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sábado, 7 de setembro de 2013

A 'anti-CNN' russa na guerra das imagens


"A terceira guerra já começou e a maior arma é a informação", dizia Agusto Boal. Esta matéria ilustra bem esta frase.( nota da editora do Blog).

Por Benjamin Bidder em 03/09/2013 na edição 762 - Observatório da Imprensa

Reproduzido do Estado de S.Paulo, 1/9/2013, tradução de Celso Paciornik
   
O programa político noturno com frequência começa com uma mistura de caos e notícias sensacionalistas. Abby Martin, a apresentadora americana que trabalha para o Kremlin, com os lábios ligeiramente separados, está aplicando um batom vermelho, que combina com seu casaco preto, saltos altos e tatuagem no tornozelo. Em seguida, ela brande um malho e destrói um aparelho de TV sintonizado na ‘CNN’, o modelo americano e nêmese de sua empregadora, a rede de TV internacional por satélite ‘Russia Today’.

Esta abertura espetacular tem, ao que parece, a intenção de ilustrar principalmente uma coisa: que a Rússia é agressiva e informada – e parece estar bem no processo.

Há uma foto de Edward Snowden, o informante que os Estados Unidos querem levar para casa para enfrentar acusações, projetada na parede do estúdio. Depois vem uma reportagem sobre o campo de detenção de Guantánamo, que tem ferido a reputação dos Estados Unidos. A Russia Today usa incansável e abundantemente o material de fonte que os EUA fornecem a seus rivais.

Nem os pecadilhos relativamente menores de Washington passam despercebidos. Por exemplo, o programa também inclui uma matéria sobre o ditador do Gabão, Ali Bongo Ondimba, que é apoiado pelo presidente americano Barack Obama.

Há muita gente no Ocidente interessada também em ver uma cobertura crítica à autoproclamada maior potência mundial. A Russia Today já é mais bem-sucedida do que outras estações de TV estrangeiras disponíveis em importantes cidades americanas, como San Francisco, Chicago e Nova York.

Em Washington, 13 vezes mais pessoas veem o programa russo do que as que sintonizam a Deutsche Welle, a estação internacional pública da Alemanha. Dois milhões de britânicos assistem regularmente ao canal do Kremlin. Sua presença online também é mais bem-sucedida do que a de todos seus competidores. E tem mais. Em junho, a Russia Today quebrou um recorde no YouTube ao ser a primeira estação de televisão a receber um bilhão de vistas de seus vídeos.

Estrela

A estação ficou ainda mais triunfal quando contratou Larry King, uma lenda do jornalismo americano de rádio e televisão, que começou a trabalhar na Russia Today neste verão russo. Antes disso, King foi o rosto da CNN por 25 anos. Seus suspensórios são ainda mais chocantes que o provocador batom de Abby Martin. “O melhor entrevistador de TV da América está desertando para os russos”, escreveu o jornal Times, de Londres, em maio.

King e seus novos colegas têm uma missão simples: eles devem “quebrar o monopólio da mídia de massa anglo-saxônica”, disse o presidente Vladimir Putin durante uma visita ao estúdio algumas semanas atrás. A receita de sucesso dos russos tem três ingredientes: sex appeal, que tem sido atípico na maioria dos canais noticiosos; uma postura rigidamente antiamericana; e um fluxo interminável de dinheiro do Kremlin.

Desde 2005, o governo russo aumentou em mais de dez vezes o orçamento anual do canal, de US$ 30 milhões para mais de US$ 300 milhões. O orçamento da Russia Today cobre os salários de 2,5 mil empregados e contratados em todo o mundo, 100 deles apenas em Washington. E o canal não teme cortes orçamentários agora que Putin emitiu um decreto proibindo seu ministro das Finanças de tomar medidas neste sentido.

A liderança de Moscou vê os recursos que entram no canal como dinheiro “bem investido”, diz Natalya Timakova, a assessora de imprensa do primeiro-ministro russo, Dmitry Medvedev. O governo também gastou muito dinheiro no centro de transmissão na zona nordeste de Moscou, para o qual a Russia Today se mudou em maio. A estação, citando requisitos de confidencialidade, não está disposta a informar o preço exato. Nos terrenos de uma antiga fábrica de chá soviética, a emissora está criando agora programação em árabe, inglês e espanhol.

A Russia Today se vê como uma defensora de um público global crítico do Ocidente. Mas também se propõe a amplificar as dúvidas próprias de europeus e americanos que foram obrigados pelos acontecimentos recentes a se perguntar se seus próprios países – como a Rússia e a China – são corruptos e controlados por um aparelho de inteligência invasivo.

De qualquer modo, a estação tem uma rara bossa para a propaganda. A idade média dos editores é inferior a 30 anos e quase todos falam inglês fluente. Para apimentar as notícias, os diretores às vezes usam efeitos especiais estilo Hollywood, como jatos israelenses que fazem uma pirueta virtual pelo estúdio antes de largarem suas bombas sobre um mapa da Síria.

Arma

Margarita Simonyan é a mulher que transformou a Russia Today na arma mais eficaz na batalha por influenciar as opiniões do público global. Em seu escritório no oitavo andar de sua sede em Moscou, a editora-chefe tem ícones da Igreja Ortodoxa sobre a sua escrivaninha e uma dezena de telas cintilando ao seu redor. Putin colocou Margarita à testa da estação noticiosa em 2005. Na época, ela tinha apenas 25 anos e era criticada como uma repórter desconhecida pelo enxame de jornalistas que acompanha o presidente em reuniões.

A missão de Margarita é evitar que a Rússia perca uma imagem de guerra como a que perdeu em agosto de 2008. Na ocasião, tanques russos avançavam pelo sul do Cáucaso, parando somente às portas de Tbilisi, a capital do pequeno país da Geórgia. O jovem presidente georgiano na época, Mikhail Saakashvili – eloquente e educado nos Estados Unidos –, apareceu em todos os canais para condenar a Rússia como agressora, apesar de ele mesmo ter provocado a guerra ao ter sido o primeiro a ordenar a invasão da república separatista da Ossétia do Sul, que mantém laços estreitos com a Rússia.

A CNN mostrou imagens de edifícios destruídos, alegadamente tiradas após um bombardeio russo da cidade provincial georgiana de Gori. Segundo a Russia Today, porém, os disparos tinham sido feitos da capital da Ossétia do Sul, Tskhinvali, após um ataque georgiano. “Não há nenhuma objetividade”, diz Margarita, “somente aproximações da verdade pelo máximo de vozes diferentes”.

Perda

A desconfiança da mídia doméstica é também maior do que nunca nos Estados Unidos. A CNN, por exemplo, enfrenta uma perda maciça de espectadores. E políticos americanos às vezes tornam particularmente fácil aos russos lançarem seus ataques. Quando um avião transportando o presidente boliviano Evo Morales foi obrigado a pousar em Viena porque agências de inteligência americanas acreditavam que Snowden estava a bordo, Abby Martin expressou o que muitos estavam pensando: “Quem diabos Obama pensa que é?”

Ao mesmo tempo, a Russia Today também usa uma mistura caótica de teorias da conspiração e propaganda bruta. No programa The Truthseeker, o ataque na Maratona de Boston, em que dois chechenos mataram três pessoas com bombas, em abril, foi transformado numa conspiração do governo americano.

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Benjamin Bidder, do Der Spiegel

Fonte:http://observatoriodaimprensa.com.br/news/view/_ed762_a_anti_cnn_russa_na_guerra_das_imagens

Leia também: http://noticias.terra.com.br/mundo/oriente-medio/,b214489e9a3f0410VgnCLD2000000dc6eb0aRCRD.html

http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2013/05/1273903-rebeldes-sirios-usaram-armas-quimicas-afirma-inspetora-da-onu.shtml


sábado, 22 de setembro de 2012

Toda araruta tem seu dia de mingau


22/09/2012 - O espetacular desfile do Grêmio Recreativo Escola de Samba Unidos no Mensalão Tucano (GRES-UMT), no Grupo Especial
- por Antonio Fernando Araujo (*)


Calma gente, toda araruta, sim, tem seu dia de mingau. Mino Carta já não escreveu na CartaCapital "nuvens plúmbeas estacionam no horizonte?"

e prosseguiu: "Desde já, CartaCapital avisa. Tão logo termine o julgamento do chamado 'mensalão petista', nossa capa vai soletrar: E AGORA VAMOS AO MENSALÃO TUCANO.

Temos um excelente enredo a desenrolar. Se mudança houve, que seja." 

E, aqui pra nós, não adianta querer forçar a barra, como insiste a talentosa Rede Globo, apelidando-o de 'mensalão mineiro', pois na verdade este 'mensalão petista', já em fase final de julgamento, ficará para a história apenas como o remanescente atávico do mesmo sistema nefasto que há tempos irriga com uma grana extra, políticos e seus Partidos, aquele que possui, desde sua origem, a experiência, a plumagem e o DNA dos que conduziram com destreza essa modalidade de patifaria: o MENSALÃO TUCANO. Pois foi lá, no ninho azul e amarelo deles, inspirados e chocados cuidadosamente por Eduardo Azeredo quando governador tucano de Minas Gerais, que nasceram todos os demais mensalinhos e mensalões, patéticos com suas variadas cores e sinistros personagens a promoverem a descrença e a deformação dos políticos e da atividade política neste país.
Augusto Boal

No entanto, nesse desfile alegórico, nessa quase pantomina que logo estará na avenida, há que se levar em conta que "o teatro é uma representação do real, não é o real, ainda que saibamos todos que a imagem do real é real enquanto imagem". Ao garantir isso em seu livro "O Teatro como Arte Marcial", Augusto Boal antecipou aquilo que décadas mais tarde se tornaria a narrativa de uma comédia encenada numa monumental passarela do samba de qualquer cidade brasileira, o enredo trágico e deslumbrante de uma Escola de Samba irreal, mas que, enquanto imagem que expressa a afirmação do mestre do Teatro do Oprimido, é ficção real, dolorosamente real e dramaticamente ficção.

Assim sendo galera, vâmu qui vâmu a esse turbilhão de alegorias onde vida e arte se entrelaçam, porque prestes a terminar o desfile do Mensalão Petista, se apressa para entrar fulgurante na avenida, o fantástico Mensalão Tucano.


Antes porém, e como acaba de divulgar o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), o tucano PSDB, que a “grande imprensa” da Família GAFE (Globo/Abril/Folha/Estadão) considera seus membros, os bastiões brasileiros da moral, dos bons costumes e da anticorrupção, é o partido que tem mais pessoas Fichas-Sujas entre os candidatos a prefeito no Brasil, os chamados Barrados do Ficha Limpa, nestas "Eleições 2012". Assim, no Grupo de Acesso, composto por todos os Barrados do Ficha-Limpa, o tucano PSDB não renunciou às suas origens, acabou de sagrar-se Campeão. Portanto sua participação no Grupo Especial já está garantida.


Agora vamos ao desfile desse Grupo Especial, do qual participa o já veterano Grêmio Recreativo Escola de Samba Unidos no Mensalão Tucano (GRES-UMT).

Já escalado pra Comissão de Frente estará o Satiagraha, ficando a refinada coreografia a cargo de Gilmar Mendes, a Suprema Majestade do Supremo dos Supremos. Segredos, há tempos guardados sob a toga, vão surpreender na avenida.

A Privataria Tucana, candidata ao Prêmio Jabuti-2012 em uma de suas categorias, virá a seguir num deslumbrante Carro Abre-Alas, onde o destaque, claro, é o incansável e insistente José Serra, fantasiado de querubim ao lado do padre Marcelo Rossi. Vibrando com ele, o Mestre de Bateria, o imbatível e sedutor FHC com sua Pasta Rosa onde guardará as batutas de maestro de oito anos de carnavais em notas de 1000. Se der tudo certo e ele for novamente guindado a Mestre de Bateria no ano que vem, elas serão distribuídas generosamente entre todos os ritmistas.

À frente deles e deslizando esplêndida como um cisne, sua Rainha, outra não poderia ser senão a vistosa Vanessa Mendonça, a mulher do grande Patrono da Escola, o benemérito bicheiro Carlinhos Cachoeira.

O teatral Roberto Jefferson, digníssimo presidente do PTB, é o puxador do samba-enredo "O Mensalão Campeão", que embora não tenha sido composto por ele, promete levantar bem alto a galera de tanto susto e indignação, depois que a merda toda vier à tona e se espalhar pelas arquibancadas, frisas e camarotes. O Primeiro Mestre-Sala, claro, é Demóstenes Torres (ex-DEM) e sua Porta-Bandeira, o Agripino Maia travestido, do DEM, portando a bandeira azul e amarelo tucana, imbatíveis quando tratam de honrar com galhardia o nobre apelido que lhes deram, C&H, de Cinismo & Hipocrisia.

Por seu turno e por não ter sido tão habilidoso quanto seu colega Demóstenes, José Arruda (ex-DEM, ex-governador do DF e que já foi flagrado nas patifarias pela segunda vez), por isso mesmo, é o Segundo Mestre-Sala. Sua Porta-Bandeira é a Rosinha Garotinho, ex-governadora do Rio, como seu marido e tutor Anthony Garotinho, ele veterano, mas ela, no caso, ainda uma aprendiz. 


Compondo a Velha Guarda do GRES-UMT, entrarão em peso e em volta do Banestado, toda a Ala do DEM, com o Jorge Bornhausen fantasiado de Madre Tereza de Calcutá, já que ele nunca escondeu sua ojeriza a pobre, seguido por ACM Neto (candidato a prefeito de Salvador e "in memoriamrepresentando o insigne avô), Rodrigo Maia (candidato a prefeito do Rio), o " dad " César Maia (ex-prefeito do Rio) e seus colegas tucanos mais emplumados e experientes, Sérgio Guerra, Álvaro Dias, Eduardo Azeredo (o histórico grande artífice de todos os mensalões), Marconi Perillo, Roberto Freire (o "tucano de periferia"), o Kassab (o "tucano regra três") e o Garotinho que, embora não sendo demo nem tucano, na última hora pediu pra entrar nessa Ala, pois quer ficar de olho na Rosinha, já que não confia nem um pouco que o trapalhão do Arruda possua gabarito suficiente para dar a ela boas aulas de rodopio com a bandeira azul, verde e branco do Mensalão do DEMOS. Como aprendiz que ela ainda é, não convém se deixar flagrar ao escorregar e cair na tentação em plena avenida, diante dos jurados do "Samba, Tradição & Fuzarca" (STF) e das câmeras ocultas dos arapongas X-9, tipo Dadá do Cachoeira.

Já o contrito Bispo Macedo, refinado como ele é, astuto Diretor de Harmonia, não teve maiores dificuldades. Ali mesmo e em troca dos trocados abençoados, ele concordou com o pedido do Garotinho, e sem pestanejar fez uma prece com o olhar revirado pro Céu - que os maledicentes logo interpretaram como uma nova versão da Oração do Mensalão -, piscou duas vezes pro evangélico Garotinho, sem titubear pegou dele o calhamaço de notas e, numa rapidez incrível, acomodou tudo num esconderijo secreto entre suas pelhancas do tronco das coxas com as nádegas.

Já a turma dos garis será comandada por ninguém menos que Boris Casoy, claro, um privilégio que depois de muito empenho, ele conseguiu com o ilibado governador Cabral, um ex-tucano, acatando uma recomendação do seu 'capo' Fernando Cavendish, agora dono nas sombras da Empreiteira Delta, por conta de uma carona rapidamente aceita no jatinho do empresário pra próxima temporada de compras parisienses com todas as mulheres, primas, cunhadas, amantes e sogras dispostas em caravana a renovar por lá o estoque de calçados da nova temporada.

Como sabemos Casoy possui uma indiscutível afinidade com essa turma de macacão laranja da Comlurb, desde quando no Natal de 2010 os desancou no ar, ao não perceber que o áudio ainda estava aberto. Nelson Jobim, fantasiado com uniforme camuflado de selva, concreto e asfalto se encarregará da segurança contando com o apoio velado do ex-Secretário de Segurança da Rosinha Garotinho, Álvaro Lins, que embora se encontre na cadeia, condenado que foi por sua exemplar conduta corporativa no gerenciamento de milícias devidamente conciliada com a pose de Secretário de Governo, prometeu um suporte discreto, mas eficaz.

Os jurados estarão sob o comando de Joaquim Barbosa, que, com o egrégio assentimento de quase todos os seus pares do órgão máximo do "Samba, Tradição & Fuzarca" (STF) também será encarregado das apurações. Perfeito, da forma como ele exigiu. Alegando dores insuportáveis no quartos praticamente impôs que nesse caso, primeiro se apure os votos e depois, se for assim tão necessário, se julgue cada um dos quesitos dos carnavalescos, num delírio tão fantasioso que a Corte Internacional que rege os carnavais do mundo todo, tão logo soube, pediu vistas.

Roberto Gurgel, o exemplar Procurador Geral da Liga, seu manhoso e celebrado assistente, assentiu levantando o dedão pro alto e ao dar o ok pra essa artimanha digna de registro nos anais forenses, consagrou uma prática jurídica que ainda vai dar muita dor de cabeça aos futuros carnavalescos que porventura pensem em burlar as ancestrais regras de presunção de inocência e virgindade das candidatas a Rainha da Bateria, dos destaques e passistas de samba no pé, bem como da necessária apresentação de provas insofismáveis que são habilidosas Portas-Bandeiras para um desfile impecável em termos puramente burlescos no surrupio do dinheiro público sem se deixar flagrar. Dessa forma, Barbosa prometeu que os resultados sairão antes das Olimpíadas de 2016 ou antes dele ficar entrevado de vez, o que acontecer primeiro.

Dadá, homem da absoluta confiança de seu amigo Carlinhos Cachoeira e seus colegas arapongas ficarão com o encargo de fingir que empurram os carros alegóricos, na verdade movidos por um motorzinho que eles produziram "Sem Autorização da Justiça" e muito menos do STF, embora digam que este teria feito vista grossa por se tratar de amigos tucanos, "tutti buona genti".

Na especial Arquibancada 7, reservada aos turistas mais bem aquinhoados, veremos José Sarney, tendo a tiracolo, Renan Calheiros e Jader Barbalho, todos do PMDB, um do Senado e outro da Câmara, um de cada lado, cercados por garçons, serventes e seguranças, estes a cargo das honradas milícias do deputado tucano Marcelo Itagiba, depois que ele defenestrou delas o Álvaro Lins. O senador Presidente do Congresso, liderando e sendo reverenciado por seus pares de homens e mulheres probos, tanto os das Bancadas Ruralista e Evangélica quanto os dos seus apaniguados no Ministério dos Transportes e no de Minas e Energia, todos presentes para aplaudir o desfile tucano, estarão muito bem instalados em poltronas confortáveis, bem nutridos, cercados de geladeirinhas térmicas recheadas com vinhos, quitutes e guloseimas, fartos de tantos privilégios.

Só falta a mídia, representada na sua totalidade pela impoluta Família GAFE da Imprensa e seu partido, o PIG, o Partido da Imprensa Golpista. Toda a cobertura jornalística e televisiva ficará a cargo do sinistro, mas casto, Roberto Civita, da Veja (mas não leia) tendo como Primeiro Assistente o Policarpo Jr., da Veja-Brasília, amigo, mais do que íntimo, do ilustre Patrono da Escola, o mais do que afamado bicheiro Carlinhos Cachoeira. Os comentaristas escalados para o "aquário" serão o Reinaldo Azevedo, também da Veja, fantasiado de matuto caipira que, por sinal, lhe cai muito bem e o fugitivo Diogo Mainardi (ex-Veja) que, devido as circunstâncias, virá fantasiado com máscaras venezianas pra não dar na vista, mas criativamente adaptadas das dos Irmãos Metralha. Todos do primeiro escalão, dessa que é ou já foi a maior revista semanal da América Latina, embora o Alexandre Garcia, da Globo News, garanta, devido sua intimidade de longa data com os porões da ditadura militar, que há controvérsias no submundo da máfia midiática.

Para o início dos desfiles escalaram a Miriam Leitão, do Globo, em especial pra entrevistar o carnavalesco da Escola, o irrequieto e inefável Geraldo Alckmin, o truculento tucano governador de São Paulo, destacado apreciador de xuxu, "a la Opus Dei". Na verdade a única função da Miriam ali é agourar - especialista que é nesse metier - pra que as demais escolas desfilem mal e a GRES-UMT volte a ser, uma vez mais, a campeã das urnas paulistanas, como tanto deseja o carnavalesco Alckmin. Pra pista também, infiltrado entre os passistas, escalaram o experiente Augusto Nunes (já andou por tudo quanto é mídia, agora está na Veja e, como não poderia deixar de ser, também na Globo News) pra que ele recorde com entusiasmo juvenil, seus tempos de estudante quando, infiltrado no movimento estudantil, funcionava maravilhosamente bem como alcaguete da ditadura.

Pros camarotes, por conta da sua Imortalidade adquirida a prestações, mas com o aval da família Malina, digo Marinho, vai o Merval Pereira, do Globo, fantasiado com o Fardão da Academia e, claro, representando a tal família. Vai levar vários exemplares dos seus dois únicos livros que escreveu, mas que nem a família leu. Não haverá autógrafos, servirão apenas para distribuição gratuita entre aqueles que já estiverem completamente embriagados, pois no dia seguinte jamais saberão ao certo como aquele troço foi parar nas suas mochilas. Entretanto, sua mais destacada missão será entrevistar o William Waack, da Globo News, que no camarote dos EEUU, representará o governo americano e o casal William Bonner & Fátima Bernardes, da TV Globo, que no britânico, posarão como se fossem Suas Altezas Imperiais Britânicas, tudo por conta do servilismo colonial, ainda muito em voga e considerado chique entre esses súditos da nobreza capitalista mundial.

Pra "Dispersão", na Praça da Apoteose, foi designada a Eliane Cantanhede, da Folha e da Globo News. Ninguém melhor que a Musa da Febre Amarela, já que não se pode imaginar uma musa que não seja tão dispersiva, roxa de carteirinha, especializada que é em qualquer tratamento de doenças graves ou leves em geral, biomas de partes remotas da região amazônica, Muamar Khadafi, Bashar-Al-Assad e outros árabes notáveis e suas vertentes islâmicas, além das sutilezas tecnológicas de caças ultra modernos adequados pra nossa FAB.

Já pro meio da galera das últimas arquibancadas, as do povão, ainda cogitaram escalar o Luiz Carlos Prates, agora no SBT, depois que foi expulso da RBS, a Rede Brasil Sul, afiliada da Rede Globo, por conta das insuportáveis asneiras que ele vociferava no ar atribuindo  à Classe C a culpa pelos transtornos no trânsito e as mortes nas estradas. Mas quando chegaram a conclusão que, no ardor da sua demência ele seria capaz de, em pleno Setor 11 da Apoteose, o dos personagens distintos desse vasto Brasil dos excluídos, aqueles conhecidos como Classe E e alguns penetras da F, já no limiar da "Dispersão", quando todos estão alvoroçados, ele tirar a roupa só pra mostrar que por baixo estará fantasiado de "chiquita bacana, lá da Martinica" com apenas uma vulgar casca de banana nanica enfiada entre as pernas como um tapa-sexo pouco criativo, acharam por bem desconvidá-lo, e por medida de segurança, ainda interná-lo no Hospital Souza Aguiar, pra desfrutar do inigualável conforto do maior hospital público da América Latina, no lado mais melancólico e esquecido do centrão do Rio.


Assim, com essa equipe, cuja parte técnica estará integralmente sob controle do Arnaldo Jabor, da CBN, os telespectadores terão a garantia de que não assistirão porra nenhuma do que realmente vai acontecer na avenida, mestre que ela é em escamotear a verdade, inventando reportagens (a Dilma Roussef-Dulce Maia, do Elio Gaspari, no Globo e na Folha), imagens (a Ficha falsa da Dilma, na Folha), entrevistas (Renato Maurício Prado, ex-Sport TV, na Veja-Rio e a recentíssima envolvendo supostas declarações do Marcos Valério, na Veja), eventos (a bolinha de papel na careca do Serra, no Globo), declarações (todas as do Lula, habilmente distorcidas, como as supostamente ditas por ele no encontro com Gilmar Mendes e Nelson Jobim), pois jornalismo pra essa turma nada mais é do que botar nas bancas e na casa dos assinantes, em primeiro lugar, somente aquilo que for agradável ao paladar mediano, ao juntar em qualquer formato, lazer com fofocas de "celebridades", patifarias falsas e verdadeiras dos políticos com dietas seguras pra emagrecer, pincelando isso tudo com as disputas por fiéis e seus dízimos entre líderes evangélicos e as últimas descobertas da medicina com alguns lançamentos da informática.

Isso vem a ser quase a totalidade do que necessitam para garantir ou aumentar a receita, sem descuidar, claro, da indispensável "aura de credibilidade" que deixam transparecer em algumas páginas raivosas que baixam a ripa exclusivamente no PT e nos textos recheados de invencionices da lavra da maioria de seus articulistas, verdadeiros paus-mandados a soldo dos patrões, para que uns e outros executem algo similar ao papel que a cereja, com galhardia, cumpre no Martíni.

Me ocorre lembrar, que foi nesses moldes que Günter Wallraff, jornalista e escritor alemão, na década de 1970, aludiu ao jornal Bild, do grupo empresarial alemão Springer, quando escreveu o seu "Fábrica de Mentiras". E é sem tirar nem por, o que Sylvia Debossan Moretzsohn, jornalista, escritora e professora da Universidade Federal Fluminense, escreveu na Edição 710, do Observatório da Imprensa, em seu artigo de 04/09/2012, "longa tradição das 'entrevistas' inventadas". Nossa mídia GAFE tem se mostrada em geral, uma aluna, dessas que nunca faltam aos ensaios nos barracões, praticante exemplar desse jornalismo de esgoto.

Mas, voltemos ao desfile pra concluir. Finalmente, o presidente da Liga, já contemplado com uma extensa ficha corrida, o honrado Daniel Dantas, dono do Grupo Opportunity, assessorado pelo não menos íntegro Índio da Costa, o ex-vice do Serra, que recentemente levou à falência o Banco Cruzeiro do Sul, em meio à denúncias cabeludas de malversação do dinheiro dos aplicadores e pelo ativo empreendedor e homem de visão, Ricardo Teixeira (ex-CBF, em conluio com João Havelange e, claro, a mando da família Marinho) já estabeleceu que, no Grupo Especial, aquela Ala Tucana campeã dos Barrados do Ficha-Limpa, deve compor-se com a jovem e promissora Ala dos Tucanalhas do Amanhã, sob a liderança do Otavinho Frias, dono da Folha, o jornal que, além de estampar uma ficha falsa da presidenta Dilma Roussef e não pedir desculpas pela safadeza, não se cansou de ceder seus veículos a notáveis figuras da ditadura militar, para a prisão, tortura e morte dos que, na década de 1970, bravamente, a ela resistiam em São Paulo.

- Aí, não tem pra mais ninguém, está tudo dominado, anunciou em manchete o Estadão, a mando do Serra, e emocionado e aos berros o Paulo Preto, tudo pronto enfim pra ser o Mensalão Campeão, disse ele, enredo e apresentação tão esperados do invencível Grêmio Recreativo Escola de Samba Unidos no Mensalão Tucano (GRES-UMT) que não perde nenhum dos desfiles de São Paulo, há quase 20 anos.

Como viram, esse Mensalão Tucano não é coisa pra principiantes, dado o número, patentes e biografias dos envolvidos. Assim, esses estreantes do Barrados do Ficha-Limpa e que agora, como campeões do Grupo de Acesso, vão participar da Ala dos Tucanalhas do Amanhã, no vitorioso Grêmio Recreativo Escola de Samba Unidos no Mensalão Tucano (GRES-UMT), podem se orgulhar e estar certos de que encontrarão nele o ambiente propício ao desenvolvimento de suas habilidades, já inicialmente testadas e comprovadas nessa recente vitória.

Portanto, desde já, podem todos, novatos e veteranos, encomendar o chope. Com uma ressalva. Saibam que essa distribuição e seu rigoroso controle ficarão exclusivamente a cargo do confiável e abstêmio mineiro Aécio Neves, o rei do bafômetro carioca, que há longa data vem acompanhando das coxias e do seu apartamento do Leblon, todos os ensaios da Escola, tendo já consumado com êxito alguns novos lances experimentais nos desfiles da Belo Horizonte das Alterosas. É o mais bem cotado come quieto, candidato único a suceder o atual presidente da Liga.


"Nuvens plúmbeas estacionam no horizonte", disse Mino Carta, mas as metáforas que protagonizaram este enredo e pretenderam interpretar Boal sob as luzes de uma passarela do samba qualquer, a avenida onde ainda vai desfilar o Grêmio Recreativo Escola de Samba Unidos no Mensalão Tucano são apenas componentes desse imenso palco de um teatro do tamanho do Brasil oprimido, onde apenas veremos uma representação do real, não o real.

Afinal, dizem os esperançosos, a realidade às vezes e ao final das contas, costuma ser até um pouco melhor do que a ficção, do tipo dessa que acabamos de descrever.

"Se mudança houve, que seja." Tomara!


(*) Antonio Fernando Araujo é colaborador deste blog



domingo, 18 de março de 2012

Augusto Boal e o Teatro do Oprimido - No palco, soluções para a vida real

15/03/2012  - Atividades homenageiam Augusto Boal e o Teatro do Oprimido
Da redação - Brasil de Fato

Dramaturgo completaria 81 anos nesta sexta-feira, 16/03/2012

Diversas atividades celebrarão, a partir desta sexta-feira (16), o Dia Mundial do Teatro do Oprimido. A escolha da data é uma homenagem ao criador do Teatro do Oprimido, o carioca Augusto Boal, que completaria 81 anos em 2012.

Nascido em 16 de março de 1931, o diretor de teatro, dramaturgo e ensaísta dedicou a vida e obra em favor das lutas sociais. Baseadas em uma estética preocupada com as questões políticas e sociais, as técnicas e práticas do dramaturgo foram difundidas em todo o mundo.

No Centro de Teatro do Oprimido (CTO), as atividades iniciam às 19h, com a apresentação de pouporrit musical do espetáculo Coisas do Gênero, com elenco do CTO. A exibição do documentário "Augusto Boal e o Teatro do Oprimido", do cineasta Zelito Viana, mostrará a trajetória de vida e obra do dramaturgo. O Centro do Teatro do Oprimido fica na Avenida Mem de Sá, 31, no bairro da Lapa, no Rio de Janeiro.

A programação também contará com a apresentação de performance internacional com elenco da Guatemala, Argentina, Bolívia, Chile, Uruguai, Peru, França, Alemanha, Espanha, Itália e Brasil, e com o lançamento do livro "A Estética de Boal – Odisséia pelos Sentidos", de Flávio Sanctum.

Já no dia 17, haverá apresentação do Grupo de Teatro do Oprimido do Complexo da Maré – GTO Maré, às 15h no Museu da Maré. O grupo formado por adolescentes criou a peça "Quem pode leva", que levanta a discussão sobre o preconceito que os jovens sofrem por morarem na favela. O Museu da Maré está localizado na Avenida Guilherme Maxwell, 26, em frente ao PSF – Programa de Saúde da Família – Augusto Boal, uma homenagem da Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro.

Ainda nesta sexta-feira (16), será lançado o Projeto Centro Interuniversitário de Memória e Documentação (CIM), locado na Universidade Federal do Rio de Janeiro. A proposta, financiada pelo Ministério da Educação, é criar um espaço para a divulgação de acervos artísticos e científicos que potencialize ações e políticas de preservação do patrimônio material e imaterial brasileiro.

A data de lançamento foi escolhida em homenagem a Boal, já que a restauração e divulgação de seu acervo são projetos-piloto do CIM, em parceria com a Faculdade de Letras (FL), a Casa da Ciência, a Reitoria da UFRJ e o Instituto Augusto Boal.

De 16 a 23 de março serão realizados diversos eventos para resgatar a trajetória do artista, falecido em 2009. No último dia, será concedido a ele o título de doutor honoris causa (post mortem) pela Faculdade de Educação (FE) da UFRJ. A programação completa pode ser conhecida aqui.

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05/05/2009 - Reeditamos a entrevista: "No palco, soluções para a vida real"
concedida a Nestor Cozetti, do Rio de Janeiro (RJ) - Brasil de Fato

Mais importante do que assistir a um filme, diz o dramaturgo, é que as pessoas pensem também ser capazes de fazer filmes Augusto Boal inovou e reinventou o teatro”, já disse sobre ele o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Mais importante do que assistir a um filme, diz o dramaturgo, é que as pessoas pensem também ser capazes de fazer filmes. Ou que as pessoas que recebam um livro para ler sejam também incentivadas a escrever livros elas mesmas. Essas afirmações definem não apenas Boal como todo o seu trabalho, mais que conhecido – praticado nos cinco continentes. Criador do Teatro do Oprimido, ele foi o diretor artístico do Festival Nacional do Teatro Legislativo, que aconteceu entre os dias 25 e 30 de outubro, no Rio de Janeiro.

Nesta entrevista ao Brasil de Fato, Boal fala de seu trabalho e conta que a primeira lei brasileira de proteção às testemunhas de crimes importantes surgiu a partir de um projeto do Centro do Teatro do Oprimido, no qual os grupos populares apresentavam espetáculos em que o público é convidado a entrar em cena, substituir o protagonista e buscar alternativas para o problema encenado.

Brasil de Fato – O que é o Teatro Legislativo?
Augusto Boal – O Teatro Legislativo foi a necessidade que nós sentíamos, antes de eu ser vereador, de transformar em lei aquilo que era um desejo manifestado pela população do Teatro Fórum. Neste, você apresenta o problema, e não as soluções possíveis. Por exemplo, o Shakespeare tem uma peça, Hamlet, em que ele fala que o texto deve ser um espelho, e esse espelho deve refletir a realidade como ela é: com nossos vícios e nossas virtudes. Isso é a opinião dele, o teatro é um espelho. Eu acho isso bonito e tudo. Mas ao mesmo tempo acho que a gente não tem que pensar só em compreender a realidade. Tem que procurar transformar a realidade. Esta sempre deve ser passível de uma transformação e vai necessitar sempre da transformação. Então, eu gostaria que o teatro fosse um espelho mágico, no qual você penetra e, não gostando da imagem que ele reflete, você vai lá dentro e lá modifica essa imagem. A gente sentiu que estava tendo idéias muito boas e tudo isso, mas na realidade a gente precisava de alguma lei. Mesmo que a gente saiba que as leis não são respeitadas no Brasil, é melhor tê-las ao nosso lado do que contra, contra nós. Então a gente começou a pensar na idéia de transformar em lei, entrando para a Câmara dos Vereadores. E eu fui candidato, fui eleito, por quatro anos.

BF – Por qual partido?
Boal – Pelo Partido dos Trabalhadores. Durante quatro anos a gente criou quase 20 grupos, no Rio de Janeiro inteiro, fazendo o Teatro Fórum. De 1993 a 1996. Chegamos a produzir quase 50 projetos de lei. Desses, 13 foram aprovados e hoje são leis. Algumas foram leis bastante localizadas.

BF – Projetos de lei surgiram dessas encenações?
Boal – Sim, com a platéia entrando em cena, havendo a discussão contraditória. Quer dizer, a peça trazia um problema, mas o primeiro espectador não achou uma solução boa, contra o segundo, o terceiro, o quinto. Então, fazendo muito o Teatro Fórum, a gente chegou a poder dizer: bom, o que eles estão querendo é uma lei nesse sentido. E eu apresentava essa lei. Entre elas, a primeira lei brasileira de proteção às testemunhas de crimes. Não havia nenhuma lei que protegesse as testemunhas. Nós fizemos durante meio ano, nas ruas, nas igrejas, nos sindicatos, nas escolas,em toda parte a gente ia, levava as peças e depois fazia a discussão teatral, com o espectador entrando em cena e dando sugestões. E aí, essa foi a primeira lei brasileira, que depois se transformou em uma lei estadual no Espírito Santo. E passou também a ser a base da lei federal.

BF – Fruto de uma encenação do Teatro do Oprimido?
Boal – Sim, de vários grupos, sobre o mesmo tema. Claro que depois o tema foi para Brasília, se ampliou enormemente, porque as possibilidades federais são bem maiores que as municipais. Quando eu saí (da Câmara de Vereadores) a gente continuou fazendo isso. Tem agora três ou quatro leis aprovadas depois que eu saí, porque é muito mais difícil manter a lei, sem ter um vereador ou deputado, assim totalmente empenhado.

BF – Como nasceu o Teatro do Oprimido?
Boal – Em 1970,quando eu trabalhei uma forma chamada Teatro Jornal, eram doze técnicas para ajudar as pessoas a transformarem notícias de jornal em cena teatral. Foi aí a semente do Teatro do Oprimido. O que aconteceu é que a gente não podia mais fazer teatro, tinha censura, invasão da polícia, prisões e tudo. Aí a gente falou: em vez de dar o produto acabado, vamos dar os meios de produção, a platéia produz o seu teatro.

BF – Um meio de produção cultural?
Boal – Sim, e teatral. Depois eu fui exilado, em 1971. Antes fui preso, torturado, aquela coisa “normal” da época. Fui banido, expulso do país. Na Argentina, comecei a desenvolver formas de teatro, como, por exemplo, o Teatro Invisível, em que agente vai para a rua e faz uma cena, e não revela que é teatro, para que todo mundo participe. Depois, no Peru, é que eu comecei com o Teatro Fórum, em que agente apresenta o problema, o espectador entra em cena e mostra alternativas. Então fui para Portugal, de lá passei a trabalhar em quase todos os países da Europa.

BF – E nesses países ficaram frutos de seu trabalho?
Boal – Sim, até hoje e cada vez mais. Na internet existe uma página internacional do Teatro do Oprimido.

BF – Qual o endereço?
Boal – O nome é em inglês, porque a página é holandesa: www.theatreoftheoppressed.org/en. Então, você acessando aí vê que tem um mapa-mundi e aí você clica em qualquer continente e aparecem todos os países onde se pratica o Teatro do Oprimido. São, setenta, oitenta países. É o primeiro método da América Latina, de um continente do Hemisfério Sul, que é praticado no mundo inteiro.

BF – Por que você e o Teatro do Oprimido são excluídos da grande mídia?
Boal – Eu acho que todos aqueles artistas que fazem alguma coisa que é extremamente útil para a população e tudo, mas que não tem um gancho, como por exemplo, um ator de televisão conhecido, ou algum outro evento que individualize as pessoas, esses são excluídos. Não é o Teatro do Oprimido, nem eu. É qualquer artista que não fizer assim. É excluído mesmo. Em geral, a mídia se interessa pela individualidade, só. E o que nós estamos tentando é fazer com que o Teatro do Oprimido seja usado em todo o tecido social. Não é ver, por exemplo, onde estão os talentos da favela da Maré. Nós não queremos transformá-los em atores de televisão, não é isso. Agora estamos lançando um projeto novo, que é a Estética do Oprimido. Nosso objetivo não é descobrir qual é o melhor poeta de Jacarepaguá, ou qual é o melhor pintor de tal lugar.

BF – Então, o que vocês querem não é o produto final, mas o processo de elaboração.
Boal – Sim, o processo estético é mais importante que o produto artístico. Agora, para quê agente quer isso, não é um capricho, não é? É que a gente vive na Terceira Guerra Mundial, clara, e estamos perdendo. E essa guerra mundial que estamos perdendo é a guerra da informação. Liga a televisão, hoje, e você vai ver somente filmes estadunidenses, e só de violência. Você nota se o filme é estadunidense ou não, de inspiração em Hollywood ou não, se em cada cinco minutos tem um soco, um tiro, ou uma explosão. Aí isso é estadunidense. O filme europeu raramente tem isso.

BF – E o Teatro do Oprimido, também por não fazer isso não sai na mídia?
Boal – Não sai. Porque a gente quer é o contrário, quer que as pessoas em vez de ficar assimilando, produzam, produzam. Então elas vão questionar, inclusive, as informações recebidas. Se você é obrigado a escrever um poema, depois você se anima, porque os poetas se animam. Entre as domésticas, tem uma que não pára de escrever. Atola a gente de poemas.

BF – Essa é a Estética do Oprimido?
Boal – É isso, é fazer com que as pessoas se apropriem da arte. Não sejam massacradas pela informação.

BF – E como é o seu trabalho com os movimentos sociais?
Boal – Com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o trabalho é muito bom, mas seria melhor se a gente tivesse meios para isso. Há alguns anos, eles começaram a vir ao Rio de Janeiro, do Brasil inteiro. Trabalharam com a gente durante algum tempo, e passamos para eles o que podemos. Depois eles voltaram para seus Estados, Rio Grande do Sul, Pará, Pernambuco etc., e lá eles começaram a desenvolver o Teatro o Oprimido.

BF – São dificuldades logísticas?
Boal – E econômicas. Mas a gente trabalha com eles. E também com os sindicatos dos bancários, dos professores. E estamos trabalhando com dez grupos da periferia. Nas prisões, em seis ou sete Estados brasileiros. Com um projeto de um ano e meio, com o Ministério da Justiça apoiando. E sai caro, porque você imagina ir daqui para Recife e voltar.

BF – Trabalho com os prisioneiros?
Boal – Fazemos as duas coisas. Desta vez tentamos fazer com os funcionários, para que se sintam também participantes desse processo. Quer dizer, que eles entendam que são oprimidos também, e que não resolvem a opressão deles oprimindo outros.

BF – E o que é para o senhor a democratização da cultura e meios de produção cultural?Boal – Democratização da cultura é uma expressão que está sendo muito usada, mas num sentido que não me agrada. Porque é como se dissessem assim: existem algumas pessoas excepcionais, que são os produtores de cultura. Então, esses produtores de cultura vão democratizá-la levando a um maior número de pessoas. Mas o maior número é entendido como de consumidores, e não como de produtores de cultura. Acho mais importante ainda que as pessoas que recebem o filme sejam também capazes de poder pensar em fazer filme. Ou as pessoas que recebem um livro para ler sejam também incentivadas a escrever elas mesmas.

Gonzaguinha e Marlene - Projeto Pixinguinha

BF – É o que acontece com a democratização da comunicação, também queremos democratizar os meios de fabricar o jornal. 
Boal – É, se você só democratizar a leitura, a exibição e tal, e transformar os outros somente em consumidores, é ruim. Mas tem que ser complementado com dizer: bom, nós viemos mostrar a vocês esses poemas. Agora escrevam vocês mesmos, vocês têm que escrever também. Democratizar a cultura é permitir que as pessoas criem cultura. É democratizar os produtores de cultura e não apenas da produção terminada. Senão se está criando mercados, e criar mercados não é o objetivo da cultura. E na informação é a mesma coisa, a gente tem que criar meios de informar, de contra-informar, de se opor informações para que dessa confrontação, para que dessas dúvidas, inclusive, nasçam certezas. E é isso o que a gente está tentando fazer.