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segunda-feira, 15 de outubro de 2012

O TRATADO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA RIO+20

Por Zilda Ferreira


Hoje é dia do mestre. Para homenagear os professores que sonham o mesmo sonho de Moema Viezzer reproduzimos a entrevista que essa grande educadora concedeu à jornalista Zilda Ferreira, durante a Rio+20.


O sonho de Moema Viezzer de conquistar corações e mentes à causa ambiental, para promoção do desenvolvimento sustentável emancipatório com cidadania plena, tocou muitos dos participantes que estiveram presentes nas atividades de lançamento da Rede Planetária do Tratado de Educação Ambiental.



Tornar esse sonho realidade é a meta dessa incansável professora, pesquisadora, indicada ao prêmio Nobel da Paz em 2005 e autora do famoso livro “Se Me Deixam Falar” traduzido em vários idiomas. Ela nasceu há 74 anos, em Caxias do Sul.

Durante o evento, perguntamos a Moema Viezzer se não estava na hora de promover uma atualização do Tratado, que é de 1992 e foi coordenado por ela. Respondeu: “Ele é muito atual e o importante é implementá-lo de fato” - depois de um breve silêncio – “Isso... É tudo que gostaria de ver antes de morrer”...

Quais foram os pontos positivos da Rio+20 e quais foram os negativos?

 MV - Com certeza um dos pontos positivos foi a própria realização da Rio+20 . Para não deixar cair no esquecimento tudo o que já foi prometido, correto?
Também me pareceu muito importante o crescimento da consciência ambiental visível nas posições colocadas pela sociedade civil.
Quanto aos pontos negativos, houve vários no processo de preparação, especialmente naqueles que se apresentavam como "novas tentativas de aproximação entre governos sociedade civil”, não entendido como tal tanto de um lado como de outro. E como sempre, o "peso imenso" da máquina, da estrutura que a ONU carrega e a forma de trabalhar que é lenta, muito lenta, por necessitar o consenso de governantes de 194 países, com posições tão diferenciadas.
Acho que também foi negativo não termos alguns compromissos dos governos mais propositivos em relação a tantos objetivos já traçados anteriormente.

Por que o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, que foi aprovado na ECO-92, sob sua coordenação, considerado um documento de vanguarda e uma ferramenta para conscientização ambiental não é conhecido e nem divulgado?

MV - O Tratado de EA não teve a divulgação necessária por falta de condições do grupo que o promoveu na Rio+20. Diferentemente da Carta da Terra que contou desde o início com forte apoio até de Maurice Strong que presidiu a II Conferencia das Nações Unidas em 92. No Brasil ele foi, sim, amplamente divulgado nas redes de educadoras e educadores socioambientais e inclusive tornou-se a base e a inspiração de nossa atual política nacional de educação ambiental. Em alguns outros países ele esteve em pauta na revisão de redes de alfabetização e de educação de adultos, como na Ásia e Pacífico do Sul. Na América Central o Tratado tem sido bastante divulgado, particularmente em El Salvador. E houve também uma aproximação com a CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) que agora está sendo retomada. Mas uma divulgação em âmbito planetário requer muita sinergia e também recursos básicos para se chegar a todos os lugares e todos os idiomas possíveis, o quê agora nós estamos propondo principalmente por podermos utilizar as redes sociais.

Na Rio+20 houve maior participação popular, maior engajamento da sociedade civil, dos movimentos sociais, muitas cobranças das ONGs e dos empresários. Mas, nenhum documento ou tratado determinante foi apresentado no final do evento. Por que?

MV - De fato, a Rio+20 não foi concebida como uma Conferência deliberativa, o que não levou a esta conclusão que você chama de tratado determinante. Mas houve outra forma de influir nas políticas públicas de todos os países, com o slogan da Economia Verde, que permeou as decisões tomadas em diversos âmbitos, independentemente de novos textos. E é sobre isto que as organizações da sociedade civil se debruçaram: "nós não queremos uma economia verde que ignore as cores da sociobiodiversidade existente no planeta" Queremos pensar em economias verdes a partir das realidades locais com seus respectivos atores sociais,com mercados verdes locais, regionais, nacionais, internacionais que levem em consideração o que está no coração da crise de valores que vivemos: a do capital hegemônico que no atual estado da globalização é, efetivamente, como costuma dizer Frei Betto, um processo de globocolonização. É isto que não queremos. Olha o que aconteceu com o golpe sofrido por nossos irmãs e irmãos do Paraguai logo agora pós a Rio+20 e veja a conexão direta com a Multinacional Monsanto. É isto que tem que ser revisto se queremos que a vida floresça neste planeta para o benefício de toda a comunidade de vida e não de uns poucos que se enriquecem desmesuradamente enquanto a maioria da população, por conta deste modelo insano, se empobrece e sofre cada vez mais juntamente com os demais seres da comunidade de vida afetado pelos produtos químicos utilizados.

Durante a Rio+20 a senhora coordenou o lançamento da Rede Global de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, ou seja, uma proposta de ação para que as pessoas conheçam e implementem esse Tratado. Há como motivar os educadores e comunicadores para que esse esforço feito durante o evento não padeça?

MV - Estamos agora virando a página da Jornada para Rede Planetária. Nosso maior desejo é que a proposta implícita no título do Tratado "Educação para Sociedades Sustentáveis (com S) e Responsabilidade Global chegue a tornar-se parte nova cultura e da nova educação que precisamos para o mundo que queremos com justiça social e ambiental. E para tanto, é evidente que a motivação de educadores e educadoras, assim como de comunicadores e comunicadoras podem fazer a diferença. Na educação formal, não formal, informal, presencial e à distancia... somos todos aprendizes e educadores. E os meios de comunicação podem e devem tornar-se CANAIS de intercomunicação para que a vida floresça neste planeta.

A senhora que escreve muito, autora do famoso livro "Se Me Deixam Falar" pesquisadora social e sonha ver 180 milhões de brasileiros educados ambientalmente - exercendo cidadania plena -, qual seria o seu apelo à sociedade brasileira para atingir essa utopia?

Repito o que o Tratado sugere: independentemente de nossa formação acadêmica, de nossa idade, sexo, cor, religião, opção o política e de nossa atuação nas organizações sejam elas da sociedade civil, das empresas ou dos governos... Vamos tratar, com urgência de "ascender à condição de aprendizes da sustentabilidade". A Mãe Terra já deu vários recados: o tempo de rever nossos padrões de produção e consumo é agora. E se nós pessoas adultas não mudarmos radicalmente nosso modo de vida marcado pelo consumo materialista, sem respeito aos seres humanos e dos demais seres que compõem a comunidade de vida... Que possibilidades temos de falar em gerações futuras? Nem planeta haverá para elas... A educação socioambiental precisa definitivamente extrapolar os bancos da escola e entrar para a escola da vida. Todo e qualquer espaço habitado pode tornar-se um espaço onde aprendemos a ser sustentáveis: uma fábrica, uma farmácia, uma padaria, um sindicato, um clube, uma igreja, uma escola, uma universidade, uma nascente de rio, um parque... Tudo é lugar para aprender a ser sustentável. E como se costuma dizer na Universidade Brtahma Kumaris: "quando um ser humano se transforma... ele transforma o mundo ao seu redor". O sonho é este mesmo: De um em um, de muitos em muitos, chegar milhões de cidadãos e cidadãs do Brasil exercendo cidadania plena no âmbito local-planetário.

No final da entrevista Moema Viezzer destacou:

M.V - Acho que não toquei no ponto essencial do negativo da Rio+20. Penso que um dos grandes problemas atuais é a forma como as grandes corporações - até para sobreviverem - estão pretendendo "esverdear" a economia. Como bem assinalou Vandana Shiva em uma entrevista à Folha de São Paulo: "não podemos esverdear a besta". Isto é muito forte e bem real. A economia tem que voltar ao seu devido lugar e estar a serviço da sociedade e do meio ambiente e não ao inverso. Esta pirâmide tem que ser invertida, conforme sugere o conceito de sustentabilidade implícito nos princípios da Carta da Terra e do Tratado de Educação Ambiental.