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sexta-feira, 22 de abril de 2011

O novo colonialismo

(Chico Villela)*

Reino Unido, França e Itália comandam a chacina na Líbia e a destruição das bases da vida civil: instalações militares, de comunicação, obras civis usadas por Gaddafi. Encerrada a fase de “limpeza”, passarão à fase da “ocupação”. Após o primeiro-ministro do Reino Unido anunciar o envio de “conselheiros militares” à Líbia, em clara violação do disposto na Resolução 1973 do CS da ONU, os primeiros-ministros de França e Itália também anunciaram o envio dos seus “conselheiros”. No Vietnã começou exatamente assim, com a deposição de “conselheiros” estadunidenses. A reviravolta francesa e italiana ocorreu apenas um dia após o primeiro-ministro francês e o comandante-em-chefe militar italiano terem declarado à mídia grande que seus países não iriam depor tropas na Líbia de forma alguma.

É uma das desmoralizações mais rápidas da história. Um dia antes, o primeiro-ministro francês Alan Juppé era enfático: “Eu permaneço absolutamente contrário à deposição de tropas em solo líbio”. Compreende-se: governo nenhum quer deixar os outros à vontade, já que se prevê a derrota final de Gaddafi e um “novo governo” sediado em Benghasi simpático às corporações que irão dividir os recursos do país. Não se pode chegar atrasado ao banquete; a distribuição dos pratos é rápida, palavra com a mesma raiz de rapina.

Para a Itália, é uma volta ao velho domínio. No início do século XX a Itália invadiu as regiões líbias de Cirenaica e Tripolitânia, então em mãos do império otomano, com alegações de “missão civilizatória”. Desta vez, a desculpa oficial geral é “missão humanitária”. De lá até o fim da Segunda Guerra, metade da população líbia foi morta em combate contra o invasor, em campos de concentração ou de fome, e boa parte exilou-se. A população líbia foi a primeira da história a ser bombardeada por aviões, que pouco distinguiam entre alvos inimigos e civis; até mesmo caravanas eram trucidadas e plantações eram arrasadas.

A França ocupou a Argélia, vizinha da Líbia, de 1830 até 1962. A ocupação da Argélia, cujas populações reagiram com vigor até a independência, foi particularmente assassina. O editor do jornal Alger Républicain, Henri Alleg, deixou aos pósteros um livro devastador, “A Tortura”, em que descreve sua vida nas masmorras francesas.
A ação militar francesa na colônia argelina é hoje classificada como “genocida”: são estimados 1.5 milhão de mortos argelinos durante as batalhas contra a ocupação. As técnicas de tortura desenvolvidas pelos franceses membros de extrema-direita da Organização do Exército Secreto (OAS) foram depois repassadas aos estadunidenses, que as aperfeiçoaram ao ponto de atingir a “exatidão científica” da qual são vítimas os presos de Guantánamo.

A França do saltitante Sarkozy aderiu de vez às políticas imperiais de conquista e rapina. A crise humanitária na Costa do Marfim foi largamente agravada com a interferências de tropas francesas que ajudaram Quattara a retirar do poder o ex-presidente Gbagbo. Quattara, que alega ter vencido as eleições, é ex-diretor do FMI e bastante próximo da França e do próprio Sarkozy. Vem promovendo campanha de limpeza dos inimigos: o ex-ministro do Interior Dsir Tagro foi surrado até a morte por tropas de Quattara
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A França também volta a uma antiga colônia, como a Itália. As razões falsas alegadas são as mesmas, como sempre: “ajuda humanitária” e “manutenção da democracia”. Não há médicos disponíveis, centenas de milhares fugiram sem seus pertences, moradores da região sul do país, que em parte apoiou Gbagbo, são perseguidos e mortos pelas tropas de Quattara. A pretexto de “ajuda humanitária”, a França interveio numa questão interna do país e agravou enormemente a questão social.

O Alto Comissariado para Refugiados da ONU relata que na cidade de Duékoué 27 mil pessoas buscaram refúgio na missão católica. O diretor padre Vicente Grupelli esclarece: “Não há comida, o povo dorme no chão, não há para onde ir, não há banheiros ou torneiras e não temos água de beber”. Além disso, surgiram alguns casos de morte por malária. A Organização Internacional para Migração, ligada à igreja católica, estima 800 mil refugiados no país apenas no oeste do país. Há muitos casos de diarréia e cólera.
Um vasto campo para a ação humanitária das tropas de Sarkozy, desde que deixem a cidade e o porto de Abidjan, maior cidade e centro de negócios do país, e passem a realizar sua “missão humanitária”. Quattara ordenou a abertura do porto, controlado pelos franceses, e retomaram-se as exportações: cacau (maior produtor mundial), café, produtos agrícolas e minerais, etc. O perfil perfeito da colônia: exportação de matérias-primas e importação de tudo da matriz.

O império inglês orgulhava-se de o Sol jamais se pôr nos territórios do império. No norte da África, o Reino Unido ocupou, entre outros, o Egito, outro vizinho da Líbia, durante 70 anos, desde 1916. Em todos os casos, a mesma coorte de horrores, saques, assassinatos. Com a criação do Africom, comando militar do Pentágono dedicado à África, nunca foram tão claros os sinais do renascimento do colonialismo no continente.

O mundo, ainda de braços cruzados, e a Líbia assistem à volta dos velhos colonialistas e, a partir de agora, passam a contar os mortos.

Fonte:  Blog NovaE por Chico Villela