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sábado, 23 de abril de 2011

O quê há por trás da invasão da Líbia

Por Emerson Leal *

Em recente reunião do Conselho Parlamentar da Europa (CPE), Svetlana Goriatcheva, da delegação russa, não conseguiu segurar sua indignação e soltou o verbo. Em tradução livre, disse: "Senhoras e senhores parlamentares, há três dias estamos aqui falando do sexo dos anjos. Enquanto isto, bombas caem às dezenas nas cabeças dos líbios, misturando sangue e areia. Sinceramente, não entendo a reação passiva e indiferente dos senhores".
Goriatcheva afirmou que as potências centrais protegem os ditadores amigos dos EUA e da União Européia que estão massacrando, com a ajuda da Arábia Saudita, manifestantes que nas ruas exigem mais democracia e melhores condições de vida. 'Não vejo aqui ninguém exigindo a cabeça desses ditadores'.
Disse mais: 1. Querem a cabeça de Kadafi porque "ele se negou a prorrogar os contratos de fornecimento de petróleo" nas mesmas condições de antes, como exigiam a França, Inglaterra, Itália e Espanha. 2. A Resolução 1973 do Conselho de Segurança da ONU, que estabeleceu a zona de exclusão aérea na Líbia, 'além de não prever a participação da OTAN nas operações, está sendo interpretada com uma amplitude absolutamente fora de propósito'.
Os senhores membros do CPE engoliram em seco. Mas, há outra causa, além do petróleo, sobre a qual a jornalista Ellen Brown chama a atenção no Asia Times Online. Em síntese, como diria Hamlet, há muito mais coisas entre o céu e a terra do que possa imaginar nossa vã filosofia.
Alertas da jornalista: 1. Contradição – enquanto o Conselho de Segurança da ONU trabalhava "febrilmente" para condenar os ataques de Kadafi contra 'manifestantes', o Conselho de Direitos Humanos elaborava "um relatório carregado de elogios à Líbia, no quesito de direitos humanos". 2. O general (da reserva) Wesley Clark disse que "10 dias após o 11 de setembro de 2001, os EUA tinham planos de invadir 7 países em 5 anos: Iraque, [Afeganistão], Síria, Líbia, Somália, Sudão e Irã".
Pois é, "os líbios têm tratamento médico gratuito; a educação é universal e gratuita; ao casar, cada casal líbio recebe um empréstimo sem juros de US$ 50 mil; agricultores são isentos de impostos; gasolina e pão são subsidiados; etc, etc."
Já afirmei que a revolta na Líbia não é do povo, mas sim de um grupo de oposição organizada e armada principalmente pelos EUA para derrubar Kadafi e tomar o poder. A importante revelação sintetizada por Ellen Brown: "Robert Wenzel, do Economic Policy Journal, afirmou que nunca antes ouvira falar de rebeldes que, com alguns dias de rebelião, já criaram um banco central!".
Qual o mistério do banco central 'dos rebeldes'? É que Kadafi, como Saddan, se negou a aceitar o dólar como moeda internacional e passou a exigir euros. Pior, conclamou os países africanos a criar uma nova moeda: o dinar-ouro. EUA e UE quase enfartaram. Sarkozy declarou que "a Líbia se transformou numa ameaça à segurança financeira internacional".
O xis da questão, é que nestas condições as potências centrais perderiam os meios de manipular os preços internacionais. Cortar o pescoço de Kadafi (como o de Saddan) e fundar um banco central subalterno na Líbia é a forma de 'cortar o mal pela raiz'. E tome tomahawk na cabeça do povo líbio.
Emerson Leal – Doutor em Física Atômica e Molecular e vice-prefeito de S. Carlos.
Email: depl@df.ufscar.br
Fonte: Rede Democrática
Leia tambëm: Uranio empobrecido uma estranha forma de proteger os civis líbios e O Novo Colonialismo

sexta-feira, 22 de abril de 2011

O novo colonialismo

(Chico Villela)*

Reino Unido, França e Itália comandam a chacina na Líbia e a destruição das bases da vida civil: instalações militares, de comunicação, obras civis usadas por Gaddafi. Encerrada a fase de “limpeza”, passarão à fase da “ocupação”. Após o primeiro-ministro do Reino Unido anunciar o envio de “conselheiros militares” à Líbia, em clara violação do disposto na Resolução 1973 do CS da ONU, os primeiros-ministros de França e Itália também anunciaram o envio dos seus “conselheiros”. No Vietnã começou exatamente assim, com a deposição de “conselheiros” estadunidenses. A reviravolta francesa e italiana ocorreu apenas um dia após o primeiro-ministro francês e o comandante-em-chefe militar italiano terem declarado à mídia grande que seus países não iriam depor tropas na Líbia de forma alguma.

É uma das desmoralizações mais rápidas da história. Um dia antes, o primeiro-ministro francês Alan Juppé era enfático: “Eu permaneço absolutamente contrário à deposição de tropas em solo líbio”. Compreende-se: governo nenhum quer deixar os outros à vontade, já que se prevê a derrota final de Gaddafi e um “novo governo” sediado em Benghasi simpático às corporações que irão dividir os recursos do país. Não se pode chegar atrasado ao banquete; a distribuição dos pratos é rápida, palavra com a mesma raiz de rapina.

Para a Itália, é uma volta ao velho domínio. No início do século XX a Itália invadiu as regiões líbias de Cirenaica e Tripolitânia, então em mãos do império otomano, com alegações de “missão civilizatória”. Desta vez, a desculpa oficial geral é “missão humanitária”. De lá até o fim da Segunda Guerra, metade da população líbia foi morta em combate contra o invasor, em campos de concentração ou de fome, e boa parte exilou-se. A população líbia foi a primeira da história a ser bombardeada por aviões, que pouco distinguiam entre alvos inimigos e civis; até mesmo caravanas eram trucidadas e plantações eram arrasadas.

A França ocupou a Argélia, vizinha da Líbia, de 1830 até 1962. A ocupação da Argélia, cujas populações reagiram com vigor até a independência, foi particularmente assassina. O editor do jornal Alger Républicain, Henri Alleg, deixou aos pósteros um livro devastador, “A Tortura”, em que descreve sua vida nas masmorras francesas.
A ação militar francesa na colônia argelina é hoje classificada como “genocida”: são estimados 1.5 milhão de mortos argelinos durante as batalhas contra a ocupação. As técnicas de tortura desenvolvidas pelos franceses membros de extrema-direita da Organização do Exército Secreto (OAS) foram depois repassadas aos estadunidenses, que as aperfeiçoaram ao ponto de atingir a “exatidão científica” da qual são vítimas os presos de Guantánamo.

A França do saltitante Sarkozy aderiu de vez às políticas imperiais de conquista e rapina. A crise humanitária na Costa do Marfim foi largamente agravada com a interferências de tropas francesas que ajudaram Quattara a retirar do poder o ex-presidente Gbagbo. Quattara, que alega ter vencido as eleições, é ex-diretor do FMI e bastante próximo da França e do próprio Sarkozy. Vem promovendo campanha de limpeza dos inimigos: o ex-ministro do Interior Dsir Tagro foi surrado até a morte por tropas de Quattara
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A França também volta a uma antiga colônia, como a Itália. As razões falsas alegadas são as mesmas, como sempre: “ajuda humanitária” e “manutenção da democracia”. Não há médicos disponíveis, centenas de milhares fugiram sem seus pertences, moradores da região sul do país, que em parte apoiou Gbagbo, são perseguidos e mortos pelas tropas de Quattara. A pretexto de “ajuda humanitária”, a França interveio numa questão interna do país e agravou enormemente a questão social.

O Alto Comissariado para Refugiados da ONU relata que na cidade de Duékoué 27 mil pessoas buscaram refúgio na missão católica. O diretor padre Vicente Grupelli esclarece: “Não há comida, o povo dorme no chão, não há para onde ir, não há banheiros ou torneiras e não temos água de beber”. Além disso, surgiram alguns casos de morte por malária. A Organização Internacional para Migração, ligada à igreja católica, estima 800 mil refugiados no país apenas no oeste do país. Há muitos casos de diarréia e cólera.
Um vasto campo para a ação humanitária das tropas de Sarkozy, desde que deixem a cidade e o porto de Abidjan, maior cidade e centro de negócios do país, e passem a realizar sua “missão humanitária”. Quattara ordenou a abertura do porto, controlado pelos franceses, e retomaram-se as exportações: cacau (maior produtor mundial), café, produtos agrícolas e minerais, etc. O perfil perfeito da colônia: exportação de matérias-primas e importação de tudo da matriz.

O império inglês orgulhava-se de o Sol jamais se pôr nos territórios do império. No norte da África, o Reino Unido ocupou, entre outros, o Egito, outro vizinho da Líbia, durante 70 anos, desde 1916. Em todos os casos, a mesma coorte de horrores, saques, assassinatos. Com a criação do Africom, comando militar do Pentágono dedicado à África, nunca foram tão claros os sinais do renascimento do colonialismo no continente.

O mundo, ainda de braços cruzados, e a Líbia assistem à volta dos velhos colonialistas e, a partir de agora, passam a contar os mortos.

Fonte:  Blog NovaE por Chico Villela