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quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

O papel da imprensa livre

por Eugênio Bucci*. Publicado originalmente no Observatório da Imprensa
Os práticos que nos perdoem, mas, de vez em quando, alguns achados do mundo acadêmico nos ajudam a entender o que encontramos por aí no mundo real. Isto posto, peço licença para trazer, aqui para o nosso Observatório, um pouco dos ares universitários. Faço-o com humildade e com alguma boa intenção.

As palavras do chapéu e do título acima lembram – propositadamente – um livro de Jesús Martin-Barbero, professor colombiano, um dos principais teóricos da comunicação no nosso continente: Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia (Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997). Barbero exerce uma forte influência acadêmica entre estudiosos de renome na Universidade de São Paulo e de várias outras universidades do mundo. Ele nos ajudou a escapar de esquematismos que vinham de interpretações mais estreitas, demasiadamente ortodoxas, do legado da Escola de Frankfurt: aquele quase determinismo que ainda hoje vê nos meios de comunicação um sistema de tentáculos a serviço da dominação de classe.

A partir dos estudos culturais e dos estudos da recepção, Barbero identificou, em pesquisas empíricas e em elaborações teóricas de boa qualidade, os núcleos da formação dos sentidos que fundam a autonomia da opinião e da vontade de cada sujeito. Isso jamais significou, do ponto de vista de Barbero e de vários outros que pensaram a partir dele, como Omar Rincón, o abandono de uma perspectiva crítica. Em nenhum momento, a afirmação da autonomia do espectador, do consumidor de informação ou, de forma mais geral, dos cidadãos, implica ressuscitar as teses de um liberalismo ora ingênuo, ora deslumbrado.

Algumas das melhores contribuições para a compreensão da televisão pública, por exemplo, vêm dessas correntes. E mesmo alguns dos melhores estudos sobre a real influência da televisão em públicos como o brasileiro. Lembro aqui um trabalho desbravador no Brasil, Muito além do Jardim Botânico (São Paulo: Summus Editorial, 1985), de Carlos Eduardo Lins da Silva. Carlos Eduardo demonstrou, de modo praticamente incontestável, que o Jornal Nacional, por mais central que fosse a sua presença no espaço público, não "fazia a cabeça" do telespectador. A audiência, entrevistada pelo pesquisador, dava todos os sinais de que sabia ver criticamente o telejornal e que sabia formar sua visão de mundo com independência. Hoje, esse livro de Carlos Eduardo é visto como um clássico nas escolas de comunicação. Com toda a justiça.

Barbero volta seu olhar para os núcleos em que os significados são tecidos. Esses núcleos se relacionam, sem dúvida, com as pautas e os pontos de vista presentes nos meios de massa, mas de modo algum se subordinam a eles. A mediação tem raízes na vida cotidiana das diversas comunidades, nas vivências materiais das pessoas, nas conversas, nas construções autônomas. Os meios, estes sim, é que vão beber aí para se redefinir, para melhor dialogar com seus públicos. A relação, enfim, não é unilateral, não é de determinação, mas é tensa, dialógica, muito mais complexa do que sonha a vã filosofia dos adeptos das variadas teorias conspiratórias.

A internet e a comunicação 'direta'
O advento da internet tornou esses processos mais visíveis. Com as tecnologias digitais, franqueou-se a circulação das opiniões independentes e, por meio delas, é muito mais fácil constatar o que teria sido sempre óbvio: as pessoas pensam com as próprias cabeças. Pensam mal, muitas vezes, mas pensam com suas próprias cabeças. Junto com a maior visibilidade da autonomia dos sujeitos, veio a euforia incontida dos que começaram a ver – nos blogs, nos sites ditos "alternativos" e nas chamadas redes sociais – a realização das utopias da tal "democracia direta", que teria vindo para atropelar e sepultar de vez a suposta "hegemonia classista" dos "formadores de opinião". Não é bem assim. Aliás, nunca é bem assim.

Um dos bordões da nossa era de internetolatria é a afirmação reiterada de que os formadores de opinião não formam mais a opinião de ninguém. Para esses, a grande prova dessa verdade teria sido dada pelas eleições de 2006, que deixaram claro que os meios de comunicação não conseguiram determinar a inclinação dos eleitores.

Mas – é o caso de nos perguntarmos – quando é que eles determinaram essas inclinações? Em 1974, quando Orestes Quércia se elegeu senador por São Paulo, a bordo do velho MDB, contra todas as opiniões ditas "dominantes". Quércia teve 4,6 milhões de votos, contra apenas 1,6 milhão de Carvalho Pinto. Quando a campanha por eleições diretas tomou as ruas do país, em 1984, deu-se o mesmo fenômeno. A televisão praticamente boicotou os comícios e, não obstante, eles só fizeram crescer – e dobraram a postura das emissoras de TV. Outra vez foi isso que vimos no movimento dos cara-pintadas que gritavam "Fora Collor".

Os formadores de opinião do establishment influenciam, assim como são também influenciados, mas não mandam na cabeça do público. Desde muito tempo. Isso é um dado da democracia de massas, se quisermos voltar a Alexis de Tocqueville (1805-1859), e continua valendo, mesmo que esse termo, "massas", seja bastante anacrônico para designar a democracia. Os meios não conduzem o povo. Dizendo a mesma coisa com outras palavras: o poder econômico não dá a palavra final. Ainda bem. Mas, atenção, isso não constitui nenhuma novidade.

Usei aqui o termo visibilidade, mas poderia ter usado outro: transparência. A internet deu transparência aos entendimentos e às negociações de sentido que têm lugar no mundo da vida e daí ingressam no espaço público, mas ela não inaugura esses entendimentos ou essas negociações de sentido para além dos poderes formais ou dos poderes constituídos. Eles já estavam lá, desde que a democracia é democracia. Os meios não ditam os sentidos – que precisam passar, sempre, pelas mediações.

Provavelmente em função dessa utopia que enxergou na internet uma vaga libertária sem precedentes – coisa que ela não é, uma vez que ela também deu novo fôlego e novo vigor a mecanismos de mercado e de acumulação de capital –, vários setores começaram a acalentar outro devaneio: o de que, agora, a comunicação é "direta" e não depende mais da mediação de nenhum órgão de imprensa independente. O raciocínio é um tanto simplório: como jornais e revistas não são mais necessários para que uma notícia vá a público, as redações independentes se tornaram tecnológica e politicamente desnecessárias. Mesmo porque, segundo o mesmo raciocínio, essas redações nunca foram independentes de fato, mas eram apenas correias de transmissão dos interesses das "elites" ou das inefáveis "classes dominantes". (Pense bem: quem são as tais "classes dominantes"? A burguesia e qual mais?) Portanto, ninguém precisa mais de imprensa, ou, pelo menos, já não se precisa mais dessa imprensa burguesa. A internet – o nirvana da "democracia direta" – daria conta de todos os recados.

Democracia e instituições
Fixemo-nos um pouco nessa expressão que usei aqui entre aspas (neste texto que, admito, vem abusando um pouco das aspas): "democracia direta". Plebiscitos, consultas populares, conferências nacionais, tudo isso é bom, por certo. São ferramentas que permitem oxigenar a máquina do Estado, trazem mais fiscalização e mais participação do cidadão na gestão da coisa pública. Nada de errado com isso. O delírio começa quando se imagina que esses recursos possam substituir o próprio Estado e as instituições.

Todas as possibilidades abertas dentro desse imenso guarda-chuva a que se vem dando o nome de "democracia direta" (as aspas, outra vez, são indispensáveis) consagram a vontade das maiorias, não raro cooptadas pelo poder governamental, mas elas não têm como zelar pelos direitos das minorias e pelas garantias individuais. Só a máquina do Estado dispõe de mecanismos para manter equilibrados os diversos contrapesos aí implicados.

Mas não vamos nos perder em categorias da Ciência Política. O ponto é que, no âmbito nacional e mesmo global, não há como escapar das fórmulas próprias da democracia representativa e das delegações, cujo funcionamento depende da legitimação das instituições e de suas regras próprias. Em suma, não há democracia direta que dispense o Estado. Ou, mais propriamente: não há democracia direta que prescinda da mediação que só as instituições (entre elas o Estado) podem oferecer ao curso das deliberações coletivas.

O resto é mito – e aqui digo mito no sentido de falsificação.

Do mesmo modo, essa histeria em torno da "comunicação direta" precisa ser lida a partir de mediações mínimas. A rigor, não existe uma "comunicação direta". Qualquer comunicação é sempre mediada pela língua, que, também ela, é uma instituição, como bem apontou Ferdinand Saussure (1857-1913). Como instituição, a língua nos fornece parâmetros comuns básicos, sobre os quais o que está em discussão vai se assentar. É a língua que nos dá as amarras mínimas para que entendamos que uma palavra está no feminino, que democracia quer dizer democracia, que direito é um valor ao qual todos nos vinculamos. Da língua vêm as categorias em nome das quais postulamos nossas proposições. E além da língua há outras instituições sem as quais não teríamos comunicação alguma.

Imprensa livre ou totalitarismo
Os que imaginam que podemos viver sem imprensa livre não sabem o que imaginam. Os que pregam a abolição da imprensa em nome de causas libertárias pregam o fim da liberdade – e das suas próprias causas, sem o saber.

A imprensa também é uma instituição. Nesse caso, uma instituição que ultrapassa de longe as fronteiras do Estado e que tem suas bases na sociedade, diretamente. Ela é anterior e posterior ao Estado. Redações independentes constituem territórios livres do poder do Estado – aqui, como em poucos outros lugares, podemos visualizar com clareza o modo como a liberdade adquire materialidade quando impõe limites ao poder do Estado. Podemos entender a liberdade como um campo em que o poder do Estado não consegue agir. Por isso as redações independentes são indispensáveis. Sem elas, perdemos a prerrogativa de olhar o poder pelo lado de fora, por meio de núcleos (as redações) que dispõem de uma gramática própria, de hierarquias próprias, de um método próprio de ler o mundo.

Que as redações – no Brasil e no mundo – andam descuidando da sua independência é um fato. É triste, é desalentador, mas é um fato. São muitas as redações que sucumbem às seduções do mercado (do poder econômico) e são muitas as que procuram se abrigar sob o manto do Estado, fazendo o jogo, por vias indiretas e dissimuladas, do poder. Mas vamos com calma. Pretender, a partir dessa constatação, que as redações independentes são apenas uma farsa e devem ser aposentadas, isso é apenas suicídio.

A imprensa precisa melhorar, com urgência. Precisa estar à altura dos desafios históricos que se apresentam, mas isso só será possível com mais – e não menos – independência. Isso só será possível com mais liberdade.

Aqui chegamos, finalmente, à função de mediação que só a imprensa livre pode exercer. Apenas as redações independentes podem promover a mediação do debate público que é essencial à democracia. Redações independentes podem ter inclinações de esquerda ou de direita: o fundamental é que elas sejam independentes da lógica do Estado e da lógica do mercado. Só elas podem reunir mediadores (os jornalistas, no sentido pleno da expressão) cuja sustentação material decorre diretamente de seu ofício, que é o de informar o público. Jornalistas independentes são sustentados não pelo Estado ou pela publicidade privada, mas pela confiança do público e pelos recursos financeiros que daí provêm. Um blog vinculado a um movimento social qualquer pode ser uma boa fonte de dados e de pensamentos originais – mas não é uma redação independente. Ela presta contas ao movimento social a que se vincula, e não ao público. Até mesmo os movimentos sociais, e principalmente eles, uma sociedade só compreende se sobre eles for capaz de deitar um olhar independente, um olhar que só pode se originar das redações independentes.

As redações independentes promovem o fórum comum dos debates públicos, comum porque acessível de modo equilibrado a todos os interesses em disputa na sociedade. Não há outro caminho. Sem os fóruns comuns, o que teríamos seria apenas a dispersão centrífuga que nos conduziria à desagregação organizativa e também de sentidos. Não há vida democrática sem o estabelecimento estável dos fóruns comuns. Por isso, não há democracia sem imprensa livre.

Melhoremos a nossa imprensa – sem matá-la. Não podemos ceder à armadilha fácil de supor que agora iremos prescindir da imprensa. Sem ela, não teremos mais a mediação mínima, a partir da qual poderemos avançar. Inclusive avançar no sentido de criticar, de aprimorar e de transformar a imprensa que temos.
*Eugênio Bucci é jornalista

domingo, 24 de janeiro de 2010

Mídia à beira de um ataque de nervos

por Alberto Dines, do Observatório da Imprensa
A mídia brasileira está sendo vítima de um surto da síndrome do pânico: está com horror ao espelho. Berra e esperneia quando alguém menciona a organização de conferências ou debates públicos sobre meios de comunicação, imprensa, jornalismo. Apavora-se ao menor sinal de controvérsias a seu respeito, por mais úteis ou inócuas que sejam. Parece ter esquecido que o direito de ser informado é um dos direitos inalienáveis do cidadão contemporâneo. O Estado Democrático de Direito garante a liberdade de expressão e o acesso universal à informação.

A instituição criada para impedir unanimidades, o poder instituído para promover o pluralismo, o bastião do Estado Democrático de Direito, agora se sobressalta e entra em transe quando pressente outros holofotes tentando focalizá-lo.

Diagnóstico 1: modéstia. Diagnóstico 2: narcisismo. Diagnóstico 3: onipotência. Diagnóstico 4: hipocrisia.

Nada impositivo
O primeiro episódio ocorreu no início de dezembro, antes da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom): o grosso das corporações empresariais de mídia desistiu de participar dos debates, compareceram apenas duas. As únicas que ficaram bem na fita. A Confecom chegou ao fim, produziu um calhamaço de propostas, a maioria inócuas, e os ausentes nem puderam cantar vitória porque se escafederam antes das luzes se apagarem (ver, neste OI, "Lições de manipulação" e "O misterioso e suspeito desaparecimento do Conselho de Comunicação Social").

Menos de um mês depois, final de dezembro, novo faniquito: o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH). A mídia inicialmente parecia sensível aos apelos das vítimas, parentes ou entidades em defesa dos direitos humanos para reabrir as investigações sobre a repressão política durante o regime militar. Então aparece a Associação Nacional de Jornais (ANJ) e começa a urrar como aquelas senhoras que pressentem uma barata no quarto escuro.

A mídia individualmente e a ANJ como corporação tiveram meses para estudar o 3º PNDH, esta é a sua função em nome da sociedade. Só se lembraram de examinar o documento quando o debate sobre tortura já estava aceso e alguém sugeriu abrandar o confronto e mudar o enfoque: que tal discutir a mídia? Então a mídia deu marcha a ré e entrou numa briga que não era sua porque no programa figurava a sugestão para a criação de um ranking das empresas de mídia (sobretudo mídia eletrônica) que respeitam os direitos do seu público e não lhes impinge baixarias. Convém lembrar que o PNDH é um programa, coleção de propostas, nada tem de mandatório ou impositivo.

O ombudsman da Folha de S.Paulo, Carlos Eduardo Lins da Silva, revoltou-se, caiu de pau no seu jornal (ver "Ombudsman critica omissão do jornal"). Acontece que a Folha, por rodízio, tornou-se a mais estridente defensora das posições da ANJ porque a sua presidente é uma das superintendentes do jornal.

Símbolos religiosos
É antiga a idéia de incluir a cruzada contra a baixaria televisiva nas iniciativas em defesa dos direitos humanos. Já em 1999, no primeiro mandato de FHC, o então Secretário Nacional de Direitos Humanos, José Gregori, tentou enquadrar os canais de TV que recusavam a classificação da programação por faixa etária (ver, neste Observatório, "Os fanáticos ensandecidos"). Então, por que tanto chilique?

O Estado de S.Paulo chegou a publicar uma entrevista com o professor Paulo Sérgio Pinheiro, consultor das Nações Unidas para questões de direitos humanos, na qual ele afirmava categoricamente que o 3º PNDH era herdeiro dos dois anteriores (produzidos nos mandatos de FHC) e que sua abrangência enquadrava-se nas recomendações e paradigmas internacionais.

A CNBB, campeã da luta contra a tortura ainda nos anos de chumbo, esqueceu o seu glorioso passado e pôs-se a berrar contra outras sugestões do 3º PNDH: liberar as restrições contra o aborto, permitir a união civil de pessoas do mesmo sexo e proibir a utilização de símbolos religiosos em instalações públicas. Mesmo sabendo que nada disso poderia ser implementado sem os devidos trâmites legislativos, a CNBB e a ANJ insistiram na histeria.

E ficaram todos muito felizes quando o salomônico presidente Lula mandou copidescar o texto do PNDH por ele assinado. Não se fala mais em direitos humanos nos próximos doze meses. Engano: a luta pelos direitos humanos não tem dono, está definitivamente incluída na pauta dos debates nacionais. Tortura não é coisa do passado, é do presente.

É melhor liberar o aborto do que encontrar diariamente nos lixões recém-nascidos abandonados por mães solteiras. A exibição de símbolos religiosos em repartições do Estado afronta aqueles que acreditam que o Estado é garantidor da isonomia cidadã, da democracia e da tolerância.

Causas e terapias
A síndrome do pânico voltou a manifestar-se intensamente no último fim de semana – e não por causa da catástrofe do Haiti –, quando o Estadão descobriu que em março começará uma nova conferência nacional, desta vez para discutir cultura. Deus nos acuda, horror. Cultura? Chamem o Goering! Na pauta menciona-se a necessidade de promover a regionalização da produção televisiva e aparece a expressão maldita "monopólio de comunicação".

Tremendo de medo, lívida, cheirando seus sais, Madame Mídia convocou o seu zorro preferido: o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ, ex-ministro das Comunicações do atual governo, o mesmo que pediu a impugnação integral da Lei de Imprensa, esquecido de que algumas de suas cláusulas eram indispensáveis para evitar o vácuo legal). O herdeiro de Chagas Freitas, ex-colunista especializado em pedir votos aos funcionários públicos, desinteressado como sempre, investiu imediatamente em defesa da aterrorizada mídia negando a existência de qualquer monopólio nos meios de comunicação.

Qualé, seu Miro – já esteve em Santos? Sabe o que se passa na maioria das capitais do Norte-Nordeste? Já examinou a situação das nossas cidades médias onde a principal emissora de TV é também a principal acionista do maior diário? Conhece os regulamentos da Federal Communications Commission (FCC) americana que impedem a propriedade cruzada de veículos na mesma região?

A síndrome do medo tem várias causas e várias terapias. Fármacos resolvem. O divã, porém, é mais eficaz.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Haiti: terremoto é desastre natural, mas a pobreza extrema, não

Mídia relaciona efeitos graves do terremoto com a pobreza extrema, mas não diz por que o país caribenho é tão subdesenvolvido
por Eduardo Sales de Lima e Igor Ojeda, do Brasil de Fato

As imagens das TVs de todo o mundo mostram um verdadeiro inferno. Destruição total, corpos estirados, homens e mulheres aos prantos. Os relatos dos repórteres nos jornais que foram a campo não são diferentes. Saques a supermercados, violência, desespero.

Quase em uníssono, os meios decretaram: os efeitos do terremoto de 7 graus na escala Richter ocorrido no dia 12 no Haiti são ainda mais graves devido à extrema pobreza em que vive a população do país, o de menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do hemisfério ocidental. A análise um tanto óbvia não é incorreta, mas a imprensa em geral “esqueceu-se” de explicar o porquê de tanta miséria, praticamente naturalizando o subdesenvolvimento acentuado do Haiti.

“É preciso que se diga que se, de fato, as causas da tragédia são naturais, nem todos os efeitos o são”, opina Aderson Bussinger Carvalho, advogado e ex-conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que visitou o país em julho de 2007. “É preciso saber que indústrias exploram a mão-de-obra barata haitiana, cujos produtos são exportados para o mercado dos EUA, assegurando imensos lucros que não se revertem em favor do povo. As casas construídas somente com areia, a ausência de hospitais, a falta de luz e água... tudo isso vem de antes do terremoto”, afirma.

Pobreza extrema
Atualmente, 80% dos haitianos vivem abaixo da linha de pobreza, sendo que 54% se encontram na extrema pobreza. A mortalidade infantil é de cerca de 60 mortes para cada mil nascimentos (no Brasil, a proporção está em torno de 22 para mil), a expectativa de vida é de 60 anos e o analfabetismo atinge 47,1% da população.

Além disso, o país sofre com a falta de infra-estrutura e indústria nacional. As estradas são bastante precárias, assim como as áreas de energia, telecomunicações e transporte. Dois terços dos haitianos dependem da agropecuária para sobreviver, enquanto apenas 9% trabalham em fábricas, em sua maioria nas chamadas maquiladoras, unidades especializadas em produção de manufaturados para exportação que se utilizam de mão-de-obra barata. “Durante o ano de 2009, percorremos todo o Haiti. Nossa brigada percorreu dez departamentos e conhecemos a situação de pobreza em que vive a imensa maioria da sociedade haitiana”, relata José Luis Patrola, militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e integrante da Brigada Internacionalista Dessalines da Via Campesina, que atua com as organizações camponesas do país.

Triste e estranha realidade para uma nação que foi a segunda das Américas a se tornar independente (da França) e a primeira a abolir a escravidão, em 1804. Ou seja, que tinha tudo para oferecer uma vida digna para seus habitantes.

Construção histórica
“A pobreza extrema do Haiti é uma construção histórica bi-centenária, produto da incessante intervenção colonialista e imperialista, em boa parte devido precisamente a ter sido o Haiti a primeira e única nação negreira onde os trabalhadores escravizados insurrecionados obtiveram a liberdade. Isso após derrotar expedições militares francesa, inglesa e espanhola”, explica Mário Maestri, historiador e professor do Programa de Pós Graduação em História da Universidade de Passo Fundo (UPF), no Rio Grande do Sul.

Segundo ele, a partir de então, o Haiti passou a ser temido pelos EUA, pois poderia servir como exemplo aos escravos estadunidenses. Assim, o país passou a “ser objeto de bloqueio quase total, desde seus primeiros anos, pelas nações metropolitanas e americanas independentes. Já em 1825, foi obrigado a pagar, sob pena de agressão militar, pesadíssima indenização à França. Conheceu nas décadas seguintes intervenções militares dos EUA, que, mesmo após a desocupação, em 1934, transformaram o país em semi-colônia, sobretudo através das sinistras ditaduras dos Duvaliers, Papa Doc e seu filho (entre 1957 e 1986)”.

De acordo com Osvaldo Coggiola, professor de História Contemporânea da Universidade de São Paulo (USP), o Haiti não é uma exceção na região em que se encontra, mas um caso extremo da dominação imposta pelos países centrais do capitalismo. Assim, para ele, “atribuir seus males à incapacidade da sua população, descendente de escravos forçados a trabalhar na ilha pelos colonialistas franceses, é um conceito abertamente racista. A classe dominante, ela sim, é corrupta até a medula. Se chegar ajuda para o governo local, vão roubar, para vender e chantagear a população”. Mais

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Cadê a coerência, senhor Ceneviva?

por Gustavo Barreto, do blog "Café da Manhã" - Consciência.Net
Apresentador do Jornal da Band, Boris Casoy (aquele que não gosta de garis) e advogado da ABRA (Associação Brasileira de Radiodifusores, na prática Band e RedeTV), Walter Ceneviva, fizeram propaganda contra as resoluções da Conferência Nacional de Comunicação (CONFECOM), dizendo que liberdade de imprensa é clausula pétrea da Constituição Federal. “Setores da esquerda radical não sabem conviver com rádios, tevês e jornais livres”, diz Casoy, ex-integranto do Comando de Caça aos Comunistas. “Não é a primeira vez que o Governo tenta cercear a liberdade de imprensa”, completa.

Curiosíssimo: ninguém da sociedade civil ou do Governo foi ouvido na “reportagem” desta quarta (20/1), apesar de ser um programa jornalístico.

Pelo que se vê, não são os “setores da esquerda radical” que não sabem conviver com os empresários – dando o nome correto ao que chamam de “livres”. A liberdade parece estar majoritariamente na própria sociedade civil não-empresarial, que se dispos a dialogar na CONFECOM com os demais setores. Walter Ceneviva, que conheci nesta Conferência, deveria exigir de sua entidade associada justamente… liberdade de expressão. Fica a dica.

A sugestão deste razoável pedido de coerência foi feito pelo site da ABRA (www.abra.inf.br/contato.php), para o editor do Jornal da Band, Fernando Mitre (fmitre@band.com.br e jornaldaband@band.com.br).

Nota do Blog EDUCOM: não deixe de ler os comentários lá no blog Café da Manhã. Basta clicar no primeiro link deste post

sábado, 16 de janeiro de 2010

BA: abuso de poder de fiscal da Anatel em repressão a rádio comunitária

São Luís, 14 de janeiro de 2010

Pessoal,

Ontem (13/1) um fiscal da Anatel, se intitulando dr. Ilton, engenheiro, invadiu uma emissora comunitária vinculada à Abraço Nacional no norte da Bahia e promoveu a apreensão de todos os equipamentos da emissora. O fiscal não tem poder de polícia, ele só pode lavrar auto-de-fiscalização e encaminhar para as providências cabíveis. O pior é que a Abraço havia denunciado uma emissora comercial que coloca um transmissor na frequência das radicom da região só para impedir que a população ouça a emissora. Ao invés de irem ao endereço denunciado, o fiscal foi à emissora comunitária e alegou que a única emissão identificada seria a daquele endereço. O coordenador da emissora mostrou a ele a antena utilizada para a interferência e ele simplesmente desconsiderou, disse que iria apreender os equipamentos. Eu falei com "Dr. Ilton" por telefone e ele me disse que a minha intervenção só iria "piorar" a situação do coordenador da rádio, pois seria a assumissão do crime. A ponderação feita por nós é a de que ele não tinha poder de polícia e que não poderia apreender os equipamentos. Que isso teria que ser feito por meio de mandado de busca e apreensão, emitido pela justiça federal para execução pela Polícia Federal. O "dr. Ilton" solicitou ao juiz da comarca e conseguiu a participação da Polícia Civil baiana. Nosso consultor jurídico falou com o delegado e mesmo assim não teve jeito. Ele disse que estava atendendo solicitação da Anatel. Segundo o coordenador da emissora, o fiscal disse que a Anatel já sabia da Abraço e que a mesma era "uma quadrilha" que organizava o crime.

Entrei em contato com o consultor jurídico do Minicom e comuniquei a ele o que estava ocorrendo.

Favor divulgarem essa denúncia.

José Sóter
Coordenador Executivo - Abraço Nacional
Secretário Geral FNDC
61-9964 8439
www.abraconacional.org
www.fndc.org.br
vicongressoabraco.blogspot.com

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Cuba envia médicos ao Haiti para ajudar vítimas do terremoto

Assistindo ao "Jornal Nacional", da TV dos herdeiros de Roberto Marinho, observei detalhes curiosos na cobertura do terremoto que devastou o Haiti terça, dia 12. Um deles: a ajuda de Cuba às vítimas não foi mencionada, nem mesmo quando foram citados os países da América Latina solidários ao vizinho Haiti. Brasil, Chile, Costa Rica... ué, onde estariam os médicos de Cuba? Mais tarde, vendo a TV Brasil, soube que somente ontem 400 médicos foram enviados por Havana. Leia esta reportagem e saiba que antes mesmo da tragédia havia centenas de profissionais de saúde cubanos trabalhando no Haiti, muitos, talvez, a esta hora desaparecidos. E a Venezuela? Por que não consta no noticiário da mídia brasileira nenhum pronunciamento do governo Chávez? Esses países não pertencem mais à América Latina? A propósito, de quantos milhões de dólares foi mesmo a ajuda da Costa Rica? (R.B, da Equipe do Blog EDUCOM)

Da Reuters

HAVANA - Cuba enviou médicos ao Haiti para atender vítimas do forte terremoto que atingiu o país, informou na quarta, dia 13, o chanceler cubano Bruno Rodríguez.

Rodríguez não relatou vítimas entre os 403 cubanos que trabalham em programas sociais no Haiti, entre os quais 344 médicos e paramédicos.

"Estamos trabalhando na ajuda médica de emergência à República irmã do Haiti. Enviamos medicamentos e um grupo adicional de médicos cubanos ao Haiti", disse Rodríguez.

O chanceler não precisou a quantidade de medicamentos nem o número de médicos adicionais enviados ao Haiti.

Rodríguez afirmou que dois cubanos no Haiti sofreram "lesões leves" em Porto Príncipe por causa do terremoto, que derrubou prédios e pode ter deixado milhares de mortos.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

A doença burguesa de Boris Casoy

por Gustavo Barreto, da revista Consciência.Net
São Paulo. Cidade Universitária, 1994. Fernando Braga da Costa, aluno do segundo ano de Psicologia da Universidade de São Paulo, tem uma tarefa: acompanhar, por um dia, o cotidiano de um grupo de trabalhadores. Ele escolheu os garis, que todos os dias varrem as calçadas e ruas e esvaziam as lixeiras do campus da maior universidade brasileira. Desde então o aluno, hoje psicólogo clínico e doutorando pela mesma universidade, se veste semanalmente de gari para ouvir os relatos de seus companheiros e sentir na pele a humilhação social sofrida por eles.


A experiência e as diversas histórias reunidas viraram tema de seu mestrado e chegaram aos leitores por meio do livro Homens Invisíveis: Relatos de uma Humilhação Social (Ed. Globo, 2004). Clique na foto da capa (ao lado) para acessar o livro no site Submarino.*

A reportagem abaixo, de Plinio Delphino, foi publicada originalmente em 2003 pelo jornal Diário de São Paulo e reproduzida pela Revista Consciência.Net dia 23 de abril daquele mesmo ano. Reproduzimos na íntegra e incluímos, abaixo, considerações sobre a profissão de gari e um banner comemorativo da prefeitura do Rio de Janeiro.

Fazemos este registro em resposta ao jornalista Boris Casoy, do Jornal da Band, que disparou todo o seu preconceito, em rede nacional, contra esta digna categoria de trabalhadores. Casoy disse em alto e bom som: “Que merda… Dois lixeiros desejando felicidades… do alto de suas vassouras… Dois lixeiros… O mais baixo da escala do trabalho”.

Fernando Braga da Costa conta como, uma vez reconhecida sua origem socioeconômica mais favorável, os garis se preocuparam em protegê-lo e passaram a tratá-lo melhor.

Após oito anos, na data da entrevista, o repórter pergunta a Fernando o que mudou na vida dele. “Acredito que essa experiência me deixou curado da minha doença burguesa. Esses homens hoje são meus amigos. Conheço a família deles, freqüento a casa deles nas periferias. Mudei. Nunca deixo de cumprimentar um trabalhador. Faço questão de o trabalhador saber que eu sei que ele existe. Eles são tratados pior do que um animal doméstico, que sempre é chamado pelo nome. São tratados como se fossem uma coisa.” Mais
*confira esta e outras sugestões de livros aqui

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Perigosa desnacionalização da TV ameaça a soberania brasileira

PL 29, o que se deve saber
do Blog do Jakobskind

"O capital privado tende a ficar concentrado em algumas mãos em parte por motivo de competição entre os capitalistas e em parte porque o desenvolvimento tecnológico e a divisão do trabalho, em crescimento, estimula a formação de unidades maiores de produção às custas das menores.

O resultado deste desenvolvimento é uma oligarquia de capital privado cujo enorme poder não pode ser efetivamente controlado nem mesmo por uma sociedade política democraticamente organizada. Sobretudo, nas condições existentes, os capitalistas controlam inevitavelmente, direta ou indiretamente, as fontes principais de informação (imprensa, rádio, educação). Assim, é extremamente difícil, e na verdade impossível na maioria dos casos, para o cidadão individual tirar conclusões objetivas e fazer uso inteligente de seus direitos políticos"- Albert Einstein

Por Carlos Alberto de Almeida, presidente da TV Comunitária de Brasília

Um gravíssimo golpe contra a soberania nacional está sendo preparado por meio do Projeto de Lei 29, relatado pelo deputado Jorge Bittar. A pretexto de criar novas regras para a TV por assinatura no Brasil, na realidade transfere o controle do setor para um reduzido grupo de poderosos conglomerados de telecomunicações (Telefônica, Telmex e Sky), abrindo espaço para um verdadeiro esmagamento da produção audiovisual brasileira, para a inviabilização completa das TVs comunitárias e universitárias, e, em futuro breve, para o controle total da TV aberta por transnacionais da comunicação. Sim, novas regras: os poucos oligopólios externos assumem o controle!

O lado triste e emblemático de tudo isto é que a manobra dos oligopólios estrangeiros da telefonia para dominar a TV brasileira ocorre no exato momento em que a AMAR (Associação dos Músicos Arranjadores e Regentes do Brasil) denuncia que o samba amaxixado "Pelo Telefone", do genial Donga, o primeiro samba gravado no Brasil, teve sua autoria transferida para editora musical dos EUA que comprou arquivos de editora nacional, sendo registrada como se fora canção norte-americana.

Esta verdadeira ofensiva de ocupação do audiovisual brasileiro, em continuidade à desnacionalização iniciada com a introdução da cabodifusão no Brasil, ocorre em meio a crescente processo de oligopolização do setor de comunicação e telecomunicação mundialmente, sem que o texto do PL 29 estabeleça qualquer mecanismo de proteção aos produtores nacionais, aos produtores independentes.

Além disso, o relator rejeitou ainda todas as sugestões para o fortalecimento das TVs comunitárias e universitárias para assegurar pluralidade e diversidade informativas. O resultado é previsível: controle da TV brasileira por conglomerados de comunicação-telecomunicação estrangeiros, hoje empenhados mundialmente na prática de formas sofisticadas de desestabilização de governos populares e nacionalistas, quando não na promoção de terrorismo midiático, como foi a operação destes impérios comunicacionais para justificar a ocupação militar do Iraque e do Afeganistão. São estas empresas que passarão a controlar totalmente a TV brasileira. O inacreditável é que os defensores do PL 29 acreditam que as mudanças, trazendo novos atores para o mercado, irão democratizar e popularizar o setor de TV por assinatura.

O apartheid audiovisual

Um rápido balanço sobre a cabodifusão no Brasil hoje já permite compreender que as novas regras trazidas pelo PL 29 simplesmente iriam concentrar e internacionalizar ainda mais a TV por assinatura no Brasil. Segundo a Ancine, 99,5 por cento dos filmes exibidos na TV paga brasileira são estrangeiros, esmagando a produção nacional. O Brasil possui a TV por assinatura mais cara do mundo, e com o maior tempo dedicado a publicidade, o que se configura em dupla-cobrança sobre o assinante que já havia pago também para livrar-se do dilúvio publicitário consumista-imbecilizante, que, na TV por assinatura, é ainda mais volumoso que na TV aberta.

No caso dos canais estatais (TVs do legislativo, do judiciário e do executivo) sua exibição na TV paga se constitui em aberrante bi-tributação, já que é com o dinheiro do contribuinte que elas são mantidas, mas, para ter acesso a elas, é preciso pagar novamente. Não admira que a TV paga no Brasil seja um fracasso de público, sem esquecer que a esmagadora maioria dos assinantes tem preferência pelos canais de TV aberta que são exibidos na TV por assinatura. É assombroso que ainda há os que chamam este verdadeiro apartheid audiovisual de democratização. Para quem, cara-pálida?

Trata-se na verdade de uma clamorosa injustiça para com o povo brasileiro que sustenta com verbas públicas estes canais por assinatura, mas é impedido de assisti-los. Enfim, é uma TV para poucos, mas paga com o dinheiro de muitos, que não têm acesso a esta TV, assim como não têm acesso a cinema, muito menos ao cinema brasileiro, praticamente clandestino no Brasil, a julgar pelos dados da Ancine e também os do IBGE apontando que apenas 8 por cento dos municípios brasileiros possuem salas de cinema, freqüentadas por apenas 12 por cento dos brasileiros, que, aos poucos, vão se tornando analfabetos cinematográficos.

Cotas? Que cotas? Quero o Brasil na TV!

Os debates em torno do PL 29 são primorosos para revelar quem é quem nesta luta pela democratização da comunicação no país. A maioria se distraiu num debate bizantino, pois na verdade estamos diante de uma operação do poder mundial do capital para ocupar um setor estratégico num país que tem riquezas estratégicas, seja petróleo, seja o potencial de energia renovável, sejam os minerais escassos em outras partes do planeta, seja a poderosa biodiversidade amazônica, cobiçada pelos oligopólios transnacionais da indústria químico-farmacêutica, todos estes atores que operam poderosamente no controle do fluxo mundial da informação, seja por meio da produção de conteúdos e/ou das estruturas de difusão, ou através da publicidade.

Num Brasil que nem mesmo empresa nacional de satélite possui mais - os brasileiros estão convocados inapelavelmente a examinar a ameaça que significa, no mundo atual, um país do porte do nosso não possuir soberania sobre seus satélites - há os que imaginam ser possível entregar o comando da propriedade e da produção televisivos e, ao mesmo tempo, acreditar , candidamente, na eficácia de algum milagroso tipo de cotas para a produção nacional.

Mesmo sabendo que ingenuidade tem limites, o deputado Jorge Bittar, em resposta a artigo da Revista Veja, elimina todas as possibilidades para dúvidas e para essas ilusões quando afirma que o PL 29 prevê apenas 10 por cento de cotas para a produção nacional, buscando tranqüilizar o oligopólio que já controla a TVA e, caso ocorra a aprovação do projeto, terá permissão legal de controlar muito mais da TV brasileira. Ou seja, nestas cotas, o Brasil está fora! Fica mais claro entender porque muitos dos que atuam no movimento pela democratização da comunicação silenciaram ruidosamente quando o ex-presidente do Senado, Renan Calheiros, denunciou a irregularidade no controle acionário sobre a TVA e pediu a instalação de uma CPI da Abril, até hoje engavetada.

A comparação feita pelos defensores do PL 29 com o regime de cotas para a produção nacional e a independente em outros países é imprópria. A França, que é um grande país capitalista, que já realizou seu processo de acumulação de capital por meio do impiedoso colonialismo, que possui mercado interno desenvolvido, mesmo assim não se dá ao luxo de não ter alavancas estatais protetores para a sua produção audiovisual frente à devastadora avalanche de ocupação do audiovisual produzido por Hollywood.

Mas, aqui, os defensores do PL, ou mesmo aqueles que no chamado movimento de democratização da comunicação estão paralisados diante de um grave golpe contra a soberania nacional - porque calculam que a entrada de novos atores tem sentido democratizante - terminam por serem coadjuvantes passivos deste processo de internacionalização e concentração de poderes sobre a TV brasileira por empresas estrangeiras, cujo resultado será rigorosamente nefasto para a produção televisiva nacional, como já se constata na realidade da cabodifusão hoje. Mais

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Confecom, um passo importante para democratização dos meios de comunicação


do Blog do Jakobskind

Balanço de evento é positivo
por Beto Almeida, presidente da TV Cidade Livre de Brasília

Basta tomar as manchetes rancorosas da grande mídia capitalista contra a primeira Conferência Nacional de Comunicação para comprovar que o evento representa indiscutivelmente uma importante vitória das forças progressistas no Brasil. Especialmente a TV Globo e o jornal “O Globo” dedicaram espaços para destruir a imagem desta primeira Confecom na história do Brasil, como se não fosse possível fazer um evento democrático na área da comunicação sem a anuência destes setores. Este era um tema proibido, hoje é agenda do Estado e da sociedade.

Nestas manchetes, revela-se que os grandes magnatas da mídia sentiram o golpe, pois para eles é inadmissível que este tema Democracia na Comunicação seja tratado pública e democraticamente. Muito menos aceitável, para eles, é que o governo patrocine tal evento. Para a oligarquia midiática qualquer ação feita com o sentido de criação de políticas públicas para a comunicação é inevitavelmente censura estatal, porque tratam a comunicação como se fosse um latifúndio, um indústria de alimentos contaminados, uma fábrica qualquer de medicamentos falsificados , embora bem embalados.

A grande diferença é que o governo atual não está interessado em censura mas em promover a democratização da comunicação. E para isto cuidou de construir uma aliança com os movimentos sociais e com setores não monopolistas do empresariado para viabilizar a Confecom, neutralizando, de certa maneira, a sabotagem organizada pela Abert, Anj e Aner. Primeiro é preciso reconhecer em geral o acerto desta tática de construir alianças entre governo e sociedade organizada, mas também com setores do empresariado dispostos a aceitar que a comunicação seja discutida por toda a sociedade e não apenas pelos pequenos círculos oligopolistas de sempre.

Pode-se prever que o tom de críticas a Lula será ainda mais azedo e odioso, do mesmo modo como também condenam e insultam Chávez, Rafael Correa, Evo Morales e Cristina Kirchner por promoverem medidas de democratização na comunicação e por terem tido a coragem de questionar e enfrentar os indecentes privilégios que aqueles magnatas da comunicação sempre tiveram. Eles não perdoarão jamais a Lula por ter convocado uma Conferência oficial para tornar a comunicação tema de todos os brasileiros.

A grande diferença é que o governo atual não está interessado em censura mas em promover a democratização da comunicação. E para isto cuidou de construir uma aliança com os movimentos sociais e com setores não monopolistas do empresariado para viabilizar a Confecom, neutralizando, de certa maneira, a sabotagem organizada pela Abert, Anj e Aner. Primeiro é preciso reconhecer em geral o acerto desta tática de construir alianças entre governo e sociedade organizada, mas também com setores do empresariado dispostos a aceitar que a comunicação seja discutida por toda a sociedade e não apenas pelos pequenos círculos oligopolistas de sempre.

Pode-se prever que o tom de críticas a Lula será ainda mais azedo e odioso, do mesmo modo como também condenam e insultam Chávez, Rafael Correa, Evo Morales e Cristina Kirchner por promoverem medidas de democratização na comunicação e por terem tido a coragem de questionar e enfrentar os indecentes privilégios que aqueles magnatas da comunicação sempre tiveram. Eles não perdoarão jamais a Lula por ter convocado uma Conferência oficial para tornar a comunicação tema de todos os brasileiros.

Organizar o campo popular da comunicação

A Confecom aprovou temas importantes, seja medidas de aplicação imediata, consideradas exeqüíveis porque dependem exclusivamente de ato de governo legitimado por um presidente que teve 63 milhões de votos e agora tem o respaldo de uma conferência nacional. Exemplo disto é que quando em 2004 o presidente Lula assinou decreto-lei criando a Rede de TVs Institucionais, que levaria o sinal destas emissoras a todos os municípios ( que também poderiam ter espaço de produção local de uma pequena parte da programação ), encontrou ampla oposição da Abert taxando o decreto de estatizante. Mas, também a Fenaj se opôs à criação da RTVI especialmente por discordar da via do decreto. Sem respaldo, e com outras dificuldades, Lula recuou. Agora tem consigo as resoluções aprovadas da Confecom, legitimadas pela ampla participação da sociedade, inclusive de um setor do empresariado. O que não elimina a necessidade do fortalecimento do campo democrático e popular de comunicação para a implementação das resoluções, consistindo na manutenção da aliança entre governo, partidos políticos, movimentos sindicais, movimentos da sociedade e segmentos empresariais não monopolistas.

Agora a Confecom lhe dá o respaldo para que, por meio de atos de governo, seja portaria, seja decreto ou regulamentação, muitas resoluções aprovadas sejam transformadas em realidade. Aqui incluídas uma boa parte das 59 propostas que a Secom aprovou na conferência, tendo como linha o fortalecimento da comunicação pública, como a criação do Operador Nacional Único de Rede nas mãos da EBC, a mudança de critérios para a publicidade institucional que também alcançará a comunicação comunitária, a inclusão dos canais comunitários na TV digital em sinal aberto, a distribuição equitativa de concessões na era digital para os segmentos público, estatal e privado, uma nova relação com as rádios comunitárias a partir de estruturas específicas para desburocratizar seus pleitos, o fim da criminalização ao setor, inclusive porque passarão a fazer parte também, oficialmente, da pauta de publicidade institucional, o que é uma relação concreta entre estado e movimentos sociais que sustentam a radiodifusão comunitária.

Deste modo, o pessimismo ou o ceticismo de muitos delegados, que só durante o transcorrer da Confecom foram se convencendo que estão de fato fazendo avançar e concretizando um leque de reivindicações que, durante décadas, eram apenas alardeadas como algo muito remoto, devem ser transformados não em otimismo inconsequente, mas num realismo ativo, construtivo, indicando que foi feita uma Confecom possível, com resultados práticos e com conteúdo político e programático justo para a continuidade de uma luta que exige medidas de fundo, muito mais radicais, que só num outro governo e com outras relações de força poderão ser adotadas.

Bandeiras históricas e propostas exequíveis

Todas as demandas históricas do movimento pela democratização da comunicação também foram debatidas - a profundidade dos debates foi enormemente prejudicada pela péssima organização dos trabalhos a cargo da FGV, com erros tão primários que o governo está na obrigação de investigar - e em boa medida aprovadas.. Há consciência de que estas bandeiras históricas, relacionadas à regulamentação do capítulo da Comunicação Social na Constituição, dependem de um acúmulo de forças muito maior na sociedade brasileira. Se aceitarmos uma estimativa de que a Confecom envolveu a participação de 30 mil pessoas que estiveram nas conferências municipais, conferências estaduais, conferências livres, seminários sindicais, encontros de segmentos, talvez estejamos diante da necessidade de aceitar que ainda falta muito para transformar radicalmente uma tirania midiática instalada há décadas, com poderes de fato para interferir nos rumos do processo político, econômico e social. Só agora, a partir da Confecom o debate da comunicação poderá deixar de ser coisa de especialistas, de comunicólogos, ou de jornalistas, para ganhar de fato a atenção de amplos setores da sociedade.

Desse modo, é importante vitória que as concessões de TV e rádio sejam debatidas e questionadas não apenas por círculos pequenos acadêmicos ou sindicais, que haja propostas para a democratização de suas outorgas e que a renovação destas concessões sejam obrigatoriamente submetidas ao crivo da participação da sociedade, por meio de audiências públicas. É também enorme vitória a aprovação pela Confecom de resoluções visando regulamentar a Constituição que já prevê a proibição do oligopólio e monopólio, que exige o uso educativo e informativo destes serviços, que estabelece a complementaridade entre os segmentos público, estatal e privado, apontando na direção do fortalecimento dos segmentos público e estatal, largamente preteridos na atualidade pelos indecorosos privilégios que o setor privado recebeu ao longo de décadas.

Conselho de Comunicação Social

A Confecom foi além ao aprovar resoluções contra a discriminação racial ou de gênero, contra a publicidade anti-saúde promotora de consumo irresponsável e destrutivo, contra as agressões publicitárias à criança. Especialmente por ter aprovado a criação do Conselho de Comunicação Social, proposta também de iniciativa do governo Lula. Sem desprezar a recuperação do Conselho de Comunicação do Congresso, hoje paralisado. Certamente, tais lutas demandarão enorme esforço de continuidade da ampliação das forças hoje em ação para que possam efetivamente virar realidade. Mas, para isto, já conta com o fortalecimento do campo público da comunicação, incluindo a expansão das emissoras ligadas à EBC, as TVs e rádios educativas, legislativas, comunitárias e universitárias, o que não depende de aprovação do Congresso Nacional, o que seria improvável a curto prazo. É fundamental que o Campo Popular da Democratização também aponte a sua luta para formar uma Bancada da Comunicação Democrática nas eleições de 2010, além de fazer com que os presidenciáveis se posicionem e se comprometam claramente com as resoluções da Confecom, como aliás, Lula mencionou na abertura do evento. Mais

COP15, 'uma depredação capitalista'. E veja como latifundiário é tratado na Bolívia...


Os presidentes da Bolívia e da Venezuela (foto, do jornal argentino Página 12) insistiram que o aquecimento se deve aos "desvios do capitalismo" e criticaram os países centrais que impediram que se chegasse a um acordo. Chávez citou Fidel ao dizer que o fechamento é "inglório". A reportagem é de Cledis Candelaresi e foi publicada pelo Página 12 no sábado, dia 19. Tradução de Moisés Sbardelotto.

"Somos guerreiros, não se metam conosco", advertia Hugo Chávez, meio a sério, meio em tom de brincadeira, com um abraço lateral a Evo Morales no palco da coletiva de imprensa que ambos os presidentes improvisaram para anunciar sua retirada da cúpula porque já não haveria um documento de consenso. A decisão foi apresentada como sendo do bloco Alba, a Aliança Bolivariana, iniciativa promovida pelo presidente venezuelano, e à qual aderem outros como Equador, Cuba e Nicarágua. Os discursos dos governantes se centraram na denúncia do capitalismo e eludiram questões técnicas.

Foi a ministra do Patrimônio Natural do Equador que fez uma síntese da denúncia formulada pelo bloco e esclareceu que o Brasil, a China e a Índia comungam dessa postura, mesmo que não estivessem presentes ali. "Denunciamos as práticas antidemocráticas, que violam os procedimentos das Nações Unidas. Não podemos aceitar que países de elite tomem decisões que nos envolvam e querem impingi-las a nós", sentenciou Marcela Aguinaga.

Ela fazia referência à possibilidade, depois concretizada, de que se apresentasse no final do evento um documento diferente de qualquer um que pudesse ter surgido do trabalho que, durante dias, os dois grandes grupos de negociação realizaram: o que discutiu uma prorrogação do Protocolo de Quioto e o que tentou construir as bases para um acordo totalmente novo. Em rigor, a mesma manobra que o presidente do Brasil objetou durante sua veemente exposição do meio-dia.

"É preciso reflorestar o planeta. Temos que frear a depredação capitalista" , sintetizou o venezuelano quando uma jornalista brasileira lhe perguntou especificamente sua opinião sobre os avanços técnicos do grupo Redd (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação), que busca analisar as complexas alternativas para combater o desmatamento do planeta. A essa inquietação expressada em portunhol, seguiram-se várias outras em inglês, que o chanceler nicaraguense – erigido a moderador do encontro – fez que fossem formuladas rapidamente, habilitando extensas respostas que finalmente não iam ao encontro do núcleo da pergunta proposta.

"O que está em debate são as duas formas de vida: a do capitalismo, que não respeita a Mãe Terra, e a do socialismo, que tenta harmonizar a vida com ela", considerou Morales. A colaboradora do presidente Rafael Correa o ajudava como intérprete, enquanto uma jovem tradutora fazia o mesmo com Chávez, que em todas as ocasiões que teve aludiu a uma opinião de Fidel Castro, dada em uma nota em seu poder. Ali, o líder da Revolução Cubana qualificou de "inglório" o encerramento desse encontro sem um documento de consenso.

Mas no mesmo estrado estava também o vice-presidente cubano, Salvador Ceren, que em tom cansado, totalmente alheio à pressão que impõe o ritmo frenético de uma sucessão de coletivas de imprensa desse evento, detalhou como a revolução da ilha limita as emissões de carbono "ensinando os jovens" a organizar a agricultura. Chávez o interrompeu prometendo contar em um minuto o que ele precisou de dez: como em seu país criam-se "animalitos" (bactérias) que devoram pragas sem necessidade de fumigar, cuidando desse modo do ambiente.

O presidente da Bolívia preferiu conceitos contundentes. "Não se trata só do clima. Trata-se da fome e do racismo. Trata-se dos desvios do capitalismo" . A funcionária equatoriana, enquanto isso, foi mais precisa ainda com o remate de sua intervenção. "Questionamos a falta de compromisso real de reduzir as emissões dos países desenvolvidos. Estão se esquecendo da dívida histórica de contaminação que contraíram". Fora do salão, enquanto isso, buscava-se desesperadamente algum papel que evitasse o encerramento inglório, segundo os termos de Fidel.

Dá-lhe Evo!

do Portal Imprensa
O banqueiro, barão da mídia e latifundiário boliviano Osvaldo Monasterio, proprietário da rede de TV opositora Unitel, teve quase 3 mil hectares de suas terras expropriados (confiscados sem indenização) pelo governo, para fins de Reforma Agrária. Segundo a agência de notícias Associated Press, as terras serão distribuídas a indígenas.

As autoridades alegam que Monasterio obteve os títulos de propriedade de maneira fraudulenta, e os prédios localizados nos terrenos não cumpriam função sócio-econômica. No entanto, parlamentares de oposição consideram que a expropriação teve motivação política.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

A grande mídia e a segunda Confecom


da Agência Carta Maior
A 1ª Conferência Nacional de Comunicação é a realização de uma reivindicação histórica dos movimentos sociais e constitui um avanço democrático com o qual os grupos privados de mídia, atores historicamente dominantes no setor, não souberam lidar. Apesar de interessar a todos os atores um marco regulatório atualizado para as comunicações, os empresários privados parecem acreditar que as políticas públicas continuarão sendo indefinidamente estabelecidas com a exclusão da cidadania. Espera-se que as entidades empresariais que se retiraram da conferência revejam suas posições e participem dos debates da 2ª Confecom. A análise é de Venício Lima*.

Concluída a 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), que aconteceu em Brasília, de 14 a 17 de dezembro, com a participação de mais de 1.600 delegados, democraticamente escolhidos em conferências estaduais realizadas nas 27 unidades da federação, representando movimentos sociais, parte dos empresários de comunicação e telecomunicações e o governo – independentemente da avaliação de suas deliberações – é hora de tentar compreender as razões que levaram os principais grupos empresariais brasileiros de mídia a boicotarem o evento.

O anúncio público da retirada das seis entidades empresariais da Comissão Organizadora da 1ª Confecom se deu após reunião realizada entre elas e os ministros das Comunicações, Hélio Costa, da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins e da Secretaria-Geral da Presidência, Luiz Dulci, no dia 13 de agosto. Os membros da Comissão haviam sido designados em 25 de maio e a primeira reunião se realizado há pouco mais de dois meses. Estava-se, portanto, apenas no início de um longo processo.

Uma nota divulgada logo após a retirada e assinada conjuntamente pela ABERT - Associação Brasileira de Emissoras de Radio e Televisão; ABRANET - Associação Brasileira de Internet; ABTA - Associação Brasileira de TV por Assinatura; ADJORI BRASIL - Associação dos Jornais e Revistas do Interior do Brasil; ANER - Associação Nacional dos Editores de Revistas e ANJ – Associação Nacional de Jornais, afirmava, dentre outros pontos, o seguinte:

Por definição, as entidades empresariais têm como premissa a defesa dos preceitos constitucionais da livre iniciativa, da liberdade de expressão, do direito à informação e da legalidade.


Observa-se, no entanto, que a perseverante adesão a estes princípios foi entendida por outros interlocutores da Comissão Organizadora como um obstáculo a confecção do regimento interno e do documento-base de convocação das conferências estaduais, que precedem a nacional.
Deste modo, como as entidades signatárias não têm interesse algum em impedir sua livre realização, decidiram se desligar da Comissão Organizadora Nacional, a partir desta data.

É importante registrar que permaneceram na Comissão Organizadora duas entidades empresariais: a ABRA - Associação Brasileira de Radiodifusores, uma dissidência da ABERT fundada pelas redes Bandeirantes e Rede TV!, em maio de 2005; e a TELEBRASIL - Associação Brasileira de Telecomunicações, criada em 1974, que tem como missão “congregar os setores oficial e privado das telecomunicações brasileiras visando a defesa de seus interesses e o seu desenvolvimento”.

Controle social e censura
A realização da Confecom – a última conferência nacional a ser convocada de todos os setores contemplados pelo “Título VIII - Da Ordem Social” na Constituição de 88 – sempre encontrou enormes resistências dos grandes grupos de mídia. Não seria novidade, portanto, que na medida mesma em que avançassem as difíceis e complexas negociações, e antes mesmo do desligamento das seis entidades empresariais, surgissem também os “bordões de combate” à sua concretização, reiterados na narrativa jornalística (cf. OI n. 550, Controle Social da Mídia – Por que não discutir o assunto?).

O que foi inicialmente identificado na nota dos empresários como uma divergência interna em torno dos “preceitos constitucionais da livre iniciativa, da liberdade de expressão, do direito à informação e da legalidade” na Comissão Organizadora, foi aos poucos se transformando em insinuação permanente de que até mesmo a simples realização da conferência se constituía em grave ameaça à liberdade de expressão. Seu foco, dizia a grande mídia nas raríssimas ocasiões em que o tema foi pautado, era o ameaçador controle social da mídia, isto é, o retorno aos tempos do autoritarismo através da censura oficial praticada pelo Estado.

No dia de abertura da 1ª Confecom, 14 de dezembro, o Jornal Nacional da Rede Globo, que até então silenciara sobre sua realização, deu uma nota que exemplifica a postura da grande mídia: questiona a representatividade do evento e insinua que seu foco seria o controle social da mídia, equacionado sem mais com a censura que cerceia a liberdade de expressão e o direito à informação. Vale conferir:

APRESENTADORA FÁTIMA BERNARDES: Começou hoje, em Brasília, a primeira Conferência Nacional de Comunicação, que pretende debater propostas sobre a produção e distribuição de informações jornalísticas e culturais no país. Entre as propostas estão o controle social da mídia por meio de conselhos de comunicação e uma nova lei de imprensa. O fórum foi convocado pelo Governo Federal e conta com 1.684 delegados, 40% vindos da sociedade civil, 40% do empresariado e 20% do poder público.

APRESENTADOR WILLIAM BONNER: Mas a representatividade da conferência ficou comprometida sem a participação dos principais veículos de comunicação do Brasil. Há quatro meses, a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, a Associação Brasileira de Internet, a Associação Brasileira de TV por Assinatura, a Associação dos Jornais e Revistas do Interior do Brasil, a Associação Nacional dos Editores de Revistas e a Associação Nacional de Jornais divulgaram uma nota conjunta em que expõem os motivos de terem decidido não participar da conferência.


Todos consideraram as propostas de estabelecer um controle social da mídia uma forma de censurar os órgãos de imprensa, cerceando a liberdade de expressão, o direito à informação e a livre iniciativa, todos previstos na Constituição. Os organizadores negam que a intenção seja cercear direitos. A conferência foi aberta com a participação do presidente Lula. Mais
*pesquisador sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da Universidade de Brasília - NEMP/ UnB

domingo, 20 de dezembro de 2009

Confecom: Sarney e Gilvam Borges são alvos de moções de repúdio


A 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), encerrada quinta, dia 17, em Brasília, aprovou duas moções de repúdio a senadores da República. Uma, ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e outra, ao senador Gilvam Borges (PMDB-AP). As moções foram apresentadas sob a justificativa de que a família de Gilvam detém monopólio de comunicação no Amapá e que Sarney usou a estrutura do Senado para promover no Amapá 105 processos contra jornalistas e blogueiros.

As moções foram assinadas por, pelo menos, 500 participantes do encontro. Entre eles, a deputada Luíza Erundina (PSB-SP), o coordenador nacional da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço), José Luis do Nascimento Soter, e o representante da Intervozes Jonas Valente. As moções foram aprovadas ao final da conferência, que ocorreu em Brasília nesta semana.

Leia as moções de repúdio aos senadores:

MOÇÃO DE REPÚDIO

Ao senador José Sarney, por patrocinar o cerceamento da liberdade de expressão de blogs e meios de comunicação dos Estados do Amapá e São Paulo, e, consequentemente, do Brasil.


Existem no Estado do Amapá diversos jornalistas e blogueiros que estão com pendências econômicas na justiça devido a ações judiciais movidas pelo Senador José Sarney (PMDB-AP), cuja fundamentação é de teor meramente político. Nas eleições de 2006, o funcionário do Senado, Fernando Aurélio de Azevedo Aquino, que ocupa o cargo de policial legislativo federal, assinou, segundo comprovante expedido pela Justiça Eleitoral, exatas 105 ações contra jornalistas, radialistas e blogueiros amapaenses. Foram vítimas desse tipo de ação e tiveram seu direito a livre expressão cerceado, as irmãs Alcilene e Alcinéa Cavalcante, os jornalistas Humberto Moreira, Domiciano Gomes, Antonio Correa Neto, o jornal Folha do Amapá, o fotógrafo Chico Terra e a Rádio Comunitária Novo Tempo. A jornalista Alcinéa Cavalcante deve cerca de R$ 2,5 milhões por ter publicado a foto de uma charge com o símbolo, nascido em 2006, do movimento Xô Sarney criado naquele Estado pela Sociedade Civil. Os demais jornalistas e blogueiros do Estado também vivem a mesma situação de ver seus minguados recursos serem bloqueados para pagar multas impostas pelas ações do Senador Sarney.


No Estado de São Paulo, o Jornal O Estado de São Paulo encontra-se há 137 dias sob censura por ter publicado matérias que continham informações da Operação Faktor, mais conhecida como Boi Barrica. O recurso judicial, que pôs o jornal sob censura foi apresentado pelo empresário Fernando Sarney, filho do senador José Sarney. Diante do exposto, nós, participantes da I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), vimos manifestar através desta moção, nosso repúdio ao senador José Sarney por patrocinar o cerceamento da liberdade de expressão de blogs e meios de comunicação do Amapá, de São Paulo e do Brasil.

MOÇÃO DE REPÚDIO

Pela utilização indevida dos meios de comunicação por parte do grupo político do Senador Gilvam Borges, promovendo-se pessoalmente em detrimento dos interesses maiores da sociedade.


As concessões públicas de meios de comunicação precisam servir aos interesses do povo Brasileiro com critérios claros e objetivos, a fim de que não se desvirtue a finalidade do seu uso. Quando interesses públicos dão lugar ao proselitismo político e ao favorecimento pessoal daqueles que se consideram "donos" de concessões, que de fato pertencem a todos nós, expõe-se quanto ainda estamos longe do controle público e democrático dos meios de comunicação.

A concentração e o monopólio da informação por parte de políticos detentores de mandatos deve acabar. No Amapá, o Senador Gilvam Borges (PMDB-AP) detém, em nome de interpostas pessoas e parentes, um império de comunicação que congrega três concessões de televisão (as afiliadas locais da MTV, TV Brasil, Rede TV) e pelo menos vinte e três concessões de rádio espalhadas pelo Estado, que fazem diuturnamente apologia a sua figura pessoal. Mantenedor de 7 rádios comerciais e 16 rádios comunitárias, o senador faz formação de rede entre elas a fim de satisfazer seus interesses político-partidários, em nítida contrariedade à lei e aos interesses da sociedade. Também é grave o fato de que Gilvam Borges faz parte da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT) do Senado Federal e vota a concessão de meios de comunicação no país.


Por esta razão, todos que aqui se subscrevem manifestam o total repúdio ao modo utilitarista como grupo político do Senador Gilvam Borges vem se servindo dos meios de comunicação. A finalidade deste grupo político é única e exclusivamente promover a imagem pessoal do senador Gilvam Borges em detrimento dos interesses maiores da sociedade. Repudiamos veementemente a utilização indevida destes meios de comunicação e a manutenção deste sistema feito ao arrepio da lei.

Por que lutamos para democratizar as comunicações no Brasil

Este vídeo foi produzido pelo Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social e apresentado durante a I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada na última semana em Brasília. Dirigido por Pedro Ekman, é inspirado na narrativa do premiado curta-metragem "Ilha das Flores", de Jorge Furtado. Levante sua voz!

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Confecom: na abertura, Lula promete encaminhar ao Congresso propostas aprovadas

Presidente e ativistas criticam boicote de empresários
Acompanhamos pelo canal estatal NBR trechos da cerimônia de abertura da I Conferência Nacional de Comunicação, realizada na noite de segunda, 14, em Brasília. O coordenador geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e vice-presidente da Federação dos Jornalistas, Celso Schröder, criticou os empresários que tentaram esvaziar e até impedir a realização da conferência. Rosane Bertotti, dirigente da CUT, avisou que os movimentos sociais sairão da plenária final tendo incluído a democratização da comunicação na agenda do país e que, se suas pautas não forem aprovadas na Confecom, ganharão as ruas. E o presidente Lula, após também reprovar a recusa dos grandes jornais e das maiores redes de TV em dialogar com a sociedade civil, garantiu que as propostas aprovadas serão encaminhadas ao Congresso Nacional. A seguir, confira um resumo de algumas intervenções importantes (R.B, Equipe do Blog EDUCOM, com Agência Carta Maior e website da I Confecom).

O jornalista Celso Schröder atribuiu aos movimentos sociais os méritos pela instalação da Confecom, 60ª conferência setorial realizada no Brasil e primeira dedicada a debater propostas para a área de comunicação. Celso acusou grande parte do empresariado da mídia de se recusar a debater com o governo e os trabalhadores. "Mesmo com muita gente não querendo debater e tentando impedir a realização da Confecom, a conferência é um fato e uma vitória de trabalhadores e militantes que lutaram intensamente por sua realização nos últimos cinco anos", observou Celso, antes de render especial homenagem a Daniel Herz (1954-2006), ex-jornalista e militante sindical que foi co-fundador do FNDC, autor de "A História Secreta da Rede Globo", além de pioneiro em várias iniciativas para a democratização dos meios de comunicação. A cerimônia de abertura foi dedicada a Herz, cuja vida e obra foram lembradas em um vídeo exibido aos delegados, autoridades e convidados presentes no Centro de Convenções Ulysses Guimarães.

Rosane Bertotti, secretária de Comunicação da Central Única dos Trabalhadores, pediu unidade entre os profissionais, estudantes, comunicadores populares e militantes das comunicações, para garantir o reconhecimento pelo Estado do direito a informação e a definição desse direito como afirmação da cidadania. "A nossa luta precisa continuar após a Confecom. Sairemos daqui com muitas pautas para construir uma nova comunicação e, se não sairmos, vamos às ruas lutar pela democratização da comunicação", discursou.

Duas intervenções foram alvo de vaias por grande parte do plenário: as do ministro das Comunicações - dono de emissoras de TV e rádio afiliadas às Organizações Globo - Hélio Costa e a do presidente da Associação Brasileira de Radiodifusores Johnny Saad (dono da Rede Band de TV e rádios). Costa limitou-se a destacar o ineditismo da Confecom e alguns avanços a partir de políticas do governo federal no campo da comunicação. Não citou, é claro, a adoção do padrão japonês para a nova TV Digital. Durante aquele processo de debates e lutas, o ministro Hélio Costa obstruiu as gestões do movimento social para que o país adotasse um padrão nacional de SBTVD, desenvolvido por pesquisadores e estudantes de uma universidade pública do Rio Grande do Sul.

Johnny Saad deixou claro que Band e Rede TV - as duas redes que formam a Abra - lutarão pela desconcentração do mercado de TV a cabo e flexibilização do acesso ao sistema de retransmissão via satélite para o exterior. Saad só fez cessar os apupos e até arrancou alguns tímidos aplausos quando pediu que o governo ofereça, nos 10 canais público-estatais da TV Digital, "que podem se tornar 40 em cada região metropolitana", segundo o empresário, espaço para os movimentos sociais... e quando disse que as redes minoritárias de televisão querem "abrir uma porteira para um latifúndio de, hoje, apenas um dono", sob gritos de "O povo não é bobo, abaixo a Rede Globo!" vindos do plenário de delegados. Na verdade, Saad abusou de cinismo ao tentar afagar os movimentos sociais. Latifundiário e agroindustrial, divulgou em outubro nos noticiários da Band um editorial classificando a ocupação, pelo MST, de terras griladas da Cutrale em São Paulo como "ato terrorista".

Responsável pelo mais longo discurso da noite de abertura, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que a comunicação social precisa ser incluída na agenda do Estado brasileiro e que os candidatos a todos os cargos públicos em 2010, “principalmente à Presidência da República”, devem ser cobrados a se pronunciar sobre o tema para expor suas convicções e ideias. Segundo o presidente, o Brasil tem uma legislação ultrapassada, que não leva em conta as mudanças no cenário das comunicações.

Lula destacou que a circulação média dos jornais no eixo Rio-SP-Brasília está estagnada há cinco anos em 900 mil exemplares diários. No mesmo período, segundo o presidente, “os jornais de outras capitais cresceram 41%. No interior, ainda mais, 61%. No caso dos jornais populares, 120%. Esse processo deslanchará ainda mais com o plano do governo federal para universalização da banda larga (prometido para 2010)”. As novas tecnologias, de acordo com o presidente, já estão mudando a forma de se fazer jornalismo no país. “A indústria da comunicação sempre trabalhou com um modelo vertical”, afirmou. “Poucos escreviam e falavam para muitos. Com o crescimento da internet, consumidores de informação passaram a formar redes horizontais, trocando opiniões e tornando-se mais críticos e menos passivos.”

O presidente lamentou que alguns atores desse cenário (referindo-se à Abert, associação das redes de TV e rádio, e à Associação Nacional de Jornais) tenham se ausentado do debate, “temendo sei lá o quê”, pontuou. Na opinião do presidente, esses setores perderam uma oportunidade histórica de diálogo. “Não será enfiando a cabeça na areia ou tentando manter nossa ultrapassada legislação que lidaremos com esse debate. É chegada a hora de uma nova pactuação”, defendeu Lula, apostando que a Confecom produzirá o melhor documento possível para orientar o futuro das comunicações no país. “Alguns poderão perguntar pelos ausentes. Devo então lembrar-lhes que a Confecom é plural, com movimentos sociais e empresariado participando cada em 40% do plenário. O governo faz questão de ser minoria. Nosso papel será o de ouvir essas milhares de vozes e encaminhar as propostas aprovadas para serem debatidas e votadas pelo Congresso Nacional”, prometeu Lula, após saudar o que chamou de "bichos-grilos da internet" e os radialistas comunitários delegados à I Confecom.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

As primeiras vitórias da Confecom

do Blog do Miro
A 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), que deve agitar Brasília de 14 a 17 de dezembro, já representa uma histórica vitória dos movimentos sociais que há muito lutam contra a ditadura midiática instalada no país. Ela só foi convocada, durante o Fórum Social Mundial em janeiro, em Belém, por pressão destes setores. E, apesar das sabotagens das principais entidades empresariais, ela só vingou graças à habilidade dos mesmos movimentos sociais, que não caíram nas armadilhas dos barões da mídia que pretendiam inviabilizar a conferência.

A partir do decreto presidencial convocando a Confecom, em abril, o debate sobre o papel dos meios de comunicação se avolumou em todo o território. Como afirma o presidente Lula, nunca antes na história do país se discutiu tanto este tema estratégico. Concluída suas etapas municipais e estaduais, já pode se afirmar que a Confecom obteve uma vitória pedagógica, caminha para consolidar um saldo organizativo nesta área e pode, ainda, conquistar vitórias concretas no pós-conferência. Estes três avanços já são motivos de comemoração dos movimentos sociais.

O saldo pedagógico

Antes da convocação da Confecom, o direito humano à comunicação era entendido por restritos núcleos de “especialistas” no tema, que tiveram o mérito de erguer a bandeira da democratização do setor há mais de duas décadas. Apesar de duramente criminalizados pela mídia, o grosso dos movimentos sociais ainda não encarava esta frente como prioritária. A preparação da conferência começou a alterar este cenário, num esforço pedagógico sem precedentes na nossa história.

Em curto espaço de tempo, centenas de encontros ocorreram no país – entre conferências livres, seminários e as etapas municipais e estaduais da Confecom. Ainda não foi contabilizado o total de participantes deste processo, mas estima-se em mais de 30 mil ativistas envolvidos. Além da crítica à mídia hegemônica, concentrada e manipuladora, os participantes formularam propostas concretas para o setor. No total, 6.101 sugestões foram apresentadas. O saldo, bastante positivo, é que milhares de ativistas passaram a militar na luta pela democratização da comunicação.

O saldo organizativo

Como festejou Laurindo Lalo Leal Filho, ouvidor da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), na abertura da etapa paulista da Confecom, não há mais retorno neste rico processo de mobilização. “Botamos o pé na porta”. A partir desta primeira conferência, a tendência é que cresça a pressão e a organização da sociedade na luta pela democratização do setor. Vários estados já discutem a manutenção das comissões da “sociedade civil” que organizaram a conferência, como forma de se ampliar e dar maior organicidade a este movimento democratizante.

O saldo organizativo já se reflete em vários setores. As rádios comunitárias, historicamente tão criminalizadas, conquistaram novo patamar de legitimidade. Os blogueiros, antes tão dispersos, também debatem novas formas de organização. O Fórum de Mídia Livre (FML), que realizou o seu segundo encontro no início de dezembro, firma-se como um pólo aglutinador dos fazedores independentes de mídia. Até entre os “empresários progressistas”, que cavaram sua participação peitando os barões da mídia, discutem uma forma própria de organização do setor.

Os avanços concretos

Mas as vitórias da Confecom não são apenas políticas – pedagógicas e organizativas. Elas podem se refletir também em avanços concretos, práticos, no processo de democratização dos meios de comunicação. Algumas propostas já poderão se tornar exeqüíveis a partir de iniciativas diretas do Poder Executivo, sem depender do Poder Legislativo num ano de campanha eleitoral. Na semana passada, por exemplo, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da Republica (Secom) anunciou que incluirá em seu plano de mídia as TVs comunitárias, bancando publicidade oficial, o que representa uma conquista dos cerca de 60 canais comunitários de sinal fechado do país.

A exemplo das outras 61 conferências realizadas pelo governo Lula, a Confecom não tem poder deliberativo. Ela sugere políticas públicas e regulamentações para os poderes constituídos. Neste sentido, as sinalizações também são positivas. As 59 propostas apresentadas pelo governo visam democratizar o setor, assimilando históricas reivindicações dos movimentos sociais. Para Beto Almeida, presidente da TV Cidade Livre de Brasília e integrante da Junta Diretiva da Telesur, “elas indicam um importante grau de sintonia entre governo, amplas parcelas do movimento sindical-social e segmentos anti-monopolistas do empresariado”.

Uma estratégia para avançar

Como se constata, a Confecom tem tudo para representar uma expressiva vitória dos movimentos sociais. Segundo Jonas Valente, membro do Coletivo Intervozes, “a etapa nacional, depois de um difícil desenrolar, pode colocar a Confecom como ponto de virada na história das comunicações brasileiras”. No mesmo rumo, Beto Almeida observa que a Confecom “não fará o ajuste final de contas com a ditadura midiática… Mas ela é uma etapa mais elevada desta longa caminhada, que deve ser aproveitada para alinhavar a sustentação e implementação de várias mudanças”.

Para fazer vingar as mudanças neste setor, o desafio agora é definir uma estratégica certeira. De forma resumida, ela deve priorizar as propostas essenciais, evitando-se a dispersão em mais de 6 mil sugestões; precisa unificar o campo popular e democrático, já que os barões da mídia farão de tudo para bancar seus interesses mercadológicos; precisa estabelecer uma aliança prioritária com os setores progressistas do governo Lula, já que a aprovação de qualquer proposta necessita de 60% dos votos; e deve explorar as contradições do meio empresarial, sem se submeter ao falso “nacionalismo” dos radiodifusores ou ao falso “pluralismo” das teles estrangeiras.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

9 de dezembro de atos pró-MST deve ser ponto de partida para rede de solidariedade

por Rodrigo Brandão, da Equipe do Blog EDUCOM



O dia 9 de dezembro de 2009 no Brasil foi marcado por atos públicos da campanha "Somos Todos Sem Terra", em solidariedade ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, alvo de uma campanha da mídia capitalista e de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), criada pela bancada ruralista para tentar impedir a Reforma Agrária no Brasil. Mas a luta não para nas mobilizações da última quarta, que tiveram como um dos pontos altos o Ato do Rio de Janeiro (foto), na sede da Associação Brasileira de Imprensa. Os movimentos sociais, partidos políticos de esquerda e intelectuais próximos à luta pela Reforma Agrária pretendem construir uma rede de solidariedade ao MST e a outras lutas sociais criminalizadas por jornais, redes de TV e poderes públicos. A partir de fevereiro de 2010, se inicia no Rio uma agenda de reuniões entre representantes de diversos destes movimentos, com o objetivo de acumular forças e definir estratégias de resistência ao cerco às reivindicações sociais no Brasil.

"Desta vez a direita e sua mídia alteraram até mesmo o grau habitual de agressividade contra o MST", observou Roberto Leher, professor da Faculdade de Educação da UFRJ e coordenador, ao lado da historiadora Virgínia Fontes, do Ato pró-MST no Rio, que lotou o auditório da ABI. Leher referia-se às reportagens exibidas no final de setembro em redes de TV, em especial às da Globo, caracterizando a ocupação, por sem terra, de uma fazenda da fábrica de sucos Cutrale, erguida no interior paulista sob grilagem de terras públicas, seguida da derrubada de pés de laranja para plantio de itens da cesta básica, como um ato criminoso. "As reportagens foram cuidadosamente editadas, já que eles as levaram ao ar uma semana após a ocupação e sem mencionar em nenhum momento que aquelas terras são fortemente contestadas pelo Incra e na justiça. O poder público caracteriza a instalação da fazenda da Cutrale como ato de grilagem", criticou Leher.

Para o professor Leher, não há dúvida de que, por trás do ataque midiático à ocupação, está uma ação estratégica orquestrada pelo empresariado do agronegócio, parceiro dos jornalões e das grandes redes de TV para impedir a revisão, pelo governo federal, dos índices de produtividade da terra - medida essencial à realização da Reforma Agrária - e possibilitar a instalação da CPMI do MST. A sequencia de fatos não deixa dúvidas sobre os objetivos de quem detonou a nova campanha difamatória contra a luta pela Reforma Agrária no país. Primeiro, em julho, o Ministério do Desenvolvimento Agrário anuncia um aumento nos índices de produtividade (que atestam se a propriedade rural é ou não passível de desapropriação para a Reforma Agrária), intactos desde 1975. Entre o final de julho e o início de agosto, o ministro da Agricultura e pau mandado do agronegócio, Reinhold Stephanes, anuncia que não assinará a portaria (a Instrução só será carimbada pelo presidente Lula se houver acordo entre seus ministros do setor agrário). Em setembro, a TV Globo e outras redes fazem imagens de helicóptero da ocupação do MST nas Monções e as editam para que pareça um ato criminoso. Em outubro, a senadora Kátia Abreu, presidente da Confederação Nacional da Agricultura, lidera a criação da CPMI.

Mário Augusto Jakobskind, conselheiro da ABI e diretor do Sindicato dos Jornalistas do Estado do Rio de Janeiro, apontou os verdadeiros motivos de a campanha contra a Reforma Agrária ter sido deslanchada pelo oligopólio da mídia. "As grandes empresas da mídia não são apenas parceiras do agronegócio. Verifiquem na internet as instituições-membros da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) e verão nomes como GloboPar (Globo Participações, ou Organizações Globo) e Agencia Estado (empresa que edita O Estado de S. Paulo). Eles não apenas estão apoiando o latifúndio e sabotando as políticas de democratização, mas defendendo diretamente seus interesses econômicos, já que são também proprietários de terra."

Coordenadora nacional do MST, Marina dos Santos agradeceu a solidariedade e o engajamento dos ativistas das mais diversas causas, lembrando que em 25 anos de luta pela Reforma Agrária "foram inúmeros os momentos em que os sem terra contaram com amplo apoio dos trabalhadores do campo e da cidade". Marina contextualizou a agressividade da mídia e dos políticos ruralistas. "Há um evidente incômodo e uma evidente preocupação em muita gente com a sequencia de triunfos eleitorais do campo popular em países da América Latina", observou. Para a dirigente sem terra, o capitalismo e as organizações políticas mais reacionárias do continente estão em plena articulação para barrar até mesmo os ainda pequenos avanços experimentados pelos povos neste início de século. "Quero deixar bem claro que nem todo o poder e o dinheiro dos nossos inimigos nos fará recuar um milímetro que seja em nossa luta por trabalho e justiça social no campo", avisou Marina, provocando entusiasmados aplausos de todo o auditório.

O geógrafo, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) e pesquisador do Conselho Latino-Americano de Ciencias Sociais (Clacso) Carlos Walter Porto-Gonçalves acabou por produzir uma das melhores intervenções da noite de solidariedade ao MST. Carlos Walter mostrou, através de números recentes e um amplo detalhamento de dados, que a concentração de terras cultiváveis no Brasil está cada vez mais dramática, que a violência contra o trabalhador rural atingiu níveis vergonhosos nas últimas décadas e que diminui assustadoramente a área utilizada no plantio de itens da cesta básica, enquanto o plantio de commodities (produtos valorizados no mercado internacional) não para de avançar. "O Brasil tem cerca de 308 milhões de hectares de terras devolutas, de um total de mais de 851 milhões de hectares", observou Carlos Walter. O geógrafo assinalou que o Índice de Gini para a concentração de terra manteve-se na casa dos 0,8, em uma escala de 0 a 1, entre 1985 e 2006, tendo subido de cerca de 0,86 em 1996 para, uma década depois, chegar a 0,872.

Baixe aqui a íntegra da pesquisa estatística "A Questão Agrária como questão de justiça e democracia e não somente como questão econômica", do geógrafo Carlos Walter Porto-Gonçalves.

Enquanto permanecem a concentração fundidária e as desigualdades no campo, segundo Carlos Walter o agronegócio vem expandindo o plantio de alimentos que podem ser exportados a preços altos e reduzindo a oferta de comida para a mesa do brasileiro. "Quem nos alimenta hoje é a agricultura familiar", frisou o professor da UFF, observando que o neoliberalismo faz muito pior do que simplesmente abolir barreiras alfandegárias. "Esse projeto ainda hegemônico no planeta quer eliminar completamente o sujeito coletivo e ataca o MST, justamente pelo fato de que os sem terra constroem lutas coletivas e nacionais." Para Carlos Walter, setores da esquerda podem ter cometido no passado um equívoco ao anunciar que lutavam contra o latifúndio "improdutivo", já que, para o intelectual, a burguesia do campo "a isso contrapôs o agronegócio". "Todo latifúndio é produtivo. Produtivo de iniquidade, injustiça e imoralidade", finalizou, sendo mais um orador a motivar demorados aplausos.

Participaram ainda, na mesa formada junto à coordenação do Ato "Somos Todos Sem Terra", o jurista e ex-governador do Rio de Janeiro Nilo Batista, o juiz de direito Geraldo Prado, do Movimento Magistrados Pela Democracia, Márcia Jacinto, da Associação Mães de Acari, Deley de Acari, da Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência (Márcia e Deley compararam a perseguição aos sem terra no campo e na mídia com a violência do governo fluminense contra moradores das favelas e periferias do Grande Rio) e a historiadora Anita Leocádia Prestes. Anita Leocádia lembrou o fato de terem sido os comunistas brasileiros os primeiros a colocarem na agenda do país a luta pela Reforma Agrária. "Prestes (Luís Carlos Prestes, revolucionário e pai da intelectual), ao percorrer o interior do Brasil com a Coluna, despertou para a gravidade da superconcentração de terras, em contraste com a imensa maioria dos trabalhadores rurais, sem mínimas condições de sobrevivencia".

Parlamentares dos partidos políticos PT, PC do B, PSol e PDT compareceram ao auditório da ABI e manifestaram sua solidariedade ao MST e às lutas sociais do povo brasileiro. Antes do início do ato, foi apresentada a tradicional mística do MST e exibido um vídeo com manifestações de apoio de ativistas brasileiros e de outros países latino-americanos à luta dos sem terra.

Ontem, dia 10 de dezembro, a Declaração Universal dos Direitos do Homem completou 61 anos. Parabéns à humanidade e em especial a todos os que lutaram e aos que ainda lutam pelos Direitos Humanos em cada um dos cinco continentes.

Junte-se à luta contra a criminalização dos movimentos sociais. Venha ao 1º Encontro Pós-Ato "Somos Todos Sem Terra" no Rio de Janeiro, dia 8 de fevereiro, na sede da Justiça Global (Av. Beira-Mar, 406 - sala 1207), às 17 horas.

SOMOS TODOS SEM TERRA

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Foi um sucesso

por Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania e do Movimento dos Sem Mídia (MSM)

5/12/2009




Acima vocês vêem a imagem dos mais de 100 brasileiros que vieram se manifestar contra a Folha de São Paulo debaixo de chuva, de alarmismo e de boicote do ato.

Foi um sucesso. Veio gente da Paraíba, de Santa Catarina, do Rio, de Belo Horizonte, do interior de São Paulo...

Um jornalista da Folha cobriu o ato, conferiu a lista de assinaturas e me entrevistou e a outros presentes.

Além de falas minhas e leitura do manifesto, outras pessoas se manifestaram.

Muitas fotos serão espalhadas por aí. Eu só pude aproveitar esta, acima, de uma leitora.

As listas de presença, publico depois, quando tiver como escanear.

Missão cumprida e alma lavada. Perdeu quem não veio. Foi uma festa democrática.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Monopólio nas concessões de televisão e rádio é tema de audiência pública no RS

com informações do site do MP Federal no Rio Grande do Sul

A prática de monopólio nas concessões de rádio e televisão por parte da Rede Brasil Sul de Comunicação (Grupo RBS, repetidor da Rede Globo nos três estados do Sul e responsável pela edição do jornal Zero Hora) no Rio Grande do Sul é tema de audiência pública que será promovida pelo Ministério Público Federal (MPF) em Canoas, na próxima quarta, 25 de novembro. Convocada pelo procurador da República no município Pedro Antônio Roso, a audiência atende a um pedido de providências formulado pelo Conselho Regional de Radiodifusão Comunitária (Conrad-RS).

O Conrad gaúcho alega que a legislação federal em vigor limita cada proprietário a ter, no máximo, dois canais de televisão por estado. A audiência deverá debater, ainda, o descompasso entre os sistemas privado e público-estatal, quanto ao uso do espectro magnético como bem social e ambiental. A distribuição, de acordo com a representação do Conrad, é dominada pelo setor empresarial em 95%, causando desequilíbrio na distribuição das verbas publicitárias e na democratização do acesso à informação.

A audiência pública acontece nesta quarta, a partir das 14 horas, no auditório da Câmara de Vereadores de Canoas (Rua Ipiranga, 123). Foram convocados a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o Ministério das Comunicações e a direção do Grupo RBS.