quinta-feira, 26 de julho de 2012

Mineração lidera ameaças a reserva de biosfera centro-americana

 Por Danilo Valladares, da IPS*
Cidade de Guatemala, Guatemala, 24/7/2012 – O risco de contaminação por causa da mina Cerro Blanco para a Reserva da Biosfera Trifinio Fraternidad, compartilhada por El Salvador, Guatemala e Honduras, é apenas a ponta do iceberg das ameaças ambientais às quais está submetida esta ampla região. O desmatamento acelerado, a contaminação de rios e lagos, más práticas agrícolas, uso indiscriminado de agroquímicos, incêndios florestais e pesca indiscriminada também estão entre as principais preocupações de ambientalistas e autoridades da Guatemala.
“A região sudeste é a mais desmatada da Guatemala e só restam alguns remanescentes”, disse à IPS o especialista Julio Castro, do Conselho Nacional de Áreas Protegidas, em alusão à parte da reserva que cabe a este país. “A pesca indiscriminada no Lago de Güija, compartilhado por El Salvador e Guatemala, as construções ilegais à sua volta, bem como a caça e o desmatamento são os assuntos que mais acompanhamos”, sem que, até agora, tenhamos conseguido frear a deterioração, admitiu Castro.
A Reserva da Biosfera Trifinio Fraternidad, declarada como tal em 29 de junho de 2011 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), compreende uma área de 1,5 mil quilômetros quadrados, integrada por oito municípios salvadorenhos, dois em Honduras e dois na Guatemala. Situada na parte central da Região Trifinio, é a primeira reserva de biosfera trinacional da América Central, que possui inumeráveis espécies endêmicas de animais como puma, macaco-aranha, tucano ou jaguar, e vegetais como carvalho e louro.
O Rio Lempa, que cruza os três países antes de desembocar no Oceano Pacífico, nasce dentro da reserva e serve de sustento para milhões de pessoas, bem como o Lago de Güija, de 45 quilômetros quadrados, compartilhado por El Salvador e Guatemala. Apesar de sua riqueza, esta área compartilhada permanece em risco devido à diversidade de atividades humanas que afetam o ecossistema.
Até agora, a preocupação que prevalece na área é a instalação da mina Cerro Blanco, no departamento guatemalteco de Jutiapa, de onde se extrairá ouro e prata a partir de 2013, o que representa “um perigo” para a saúde humana pelo uso de químicos tóxicos, alertam ambientalistas. O vice-presidente salvadorenho, Salvador Sánchez, acusou este mês a Guatemala de contaminar águas trinacionais com essa atividade e ameaçou processar o país “em outras instâncias” se não agir a respeito.
“Há provas científicas da contaminação; não exageramos”, disse à IPS a ativista Berta Medrano, do grupo salvadorenho Gaia, que mostrou preocupação com a degradação das águas do Lempa, que abastece milhares de famílias salvadorenhas. “Por isso insistimos que se eleve o grau de envolvimento das chancelarias e dos presidentes neste assunto, porque os processos produtivos dos países não podem colocar em perigo as vidas humanas de outros Estados nem do próprio”, acrescentou.
E há outros assuntos considerados igualmente preocupantes na área. “O desmatamento acelerado pela mudança no uso da terra para pecuária e agricultura extensiva, a utilização indiscriminada de produtos químicos que causam a poluição da água, queimadas e incêndios florestais são ameaças constantes”, destacou a ativista. De acordo com o Programa de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD) na América Central e República Dominicana, mais de 285 mil hectares de árvores são perdidos a cada ano na região.
Outros estudos também confirmam a derrocada ambiental. “Em 2100 seria de se esperar a perda de um terço das florestas existentes em 2005 e 80% dos campos, savanas e arbustos, enquanto a área agrícola poderia crescer até 50%”, prevê um estudo da Comissão Econômica para a América Latina e no Caribe. A situação exige uma ação urgente dos governos, mas também a sociedade civil, advertiu Medrano, cuja organização promove temas como, a educação ambiental, a produtividade e o desenvolvimento sustentável.
“Os governos devem harmonizar os marcos ambientais legais para facilitar a consolidação da Reserva. Outro grande problema a trabalhar é a reconversão produtiva para tornar sustentável a agricultura tradicional”, apontou Medrano. Além disso, ela pediu o fortalecimento da plataforma trilateral e o desenvolvimento de mercados consumidores locais sustentável, porque, do contrário, “a região correria o risco de perder a categoria de biosfera que recebeu a região de Trifinio Fraternidad”, alertou.
Ángel Ibarra, da não governamental Unidade Ecológica Salvadorenha, compartilha as preocupações de Medrano sobre a Reserva Trifinio Fraternidad, mas considera que El Salvador pode ser mais prejudicado. “Os problemas de poluição, desmatamento e uso da terra são semelhantes em todos os três países, no entanto, por estar na parte inferior da bacia do Lempa, El Salvador, pode ser mais afetado”, disse à IPS.
Ibarra acredita que atualmente as principais ameaças decorrem da mineração intensiva, “que é mais permissiva na Guatemala e Honduras, o que deveria motivar ações diferentes para melhorar a qualidade de vida da população”. “A promoção de práticas de agricultura sustentável para alcançar a soberania alimentar, a proteção das fontes de água e seu uso racional e equitativo, planos de manejo sustentável dos ecossistemas, em particular a zona protegida, e proibição de mineração”, destacou, entre outros. No lado guatemalteco existe preocupação com a importância que está tomando a indústria extrativista em prejuízo do meio ambiente.
Raúl Maas, do Instituto de Agricultura, Recursos Naturais e Meio Ambiente da Universidade Rafael Landívar, declarou à IPS que “as apostas do governo guatemalteco estão em linha com a promoção do crescimento econômico para gerar recursos que mantenham viva a economia nacional. Porém, não há equilíbrio ambiental. De cada cem quetzales gerados do produto interno bruto, apenas 60 centavos são investidos na proteção dos sistemas naturais”. Ele acredita que a mineração de metais preciosos não deveria ser permitida na Guatemala, por considerar que para o país o balanço é mais negativo, por seus efeitos sobre o meio ambiente, do que o benefício econômico que representa esta indústria para o país. Envolverde/IPS