segunda-feira, 9 de abril de 2012

O poema que desmascarou Israel

07/04/2012 - Baby Siqueira Abrão - Correspondente no Oriente Médio
- redecastorphoto

O escritor alemão Günter Grass, prêmio Nobel de Literatura de 1999, provoca polêmica internacional ao publicar um poema afirmando que Israel é um risco à paz mundial e criticando o país pelo arsenal nuclear e pelas ameaças ao Irã.

A polêmica começou em 4 de abril, quando o Süddeutsche Zeitung (literalmente, Jornal do Sul da Alemanha) publicou o mais novo poema de Günther Grass, “Was gesagt werden muss” ("O que deve ser dito"). Nele, Grass critica Israel por seu poderio nuclear e pelas ameaças de ataque ao Irã. E vai além, chamando Netanyhau, primeiro-ministro israelense, de “fanfarrão” que quer exterminar o povo iraniano. O escritor também critica a Alemanha, que há pouco tempo vendeu outro submarino nuclear ao governo de Israel.


Importantíssimas são as sugestões de Grass para que Israel e Irã permitam que autoridades internacionais inspecionem suas instalações nucleares; para que os sionistas renunciem à força; e o desafio à hipocrisia do Ocidente, que silencia diante dos crimes israelenses por temer a acusação de “antissemitismo” – segundo o poeta, uma “gravosa mentira”, uma coação. É preciso lembrar que os sionistas acusam seus críticos de “antissemitas”, procurando identificar esse termo com “antissionismo”.

Na verdade, ambas as palavras referem-se a conceitos muito diferentes.

Antissemitas”, vocábulo cunhado no final do século 19 no contexto europeu de perseguição aos judeus, refere-se – com muita impropriedade, destaque-se, uma vez que grande parte da população árabe é semita e os judeus da Europa não o são – às pessoas que se opõem aos que professam o judaísmo. Já “antissionismo” diz respeito ao crescente movimento mundial daqueles que repudiam a ideologia sionista, considerada racista, militarista, apoiada em mitos que falseiam a história, na violência e na violação de direitos humanos, em função da opressão a que submete o povo palestino há mais de 100 anos.

O sionismo conta com profissionais para criar argumentos que, distorcendo e negando a realidade, fazem a defesa de suas políticas e de suas práticas. Esses argumentos têm como objetivo desviar, do foco das críticas, a situação criada pelos sionistas na Palestina.

Enviados a sionistas e judeus do mundo todo, são repetidos por eles à exaustão. Podem convencer ao interlocutor desacostumado a esse debate, mas são facilmente desmontados por aqueles que têm um mínimo de conhecimento sobre a história do sionismo, as pressões internacionais que seus adeptos fizeram para tomar a Palestina e a violência a que os sionistas submetem os palestinos desde fins do século 19.

Günter Grass não chega ao ponto de desmascarar a falsa relação que os sionistas fazem entre antissemitismo e antissionismo ou as falácias que sustentam essa relação. Mas, numa Europa em que a população vive acuada, temendo ser acusada de antissemita, é um grande passo denunciar o uso da palavra como instrumento político de coação, destinado a calar os opositores dos sionistas (instrumento, por sinal, também utilizado no Brasil).

Esses pontos, fundamentais no debate sobre o perigo que Israel representa para a ordem mundial, ao, entre outras ilegalidades, violar a legislação internacional, fabricar e armazenar secretamente armas de destruição em massa, praticar genocídio (*) contra o povo palestino, foram colocados na pauta mundial por Grass.

Diante desse fato, as qualidades literárias do poema, consideradas abaixo da média pela crítica especializada, e o fato de o poeta ter participado de uma organização nazista aos 15 anos de idade (o que pode ser explicado por sua imaturidade, aliada à confiança que o povo alemão, Grass incluído, depositava no nazismo quando o levou ao poder), não têm a mínima importância.

Trata-se de um poema militante, de um homem que conheceu a barbárie da guerra e teme que a humanidade, indefesa, seja submetida a barbárie muito pior em consequência dos caprichos de governantes desvairados.

Conheça o poema de Günter Grass, traduzido da versão espanhola.

O que deve ser dito

Porque guardo silêncio há demasiado tempo
sobre o que é manifesto
e se utilizava em jogos de guerra
em que no fim, nós sobreviventes,
acabamos como meras notas de rodapé.

É o suposto direito a um ataque preventivo,
que poderá exterminar o povo iraniano,
conduzido ao júbilo
Benjamin Netanyahu - Primeiro Ministro de Israel
e organizado por um fanfarrão,
porque na sua jurisdição se suspeita
do fabrico de uma bomba atômica.

Mas por que me proibiram de falar
sobre esse outro país [Israel], onde há anos
- ainda que mantido em segredo –
se dispõe de um crescente potencial nuclear,
que não está sujeito a nenhum controle,
pois é inacessível a inspeções?
Antisemiticroths - Charles Lucien Léandre


O silêncio geral sobre esse fato,
a que se sujeitou o meu próprio silêncio,
sinto-o como uma gravosa mentira
e coação que ameaça castigar
quando não é respeitada:
“antissemitismo” se chama a condenação.

Agora, contudo, porque o meu país,
acusado uma e outra vez, rotineiramente,
de crimes muito próprios,
sem quaisquer precedentes,
vai entregar a Israel outro submarino
cuja especialidade é dirigir ogivas aniquiladoras
para onde não ficou provada
a existência de uma única bomba,
se bem que se queira instituir o medo como prova… digo o que deve ser dito.

Por que me calei até agora?

Porque acreditava que a minha origem,
marcada por um estigma inapagável,
me impedia de atribuir esse fato, como evidente,
ao país de Israel, ao qual estou unido
e quero continuar a estar.

Por que motivo só agora digo,
já velho e com a minha última tinta,
que Israel, potência nuclear, coloca em perigo
uma paz mundial já de si frágil?

Porque deve ser dito
aquilo que amanhã poderá ser demasiado tarde [a dizer],
e porque – já suficientemente incriminados como alemães –
poderíamos ser cúmplices de um crime
que é previsível,
pelo que a nossa cota-parte de culpa
não poderia extinguir-se
com nenhuma das desculpas habituais.

Admito-o: não vou continuar a calar-me
porque estou farto
da hipocrisia do Ocidente;
é de esperar, além disso,
que muitos se libertem do silêncio,
exijam ao causador desse perigo visível
que renuncie ao uso da força
e insistam também para que os governos
de ambos os países permitam
o controle permanente e sem entraves,
por parte de uma instância internacional,
do potencial nuclear israelense
e das instalações nucleares iranianas.


Só assim poderemos ajudar todos,
israelenses e palestinos,
mas também todos os seres humanos
que nessa região ocupada pela demência
vivem em conflito lado a lado,
odiando-se mutuamente,
e decididamente ajudar-nos também.

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(*) Segundo o artigo 6 do Estatuto de Roma, que fundou o Tribunal Penal Internacional, entende-se por “genocídio” qualquer dos seguintes atos: “perpetrados com a intenção de destruir total ou parcialmente um grupo nacional, étnico,
a) Matança de membros do grupo;
b) Lesão grave à integridade física ou mental dos membros do grupo;
c) Sujeição intencional do grupo a condições de existência que acarretem sua destruição física, total ou parcial;
d) Medidas destinadas a impedir nascimentos no seio do grupo;
e) Transferência, por meio da força, de crianças do grupo a outro grupo”.

As práticas sionistas também se inscrevem em outros crimes estabelecidos pelo Estatuto de Roma: lesa-humanidade (capítulo 7) e crimes de guerra (artigo 8).
Esses crimes são imprescritíveis e o leitor pode comprovar pelos artigos abaixo, com seus próprios olhos, que esses crimes foram e continuam sendo cometidos contra o povo palestino.

Outros artigos sobre o mesmo assunto:
- As cobaias humanas de Israel (ver em: http://www.brasildefato.com.br/content/cobaias-humanas-de-israel )
- O genocídio do povo de Gaza (ver em: http://www.brasildefato.com.br/node/3426 )
- Massacre em Gaza (ver em: http://www.cartamaior.com.br/templates/index.cfm?home_id=94&alterarHomeAtual=1 )
- O inferno de Gaza agora Israel chega a um acordo com a verdade (ver em: http://www.libreidee.org/pt/2010/07/linferno-di-gaza-ora-israele-fa-i-conti-con-la-verita/ )

- Vídeo Visita a Gaza (imagens de Miguel Portas, deputado do Parlamento Europeu) (ver em: http://www.youtube.com/watch?v=t9QPfG9iu3E&feature=player_embedded )





domingo, 8 de abril de 2012

A grande mídia a serviço de quadrilhas organizadas

02/04/2012 - J Carlos de Assis* - Carta Maior

No Brasil, estamos assistindo estupefatos ao descortinamento do conúbio inacreditável entre setores da mídia e crime organizado: gravações feitas pela Polícia Federal com autorização da Justiça revelam que a maior revista do pais, “Veja”, teria sido regularmente pautada por bandidos que usam espiões privados, alguns egressos do antigo SNI, para muitas vezes forjar escândalos.
O artigo é de J. Carlos de Assis*

Décadas atrás li a autobiografia do general Reinhard Gehlen, o chefe da espionagem alemã no Leste europeu durante a Segunda Guerra, o qual, com o fim desta e a derrota de Hitler, salvou a própria cabeça e as cabeças de seus auxiliares mais próximos vendendo aos americanos seus arquivos e sua rede de contatos no coração da União Soviética. Tornou-se uma legenda, pela eficiência com que organizou, nas duas situações – sob Hitler, e sob os americanos -, sua excepcional rede de espionagem contra os soviéticos.

General Reinhard Gehlen ao centro

O fim da guerra deveria ter significado também o seu fim. Precavido, antes da derrocada final alemã enterrou algo como 50 barris de microfilmes em montanhas da Áustria para negociá-los com os vencedores. Deu certo. Gehlen acabou conquistando a confiança dos americanos, e da própria CIA, transferindo para eles sua lealdade e, principalmente, seus arquivos materiais e mentais. Na antiga função, notabilizara-se sobretudo por ter sob seu comando centenas de brilhantes jovens espiões, recrutados entre a elite dos exércitos alemães.

Na nova, manteve esses critérios.

Ex-general Reinhard Gehlen
Cerca de 4 mil agentes do antigo Reich foram “transferidos” para os serviços de espionagem da nova Alemanha dirigidos por Gehlen. Foram fundamentais para a organização de um serviço de informação ocidental direcionado contra os soviéticos. Antes, não havia nenhum sistema de espionagem estruturado nesse sentido pelos americanos. Sem os serviços de Gehlen, e sem essa “transferência”, os Estados Unidos teriam uma tremenda dificuldade na condução ideológica de seu lado na Guerra Fria, que não se limitava apenas à espionagem, mas também à comunicação.

Boris Yeltsin
Essas reminiscências me vieram à mente com o fim da União Soviética, e com a pergunta óbvia: O que foi feito do imenso aparato de espionagem, informação e contra-informação soviético, deixado sem pai nem mãe enquanto o Estado se desestruturava no desgoverno Yeltsin? Sabemos que algo dele sobreviveu nas mãos de Putin, mas até que este antigo homem de informação assumisse o poder dezenas de milhares de espiões de dentro e de fora da União Soviética perderam privilégios e rendas, sendo forçados a buscar outros meios de vida.

Minha intuição é que essa rede universal de espionagem deserdada, não tendo em seu comando um general Gehlen que a negociasse em bloco com um novo patrão – os americanos não se interessariam, a não ser pelos cabeças -, tem sido comprada no varejo por duas estruturas poderosas, que podem pagar por ela: o sistema financeiro e a grande mídia. O sistema financeiro usa a espionagem privada para manipular e chantagear políticos na busca de decisões legislativas a seu favor. É uma forma agressiva de lobby, que funciona sobretudo nos Estados Unidos.

Quanto à utilização pela mídia de espiões descolados das estruturas formais de espionagem, tivemos a primeira evidência mundial com o caso Murdoch na Inglaterra: esse mega-empresário das comunicações, dono do Wall Street Journal, dentre outros jornais de direita, foi pego com a boca na botija ao empregar espiões para grampear personalidades de várias áreas na Inglaterra para chantageá-los com seu jornal de escâncalos. Isso sugere o cruzamento de interesses financeiros com interesses midiáticos espúrios, numa conspiração gigantesca, em escala global, contra a democracia.

No Brasil, estamos assistindo estupefatos ao descortinamento do conúbio inacreditável entre mídia e crime organizado: gravações feitas pela Polícia Federal com autorização da Justiça revelam que a maior revista do pais, “Veja”, teria sido regularmente pautada por bandidos que usam espiões privados, alguns egressos do antigo SNI, para muitas vezes forjar escândalos. Note-se que o SNI, Serviço Nacional de Informações, foi extinto por Collor anos atrás, e seus espiões, assim como os soviéticos, foram deixados à solta no mundo para quem pagasse melhor.

Em relação à “Veja” havia outros indícios de utilização de espiões, como tem sido bem documentado pelos jornalistas Luís Nassif e Paulo Henrique Amorim. Com minha experiência de mais de 30 anos de jornalismo ativo, e tendo eu próprio sido um dos introdutores do jornalismo econômico investigativo na área econômica no início dos anos 80 – portanto, ainda sob a ditadura -, desconfio de reportagens com excesso de detalhes cronológicos, minuto a minuto – como recentemente fizeram com José Dirceu. Nenhum repórter consegue esses detalhes relativamente a fatos passados a não ser pela mão de um espião. Alguém os colhe, e a maioria que os colhe, colhe-os para vender.
 
Como outras revistas de direita, “Veja” paga pelo material, na medida em que rende aumento de circulação, pondo um laranja para assinar.

Tudo se faz, claro, sob o manto protetor da liberdade de imprensa!
  
 (*) Economista e professor, presidente do Intersul, autor, junto com o físico-matemático Francisco Antonio Doria, do recém-lançado “O universo neoliberal em desencanto”, pela editora Civilização Brasileira. Esta coluna é publicada também no site “Rumos do Brasil” e, às terças, no jornal carioca Monitor Mercantil.


sábado, 7 de abril de 2012

Roger Waters defende a causa palestina e sofre ameaça

03/04/2012 - Baby Siqueira Abrão - Correspondente no Oriente Médio - Brasil de Fato

A Federação Israelita do Estado do Rio de Janeiro (FIERJ) entra com ação para calar um dos fundadores do Pink Floyd, por críticas a Israel em entrevista realizada no Brasil.


A passagem pelo Brasil de Roger Waters, um dos fundadores do extinto grupo de rock progressivo Pink Floyd, enfureceu os sionistas.

Ativista da causa palestina desde 2006, quando decidiu conhecer a Cisjordânia depois de um show em Tel Aviv, Waters, em entrevista coletiva realizada no Rio de Janeiro, defendeu os palestinos, criticou o governo israelense e declarou apoio à campanha BDS, que boicota produtos fabricados em Israel. Também divulgou o Fórum Social Palestina Livre, encontro internacional a ser realizado em Porto Alegre de 28 de novembro a 1º. de dezembro de 2012.

As declarações desagradaram a Federação Israelita do Rio de Janeiro (FIERJ). Segundo nota publicada na coluna de Alcelmo Gois, em O Globo, o advogado da FIERJ, Ricardo Brajterman, tentou impedir na Justiça que Roger Walters voltasse a fazer “declarações antissionistas” no show realizado no Engenhão em 29 de março.

Acostumados à submissão europeia e estadunidense, os sionistas não esperavam a reação dos brasileiros, de afirmação da liberdade de expressão e de rejeição a todas as tentativas de calar as pessoas, em especial as que fazem críticas a Israel pela violação dos direitos humanos dos palestinos.

Várias organizações, como o Comitê de Solidariedade e Apoio ao Povo Palestino do Rio de Janeiro, a Frente em Defesa do Povo Palestino e a Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal) divulgaram notas públicas de apoio às declarações de Roger e de repúdio à atitude da FIERJ.

Israel ocupa territórios palestinos em desacordo com todas as leis internacionais, ergueu o muro do apartheid e da colonização, que foi declarado ilegal pelo Tribunal Internacional [de Justiça]. Constrói assentamentos na Cisjordânia, território palestino ocupado por Israel, em desacordo com todas as resoluções internacionais. Cerca e bombardeia a Faixa de Gaza, onde 1,5 milhão de palestinos estão sujeitos a sobreviver abaixo das mínimas condições de alimentação, educação e saúde. Israel não respeita e não cumpre as resoluções da ONU e do direito internacional, em total isolamento com a [sic] comunidade internacional. O governo de Israel faz tudo isso em nome do sionismo e quer impedir as pessoas de criticar essas ilegalidades e ações desumanas e opressoras?”, escreveram os ativistas da Fepal.

Os que querem calar Roger precisam ser informados de que o Brasil é um país democrático, o Brasil não ocupa e não oprime nenhum povo, o Brasil é um país onde convivem, pacificamente e com respeito, judeus, árabes, cristãos e muçulmanos, todos com os mesmos direitos e deveres estabelecidos na constituição da Republica Federativa do Brasil.

Repudiamos toda tentativa de intimidação e censura à liberdade de expressão por parte dessa [FIERJ] ou de qualquer outra organização. Tal atitude – inconstitucional, nos moldes da ditadura militar que vigorou no Brasil dos anos 1960 aos anos 1980 –, não tem mais espaço no Brasil”, afirmaram o Comitê de Solidariedade e Apoio ao Povo Palestino e a Frente em Defesa do Povo Palestino, citando, em seguida, artigos da Constituição brasileira e da Declaração de Direitos Humanos.

“[...] são ilegítimas e só podem ser encaradas como censura e perseguição as ameaças da Fierj ao cantor e ativista. Uma postura tão conhecida quanto inaceitável, de tentar criminalizar os movimentos sociais e as pessoas de consciência que se levantam contra a opressão ao povo palestino e contra a ocupação de suas terras. Repudiamos veementemente a atitude e as ameaças da FIERJ e reafirmamos nosso apoio a Roger Waters, à liberdade de expressão e aos valores democráticos. Aproveitamos para agradecer Roger Walters por não silenciar diante da injustiça e por emprestar sua imagem e sua voz para essa nobre causa da humanidade.”

Reclamações também foram feitas ao Ministério Público, que pode abrir processo contra a FIERJ.

Se o exemplo brasileiro fosse seguido em outras partes do mundo, os ativistas de direitos humanos e os críticos dos sionistas não sofreriam tanta perseguição nem tantos processos por exercer o sagrado direito de manifestar livremente o que pensam. Hoje, militantes da causa palestina estão sendo processados na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos.


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Carta que Roger Waters divulgou no Brasil:



Desde minha visita a Israel e aos territórios ocupados, em 2006, eu faço parte de um movimento internacional para apoiar o povo palestino em sua luta por liberdade, justiça e igualdade.


Sinto-me honrado por ter sido convidado pelo Comitê Nacional Palestino BDS para anunciar a iniciativa da realização do Fórum Social Mundial Palestina Livre em Porto Alegre, Brasil, em novembro deste ano, em cooperação com o movimento social brasileiro e redes internacionais da sociedade civil.

O objetivo será a criação de um encontro internacional que irá incentivar o instinto humano básico em todos os homens e mulheres de boa fé para se unirem em apoio ao povo palestino em sua luta por autodeterminação.


Em todo o mundo, nosso movimento está crescendo.

Incentivado por eventos como o que acontecerá aqui no Brasil, a nossa voz vai crescer.

Continuaremos o nosso apelo pelo fim da ocupação israelense de terras palestinas, pela derrubada dos muros de colonização e de apartheid, pela criação de um Estado palestino com sua capital em Jerusalém, pela concessão de direitos plenos e iguais aos cidadãos árabe-palestinos de Israel e pelo direito dos refugiados palestinos de voltar para suas casas, conforme exigido pela Convenção de Genebra, como estipulado na resolução 194 da ONU de 1949 e também reafirmado pelo Tribunal Internacional de Justiça em 9 de julho de 2004.

Estou muito encorajado pelo crescimento desse movimento em Israel, especialmente entre os jovens judeus israelenses, e também pelo não menos importante "Boicote de Dentro", com quem estou em contato.

Nós estamos com vocês.


Eventos em Israel e nos territórios ocupados não são amplamente relatados nem com precisão no Ocidente. Em novembro próximo, o Fórum Social Mundial Palestina Livre, em Porto Alegre, vai ajudar a quebrar os muros de desinformação e cumplicidade.


Conclamo as pessoas de consciência para que apoiem este fórum e ajudem a torná-lo um divisor de águas na solidariedade internacional ao povo palestino.



A verdade nos libertará.

Em solidariedade,



Roger Waters

sexta-feira, 6 de abril de 2012

A governança sul-americana da água

Zilda Ferreira
A América do Sul pode saciar a sede de todos os latino-americanos e socorrer quem precisar. É a região de maior reposição de água do mundo e tem três grandes aquíferos. Mas para isso é urgente que se consiga, em junho, durante a Conferência Rio+20, a criação de um organismo sul-americano capaz de impor o cumprimento da Resolução da ONU 64/292. Aprovada em julho de 2010 pela Assembleia Geral, reconhece como Direito Humano Água e Saneamento. O futuro organismo continental poderá defender nossos recursos hídricos, ameaçados de privatização.

No 6º Fórum Mundial da Água, realizado na França em março de 2012, as transnacionais da água, principalmente as francesas, defenderam um organismo internacional para gestão da água, a “Governança Global da Água”, para facilitar o processo de privatização. Relatora Especial da ONU para o Direito à Água e ao Saneamento, a portuguesa Catarina de Albuquerque se disse surpresa ao descobrir que o nenhuma menção à 64/292 nem qualquer referência a água como Direito Humano constava da declaração ministerial do Fórum.

O Conselho Mundial da Água – hegemonizado por transnacionais - não reconhecer como direito humano a água e o saneamento era previsível. Mas é preocupante que, presentes na delegação brasileira, os tecnocratas da ANA (Agência Nacional de Águas) e do CPRM-Serviço Geológico do Brasil (empresa de capital misto vinculada ao Ministério de Minas e Energia) tenham feito coro com os europeus em favor da criação da Governança Global.

Alter do Chão, Guarani e Bacia do Maranhão, três dos maiores aquíferos do mundo
Quem leu o livro Ouro Azul - como as grandes corporações estão se apoderando da água doce do planeta, de Maude Barlow e Tony Clarke, sabe que 70% do mercado da água pertence a duas empresas francesas - Suez e Vivendi. A Vivendi é dona do segundo maior conglomerado de comunicações do mundo, incluindo redes e canais a cabo de TV, jornais, editoras e operadoras de acesso à internet como a GVT, já em atividade no Brasil. A força do império Vivendi é difícil de medir, mas as empresas de exploração de água são as mais rentáveis, com tentáculos em todos os organismos multilaterais, decisivos para abrir caminho à privatização de recursos hídricos mundo afora.

Precedentes perigosos não faltam. Em 2007 a França tentou aprovar no IPCC (sigla em inglês para Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) instrumento intervencionista ainda mais abrangente. O então presidente francês Jacques Chirac propos a criação de um organismo internacional para fiscalizar o meio ambiente, óbvia estratégia para viabilizar a internacionalização da Amazônia. O governo francês já deu indicações de que voltará a tentar emplacar a proposta na Rio+20.

Apelo
Diante desse quadro é fundamental que os movimentos sociais e lideranças ambientais se juntem aos líderes sul-americanos durante a Rio+20 e tentem criar um organismo regional para gerir os recursos hídricos do continente. Corremos o risco de a América do Sul, que concentra quase metade da água do planeta, conhecer a sede em larga escala, pois a voracidade do mercado europeu de recursos hídricos é inesgotável.

No Brasil já existem exemplos de como o capital é agressivo para se apropriar da água. Os habitantes de Manaus vivem sobre a maior reserva do planeta, mas quem não pode pagar não tem acesso à água. A concessionária local é subsidiária de uma multinacional francesa e o aquífero está sendo contaminado por falta de investimento.

É tarefa da educomunicação, exercida principalmente pelos professores, educadores ambientais e comunicadores, acompanhar debates, fóruns internacionais, ler a mídia e o entorno de maneira crítica, além de analisar as propostas do mercado e dos tecnocratas. É preciso conscientizar o povo a exigir seus direitos ao meio ambiente e à água, que estão sendo apropriados pelas transnacionais. Para concretizar essa tarefa se faz necessário a criação de um organismo sul-americano forte e com participação popular.

Leia ainda:
Privatização da água: o 'fracasso' melhor financiado
A Centralidade da Água
A água novamente entre a vida e a morte


A CÚPULA DOS BRICS E O BOICOTE DA MÍDIA OCIDENTAL

30/03/2012 - Mauro Santayana em seu blog

A cada ano, quando chega a época da Cúpula Presidencial dos BRICS – a quarta edição desse encontro acaba de terminar em Nova Delhi, a capital indiana – torna-se cada vez mais evidente, para o observador atento, o patético esforço da mídia “ocidental” (entre ela boa parte da nossa própria imprensa) de desconstruir a imagem de uma aliança geopólítica que reúne quatro das cinco maiores nações do planeta em território, recursos naturais e população e que está destinada a modificar a o equilíbrio de poder no mundo, no século XXI.

Essa estratégia – com a relativa exceção dos meios especializados em economia - vai de simplesmente ignorar o encontro, à tentativa de diminuir sua importância, ou semear dúvidas sobre a unidade dos principais países emergentes, tentando ressaltar suas diferenças, no lugar do reconhecer o que realmente importa: a política comum dos BRICS de oposição à postura neocolonial de uma Europa e de um EUA cada vez mais instáveis, que se debatem com um franco processo de decadência econômica, diplomática e social.

Para isso, a mídia ocidental – incluindo a “nossa” - ignora os despachos das agências oficiais dos BRICS, principalmente as russas e as chinesas, que ressaltam a importância do Grupo e de suas iniciativas para suas próprias nações – o Brasil inexplicavelmente ainda não possui serviços noticiosos em outros idiomas, coisa que até mesmo Angola utiliza, e muito bem – e se concentra em procurar e entrevistar observadores “ocidentais” ou pró-ocidentais situados em esses países, que se dedicam a repetir a cantilena da "impossibilidade” do estabelecimento de uma aliança geopolítica de fato entre o Brasil, a Rússia, a Índia, a China e a África do Sul, baseados nos seguintes argumentos:


- A “distância” entre o Brasil, a África do Sul, e a Rússia, a índia e a China, como se em um mundo em que a informação é instantânea e um míssil atinge qualquer ponto do globo em menos de quatro horas, isso tivesse a menor importância.

- O fato de a África do Sul, o Brasil e a Índia serem democracias, e a China e a Rússia não serem democracias “plenas ” segundo o elástico conceito ocidental, que não considera a Venezuela uma democracia “plena”, mas o Kuwait ou a Arábia Saudita – autocracias herdadas e governadas pelo direito de sangue - sim.

- A concorrência da Índia, da China e da índia no espaço asiático, como se esses três países não cooperassem, até mesmo no campo militar, e não mantivessem reuniões, há muitos anos, para resolução de problemas eventuais.

- A rotulagem desses países em “exportadores de commodities” como a Rússia e o Brasil, “provedores de serviços”, como a India, e “fábricas do mundo”, como a China, como se essa situação, caso fosse verdadeira, não pudesse ser usada a favor de uma aliança intercomplementar, ou como se Rússia, Brasil e índia também não produzissem manufaturados, e entre eles produtos industriais avançados, como aviões, por exemplo.

É óbvio que uma aliança como os BRICS, que reúne um terço do território mundial, 25% do PIB, e praticamente a metade da população humana não se consolidará, política e militarmente, de uma hora para a outra. Mas também é igualmente claro, que não se trata de um grupo heterogêneo de nações que não tenham nada a ver uma com a outra.

Se assim fosse, o Brasil não estaria fornecendo aviões-radares para a índia, não estaríamos desenvolvendo mísseis ar-ar e terra-ar com a DENEL sul-africana, ou comprando helicópteros russos de combate, ou não teríamos, há anos, um programa de satélites de sensoriamento remoto com a China.

O primeiro traço comum entre os grandes “brics” como a Rússia, a China, a Índia e o Brasil, e, em menor grau, a África do Sul, é, como demonstra a sua oposição à política ocidental para com a Líbia e a Síria, o respeito ao princípio de não-intervenção.

Porque o Brasil, a Rússia, a Índia, a China, não aceitam que se intervenha em terceiros países, em função de questões relacionadas aos “direitos humanos”, por exemplo, ou devido à questão nuclear?

Porque, como são países que prezam a sua soberania, não aceitam que, amanhã, o mesmo “ocidente” que hoje ataca a Libia, a Siria, ou o Irã, venha se unir contra um deles, qualquer deles, por causa de outras questões, como poderia acontecer conosco, eventualmente, no caso dos “ direitos” indígenas, ou da defesa da Amazônia, o “pulmão do mundo”.



Quem tem telhado de vidro não joga pedra nos outros.

Que atire a primeira quem nunca pisou na bola. Qual é o país, hoje, que pode acordar pela manhã, olhar-se, enquanto sociedade, no espelho, e dizer que não tem nenhum problema de direitos humanos?

E mais, quem arvorou à Europa e aos norte-americanos a missão de julgar o mundo? Pode um país como os Estados Unidos, que invadiu e destruiu o Iraque, por causa de outro mito intervencionista, o da existência – comprovadamente falsa - de armas de destruição em massa naquele país, falar em direitos humanos? 

Pode uma Nação que inventou e usou, no Vietnam, centenas de toneladas de um veneno químico chamado agente laranja, contaminando para sempre o solo e as águas de milhares de hectares de selva, falar em defesa da natureza e das florestas tropicais?

Ou pode um país que jogou duas bombas atômicas sobre dezenas de milhares de velhos, mulheres e crianças desarmadas, queimando-as até os ossos - quando poderia – se quisesse – tê-las testado sobre soldados do exército ou da marinha japonesa, falar, em sã consciência, de controle de armamento atômico e da não proliferação nuclear?

A realidade por trás do discurso de defesa dos direitos humanos e da natureza é muito mais complexa do que Hollywood mostra às nossas incautas multidões em filmes como Avatar. Por mais que muitos espíritos de "vira-lata" queiram - mesmo dentro do nosso país - que Deus tivesse dado à Europa e aos Estados Unidos o direito de governar o mundo, para defender seu artificial e efêmero “american way of life”, ele não o fez.

Pequenos países, como a Espanha ou a Itália, na ilusão de se sentirem maiores, podem – assim o decidiram suas elites - abdicar de sua soberania política e econômica e bombardear a população civil na Líbia, no Iraque, no Afeganistão, em defesa de uma impossibilidade quimérica como a Europa do euro, e do mandato da “Pax Americana”.


Nações como o Brasil, a Índia, a China e a Rússia, se aferram ao direito à soberania, ao recurso à diplomacia, à primazia da negociação.

Não se pode salvar vidas distribuindo armas para um bando descontrolado de açougueiros que espanca e mata prisioneiros indefesos, desarmados e ensanguentados – mesmo que eles se chamem Khadaffi – e obriga jovens muçulmanos a desfilarem em fila, de joelhos, repetidas e infinitas vezes, sob a lente da câmera e a ameaça de armas e chicotes, para mastigar e engolir nacos de cadáveres de cães putrefatos. O futuro da humanidade no século XXI e nos próximos, depende cada vez mais da emergência de um mundo multipolar que se oponha à pretensa hegemonia “ocidental”.

E é isso – queiram ou não os jornais e comentaristas europeus e norte-americanos – que está em jogo a cada nova Cúpula dos BRICS, como a de Nova Delhi.