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domingo, 9 de fevereiro de 2014

Os EUA e o ópio do Afganistão

30/01/2014 - Sobre as drogas dos “Pacificadores”
- Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu para a Redecastorphoto

Militar dos EUA-OTAN patrulha uma plantação de papoula (ópio) no Afeganistão

Pelo 3º ano consecutivo, o Afeganistão ocupado pela OTAN cultivou número recorde de papoulas do tipo que produz ópio.

Segundo relatório do Gabinete da ONU para Drogas e Crimes [orig. United Nations Office on Drugs and Crime (UNODC)], em 2013 as culturas de papoula de ópio no Afeganistão ocuparam a maior superfície de terra, ultrapassando todos os registros anteriores.

Apesar das condições climatológicas desfavoráveis, sobretudo em áreas no oeste e no sul do país, as plantações para produção de ópio ocupavam um total de mais de 209 mil hectares, 36% a mais que no ano anterior.

Taxa de crescimento das plantações de papoula-ópio.

Tabela 1. Em duas décadas, segundo o relatório.

Tabela 2. Comparação (em %), de 2012 e 2013.

Oficialmente, o cultivo da papoula-ópio – principal componente para a produção de heroína – é proibido por lei no Afeganistão, embora o número de províncias nas quais a planta está sendo cultivada não pare de crescer.

A produção de ópio alcançou a marca de 5.500 toneladas, mostrando crescimento de 49% em comparação com 2012.

Militares da OTAN e plantadores de papoula (ópio) no Afeganistão

A propaganda ocidental culpa os Talibã pela produção de ópio, ou representantes do regime, que estariam imersos no tráfico de drogas. Mas essas alegações não se confirmam, se se observa o que está realmente acontecendo.

O comando da OTAN diz que os Talibã

"(...) opunham-se inicialmente às drogas, mas agora ou cultivam eles próprios, ou criam “impostos” sobre as colheitas das fazendas produtoras."

Mas os comandantes dos Talibã têm repetido, com insistência, que os mujahideen afegãos estão em luta de jihad contra as forças de ocupação; e que o Islã proíbe estritamente tanto o consumo de álcool quanto de drogas.

E deve-se dizer que, sim, os islamistas fanáticos seguem essa regra ao pé da letra.

Quanto aos fantoches do ocidente, como Hamid Karzai [foto] e os que o cercam, aí, sim, há provas mais do que suficientes de envolvimento deles na produção e no comércio de drogas.

Em outubro de 2013, eclodiu um escândalo em Kabul quando, durante inspeções no Afeganistão, descobriu-se que 65 altos funcionários da inteligência afegã eram dependentes de heroína.

Alguns anos antes, se soubera que a CIA financiava Ahmed Wali Karzai, irmão mais moço do presidente Hamid Karzai [foto acima], o qual era conhecido, já há mais de oito anos, como um dos principais traficantes de ópio na região.

Nikolai  Malishevski
Pesquisadores norte-americanos insistem que o tráfico de ópio nos EUA está sendo controlado por redes e cartéis que foram descobertos durante o caso “Irã-Contras” e que não suspenderam suas atividades desde os anos 1980s:

"O pilar do regime de Karzai é o apoio que recebe do tráfico de drogas, e, para nós, esse pilar é intocável.

Os EUA convertemos o Afeganistão no maior fornecedor mundial de heroína.

E isso aconteceu sob o comando da CIA – observam aqueles pesquisadores."

Segundo informação recolhida de vários jornais de grande circulação (The Daily Mail, The New York Times, Pakistan Dail etc.), os principais fornecedores de heroína para o mercado global seriam:

- Izzatullah Wasifi, governador da província Farah; presidente da Administração Geral Afegã Independente contra a Corrupção, cujas atribuições incluem o combate ao cultivo de papoulas e à produção de ópio, e amigo de infância de Hamid Karzai; e que foi preso por autoridades dos EUA, em julho de 1987, por tráfico de heroína de alto grau (!);

- Jamil Karzai, presidente do Partido Nacional da Juventude Solidária do Afeganistão [orig. National Youth Solidarity Party of Afghanistan], membro do Conselho Nacional Afegão de Segurança e sobrinho de Hamid Karzai, que manteria relações de negócios com Haji Mohammad Osman, proprietário de um laboratório de produção de drogas no distrito de Achin, na província de Nangarhar (na pequena região do Damgal);

- Abdul Qayum Karzai, membro da Câmara Baixa da Assembléia Nacional Afegã, ex-empregado da Unocal, empresa norte-americana, e irmão de Hamid Karzai, e que seria o grande barão da droga em Kandahar;

- Shah Wali Karzai, irmão de Hamid Karzai, proprietários de campos de plantação de papoulas nas províncias de Kandahar, Nangarhar, Urozgan, Zabul, Paktia, Paktika e Helmand; e dúzias de autoridades do Executivo e do Judiciário afegãos, além de funcionários do Ministério de Relações Interiores do Afeganistão. 

Família Karzai em foto sem data
Em pé: Shah Wali Karzai, Ahmed Wali Karzai, Hamid Karzai, atual presidente, e Abdul Wali Karzai.
Sentados: Abdul Ahmad Karzai, Qayum Karzai; Abdul Ahad Karzai, o patriarca, e Mahmoud Karzai.

Se se acredita na imprensa-empresa ocidental, os responsáveis pelos crimes de produção e tráfico são fantoches do ocidente, como a família Karzai [foto acima] e seu círculo, aos quais a mesma imprensa-empresa ocidental culpa pelo rápido crescimento do número de dependentes de heroína em todo o mundo.

Áreas de cultivo de papoula (ópio/heroína) no Afeganistão em 2012

Mas a verdade é que só 20% das papoulas-ópio são cultivadas nos distritos do norte e do centro do Afeganistão, que são as regiões controladas pelo governo Karzai.

Todo o resto da produção desse veneno tão lucrativo vem das províncias do sul, da fronteira com o Paquistão – áreas controladas pelas forças da OTAN.

O principal centro de produção de drogas é a província de Helmand, que está sob comando de forças do exército britânico.

Em vez de ajudar os agricultores afegãos a mudar-se para colheitas alternativas, os “pacificadores” limitam-se exclusivamente a discutir por que a produção só aumenta; e, segundo provas recolhidas de fontes locais e internacionais, os “pacificadores” também participam ativamente do “negócio” [foto: Karzai e Obama].

Alguns analistas estão atribuindo essa “participação” ao fato de que os EUA tentam por todos os meios evitar um conflito potencial contra os barões da droga, cujo apoio político é importante para a existência do governo Karzai.

Mas o que se vê, de fato, é que os EUA estão ignorando deliberadamente o elo que há entre o tráfico de drogas, a crescente instabilidade no Afeganistão e o crescimento de atividade terrorista na região.

Dito de forma simples: se os EUA estão garantindo aos barões da droga toda a liberdade de que precisam para manter o “negócio” (em troca de apoio político ao governo de Karzai), os EUA estão, de fato, trabalhando contra os próprios objetivos pelos quais invadiram o Afeganistão: garantir paz e segurança ao país.

Especialistas ocidentais como Thomas Ruttig [foto], co-diretor do centro de pesquisa independente Afghanistan Analysts Network, observa que:

"(...) com a próxima retirada das forças da OTAN do Afeganistão, diminuiu muito a pressão, pelas autoridades, contra os plantadores de papoula-ópio.

O relatório divulgado pela ONU diz, dentre outras coisas, que em 2013 as autoridades destruíram 24% de pés de papoula-ópio a menos, que antes."

Resultado: o Afeganistão está-se afirmando, consistentemente, como o maior fabricante de ópio do mundo, produzindo mais de 90% de tudo que o mundo produziu em 2013.

Há três anos, os mesmos analistas da ONU observaram que as papoulas estavam sendo cultivadas em apenas 14, das 34 regiões do país; no início de 2014, esse número já subiu para 20.

Enormes plantações reapareceram em províncias do norte do Afeganistão, como Balkh e Faryab, nas quais a papoula-ópio havia sido declarada erradicada.

Essas províncias afegãs são vizinhas de dois países da Commonwealth of Independent States (CIS, organização que reúne 11 repúblicas ex-soviéticas, inclusive a Rússia) – o Uzbequistão e o Turcomenistão.

Simultaneamente, se observa que está em andamento um processo para militarizar os grupos internacionais de drogas concentrados na região.

Viktor Ivanov [foto], chefe do Serviço Federal de Controle das Drogas da Federação Russa [orig. Federal Drug Control Service of the Russian Federation (FSKN)], diz:

"Já se vê que estão surgindo grupos armados que, vários deles, são ramificações dos cartéis de drogas no norte do Afeganistão. Esses grupos têm suas próprias unidades de combate (...)

No Afeganistão, já está em andamento a rápida militarização de grupos ligados ao tráfico. De modo geral, são bem armados.

Têm armas leves, armamento portátil, granadas e lança-granadas, e usam regularmente essas armas. O orçamento de grupos ligados aos tráfico como esses é de cerca de 18 bilhões de dólares norte-americanos.

É dinheiro que obtêm da produção da droga, e motivo pelo qual esses grupos converteram-se em fator importante em tudo que tenha a ver com a situação política, econômica e criminal dentro dos estados da Ásia Central."

Já há muitos anos, os EUA vêm usando o tráfico de drogas para manter sua Guerra Fria contra os estados pós-soviéticos, porque consideram que a droga seria elemento eficiente para minar o potencial humano dos exércitos adversários naquelas áreas.

Às vésperas de se retirarem do Afeganistão, as forças de ocupação da OTAN tratam de reforçar a produção de papoulas-ópio, por todos os meios possíveis. 

Assim, contam com empurrar o conflito para confrontos cada vez mais violentos, usando grupos armados das máfias da droga, que se concentram ao longo da fronteira sul da ex-URSS.

Por isso, lá circulam hoje tantas armas e tantos grupos armados mantidos pelo tráfico, mas que se ocultam por trás de “bandeiras” islamistas e de slogans “jihadistas”.

Fonte:
http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2014/01/sobre-as-drogas-dos-pacificadores.html?utm_source=feedburner&utm_medium=feed&utm_campaign=Feed:+redecastorphoto+(redecastorphoto)

sábado, 7 de julho de 2012

A vida privada de Assange usada para tentar ocultar o grande triunfo de WikiLeaks

01/07/2012 - por Patrick Cockburn
Original: The Independent “Patrick Cockburn: How Julian Assange's private life helped conceal the real triumph of WikiLeaks”
Traduzido pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu

A partir do momento em que Julian Assange conseguiu evitar a prisão, buscando refúgio na embaixada do Equador em Knightsbridge, escapando assim de ser extraditado para a Suécia, e provavelmente, em seguida, para os EUA, os jornalistas, colunistas e comentaristas britânicos tornaram-no alvo da mais escandalosa agressão.

Parecem babar de ódio, enquanto repetem os mais mesquinhos “exemplos” de uma pressuposta grosseria, pressuposto egoísmo e aparência pressuposta “péssima”, como se o que dizem fosse verdade e, por ser escrito pelos que escrevem, como se tratasse de crimes imperdoáveis.


O que se lê na imprensa britânica fala, uma vez mais, muito mais do convencionalismo e do instinto de manada dos formadores britânicos de opinião, do que de Assange.

O que passa sem ser noticiado, em toda a cobertura, é o quase inacreditável sucesso do fundador de WikiLeaks, que conseguiu publicar documentos do governo dos EUA, os quais, publicados, permitiram que muitos, em todo o mundo, começassem a saber como realmente agem seus governos. Que os eleitores conheçam, precisamente, esse tipo de fato é a alma da democracia, porque os eleitores têm de ser bem informados, para que consigam eleger representantes que de dediquem a fazer “governo do povo, pelo povo e para o povo”.

Graças a WikiLeaks, a opinião pública teve acesso a mais informação sobre o que fazem pelo mundo os EUA e seus aliados do que nunca antes, em toda a história da imprensa ocidental. O único momento semelhante a esse que me vem à mente foi a publicação, pelos bolcheviques vitoriosos em 1917, de tratados secretos, incluindo planos da Grã-Bretanha e da França, para ocupar o Oriente Médio [1].

Paralelo mais fácil foi a publicação dos Papéis do Pentágono, graças a Daniel Ellsberg em 1971, que revelaram as sistemáticas mentiras do governo Johnson sobre o Vietnã. Como se fez contra Assange, Ellsberg foi massacrado pela imprensa e pelo governo dos EUA, que o ameaçou com as mais severas penas.

Aspecto extraordinário da campanha contra Assange é que jornalistas, colunistas e “especialistas” sentem-se perfeitamente livres para publicar milhares de palavras sobre alegadas faltas de Assange, sem que se leia qualquer indignação contra os crimes de Estado, infinitamente mais graves, que WikiLeaks revelou ao mundo.

Os críticos e os leitores que concordam com eles deveriam, antes de falar, assistir a 17 minutos de um filme divulgado por WikiLeaks, filmado pela tripulação de um helicóptero Apache, sobre um bairro na parte leste de Bagdá, dia 12/7/2007. Mostra a tripulação do helicóptero matando, a rajadas de metralhadora, pessoas que se veem no solo, e que os soldados norte-americanos dizem supor que fossem guerrilheiros armados. Examinando o filme, não consigo ver arma alguma. O que teria sido tomado por arma, em mãos de um dos mortos, foi depois identificado como câmera de filmagem que estava sendo usada por Namir Noor-Eldeen, jovem fotógrafo da agência Reuters, morto, com o motorista também a serviço da Reuters, Saeed Chmagh. O vídeo mostra o helicóptero voltando para um segundo ataque, dessa vez contra uma caminhonete que parou para recolher os cadáveres e os feridos. O motorista dessa caminhonete também foi morto, e duas crianças foram feridas. "Há-há-há! Acertei eles!” – grita, em triunfo, um dos soldados norte-americanos. Olhem só os filhos da puta mortos!”

Eu estava em Bagdá quando a matança aconteceu e lembro que, no momento, nem eu nem outros jornalistas que lá estavam acreditamos no que o Pentágono informou, que todos eram guerrilheiros armados. Mas não havia como provar que o Pentágono mentira. Rebeldes armados não estariam conversando na esquina, com helicópteros dos EUA à vista. Logo se soube que havia um vídeo da matança, mas o Departamento de Defesa recusou-se terminantemente a divulgá-lo, nem quando se invocou a Lei da Liberdade de Informar [orig. Freedom of Information Act]. A versão oficial nunca pôde ser desmentida, até que o vídeo chegasse a WikiLeaks, enviado, parece, por um soldado dos EUA, Bradley Manning. WikiLeaks publicou o vídeo em 2010. [2]

Os telegramas diplomáticos que chegaram a WikiLeaks foram publicados adiante, no mesmo ano, em cinco jornais –The New York Times, The Guardian, Le Monde, Der Spiegel e El País – mas a resposta ao trabalho de Assange foi surpreendentemente mesquinha. Os jornalistas pareceram ter ficado furiosos por seu campo de caça privativo ter sido invadido por um nerd australiano, que fizera o trabalho que os jornalistas não haviam feito. Na Grã-Bretanha, o colunariato das empresas jornalísticas é clube notoriamente fechado, conservador e hostil a quem chegue de outros contextos culturais, com diferentes normas políticas.

Mas nem isso bastaria para explicar que toda a mídia planetária declarasse aberta a temporada de caça a Assange. Para que isso acontecesse, foi preciso que aparecessem acusações de que Assange seria autor de estupro na Suécia. Acusações de estupro destroem qualquer reputação, por mais frágeis que sejam as provas e mesmo que não haja prova alguma. Assange nunca conseguiu recuperar-se completamente daquelas acusações.

Quanto à sugestão de que ele estaria exagerando o risco de ser extraditado da Suécia para os EUA, é parte da caçada: quem, em sã consciência se exporia a algum acaso, mesmo que com 5% de probabilidades de deixar-se meter-se num voo para a Suécia que poderia levá-lo a sentença de 40 anos de cadeia nos EUA?

Muitos jornalistas e comentaristas agarraram-se ao argumento oficial de que os vazamentos teriam “posto vidas em risco”. Esse lobby começou a fracassar e a calar em 2011, quando funcionários do Pentágono tiveram de reconhecer, extraoficialmente, que não havia qualquer prova de que alguém tivesse sido ferido ou morto por causa dos vazamentos.

Resposta melhor seria que WikiLeaks nada revelou de realmente secreto; e que os documentos aos quais o cabo Manning teve acesso não eram classificados como secretos. Outro bom argumento de defesa ouvi de um diplomata dos EUA em Cabul, onde eu estava na época da publicação. Disse ele: “Não há segredo algum a ser divulgado por WikiLeaks, porque os “segredos” já foram vazados pela Casa Branca, Pentágono ou Departamento de Estado, que não souberam proteger os próprios documentos sigilosos, se fossem sigilosos”.

Na prática, os documentos publicados por WikiLeaks são exclusivamente e vastamente informativos sobre o que os EUA fazem e sobre o que os EUA pensam sobre o mundo no qual vivemos. Por exemplo, há um telegrama enviado da embaixada dos EUA em Cabul, em 2009, no qual o primeiro-ministro é descrito como “indivíduo paranoico e fraco, sem qualquer familiaridade com o básico da construção nacional”. [3]

Especialistas em Afeganistão comentaram que os defeitos de Karzai absolutamente não eram segredo ou novidade para ninguém. Deixaram de comentar que ali se ouvia a opinião de diplomatas norte-americanos experientes, falando sobre um homem que os norte-americanos e os britânicos estavam matando e morrendo, não para tirar do poder, mas para manter no poder.

Todos os governos são hipócritas, em maior ou menor medida, e há grande distância entre o que dizem em público e no privado.

Quando o povo exige transparência democrática em ações ou políticas gerais, o Estado e os governos fingem que enfrentam demandas por total transparência, que tornaria inviável qualquer governança efetiva.

A rapidez com que convertem demandas razoáveis em demandas alucinadas visa, quase sempre, a ocultar algum fracasso ou a defender o monopólio do poder.

Naquele caso, os EUA desejavam manter secreta bem mais que uma opinião negativa sobre Karzai, principal aliado local dos EUA. O real segredo que os EUA desejavam manter secreto é que não tinham qualquer parceiro confiável no Afeganistão e que, portanto, a guerra contra os Talibã tinha de ser dada por antecipadamente perdida.

Assange e WikeLeaks não desmascararam alguma incoerência, na opinião de um ou outro embaixador. Desmascararam a duplicidade de julgamentos para justificar a insistência dos EUA em prosseguir guerras fracassadas, nas quais morrem dezenas de milhares. Informações recentes mostram que esse tipo de segredo e o sigilo oficiais, com a ajuda empenhada de jornalistas “incorporados” às tropas, muitas vezes geram exatamente os resultados que se esperam deles.

No Iraque, nos meses anteriores à eleição presidencial de 2004 nos EUA, muitas embaixadas estrangeiras em Bagdá sabiam e informavam que os EUA só controlavam porções ínfimas de território, em país hostil. Mas o governo Bush conseguiu persuadir do contrário os eleitores norte-americanos: que estaria combatendo e vencendo uma batalha para instalar a democracia, contra os restos do regime de Saddam Hussein e seguidores de Osama bin Laden.

O controle da informação pelo Estado e a capacidade de manipular a informação, servindo-se para isso da imprensa-empresa, tornam sem sentido, na prática, o direito democrático de votar. Por isso os povos precisam muito de gente como Assange: para dar sentido, novamente, ao voto democrático.

Notas dos tradutores:
[1] A publicação desses tratados secretos foi dos primeiros atos do governo revolucionário bolchevique. Foram publicados dia 17/11/1917, por ordem de Trotsky, então Comissário do Povo para Assuntos Internacionais. Em 26/2/1922, o New York Times publicou matéria sobre eles em: EUROPE'S SECRET TREATIES. Em resumo acessível hoje dessas notícias, lê-se: “Desconfiança reina na Europa. Rússia revela os Tratados Secretos. Confiança nos EUA segue inabalável”.

[2] Os que não conheçam podem comprovar assistindo as cenas terríveis no vídeo que se segue:

[3] WikiLeaks “Diplomatic Cables”, Tuesday, 07 July 2009, 13:29 - S E C R E T SECTION 01 OF 03 KABUL 001767/ SIPDIS EO 12958 DECL: 07/03/2019 / TAGS PGOV, PREL, AF SUBJECT: KARZAI ON THE STATE OF US-AFGHAN RELATIONS – The Guardian, UK, em: “US embassy cables: Karzai feared US intended to unseat him and weaken Afghanistan”

Fonte:
http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2012/07/vida-privada-de-assange-usada-para.html

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

EUA suplicam que os Talibã negociem (U.S. beseeches Taliban to talk)

 20/12/2011-MK Bhadrakumar*, Indian Punchline - Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu

A matéria “exclusiva” da Agência Reuters [1] sobre contatos secretos entre os EUA e os Talibã é, sem dúvida, sensacional. Raras vezes o tabuleiro afegão foi tão claramente “desmitificado”. Serão os EUA, agora, “transparentes”? Uma nova abordagem? Porque tampouco os EUA jamais antes “revelaram” tanto de sua própria política regional, de modo tão explícito. Jamais tampouco se viram intenções de “processo de paz”, depois de guerra tão brutal, manifestas com tal sinceridade de intenções, com tantos bons propósitos, com tal generosidade em relação ao “inimigo”.

Que chances há de alguma coisa do que a Reuters publica hoje “com exclusividade” ser verdade?

Pergunto sobre as intenções que haja por trás de tantas declarações proferidas por militares norte-americanos identificáveis, falando todos, em fila, um depois do outro, em momento crucial de definição da guerra do Afeganistão. E escolhem logo, para divulgar toda aquela sinceridade e transparência, uma agência de notícias que tem leitores em todo o planeta, fazendo-a porta-voz daquelas “revelações”.

O que pode ter empurrado, para tamanha exposição, aqueles “militares norte-americanos de alto escalão”?

Comecemos pela “revelação” – que tem de simples o que pode ter de falsa: os EUA estariam trabalhando num “processo de paz” com os Talibã, com as conversações já bem adiantadas. E esses esforços alcançaram um ponto crítico, com boas chances de progressos consistentes; embora também tudo possa vir abaixo num segundo.

Quanto aos motivos: os funcionários dos EUA falam ali para vários públicos. Há o público doméstico no país – os norte-americanos cansados daquela guerra e que já não vêem sentido algum em continuar no Afeganistão. Esses lêem, em matéria publicada pela Reuters, que o governo Obama empenha-se muito em pôr fim à guerra e avança palmo a palmo, com denodo, rumo ao fim do túnel.

Assim sendo, que ninguém culpe o governo Obama se, apesar do esforço, a tentativa der em nada, por causa da intransigência dos Talibã.

O mais importante de tudo: se, por acaso, a guerra prosseguir, e os EUA chegarem ainda em guerra ao ano da crucial (re)eleição presidencial de 2012, não terá sido por decisão do presidente-candidato Obama, mas por imperiosa necessidade. Obviamente, a lei sobre Guantánamo torna urgente alguma definição sobre o estatuto daqueles prisioneiros, antes que Obama sancione lei. Aqueles prisioneiros são lixo. Por que não se livrar deles e, de quebra, ainda extrair do lixo algum lucro político?

Muito espertos. Sobretudo se a transferência dos prisioneiros para a custódia de Karzai puder ser apresentada como “movimento de cortesia” dirigido aos Talibã. A mensagem visa também os afegãos, especialmente o presidente Hamid Karzai, para que saiba que o nível de exasperação em Washington está alto; que, com ou sem o aval de Kabul, os EUA estão fazendo avançar sua própria agenda; e que já acumularam massa crítica.

Claro que é também mensagem para o Paquistão e para toda a região, os quais, depois dessa “notícia”, terão de começar a pensar sobre as intenções dos EUA no pós-2014.

O momento das “revelações” também é interessante:
a) Obama tem de dar respostas políticas “em casa”;
b) Washington está irritada com Karzai;
c) os EUA estão inseguros quanto às intenções dos Talibã;
d) o Paquistão entrou em modo de “desafio estratégico”; e
e) há oposição regional às bases militares dos EUA no Afeganistão.

A parte intrigante é que governos só “divulgam” sua diplomacia mais top secret quando, de fato, a confidencialidade deixou de ser interessante. Os funcionários do governo dos EUA que fizeram “revelações” à Agência Reuters admitiram publicamente que Washington
desistiu de quaisquer “pré-condições” no relacionamento com os Talibã (que desistiu de todas, fossem quais fossem: que tenham de obedecer à Constituição afegã, que tenham de separar-se da al-Qaeda etc.); e admitiram que os Haqqanis também são muito bem-vindos ao grupo.

A grande pergunta é se as “revelações” sugerem que estaria aparecendo pensamento novo, com vistas ao cenário do pós-2014. Pelo que se pode ver, os EUA começam a considerar uma era pós-Karzai. Querem mostrar que aprenderão a conviver com um Afeganistão comandado pelos Talibã. Mas... e por quê os Talibã engoliriam tudo isso?

Como se poderia adivinhar que fariam, os Talibã imediatamente desmentiram tudo [2] e deram as costas à abertura proposta pelos EUA.

Pode não ser a última palavra dos Talibã.

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Notas dos tradutores:
[1] 19/12/2011, “Exclusive: Secret U.S., Taliban talks reach turning point”, Reuters, (em inglês).
[2] 19/12/2011, “No secret talks with U.S.: senior Taliban commander”, Reuters, (em inglês).

*MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu, Asia Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.

Fonte: http://redecastorphoto.blogspot.com/2011/12/eua-suplicam-que-os-taliba-negociem.html