública. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Agência Pública. Mostrar todas as postagens

sábado, 1 de março de 2014

Manaus sem Copa verde

24.02.14 - Sem Copa verde - Por Elaíze Farias
- extraído do site Agência Pública

Vendida como a capital da floresta, Manaus acumula decepções com as obras - que já mataram três operários - sem retorno para os moradores; e pode decepcionar os visitantes com as marcas da degradação urbana e da desigualdade social
  
A arena de futebol custou aos cofres públicos mais de R$ 600 milhões e ninguém sabe o que será dela depois; a reforma do porto consumiu R$ 71 milhões de recursos federais (via DNIT) e teve o processo de licitação contestado – as obras foram há pouco retomadas mas ainda não se sabe o 
porto estará pronto antes da Copa. As obras do aeroporto internacional Eduardo Gomes soterraram um curso d’água e desmataram um área protegida da capital amazonense. Os centros de treinamento – dois – não têm data para abertura.

Fiscalização do Ministério Público do Trabalho na Arena

Quando Manaus foi escolhida para sediar quatro jogos da Copa, a decisão foi saudada pela imprensa local e por políticos e um clima de euforia reinou na cidade. Uma lista de projetos que fariam parte “do legado da Copa” entrou nas agendas de discussão dos gestores públicos e passou a pautar reportagens e debates: obras de mobilidade urbana, incremento da rede 
hoteleira, revitalização de áreas degradadas, melhorias no transporte público. Até mesmo um projeto de geração de energia solar, que seria instalado no entorno da Arena da Amazônia, foi previsto no pacote.

A maioria dos projetos foi abandonada ao longo do caminho e a população não esqueceu. 

Pressionados agora a dar uma resposta à sociedade, os gestores públicos se empenham em anunciar como “legado” intervenções de menor porte, planejadas a toque de caixa, na área de segurança pública, do trânsito urbano.

O desapontamento com o (não) legado da Copa vem acompanhado pelo desalento trazido pela morte de três operários ao longo da construção da Arena da Amazônia: foram duas mortes em 2013 e uma nesse início de fevereiro de 2014. Uma quarta morte, embora não associada diretamente a 
acidente de trabalho, também trouxe comoção ao canteiro de obras – um trabalhador morreu vítima de infarto – e marcou Manaus com a cidade-sede da Copa com o maior número de acidentes fatais durante os preparativos para o megaevento. A construtora Andrade Gutierrez – uma das mais beneficiadas pelas obras da Copa no país – é alvo de uma ação por dano moral coletivo e, em 7 de fevereiro deste ano, o Ministério Público do Trabalho pediu prioridade no julgamento dessa ação contra a responsável pela obra, no valor de R$ 20 milhões.

MOMENTO “POSITIVO”
Nem mesmo o gestor da Copa – como é informalmente conhecido o cargo de coordenador da Unidade Gestora do Projeto Copa em Manaus (UGP Copa), criado pelo governo do Amazonas –  Miguel Capobiango, cita mais as prometidas obras de mobilidade e revitalização urbana ao falar do legado da Copa. “O principal legado que a Copa vai deixar para Manaus é a visibilidade”, ele diz. “E ela trará turistas. Então, é preciso tentar dentro do projeto da Copa fazer com que este momento de visibilidade se torne um momento positivo”, incentiva.

Não vai ser fácil mostrar um cenário tão “positivo” para os visitantes. Embora detenha o sexto PIB do país, segundo o IBGE de 2010, sobretudo por abrigar o Polo Industrial de Manaus (PIM), a cidade se destaca por sua elevada desigualdade social. O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH) vem melhorando, hoje é de 0,737 (o máximo é 1), mas o Índice Gini, usado para medir a concentração de renda, indica que a desigualdade em Manaus vem crescendo: passou de 0,56 em 1991 para 0,61 em 2010 (numericamente, 0 significa total igualdade e o 1, completa desigualdade).

Eliane Nascimento que vive com sua família em um barco no Igarapé de Educandos
(Foto: Elaíze Farias)

Prometeram um legado, mas isso não passou de discurso. Está muito claro quem está ganhando com a Copa em Manaus: as construtoras, os organizadores, os dirigentes do Estado e a própria Fifa. Esses são os que vão lucrar com as grandes somas investidas. Enquanto isso, as mazelas da cidade estão expostas”, afirma Hamilton Leão, presidente do Instituto Amazônico de Cidadania (IACi), uma das organizações de Manaus mais atuantes na cobrança dos gastos públicos na cidade.

Fazem tantas propagandas sobre a cidade que não correspondem à realidade. Se quiserem fazer um raio-X da cidade não perguntem ao empreiteiro, ao empresário, ao homem público. Vá a um bairro da periferia e consulte o cidadão comum e veja  como é o dia-a-dia dele e pergunte se a Copa está trazendo algum benefício para ele”, completa.

APOSTA DE RISCO NO TURISMO
A aposta no crescimento do turismo é um risco: Manaus tem uma rede de hotelaria pequena para o aumento projetado durante e depois da Copa. A Unidade Gestora da Copa estima que 18 mil turistas visitarão Manaus no período da Copa, enquanto Capobiango diz que Manaus tem 14 mil leitos em hotéis convencionais. Há os chamados “3 mil leitos alternativos”, instalados em motéis, locações temporárias em residências e até em embarcações localizadas na orla de Manaus.

O governo do Amazonas reservou um montante de R$ 10 milhões para divulgar o turismo pré-Copa em ações voltadas para workshops de educação para operadores e jornalistas de turismo, nacionais e internacionais, dando ênfase aos oito países da Copa e às 11 cidades sedes do Brasil”, segundo declarações da titular da Amazonastur, Orenir Braga. As ações incluem também anúncios publicitários em revistas de bordo de companhias aéreas e revistas especialistas” e participação do órgão em feiras de turismo no exterior e no Brasil, que deverão começar em março, segundo o cronograma da Amazonastur.

COPA VERDE
Localizada no centro do maior Estado da Amazônia, a capital do Amazonas, que conserva 90% de cobertura florestal, foi escolhida como cidade-sede em 2009 mesmo sem ter nenhum time de expressão no futebol brasileiro. A surpreendente vitória contra a outra forte candidata, Belém (PA), com maior tradição no esporte, pode ser atribuída a uma boa campanha de marketing: Manaus vendeu a marca “Copa Verde” – a “capital da floresta amazônica”.

Mas a realidade urbana é bem diferente da imagem projetada. Manaus é uma cidade com arborização mínima (com exceção das poucas áreas preservadas por lei), fruto de uma política de urbanização que jamais valorizou a vegetação nativa (incluindo o próprio entorno da Arena Amazônia, onde não se vê árvores).


A preservação da arquitetura também não é o forte da cidade e a Copa parece ter contribuído para uma perda nessa área. Todos esperavam, por exemplo, que o antigo estádio, o Vivaldo Lima, chamado de Vivaldão, criado pelo renomado arquiteto Severiano Mário Porto fosse reformado. Mas, apesar da comoção em muitas pessoas que tentaram impedir sua derrubada, ele foi demolido. Somente um novo estádio corresponderia às exigências da Fifa, justificou-se.

O transporte público também é precário e as prometidas obras de mobilidade foram abandonadas. Entre as mais importantes estavam uma linha de monotrilho que faria a ligação da Zona Norte (a mais populosa de Manaus) ao centro da cidade e o corredor exclusivo para ônibus (chamado de BRT – Bus Rapid Transit). O monotrilho foi orçado em R$ 1,3 bilhão e o BRT em R$ 200 milhões e ambos seriam bancados com recursos públicos locais e federais.

A ausência de dados técnicos fundamentando os projetos, porém, provocou uma série de questionamentos do Ministério Público Federal (MPF), do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria Geral da União (CGU). A sociedade civil também questionou o traçado do monotrilho quando ele ainda estava no papel pela possibilidade de centenas de desapropriações e de impactos em área tombada pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) no centro de Manaus.

Em outubro de 2013, acatando a uma ação do MPF, a Justiça Federal do Amazonas determinou, em liminar, a suspensão das obras do monotrilho, e orientou a Caixa Econômica Federal a não liberar empréstimos para o governo do Amazonas. Até o momento, não há informações de que o governo estadual tenha recorrido da decisão, mas empresas que ganharam a licitação, em 2011, sim. O caso está no Tribunal Regional Federal (TRF1), em Brasília.

IRREGULARIDADES PERMANECEM
O projeto do monotrilho acabou sendo retirado da Matriz de Responsabilidade da Copa e transferido pelo governo do Amazonas para o PAC da Mobilidade Urbana do Ministério das Cidades, mas isso não altera em nada a ação do MPF, já que as irregularidades permanecem como explica o Procurador da República Jorge Medeiros, que atua na área do patrimônio público.


O monotrilho não tem a devida especificação do que deve ser licitado. Tem rubricas abertas, que constam apenas como ‘verbas´. Verbas para que? A justificativa que era que apenas depois da licitação é que seria possível determinar. O que é uma temeridade. A lei exige que o detalhamento seja prévio. Isso gera problema concreto porque, se não existe especificação antes, que já é ilegal, no momento posterior, fatalmente vai ter termos aditivos”, diz o procurador, que aponta ainda outra irregularidade identificada no projeto: a falta de observância de exigências da lei federal de 2002 que determina que os modais de transporte devam ser inseridos no contexto do plano diretor da cidade.

A Pública tentou ouvir, diversas vezes, a Secretária Estadual de Infra-Estrutura (Seinfra), Valdívia Lopes, responsável pelo projeto do monotrilho, sem sucesso.

Já o BRT foi suspenso e substituído por outro projeto, o BRS (Sistema Bus Rapid Service), também fora da matriz da Copa. Orçado em R$ 150 milhões, o BRS começou a ser implantado, de fato, nas últimas semanas e apesar do pouco tempo de funcionamento, vem sendo questionado pela população por ter sido criado sem levar em conta o fluxo real do trânsito na cidade, trazendo mais congestionamentos.

O BRT foi retirado da Copa porque ele estava vinculado ao monotrilho. Com os complicadores em relação aos dois, a gente adotou uma medida mais simples”, explicou Antônio Nelson, diretor de engenharia da Secretaria Municipal de Infra-Estrutura (Seminf), responsável pela obra. Os R$ 150 milhões estão sendo bancados pela prefeitura de Manaus, segundo Nelson, mas a administração municipal espera receber do governo federal um empréstimo a fundo perdido da Caixa Ecônomica Federal. “O Ministério do Planejamento aprovou o projeto, mas ele ainda será analisado pela Caixa para ver se o banco libera R$ 125 milhões. Os outros R$ 25 milhões serão do tesouro da prefeitura”, disse.

UMA ARENA COM O FUTURO A DEFINIR
O governo do Amazonas terá 20 anos para pagar o empréstimo de R$ 400 milhões ao BNDES destinado à construção da Arena da Amazônia. O restante dos recursos – cerca de 200 milhões, vêm dos cofres do governo estadual. Fazem parte do projeto dois centros de treinamento – o CT Colina e o CT Coroado que custaram R$ 21 milhões e R$ 14 milhões, respectivamente, ao governo do Amazonas.

As cifras assustam quando se junta a esses gastos o valor estimado para a manutenção da Arena da Amazônia: R$ 500 mil por mês, de acordo com os cálculos feitos com base nos custos do Estádio do Engenhão, no Rio de Janeiro, explica Miguel Capobiango. De onde virá o dinheiro? 

Isso nenhum gestor sabe responder. Sem uma equipe de futebol de peso (o time melhor ranqueado no futebol brasileiro é o Nacional, que está na Série D) e, por conseguinte, sem atrativo suficiente para chamar público para os 44 mil lugares do estádio, o futuro da Arena Amazônia virou tema de especulação: já circularam rumores de que se faria ali um presídio depois da Copa (mera especulação, logo negada pelo governo) ou um shopping center.


Miguel Capobiango diz que o governo contratou uma empresa de consultoria “para mapear o que está funcionando no Brasil e no exterior e assim estudar o mercado” de modo a “enfrentar o desafio de manter a arena sem que ela onere o poder público”. Uma eventual evolução do futebol amazonense, atualmente na quarta divisão, também é mencionada: “Com um palco adequado, o futebol passa a ter visibilidade. Se vai (o futebol amazonense) se tornar grande, isso vai depender dos operadores do futebol”, diz, evasivo.

Autor de representações no Ministério Público Federal e Estadual para tentar evitar a demolição do Vivaldão, o engenheiro industrial Jerônimo Maranhão é mais contundente quando fala no assunto: “A população vai gastar R$ 150 milhões por cada um dos quatro jogos da Copa. E depois? O que vai acontecer? Este estádio vai servir apenas para a população vê-lo todos os dias, quando passar de ônibus em frente a ele”, diz ele.

Segundo os cálculos do engenheiro, uma reforma com custo máximo de  R$ 200 milhões teria preservado o antigo estádio e poupado recursos públicos. “Se era para atender exigências da Fifa, bastava, por exemplo, inclinar a arquibancada, rebaixar o gramado, entre outras intervenções”, afirma, questionando também o valor estimado para a manutenção do estádio. “Como se chega a esse valor se tudo ali é novo e está na garantia? Se, por acaso, ocorrer algum problema é a construtora que tem que responder por pelo menos dois anos”, diz.

Miguel Capobiango, o gestor da Copa, diz que não é verdade que a nova Arena se tornará um elefante branco” como se comenta na cidade. “A Arena vai gerar serviços para a população. Se falava a mesma coisa quando foi construído o Sambódromo, em Manaus, e hoje ele é usado para caramba. Ninguém diz que o Sambódromo é um elefante branco”, diz, referindo-se ao Centro de Convenções de Manaus, mais conhecido como Sambódromo, onde acontecem atividades culturais e shows musicais.

O FIM DA NASCENTE DE UM IGARAPÉ
Manaus é uma cidade cortada por centenas de cursos d’água conhecidos localmente como igarapés – microbacias que, juntas, vão formar um grande rio. No caso de Manaus, o rio Negro, o segundo maior do mundo em volume de água, atrás apenas do rio Amazonas. A importância dos igarapés está na sua atividade biológica e química. A presença de um igarapé, além de indicar a qualidade do ambiente, também atesta a qualidade do solo. É esse ambiente que mantém a sustentabilidade da Amazônia”, explica o pesquisador Sérgio Bringel, da Coordenação de Dinâmica Ambiental do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) doutor em Hidrogeoquímica e membro do Conselho de Recursos Hídricos do Amazonas.

A maioria dos igarapés de Manaus estão poluídos e/ou foram aterrados  para obras de urbanização. Os poucos que sobrevivem estão em áreas de proteção ambiental (APPs). Ainda assim, não tem a vida garantida: durante  as obras de ampliação do Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, por exemplo, uma das nascentes do Igarapé da Água Branca, localizado no bairro Tarumã, zona Oeste de Manaus, foi soterrada. Áreas de vegetação nativa também foram suprimidas. A obra faz parte da Matriz de Responsabilidade da Copa.

Nascente do Igarapé da Água Branca foi soterrado
(Foto: Jó Farrah)

A área impactada é conhecida como APP do Aeroporto foi atingida com o aval do órgão estadual Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), que concedeu a licença para a obra. A nascente que desaguava em um igarapé maior, o Tarumã-Mirim, alcançando então o rio Negro, não existe mais.

O jornalista Jó Farrah, morador do Tarumã e ativista em defesa da floresta e da fauna silvestre e dos igarapés que ainda resistem por ali, denunciou os danos mas já era tarde para salvar a nascente. “Começamos a fazer denúncia no facebook no perfil do Igarapé da Água Branca e exibimos fotos. Fizemos a mesma denúncia na comissão ambiental da Assembleia Legislativa do Amazonas e depois uma visita técnica. Fomos no local e identificamos que não tem mais jeito. Soterraram tudo”.

A Infraero, responsável pelo Aeroporto Eduardo Gomes, foi acionada e, segundo Farrah, admitiu que a obra foi feita no local por opção, já que outro traçado poderia forçar desapropriações de residências, aumentando os custos. “A Infraero justificou dizendo que só havia aquela área para fazer a obra. Desapropriar sairia caro. Saiu mais barato destruir a floresta e impactar o igarapé”, diz o ativista.

Desolado, Jó Farrah diz que o Igarapé da Água Branca, um dos poucos de Manaus que tem água limpa, perderá volume com o desaparecimento da nascente. “O igarapé da Água Branca tem água cristalina, e pura e fria. Abastece e oxigena as águas poluídas da bacia do Tarumã-Mirim. Em suas águas peixes como matrinxãs, traíras, bagres, carás , sardinhas e jaraquis crescem até o tamanho certo para migrar para os rios. Sem esse igarapé este fluxo de vida morre”, diz Jó.

Igarapé Água Branca (Foto: Jó Farrah)

Farrah também conta que durante as obras, o barro do aterro foi lançado na parte limpa do igarapé e muitos buritizais (palmeira típica da Amazônia) morreram soterrados pela lama. Fizemos uma reunião com a Infraero, que se comprometeu a realizar ações de mitigação. Mas não sabemos quais serão. Agora, também passaremos a fazer outras cobranças. Com a ampliação do 
aeroporto, queremos saber para onde vão os efluentes já que a demanda de passageiros vai aumentar. Para onde vão jogar os resíduos? Para outros igarapés, para o rio Negro?”, questiona.

O pesquisador Sérgio Bringel explica que quando uma microbacia, como um igarapé, é impactada, além do desaparecimento de uma fonte natural e da vida que ali existia, também ocorrem danos ao solo. Ao ouvir da Pública o caso da nascente do Igarapé Água Branca, ele não tem dúvidas em classificar a obra como um crime ambiental. E, se houve licenciamento ambiental então também houve “falta de responsabilidade do órgão responsável”, ele diz.

A assessoria de imprensa da Infraero informou que, em janeiro passado, a Infraero obteve do órgão ambiental licença de instalação e disse que “todos os procedimentos administrativos e técnicos referentes ao licenciamento foram adotados previamente junto ao órgão ambiental competente”, e que “aguardará pela manifestação do órgão licenciador sobre possíveis impactos 
ambientais”.

Procurada, a assessoria do Ipaam informou que a obra foi licenciada e que “se houver irregularidades e descumprimento das condicionais constantes da licença ambiental”, o órgão vai tomar medidas cabíveis e divulgá-las.

Com um orçamento de R$ 444 milhões, a ampliação do Aeroporto Internacional Eduardo Gomes é uma promessa antiga, ressuscitada pela Copa. Com as obras, a capacidade do aeroporto, atualmente de 6,4 milhões de passageiros ao ano, subirá para 13,5 milhões ao ano, segundo a assessoria da Infraero.

Mas, além dos prejuízos ambientais, as obras do aeroporto também foram questionadas por irregularidades trabalhistas. Chegaram a ser interditadas por determinação judicial em processo movido pelo MPT. No início de fevereiro, após audiência com o MPT, as obras foram retomadas. Segundo a assessoria de imprensa a previsão é que ele seja reinaugurado no final de abril.

BARCOS, PALAFITAS E VISTA DO RIO NEGRO
Quem passa apressado pela avenida Lourenço da Silva Braga, mais conhecida como Manaus Moderna, pouco tempo tem para observar os detalhes de um dos lugares mais degradados do centro da cidade e, ao mesmo tempo, um dos que possuem a vista mais bela da capital amazonense – o rio Negro. 

Apesar da paisagem, os turistas que visitam Manaus são direcionados para áreas mais arejadas e elitizadas da cidade, como a região da Ponta Negra, na zona Centro-Oeste da cidade.

Casas no Igarapé de Educandos (Foto: Valter Calheiros)

Se um cidadão se dignar a circular na estreita calçada (com vários trechos quebrados) da artéria permanentemente congestionada, vai logo perceber porque ali não há turistas. Basta se escorar na frágil mureta que a circunda e olhar para baixo para uma vista inesquecível: uma orla suja, cheia de lixo e uma fileira de embarcações atracadas no igarapé de Educandos, um dos 
principais e maiores cursos d'água de Manaus.

Um olhar desatento nem imagina que mora gente ali. Mas é na margem do Igarapé de Educandos, que Eliane Nascimento, 36 anos, trabalha como vigia de embarcações junto com o marido, Pedro dos Santos, e vive há cinco anos com os oito filhos em um barco cujo proprietário sumiu. “Eliane, você acompanha notícias sobre a Copa em Manaus? Sabe o que significa isso?”, pergunto. “Olha, sei pouco. Dizem que vai trazer coisas boas, mas não sei que é. Não falam para gente disso. A senhora sabe?”, pergunta de volta Eliane.

Será que vão melhorar as coisas aqui na época da Copa?”, entra na conversa Estônia Gomes, 53, comandante de outro barco ancorado. Estônia trabalha no comando do “timão” do barco transportando produtos extrativistas de cidades do interior próximas para comercializar em Manaus. Passa a maior parte do tempo no rio, mas tem residência fixa.

Palafitas do Igarapé de Educandos (Foto: Elaíze Farias)

Seria bonito se limpassem, tirassem essa sujeira toda que se acumula há anos”, sonha Estônia. Olha, a gente não tem nem água limpa para beber. Não tem torneira. Eu compro água do outro lado do rio, num posto de gasolina e encho várias garrafas de refrigerante PET. Imagine só. A gente morando na cidade onde tem um rio desse tamanho”, lamenta.

A cerca de 300 metros dos barcos ancorados estão as palafitas, cujos donos não sabem até quando vão ficar. As moradias erguidas em estacas de madeira com mais de 30 metros para resistir à cheia do rio, que davam a Manaus o aspecto de “cidade flutuante”, perderam sua aura romântica entre o odor do esgoto e o lixo jogado no rio. Os canoeiros continuam a fazer o transporte 
entre as orlas e as casas, oferecendo serviços pagos. Foi de uma canoa, que a Pública conseguiu conversar com alguns moradores, que ainda sonham com melhorias também na área de Educandos. 

Estou aqui há 15 anos. Gostaria de sair, mas para onde vou? Se Deus permitir, eu saio. Ou me tiram. Mas, pra ser sincera, eu gostaria de ficar. Se ao menos limpassem o igarapé. Está muito sujo”, diz dona Juraci de Souza, 54 anos.

A comandante de barco Estônia Gomes (Foto: Elaíze Farias)

POLÍTICAS PÚBLICAS
A reportagem tentou saber da Prefeitura de Manaus se a administração tem planos de revitalização, reforma ou melhorias para a área da Manaus Moderna. Afinal, a atual gestão da prefeitura criou uma pasta, Secretaria Municipal do Centro, apenas para responder demandas da área. Pela assessoria de imprensa, porém, soube que aquele trecho não faz parte da atuação desta secretaria.

A Secretaria Municipal de Infra-Estrutura (Seminf) sinaliza com um projeto de revitalização do centro, estimado em R$ 1 milhão, que inclui pavimentação, faixa exclusiva para pedestres, balcões com baias para estacionamento e bilheteria para passageiros que usam barcos para viajar. Os recursos viriam da Caixa Econômica Federal, mas o banco ainda está analisando o projeto, segundo Antônio Nelson, diretor de engenharia da Seminf. “Esperamos que a Caixa libere esse recurso, que são sobras aplicadas em um outro projeto anterior e que só podem ser investidas no centro”, disse Nelson.

Como política pública para os moradores das palafitas há o Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus (Prosamim) que realiza assentamento de famílias, com financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), principalmente quando afetadas por inundações durante o período de chuva. Essas famílias são reassentadas em unidades residenciais de baixa renda, e os igarapés canalizados, embora os pesquisadores da área de recursos hídricos em Manaus afirmem que o ideal seria revitalizar os cursos d'água e não aterrá-los.

Juraci de Souza, em palafita no Igarapé de Educandos
(Foto: Elaíze Farias)

Sobre o Igarapé de Educandos, a assessoria de imprensa do Prosamim disse que ainda não há projeto destinado às (aproximadamente) 500 casas, e que as melhorias estão sendo realizadas em outros áreas de igarapés da cidade. A Pública também visitou o Igarapé dos Franceses, no bairro Alvorada I, próximo ao estádio. Além de residências humildes, encontrou dois campinhos de futebol, desolados e precários, cercados por um terreno baldio. Quase nada de área verde. “maior parte dessa vegetação é mato. E ainda temos um igarapé poluído, sujo, que tem mau cheiro. E isso há poucos metros da arena”, disse o comerciante Francisco Gonçalves, de 80 anos, que circulou todo o trecho do Igarapé dos Franceses, um curso d’agua manso e poluído, com a Pública (mas não aceitou sair na foto).

Moro aqui perto mas eu nem sei dizer o que penso sobre isso [a Copa]. Estou preocupado sobre o que vai acontecer com os moradores durante os jogos. Imagine como vai ficar isso aqui”, diz.

FALTA DE ÁGUA NA CAPITAL DA “RAIN FOREST
Há aproximadamente 40 anos, Manaus era uma cidade com pouco mais de 400 mil habitantes. Hoje, são quase dois milhões, segundo o Censo do IBGE de 2010, e os bairros que eram considerados como zona Norte já foram engolidos pela região central. A atual zona Norte forma com a zona Leste a “periferia” da capital, carregando todos os estigmas sociais dessas áreas.

São bairros nascidos de ocupação irregular que foram sendo urbanizados (a maioria das vezes de forma precária) por pressão dos seus moradores. Rraramente aparecem nos anúncios publicitários, com suas ruas esburacadas e mal iluminadas, tragadas por erosões, sistema de transporte público caótico, fornecimento de água irregular.

Cano de água exposto na rua do bairro Nova Floresta
(Foto: Valter Calheiros)

Um  exemplo desse microcosmo da periferia de Manaus é o bairro Jorge Teixeira, localizado na zona Leste e dividido em 13 comunidades. Uma delas se chama João Paulo, formado por três blocos (etapas, dizem em Manaus).

Salatiel Cordovil dos Reis, 61 anos, é um dos moradores da etapa 3 e também a principal liderança comunitária. Para respaldar suas críticas, reclamações e denúncias contra descasos aos moradores, carrega sempre um exemplar da Constituição de 1988.

Um dos maiores “abusos” cometidos pelas autoridades, diz, é a cobrança de tarifa de água a que são submetidos há vários anos os moradores do bairro. A indignação tem um motivo simples: os moradores nunca tiveram fornecimento de água da concessionária privada Manaus Ambiental (nome adotado há dois anos, quando até então se chamava Águas do Amazonas).

Deixei de pagar conta de água há vários anos pois nunca tive água em casa. Meu nome, assim como de outros moradores, foi parar no SPC (Serviço de Proteção ao Crédito), e está lá até hoje. Entramos na justiça para não pagar”, conta Salatiel, que elenca vários outros problemas da cidade: transporte público insuficiente, carência de posto de saúde, ausência de obras de 
melhorias das vias públicas, etc.

No final do ano passado, após muita pressão popular, a prefeitura e a concessionária de água firmaram um acordo para levar abastecimento de água aos moradores da zona Leste e há dois meses, segundo os moradores, a água começou a chegar, embora ainda sem regularidade e qualidade.

Vem suja, poluída, com gosto ruim. A gente usa para lavar louça e tomar banho, mas não para beber. Muita gente daqui de casa passou mal e voltei a comprar água mineral”, diz a dona de casa Ângela de Souza, 27, moradora da rua Erva Doce, no Jorge Teixeira. Ângela também está endividada e com o “nome sujo”. Ela acumula faturas da concessionária de água cujo valor mensal médio é de R$ 600.

Nunca tivemos água e continuamos recebendo faturas com esse valor. Não entendo como eles medem. Por isso decidir nunca pagar”, diz Ângela, cuja rua exibe várias crateras enlameadas por causa de vazamentos feitos pela concessionária para supostos consertos.

A Pública visitou outras ruas do bairro Jorge Teixeira e os bairros Nova Floresta e Grande Vitória, também na zona leste. Em várias partes dos bairros encontrou tubulações de água expostas na rua, sem proteção – até pouco tempo os moradores retiravam água de poços artesianos particulares. No bairro Nova Floresta, um morador foi flagrado retirando água de um cano quebrado da calçada e se justificou dizendo que ela vem mais limpa do que a que vai direto para as casas.

Francisca de Souza mostra contas de água
(Foto: Valter Calheiros)

No bairro Grande Vitória, a aposentada Francisca de Souza, 74, mostrou várias faturas de água que também nunca pagou: apesar de prometido, o abastecimento de água ainda não chegou e ela continua tirando água de um poço artesiano de um vizinho, para quem pagou R$ 700 pelo direito de uso. Sobre o que acha da Copa em Manaus,  Francisca disse: “Se vai trazer benefícios, de certeza não será para mim, nem para a minha família, nem para o meu bairro. Para ser sincera, eu nem sei o que significa isso de benefício de que tanto falam”.

A Manaus Ambiental diz que o fornecimento e a rede de distribuição de água atende a 98% da população de Manaus e que até março pretende ampliar a cobertura para 100%. Também disse ter incorporado 16 mil novas ligações de água ao sistema atual e que vários bairros das zonas Norte e Leste estão sendo atendidos pelo Programa Águas para Manaus (PROAMA).

Em relação à qualidade da água, a Manaus Ambiental informou que a água tratada e distribuída pela concessionária atende integralmente todas as exigências da Portaria 2914/11 do Ministério da Saúde.

Leia também:
- Andrade Gutierrez enfrenta ação do MPT por acidentes de trabalho - Elaize Farias
- Morrendo de sede em Foz do Iguaçu - Zilda Ferreira

Fonte:
http://www.apublica.org/2014/02/manaus-na-copa/

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

USAID: os passos da gestação de um golpe

21/02/2014 - Passo a passo, o plano da USAID para acabar com o governo Chávez
- Natália Viana e Luiza Bodenmuller, da Agência Pública
- extraído da Agência Carta Maior

Documento secreto do WikiLeaks detalha como William Brownfield [foto], hoje secretário-assistente do Departamento de Estado, planejava acabar com o chavismo.

Após o fracasso do golpe contra Hugo Chávez em 2002, a embaixada americana em Caracas resolveu tomar para si a tarefa de reorganizar a oposição venezuelana, apostando em uma estratégia de longo prazo que minaria o poder do governo.

Em agosto de 2004, mesmo mês do referendo revocatório promovido pela oposição com amplo apoio da missão americana, o texano William Brownfield [foto] chegou a Caracas, nomeado por George W. Bush, para assumir o posto de embaixador no país.

Pragmático e sucinto, William Brownfield elaborou um plano de 5 pontos para acabar com o chavismo em médio prazo, como revela um documento do WikiLeaks analisado pela Agência Pública.

O documento secreto, enviado por Brownfield a Washington em 9 de novembro de 2006, relembra as diretrizes traçadas dois anos antes.

“O foco da estratégia é:

1) Fortalecer instituições democráticas,
2) Infiltrar-se na base política de Chávez,
3) Dividir o Chavismo,
4) Proteger negócios vitais para os EUA, e
5) Isolar Chávez internacionalmente”,

escreveu Brownfield, hoje secretário anti-narcóticos do Departamento de Estado – órgão que cuida do treinamento de forças policiais estrangeiras pelos EUA, incluindo em dezenas de países latinoamericanos.

Entre 2004 e 2006, a Usaid realizou diversas ações para levar adiante a estratégia divisada por Brownfield, doando nada menos de US$ 15 milhões a mais de 300 organizações da sociedade civil. 

A Usaid, através do seu Escritório de Iniciativas de Transição (OTI) – criado dois meses depois do fracassado golpe – deu assistência técnica e capacitação às organizações e colocou-as em contato com movimentos internacionais.

Além disso, explica o documento, “desde a chegada da OTI foram formadas 39 organizações com foco em advocacy (convencimento); muitas dessas organizações são resultado direto dos programas e financiamentos da OTI”.

Um dos principais objetivos da Usaid era levar casos de violações de direitos humanos para a corte interamericana de Direitos Humanos com o objetivo de obter condenações e minar a credibilidade internacional do governo venezuelano.

Foi o que fez, segundo o relato do ex-embaixador, o Observatório das Prisões Venezuelanas, que conseguiu que a Corte emitisse uma decisão requerendo medidas especiais para resolver as violações de direitos humanos na prisão La Pica’, no leste do país.

Outra organização, a “Human Rights Lawyers Network in Bolivar State” (rede de advogados de direitos humanos no estado de Bolívar), apresentou à Corte Internacional um caso de massacre de 12 mineiros pelo exército Venezuelano no estado de Bolívar.

O grupo foi criado, segundo Brownfield, “a partir do programa da Freedom House, e um financiamento da DAI que distribui pequenas bolsas no programa”.

A empresa DAI – Development Alternatives Inc – foi de 2004 a 2009 a principal gerente da verba da Usaid no país, tendo distribuído milhões de dólares a diversas organizações a partir da estratégia do governo norte-americano. (Clique aqui para ler mais sobre a DAI)

Ela desembolsou, por exemplo, US$ 726 mil em 22 bolsas para organizações de direitos humanos, segundo o documento do WikiLeaks.

Também ajudou a criar o Centro de Direitos Humanos da Universidade Central da Venezuela. 

Eles têm tido sucesso em chamar a atenção para o Direito de Cooperação Internacional e à situação dos direitos humanos na Venezuela, como uma voz nacional e internacional”, explica o texano Brownfield no despacho diplomático.

Outras áreas nas quais financiamento para ONGs ajudaria a concretizar a estratégia americana incluíam tentativas de neutralizar o “mecanismo de controle Chavista”, que utiliza “vocabulário democrático” para apoiar a ideologia revolucionária bolivariana, nas palavras do diplomata.

OTI tem lutado contra isso através de um programa de educação cívica chamado ‘Democracia entre nós’, cujo princípio era ensinar ao povo venezuelano o que, de fato, significava democracia. 

Programas educacionais dirigidos, como tolerância política, participação e direitos humanos já atingiram mais de 600 mil pessoas”, diz o documento.
  
DIVIDINDO O CHAVISMO

Em seguida, o documento detalha as estratégias para “dividir o chavismo”, baseadas na concepção de que Chávez tentava “polarizar a sociedade venezuelana usando uma retórica de ódio e violência”.

O remédio, na cabeça de Brownfield, seria dar auxílio a ONGs locais que trabalham em “fortalezas Chavistas” e com os “líderes Chavistas” para “contra-atacar a retórica” e promover alianças”.

Os esforços da Usaid neste sentido custaram US$ 1,1 milhão para atingir 238 mil pessoas em mais de 3 mil fóruns, workshops e sessões de treinamento, “transmitindo valores alternativos e dando oportunidade a ativistas de oposição de interagirem com Chavistas, obtendo o desejado efeito de tirá-los lentamente do Chavismo”.

Exemplos são o grupo “Visor Participativo” composto por 34 ONGs formadas e supervisionadas pela OTI, para trabalhar no fortalecimento das municipalidades.

Enquanto Chávez tenta recentralizar o país, a OTI, através do Visor, está apoiando a descentralização”, escreve Brownfield.

Outra iniciativa, a custo superior a US$ 1,2 milhões, promoveu a criação de 54 projetos sociais em toda a Venezuela “permitindo visitas do Embaixador a áreas pobres do país e demonstrando a preocupação do governo dos EUA com o povo venezuelano”, detalha Brownfield.

Esse programa confunde os bolivarianos e atrasa a tentativa de Chávez usar os EUA como um ‘inimigo unificador’”.

Com o objetivo de “isolar Chávez internacionalmente”, o embaixador gaba-se de que a USAID, através das ONG americana Freedom House, financiou viagens de membros de organizações de direitos humanos da Venezuela ao México, Guatemala, Peru, Chile, Argentina, Costa Rica e Washington.

Além disso, o DAI trouxe dezenas de líderes internacionais à Venezuela e também professores universitários, membros de ONGs e líderes políticos para participarem de workshops e seminários, para que eles voltassem aos seus países de origem entendendo melhor a realidade da Venezuela, tornando-se fortes aliados da oposição venezuelana”.

Brownfield termina o documento, escrito em 2006, com um alerta: “Chávez deve vencer a eleição presidencial de 3 de dezembro e a OTI espera que a atmosfera para o trabalho na Venezuela se torne mais complicada”.

De fato, o embaixador saiu do país no ano seguinte, assumindo o mesmo posto na Colômbia antes de ser designado pelo governo Obama para cuidar de cooperação policial com outros países.

Antes de Brownfield assumir a política dos EUA para a Venezuela o escritório de Iniciativas de Transição (OTI) focava sua atuação no fortalecimento dos partidos políticos de oposição – como mostra outro documento do WikiLeaks, de 13 de julho de 2004 – incluindo um projeto de US$ 550 mil destinado a promover consultorias de especialistas latinoamericanos em liderança política e estratégia aos partidos, e um projeto de US$ 450 mil com o International Republican Institute (IRI) – do Partido Republicano - para treinar os partidos de oposição a “delinear, planejar e executar campanhas eleitorais” em escolas de treinamento de campanha”.

Em 2010, sob crescente pressão do governo venezuelano, o escritório da OTI no país foi fechado, e suas funções foram transferidas para o escritório para América Latina e Caribe da Usaid.

Cables Caracas



ESTOS SON LOS 5 PASOS DEL GOLPE SUAVE QUE EJECUTAN EN ESTE MOMENTO EN VENEZUELA

(Original da LaIguana.TV – Venezuela 19/02/2014)

http://www.youtube.com/watch?v=wROZiWk1tNQ

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Internacional/Passo-a-passo-o-plano-da-USAID-para-acabar-com-o-governo-Chavez/6/30315

Nota:
A inserção de imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

A Amazônia que o BNDES financia

05.12.13 - Por Bruno Fonseca e Jessica Mota
- da série #BNDESnaAmazônia - Agência Pública

Pela lei de acesso à informação, a Pública obteve 43 contratos do BNDES com grandes corporações nacionais para empreendimentos na Amazônia.

Nos calhamaços de papel assinados e rubricados diversas vezes por gigantes da economia brasileira – Vale, Eletrobrás, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Votorantim, Alcoa, dentre outros -, saltam cifras de 500 milhões, 1 bilhão, até quase 10 bilhões de reais.

São os contratos de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a uma série de megaempreendimentos na Amazônia, que não são disponibilizados publicamente pelo banco, embora todas essas obras sejam custeadas com o dinheiro de impostos.

A Pública entrou com um pedido de acesso à informação para obter os contratos dos principais investimentos do BNDES em projetos de infraestrutura na Amazônia brasileira e obteve 43 contratos que revelam detalhes sobre o financiamento de projetos de empresas e estados – as garantias exigidas, os compromissos socioambientais acordados – e descobriu que, na prática, muitas dessas obras desrespeitam o que foi assinado, contribuindo para muitos dos problemas que a reportagem vem encontrando ao longo da produção dessa série, motivando inclusive ações judiciais.

O curioso é que isso ocorre apesar da complexidade de procedimentos que o processo de obtenção do financiamento implica. Para pleitear um empréstimo, é preciso enviar um pedido formal, que tem de ser acompanhado de documentação específica de acordo com a modalidade de financiamento – o banco oferece 11 produtos diferentes, cada um com linhas de financiamento específicas.

Esse documento inicial tem que conter dados gerais sobre a operação e dados específicos sobre o projeto em questão, incluindo informações sobre os aspectos econômicos e financeiros da empresa e do seu mercado de atuação; e sobre os aspectos jurídicos, com todos os estudos e licenças de operação e meio ambiente emitidos pelos órgãos responsáveis, como o IBAMA ou a Secretaria de Meio Ambiente.

Caso o projeto apresente algum impacto ambiental, são negociadas medidas de compensação através de outras linhas de apoio paralelas oferecidas pelo BNDES, voltadas ao meio ambiente.

A empresa também responde a um questionário sobre os aspectos e impactos sociais da empresa e do projeto.

Assim, o Comitê de Enquadramento e Crédito do BNDES, formado pelos 23 superintendentes do banco, classifica a operação com base nos riscos ambientais apresentados na proposta.

Só então o banco prossegue com a aprovação e a contratação do financiamento do projeto pela diretoria, formada pelo presidente, vice e sete diretores do BNDES. O contrato de financiamento não é disponibilizado no site do BNDES ou em outra plataforma ao alcance do público.

No caso dos contratos internacionais, o acesso à Pública foi negado, mesmo pela Lei de acesso à informação.

CLÁUSULAS SÃO INSUFICIENTES PARA PROTEÇÃO DE DIREITOS HUMANOS E MEIO AMBIENTE
Através da análise dos 43 contratos aos quais a Pública teve acesso, foi possível perceber que mesmo com tantas exigências formais por parte do BNDES, as cláusulas que dizem respeito à proteção dos direitos humanos e meio ambiente são estipuladas, em sua maioria, através de parágrafos padronizados, e não garantem o cumprimento de compromissos de acordo com a especificidade dos projetos.

Por exemplo, a frase “manter em situação regular suas obrigações juntos aos órgãos do meio ambiente, durante o período de vigência deste Contrato” está presente em todos os documentos analisados, bem como “adotar, durante o período de vigência deste Contrato, as medidas e ações destinadas a evitar ou corrigir danos ao meio ambiente, segurança e medicina do trabalho que possam vir a ser causados pelo projeto”.

Não há detalhes tampouco nas Disposições Aplicáveis aos Contratos do BNDES, destinadas a todos os contratantes, que se limitam a estipular o cumprimento das obrigações estabelecidas por Lei, sem maiores acréscimos.

Até onde se sabe, não haveria uma customização. As cláusulas [socioambientais] não são desenhadas de acordo com o projeto, são cláusulas padrão”, critica Caio Borges, pesquisador da Conectas – ONG que promove os direitos humanos na África, América Latina e Ásia.

Na visão do pesquisador, o processo ideal para esses contratos envolveria três etapas: a elaboração de uma política de direitos humanos, a realização de auditoria em direitos humanos – “que criariam ferramentas operacionais [para] que essa política esteja efetivamente dentro da rotina e dos processos da empresa”, como explica Caio – e a criação de mecanismos operacionais de denúncia e reclamação a exemplo das ouvidorias dos bancos multilaterais, como o Banco Mundial.

Deve existir um canal institucional de diálogo em que uma pessoa que se sinta atingida possa ligar para o banco e dizer que aquele projeto está violando algum direito dela ou que alguma política do banco está sendo descumprida e que aquele projeto não está seguindo os procedimentos que o próprio banco estipula”, diz Caio que acredita que só assim, e com uma melhor fiscalização dos órgãos públicos responsáveis pela concessão de licença, seria possível estancar o uso de dinheiro público em projetos que descumprem as salvaguardas sócio-ambientais tanto no Brasil como em outros países.

DE BELO MONTE A IMPERATRIZ: LICENÇAS QUESTIONADAS
É este o caso de diversos empreendimentos que tiveram suas licenças ambientais questionadas, como a polêmica usina de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará.

Mesmo após a Justiça brasileira determinar paralisação das obras por ilegalidade no licenciamento ambiental, o BNDES não divulgou qualquer modificação ou sanção em relação aos contratos de mais de 25 bilhões de reais firmados com o consórcio responsável, a Norte Energia.

E isso em um contrato que se destaca entre outros do BNDES por haver um maior detalhamento nas condicionantes socioambientais, entre eles, a obrigação de cumprimento das diretrizes dos Princípios do Equador, estabelecidas pelo International Finance Corporation (IFC), do Banco Mundial.

Ali se estipulam as regras para avaliações ambientais; proteção a habitats naturais; segurança de barragens; populações indígenas; reassentamento involuntário de populações; trabalho infantil, forçado ou escravo; projetos em águas internacionais e saúde e segurança no trabalho; dentre outros.

Já na construção da usina produtora de celulose da Suzano, em Imperatriz, no Maranhão, objeto de um contrato de mais de 2,7 bilhões de reais, o BNDES determinou à Suzano “adotar, durante o período de vigência deste Contrato, medidas e ações destinadas a evitar ou corrigir danos ao meio ambiente, segurança e medicina do trabalho que possam vir a ser causados pelo projeto”.

Entretanto, a construção da usina, em andamento no interior do Maranhão, está envolvida na morte de três funcionários, isso após o Ministério Público do Trabalho ter constatado, seguidamente, problemas de segurança no canteiro de obras.

Uma das empresas envolvidas no projeto, a Imetame, chegou a se recusar a  assinar um Termo de Ajustamento de Conduta do MPT (leia mais aqui), o que mostra como, na prática, a lei é ignorada.

- Leia e baixe os 45 contratos que a Pública teve acesso e que estão exibidos no final dessa matéria, acessando o link da fonte:

Fonte:
http://www.apublica.org/2013/12/amazonia-bndes-financia/

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.