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domingo, 26 de agosto de 2012

Mídia: fila de espera na seção "Erramos"

24/08/2012 - Blog das Frases - Saul Leblon - Carta Maior

1) Mídia: 'o chavismo fez da Venezuela o pior lugar da América Latina para se viver';

Fatos: a Venezuela é o país menos desigual da América Latina (Habitat-ONU);


2) Mídia: 'a xeonofobia e o populismo de Cristina Kirchner isolaram o país e afundaram sua economia';

Fatos: o investimento estrangeiro direto na Argentina cresceu no primeiro semestre acumulando um saldo de US$ 2,2 bi, 40% acima do registrado no mesmo período de 2011 (Banco Central argentino);


3) Mídia: 'o deputado João Paulo Cunha (PT-SP) desviou dinheiro público em benefício próprio e para a compra de votos' do mensalão;

Fatos: as operações imputadas a João Paulo foram legais; a subcontratação de terceiros pela agência SMP&B, de Marcos Valério, que prestava serviços licitados à Câmara, é praxe no mercado; dos R$ 10,9 milhões pagos à SMP&B, R$ 7 milhões foram transferidos aos grandes grupos de comunicação para veiculação de publicidade: TV Globo (a maior fatia, R$ 2,7 milhões), SBT, Record, Abril, Folha e Estadão. (ministro Ricardo Lewandowski). Ou seja, os mesmos grupos de comunicação que sabiam da lisura do processo, lucraram com ele, mas martelavam a condenação do deputado.


4) Mídia: 'a carga' é intolerável e não se reflete nos serviços oferecidos';

Fatos: a arrecadação fiscal do Estado brasileiro é de US$ 3.797 per capita; a média dos países de G -7 é de US$ 11.811. Para ter recursos que permitissem oferecer serviços públicos de padrão europeu a receita (em sintonia com o PIB) teria que triplicar, o que só seria possível gravando os mais ricos, ao contrário do que apregoa o conservadorismo (dados FMI/FGV).


5) Mídia: 'O problema da saúde pública é de gestão';

Fatos: o gasto público per capta com saúde no Brasil é de US$ 320/ano; a média mundial é de US$ US$ 549/ ano; a dos países ricos é dez vezes maior que a brasileira (OMS-2012). Em tempo: em 2006, a conservadorismo logrou extinguir a cobrança da CPMF. Foram subtraídos R$ 40 bi em recursos à saúde pública, mesmo depois de o governo propor emenda vinculando indissociavelmente a receita CPMF ao orçamento da saúde pública.


Fonte:http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=6&post_id=1069

quinta-feira, 19 de julho de 2012

A diplomacia brasileira está em crise? (*)

16/07/2012 - Francisco Carlos Teixeira (**)
original extraído do site Carta Maior

Durante os dois governos de Lula da Silva (2003-2010) a diplomacia brasileira atingiu o ápice de dinamismo e autonomia pouca vezes praticada na políticas externa do país, servindo de comparação com a chamada Política Externa Independente dos anos de 1961-1964.

O chamado “Novo Protagonismo Mundial” do Brasil – tendo à frente o chanceler Celso Amorim e, como verdadeiro mentor, o embaixador Samuel Pinheiro Guimaraes, um intelectual de porte – foi, por isso mesmo, alvo de atenção, elogios e duríssimas críticas.

O Governo Dilma Rousseff, tendo o chanceler Antonio Patriota como condutor, mostrou, até o momento, pouco interesse e pouca ação nas relações internacionais, com duros revezes na agenda internacional.

A Guerra e a Paz do Governo Dilma
A presidente – nego a flexão de gênero da palavra por feia e desnecessária! – assumiu o governo do Brasil com três grandes desafios para enfrentar. O primeiro, e de longe o mais importante, reside na eliminação da pobreza e da miséria no país. Trata-se de cerca de 16 milhões de pessoas que recebem menos de R$70 por mês e não possuem, em sua maioria, acesso à água encanada, esgotamento sanitário e luz. Esta é a linha da extrema pobreza, como definida pelo IBGE, no Brasil. E é ela que embasa o Programa Brasil sem Miséria, criado por Dilma e administrado pela ministra do desenvolvimento social e combate à fome, Tereza Campelo.

O programa, em cerca de 18 meses de governo, já representou a incorporação ao Bolsa Família de cerca de 2.7 milhões de crianças [1]. Este é uma avanço concreto na luta pelo fim da miséria no país. Dilma impôs a si mesma a meta de eliminar, nesta geração, a vergonha da miséria absoluta num país tão rico como nosso.

Uma segunda, e duríssima frente de luta, é a manutenção do crescimento econômico no, com a geração de emprego e renda no país. Sem o crescimento econômico todas as demais metas – incluindo aí a eliminação da pobreza – estarão comprometidas. Entretanto, a crise mundial – com o afundamento das economias europeias, paralisia do Japão, a “gangorra” americana e a desaceleração da China Popular – bate com força ás portas do Brasil. O modelo usado com sucesso por Lula em 2008/09 para enfrentar a crise – aumento do consumo interno, redução dos juros e redução fiscal – embora benfazejo no momento não parece mais surtir os efeitos anteriores (crescimento de 7.5% do PIB em 2010).

Na verdade, o momento é de aumento dos investimentos, ampliação da infraestrutura e criação condições permanentes e sustentáveis de crescimento. Isso tem sido lento, pela dificuldade de fazer os investimentos – o PAC, por exemplo – e pela qualidade da gestão no nível local, além da praga da corrupção que paralisa obras públicas. De qualquer forma, mesmo crescendo a pouco mais de 2.5% o Brasil é uma exceção entre as grandes economias.

Por fim, Dilma teve que lidar com uma ampla sucessão de “malfeitos”, obrigando-a a tratar com uma base aliada sempre fisiológica, sem ideologia e ávida de cargos e sinecuras.

Assim, nestas condições, não é de se estranhar a pouca atenção aos assuntos externos, deixados aos cuidados dos “especialistas” do Itamaraty. Aí talvez residam as origens da atual situação.

A crise da Rio+20
Para falar toda a verdade, a Presidente Dilma foi quem mais se esforçou para o sucesso da Rio+20, utilizando suas, poucas, viagens ao exterior para pedir a presença de chefes de Estado e de Governo na conferência. Contudo, a agenda internacional era negativa. Com a agudização da crise econômica – que coincidiu com o auge da crise da Espanha e do euro – e a gastança mundial para socorrer bancos e banqueiros, a ideia original de um fundo mundial de obras e ações de sustentabilidade, foi perdida.

Da mesma forma, a proposta de criação de Agência Mundial de Meio-Ambiente – da qual não sabemos até o momento se o Brasil é favorável em razão do silêncio do Itamaraty – e posta na mesa pelo Presidente François Hollande, não prosperou. O resultado foi o rompimento das organizações não-governamentais com a direção da conferência e a “pequena crise” entre o Brasil, o secretário-geral da ONU Ban Ki-moon e a primeira-ministra da Dinamarca, na ocasião representante da União Europeia.

Foi necessário e útil para a Rio+20 e o Brasil tal crise? Creio que não. Em Copenhague, em 2009, na própria presença de Dilma, quando foi armado o impasse pelos Estados Unidos e a China Popular – que não queriam nem metas nem compromissos sobre sustentabilidade – Lula deslocou-se até a capital do Príncipe Hamlet, e, ao lado de Nicolás Sarkozy, fez um imenso esforço de desbloquear a conferência e avançar metas e propostas, mesmo que auto-impostas.

Para ser mais explícito vamos citar a mídia da época: “... no último dia da conferência das Nações Unidas [ em Copenhague, 2009], o presidente Luiz Inácio Lula da Silva confessou sua frustração em relação ao desenvolvimento das negociações e garantiu que o Brasil está disposto a fazer sacrifícios para financiar os países pobres a se adaptarem aos efeitos da mudança climática” [2]. Na ocassião Lula buscou apoio da Índia, da África do Sul e outros emergentes contra um “diktat” das duas grandes economias mundiais. Foi, então, o Brasil que criticou a fragilidade do docuemnto. Ao chegar a nossa vez de avançar, aceitamos um consenso murcho e frouxo...

No Rio, os diplomatas brasileiros buscaram, às pressas, um consenso mínimo e se declararam “ofendidos” pelas críticas aos parcos resultados, admoestando o secretário-geral da ONU e brandindo ofensas contra Helle Torning-Schmidt, a “premier” da Dinamarca, que havia, em verdade, criticado os Estados Unidos e pedido maior empenho em um resultado mais impositivo para a Rio+20 [3].

Ao contrário de Lula em Copenhague, a diplomacia brasileira optava pelo consenso mínimo, eximia-se de criticar os grandes poluidores – Estados Unidos à frente – e criava embaraços para a ONU e a União Européia. Ora, em Copenhague o Brasil aliara-se a U.E. e a ONU, exatamente na crítica aos EUA e a China Popular. Na ocasião, Lula não aceitara que os “dois grandes” criassem um novo “condomínio bipolar” no mundo, ressaltando o protagonismos dos emergentes.

Perdemos, na Rioi+20, a oportunidade de melhorar o perfil dos produtos brasileiros frente aos países poluidores, aceitando recomendações aquém da legislação brasileira.

Enquanto isso avolumava-se a crise no Paraguai.

A crise no Paraguai
A crise paraguaia deu-se simultaneamente a Rio+20, num momento que todas as atenções estavam voltadas para a aprovação do fraco documento proposto pela diplomacia brasileira.

O caráter “relâmpago” dos procedimentos já foi, aqui mesmo na Carta Maior, destrinchados e amplamente desmascarados seus procedimentos golpistas. Tratou-se, ainda uma vez, de um “golpe constitucional, expresso”, quando uma maioria atropela a Lei e seu espírito e letra – isso mesmo a letra da lei! – para depor um presidente constitucional, mas minoritário. Honduras, em 2009, foi o protótipo experimentado visando dar ares legais ao ilegal. A insistência da mídia brasileira em destacar os trâmites legais do golpe esbarra no Artigo 17, dos Procedimentos Processuais, Item 7, da prórpia Constituição Nacional do Paraguai que estabelece que todo acusado, em juizo, deve usufruir “...dos meios e prazos indispensáveis para a preparação de sua defesa de forma livre".

Foi tudo o que não houve no Paraguai.

Em suma, a diplomacia brasileira agiu certo ao impor, até próximas eleições, uma suspensão do país guarani no âmbito do Mercosul. No entanto, aí explicitam-se as dúvidas e dubiedades dos diplomatas brasileiros. O que houve com o acompanhamento da crise paraguaia pela diplomacia brasileira em Assunção antes do golpe? Somente no momento da crise acordamos para o, já então, inevitável?

Sem dúvida, houve erros de acompanhamento, já que a diplomacia venezuelana já havia detectado possibilidades de golpe e denunciando a situação de cerco de Lugo.

Além disso, após a “suspensão” do Paraguai, na Cúpula de Mendoza (Mercosul+UNASUL, 29/06/2012), se permitiu uma evolução ridícula da diplomacia de Assunção: primeiro cheia de elogios a Dilma Rousseff, depois tornou-se agressiva e, no limitem, injuriosa. Chegou-se ao ponto de acusar a política externa brasileira de reeditar a Tríplice Aliança – Uruguai, Argentina e Brasil na Guerra do Paraguai – reavivando o velho modelo da oligarquia do Paraguai de vitimizar-se para manter seu poder de mando. Já o embaixador paraguaio em Washington – satisfeito com a posição do governo Obama- definiu o Brasil como uma elefante numa loja de louças, sempre quebrando a “harmonia e paz” [4].

Por fim, aceitou-se a formação de uma “missão” da OEA – o mesmo organismo que se calou perante a crise de Honduras de 2009, como o Itamaraty já sabia e já experimentara com amargura – para fazer uma avaliação da “crise”, como se não fosse claro o golpe perpetrado. A missão, liderada por José Miguel Insulza, do Chile, era composta pelos EUA, Canadá, México – três países do NAFTA, extremamente críticos do Mercosul, antes defensores da ALCA, e estranhos e contrários a Unasul, além de Honduras – onde o governo é um produto do primeiro golpe constitucional das Américas e do pobre e desmantelado Haiti, de nenhuma experiência democrática.

A aceitação de tal missão, sabendo-se o que a OEA fez no caso de Honduras, e de tal composição da missão, foi um erro desde de sua criação. O resultado foi uma extrapolação dos objetivos e um claro endosso ao golpe. A bem da verdade, o Brasil só tem colecionado derrotas na OEA, incluindo aí casos como Honduras e questões de legislação. Hegemonizada pelos os Estados Unidos e seus dois aliados do Nafta – Canadá e México – seria o momento da Diplomacia brasileira romper tais laços e declarar a Doutrina Monroe – base de criação da OEA -, alma da hegemonia americana nas Américas, bem como o TIAR, como letra morta.

Por sinal, não é compreensível a razão pela qual o Itamaraty insiste em aconselhar a não abertura das investigações dos crimes contra os direitos humanos, como o caso Vladimir Herzog, opondo-se com leguleio e casuísmos perante a OEA. Em vez de sermos condenados em cortes internacionais deveríamos, ter as iniciativas da questão, como é, de fato, a política de Dilma Rousseff.

Algumas poucas verdades sobre o Paraguai
Além do Paraguai, desde décadas, nada fazer para controlar o fluxo de drogas, carros roubados e de lavagem de dinheiro, a postura internacional do país, cria sérios problemas para a diplomacia brasileira. Mesmo no âmbito Mercosul o Paraguai é um entrave. O Governo de Assunção – com outros países do Caribe e América Central e ilhas do Pacifico, sob injunções norte-americanas – reconhece o governo de Taiwan, criando sérios obstáculos para acordos entre o Mercosul e a China Popular.

Taiwan, para manter sua embaixada aberta em Assunção, oferece – como “ajuda” – cerca de 300 milhões de dólares anuais às autoridades paraguaias – no Malauí eram 400 milhões! – que são distribuídos segundo critérios políticos [5]. Uma das ameaças de Lugo, temida pelos “ajudados”, era exatamente o reconhecimento de Beijing, trocando os titulares das embaixadas. Quando a mídia brasileira “alertou” para a possibilidade de uma aproximação entre Assunção e Beijing como retaliação a sua suspensão do Mercosul, na verdade, estava trocando as bolas. As ameaças de Assunção são, sempre, de romper com o Mercosul para se aproximar dos... Estados Unidos.

Governo do Paraguai acusa Chávez
Mais uma vez a mídia brasileira apressou-se em desviar a atenção do “golpe expresso” em Assunção para acusar Chávez de intervenção nos assuntos internos do Paraguai. Mais uma vez, ainda, a Diplomacia brasileira, mesmo atingida e chamada de marionete de Chávez, manteve silêncio. Acusação, feita pela ministra da defesa Maria Liz Garcia ( portanto um ato de Estado) de que o chanceler Nicolas Maduro ( da Venezuela) tentou mobilizar o exército paraguaio para um golpe foi amplamente noticiada, mas o filme feito “provando” tal intervenção jamais foi exibido na TV brasileira. Por uma razão simples: a edição e a montagem eram primárias.

Na verdade, a Comissão de Inquérito criada para verificar a “intervenção da Venezuela” – o que ocasionou, antes de qualquer comprovação a declaração do embaixador venezuelano e do chancelar Maduro “persona non grata” em Assunção – e presidida pela Procuradora Geral da República Paraguaia Estella Marys Cano comprovou não ter havido qualquer ato ou proposta de intervenção ou conluio entre militares paraguaios e diplomatas venezuelanos.

Tal notícia, contrariando o “furo” da mídia brasileira, não foi notícia de relevo no Brasil [6].

Mais uma vez o Brasil, agora sob forte ataque da diplomacia paraguaia, decidiu por não comentar o resultado do inquérito paraguaio. Da mesma forma, as ofensas dirigidas pelo Congresso Paraguaio contra a Presidente Dilma ficaram sem resposta, inclusive da Comissão de relações Exteriores do Congresso Brasileiro, presidida pelo senador (PTB-AL) Fernando Collor.

As primeiras nomeações do novo presidente do Paraguai – uma irmã para presidir a empresa Itaipu Binacional e um cunhado como ministro – também não mereceram atenção.

Por fim, a Diplomacia brasileira sabia, e calou-se sobre isso, que o veto do parlamento paraguaio a admissão da Venezuela ao Mercosul era uma chantagem, visando arrancar dinheiro de Caracas da mesma forma que arrancam de Taiwan. No entanto, deixamos ser armada , pela política uruguaia anti-Mujica e pelos senadores paraguaios sobre os quais paira a acusação de benevolência perante o narcotráfico, uma pretensa ofensa brasileira aos brios da “democracia guarani”. O presidente Mujica, enfim, veio à público e confirmou as ligações do Partido Colorado – motor da demissão de Lugo – com os traficantes que, em última instância, infestam as grandes cidades brasileiras.

A crise com a Argentina
O país vizinho, nosso grande parceiro e aliado em fóruns internacionais – futebol à parte – passa por séria crise econômica, derivada de fatores múltiplos, incluindo uma tremenda seca e perda de lavouras (o que afeta também o Brasil). Neste contexto, Buenos Aires optou por controlar os fluxos de comércio com o Brasil, tomando uma série de medidas restritivas. A maioria delas contradiz fortemente o espírito das medidas que amparam o Mercosul.

Apesar de todas as restrições, o comércio bilateral, no entanto, alcançou a casa dos 40 bilhões de dólares, com crescimento de cerca de 35% das exportações brasileiras para a Argentina, gerando um déficit para os argentinos de mais de 6 bilhões de dólares. Tais dificuldades sempre foram comuns, e algumas vezes ásperas. Na administração Lula tais questões eram resolvidas através da chamada “diplomacia presidencial”, com entendimentos diretos entre o Planalto e a Casa Rosada. Essa era a política implantada por Celso Amorim e Samuel Pinheiro Guimarães – e que a mídia espezinhava como “diplomacia companheira” e que, em verdade, gerava emprego e renda no Brasil.

Hoje, a diplomacia brasileira – aliada com a burocracia dos ministérios brasileiros, fortemente anti-argentina – apela para uma denúncia na OMC, para além do entendimento direto com Buenos Aires. Não há, no entanto, qualquer iniciativa de discussão aberta e franca entre Cristina K. e Dilma, como antes se dava com Lula e Nestor K.

É interessante ressaltar que o comércio Brasil-Estados Unidos, a quem a Diplomacia brasileira atribui hoje grande relevância e se diz “apaziguadora” (numa crítica velada ao anterior secretário executivo do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães), é fortemente deficitário para o Brasil, e Washington prejudica claramente as exportações brasileiras de aço, sapatos, tecidos, suco de laranja, açúcar, algodão, etc...

Da visita de Obama conseguimos, em verdade, o reconhecimento da cachaça como produto nacional e a abertura de mais consulados, facilitando a ida de turistas para Miami. O Brasil exporta empregos para os estados Unidos – cerca de 900 mil postos de trabalho – com as compras brasileiras. Nem isso alenta a Diplomacia brasileira a exigir maior consideração pelos interesses brasileiros, seja no caso do Paraguai, seja na intervenção a licitação pública que anulou a compra de aviões Embraer pela Força Aérea Norte-Americana!

Projetos e Perspectivas
Sem dúvida o conjunto de iniciativas, e de ausências de iniciativas, da Diplomacia brasileira nos últimos meses explica a demissão do embaixador Samuel Pinheiro Guimarães da presidência do Mercosul no último dia 29 de junho, em Mendoza. A Diplomacia brasileira volta a ser corriqueira, banal e fascinada pelos Estados Unidos – que trata o Brasil como piada, como aquela feita por Hillary Clinton na véspera de sua viagem para a Rio+20.

Em grande parte isso se deve a ausência de interesse, talvez conhecimentos, do cenário mundial por parte da presidente Dilma Rousseff. Mas, deve-se mais ainda, pela condução atual do Itamaraty.

Assim, as propostas em pauta da agenda brasileira são, exatamente, contrárias à dinâmica política externa anterior do país. Por exemplo, a proposta der aproximação com o México e sua adesão como “membro associado” ao Mercosul. Trata-se de um tremendo equívoco. O México, membro do Nafta e aliado dos Estados Unidos, será um cavalo de Tróia para produtos e serviços americanos ( além de vetar a reforma do Conselho de Segurança da ONU, visando impedir a entrada do Brasil). Além disso, criou, em 2011, com a Colômbia, Peru e Chile – países com Tratados de Livre Comércio com os EUA – a Associação de Países do Pacífico, visando contrapor-se às políticas brasileiras de integração sul-americana.

Por outro lado, abandonamos nossa posição construída lentamente no Oriente Médio. As relações com a pujante Turquia foram adormecidas, e a chancelaria brasileira recusou um encontro com os iranianos na Rio+20.

Ok, podemos entender que Dilma não goste de governos que permitem o apedrejamento legal de mulheres – ninguém gosta!

Mas, cabe dizer isso aos interessados e ter um papel construtivo numa crise – o uso de tecnologias nucleares – que envolvem, querendo ou não, o Brasil e nossos interesses. Perdeu-se uma ocasião de ouvir-se a voz do Brasil.

Enfim, seria bom, muito bom mesmo, que Dilma Rousseff encontre mais tempo para ocupar-se da Diplomacia brasileira e busca de identificá-la com as metas justas e claras de seu governo, em vez de deixar as relações exteriores no domínio da banalidade dos “especialistas”.

NOTAS
(*) Peço perdão aos leitores pela extensão do artigo, ocorre que o tema – bastante controverso – não permite uma abordagem menos clara.

[1] Ver http://blog.planalto.gov.br/brasil-sem-miseria-foco-sera-16267-milhoes-de-brasileiros-que-vivem-na-extrema-pobreza/.
[2] “Lula deixa a conferência de Copenhague”
[3] “Dinamarca critica texto da Rio+20 e pede mais empenho aos EUA” In:
[4] Embaixador paraguaio na OEA: Brasil é 'como um elefante em loja de cristal' In: BBC 'http://www.bbc.co.uk/portuguese.
[5] Paraguai vai retirar apoio a Taiwan e se aproximar da China In: http://www.felsberg.com.br/m3.asp?cod_pagina=393&conteudo=sim&i=33456&desc=if&frmArea=416&palavrachave=
[6] Manipulação das notícias no Paraguai In: http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-manipulacao-das-noticias-no-paraguai

(**) Professor na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=5686

Nota da editora do Blog
Discordo da opinião do autor. Mas acho fundamental que o público a conheça. A posição do Itamaraty quanto Rio+20 foi correta, corajosa e diplomática. Acompanhei a imprensa francesa durante 20 anos, como assistente. Há 30 anos faço coberturas na área de meio ambiente. Participei da Eco-92. É fácil criticar, mas o jogo foi muito duro. Porque tudo que os europeus queriam era essa tal Agencia Ambiental. Não é preciso explicar porque. Nossos leitores são inteligentes. Regular a Amazônia, é claro!!
Zilda Ferreira

quarta-feira, 13 de junho de 2012

A falência da Espanha e seus disfarces

10/06/2012 - Maurício Caleiro
em seu blog Cinema & Outras Artes

A Espanha quebrou, faliu.

Este é o fato, a terrível realidade que se esconde por detrás de uma operação discursiva que lança mão de termos amenos, humanistas e solidários como “ajuda”, “resgate” e “operação de salvamento”.

Trata-se, na verdade, de uma intervenção na economia e na soberania espanholas, para benefício do mercado financeiro e com duras consequências para a população.


Rajoy questionado

 Tendo imposto suas demandas ao governo do conservador Mariano Rajoy sob sua relutância apenas aparente, a batalha que os arautos do neoliberalismo ora travam é de ordem discursiva: em primeiro lugar, trata-se de convencer os espanhóis que é não apenas aceitável, mas para seu próprio bem desejável que paguem, com carestia, desemprego, cortes nos salários, nas aposentadorias e no acesso a saúde e educação – em suma, com o que resta do Estado de bem-estar social à europeia – as dezenas (talvez centenas) de bilhões de euros que serão utilizadas para tirar as instituições financeiras do buraco por elas mesmas cavado.

A julgar pelas reportagens na imprensa espanhola, agora está ficando claro para muitos de seus ingênuos eleitores que Rajoy - que há dez dias declarou taxativamente que não haveria resgate aos bancos - mentiu. E, a bem da verdade, continua a fazê-lo, já que é lugar-comum entre economistas que cem bilhões de euros são um mero paliativo, e que o setor financeiro, com as cartas na mão, demandará de quatro a oito vezes esse valor para cobrir seus rombos - com a imposição dos cortes sociais correspondentes.

Não foi por falta de aviso.

Consequências psicológicas
A intervenção é um golpe psicológico que constitui um marco na história de nossas relações com a Europa. Em um país onde a identidade nacional e os sentimentos de autoestima coletiva têm estado sempre tão estreitamente vinculados aos feitos alcançados no âmbito europeu, custa crer que tenhamos chegado a este ponto. Entender como e por quê e o que ocorrerá a partir de agora mostra-se imprescindível”, aquiesce uma voz favorável ao "resgate".
http://economia.elpais.com/economia/2012/06/09/actualidad/1339256267_154181.html (El País - Un duro golpe psicológico)

Desse quadro decorre um segundo movimento da citada operação discursiva, desta feita para salvaguardar o orgulho nacional, que a menção à condição de quarta economia da Europa costuma alimentar. Nela pontifica, de novo, a promoção do contorcionismo verbal à maneira do "1984", de Orwell, com a adoção de uma novilíngua em que a tragédia torna-se 'pacto social'; a bancarrota, 'ajuste mercadológico'; a humilhação à soberania nacional, 'solução negociada com os parceiros de bloco'.

Nós, latino-americanos, já vimos algumas vezes esse filme, porém em versões em preto e branco, do final do século passado. Trata-se, com o perdão pela redundância, de uma chanchada de má qualidade, protagonizada por canastrões, com um roteiro que tem sérios problemas de verossimilhança e, pior, não tem final feliz: os vilões vencem.

Espanha x Argentina
Essa autorreferência ao nosso continente nos leva ao terceiro movimento da estratégia discursiva neoliberal acima aludida, desta feita de caráter eurocêntrico e, naturalmente, pró-mercado, facilmente identificável no discurso da mídia brasileira relativo à crise espanhola:

Quando o resgate era de país da periferia, a mídia chamava de falência, quebra. Quando é no centro: resgate, apoio, empréstimo. Ajuda”, resume o professor Emir Sader, em seu Twitter.

Convido os(as) leitores(as) a compararem o tratamento que essa mesma mídia deu ao 'default' argentino – que se recusou a seguir as imposições do sistema financeiro internacional - e o enfoque que ora dispensa à quebra da Espanha – que segue à risca o que manda a Troika. Recomenda-se, ainda, daqui a algum tempo, quando tivermos elementos sobre os desdobramentos da obediência espanhola à banca, que também se leve em conta, nessa comparação, a situação do país ibérico e a da Argentina – que, malgrado todas as ameaças de danação eterna a que fatalmente estava condenada por ousar enfrentar a cartolagem, tem apresentado, sob um governo de centro-esquerda, um desempenho econômico superlativo em meio à crise.

Confusão conceitual

A persistência do neoliberalismo como modelo orientador das políticas econômicas da Zona do Euro - agravadas por sua prescrição como antídoto que só faz agravar sua maior crise, como se vê na Espanha - nos fornece a medida do quanto a constituição de blocos econômicos transnacionais, apregoada como imprescindível à sobrevivência na globalização, acabou por constituir-se em um fator determinante na submissão dos estados nacionais aos ditames do mercado financeiro.

No âmago de tal problema está uma confusão conceitual, intencionalmente inoculada pelos arautos do neoliberalismo quando da ascensão histórica deste, ao longo dos anos 80, sob os eflúvios de Thatcher e Reagan: a concepção de globalização e neoliberalismo como termos indissociáveis e, em larga medida, intercambiáveis, marcados por uma relação pela qual a primeira, por seu caráter estruturante, imporia a adoção de políticas econômicas nos moldes ditados pelo segundo, sob a ameaça de expulsão da então chamada nova ordem mundial” e decorrente aniquilamento do país enquanto ente autônomo.

Essa confusão e essa crença são um lugar-comum na reflexão teórica sobre o período, levada a cabo inclusive por pensadores que continuam na linha de frente da crítica socioeconômica. É notável, no entanto, que tanto intelectuais brasileiros como Octávio Ianni e Milton Santos quanto uma certa tendência do pensamento franco-europeu agrupada em torno do Le Monde Diplomatique tenham desde sempre, em sua maioria, recusado a aferrar-se ao determinismo teórico do período. (http://oglobo.globo.com/blogs/cinema/posts/2006/11/27/milton-santos-a-globalizacao-vista-de-ca-15525.asp)

O retorno da soberania
Este, embora falho, é até certo ponto compreensível, posto que tardiamente desmentido factualmente, pois, a rigor, a constatação de que a morte do Estado nacional era uma balela e que havia possibilidade de sobreviver – com crescimento, inclusão social e um Estado fortalecido, atuante e que conservasse um bom grau de independência a despeito da interdependência da economia global – só tem lugar com a ascensão e o sucesso das administrações de Lula, Chávez, Kirchner, Morales, Corea, entre outros, e, eentualmente, de seus sucessores.

Assim, ainda que devamos ter muito claros a persistência insidiosa do poder neoliberal sobre tais administrações, e os limites e eventuais equívocos e desacertos destas – como a insensibilidade do governo de Dilma Rousseff para com as demandas do funcionalismo público ora fornece um dentre tantos exemplos possíveis -, é preciso atentar com limpidez para as conquistas e as possibilidades propiciadas pelo realinhamento político-ideológico promovido pela democracia brasileira na última década - e lutar para efetivá-las e ampliá-las.

O povo espanhol, por sua vez, já promete voltar a tomar as ruas e a Puerta del Sol, em protesto. Suerte.

Fontes das fotos:http://www.teoriaedebate.org.br/materias/internacional/espanha-do-sonho-ao-pesadelo
http://www.lingoro.info/tag/rajoy/
http://economia.elpais.com/economia/2012/06/09/actualidad/1339256267_154181.html (El País - Un duro golpe psicológico)

Origial do texto em:

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Os desafios da nova YPF

19/Abril/2012 - por Claudio Katz [*]
original extraído do site Resistir (Portugal)


A intervenção na YPF e a introdução de uma gestão estatal da empresa são medidas necessárias para começar a reverter a depredação energética. Mas constituem só um ponto de partida para recuperar os recursos petrolíferos.


Durante uma década a REPSOL liderou o esvaziamento de poços, reservas e instalações pré-existentes. Extraiu o máximo possível sem investir e expatriou lucros de forma escandalosa.

Mas esta conduta não irritou nenhum dos críticos neoliberais da expropriação em curso.

Agora questionam a "violação da ordem jurídica", esquecendo o total incumprimento dos contratos por parte da firma.

Este duplo critério é congruente com a sua habitual aprovação dos atropelos contra os direitos dos assalariados ou aposentados. Nunca estendem a estes sectores os princípios da segurança jurídica.

Falácias neoliberais
Os direitistas estão a recriar os fantasmas de 2001-2005 e repetem os mesmos argumentos que difundiram a seguir ao incumprimento (default). Advertem contra as terríveis consequências de "isolar-se do mundo", omitindo o seu recorde de prognósticos falhados.

Alguns desculpam a REPSOL afirmando que sofreu um castigo de preços desfavoráveis. Mas silenciam os sucessivos ajustes dos últimos anos, a autorização para liquidar divisas no exterior e a permissão para exportar a custo do auto-abastecimento. As objectadas retenções móveis às vendas externas foram uma ténue compensação pela terrível drenagem que o país sofreu. Tão pouco recordam que a falta de investimentos remonta aos anos 90, quando o combustível era muito caro em dólares.

Os porta-vozes locais da REPSOL afirmam que a expropriação afugentará os investimentos, que são necessários para recompor a produção. Mas o desenvolvimento petrolífero da Argentina nunca proveio dos capitais estrangeiros. Foi um resultado da propriedade estatal do petróleo bruto e do equilíbrio entre exploração (exploración) e gestão da extracção (explotación) de poços, que se conseguiu mediante um sistema integrado de extracção, refinação e comercialização. Este regime foi demolido com a privatização e deveria ser recomposto para reconstruir o abastecimento.

Qualquer passo nessa direcção é visto pela direita como uma expressão de "populismo, ou demagogia nacionalista". Mas com o seu apoio à privatização já demonstraram como concebem o ideal oposto de condutas republicanas, maduras e responsáveis. Os defensores mais descarados da REPSOL alertam contra o iminente conflito entre argentinos e espanhóis que provocará a expropriação, como se a firma afectada fosse a representação do povo ibérico.

Na realidade é uma empresa privada de duvidosa propriedade espanhola, uma vez que o grosso do seu capital encontra-se distribuído em vários centros financeiros do mundo. Como se especializada, além disso, em localizar sociedades em paraísos fiscais, potencia a evasão tributária que deteriorou as finanças espanholas, precipitando o brutal ajuste que padece esse país.


A REPSOL, naturalmente, é defendida por uma monarquia e um governo reaccionário, que continuam a exibir soberba neo-colonial com crescente descaramento. A repetição local dessa diatribe é particularmente chocante. Como a firma recorrerá a seus aliados da Europa e ao G20 para gerar um conflito jurídico internacional, é imperioso que a Argentina se retire do CIADI [1]. Esse tribunal já tem preparada uma sentença a favor daquela petrolífera. [2]

Empresa mixta ou estatal?
Os principais problemas da nova YPF não estão no flanco externo.

É evidente que o governo decidiu a expropriação por necessidade e não por convicção.

Estava aguilhoado pela queda da produção e consequente obrigação de financiar importações com os poucos recursos que dispõe a Tesouraria. Pressionados por essas circunstâncias efectuou uma volta de 180 grau no seu idílio anterior com a empresa afectada.

Negociou sem resultados um compromisso de maior investimento e finalmente optou pelo choque com os seus velhos sócios.

Julio de Vido

A expropriação não faz parte de uma estratégia prevista, nem obedece ao grande volume de votos conseguido nas últimas eleições.

A reconstrução da YPF encontra-se agora em mãos daqueles que participaram da sua destruição.

Grande parte da elite actual de funcionários tomou parte no sucateamento da empresa durante o governo Menem e no remate das suas acções. Sua responsabilidade no descalabro energético dos últimos oito anos é inocultável. De Vido [3] é a antítese de Mosconi.[4] Pelo seu gabinete passaram todas as autorizações requeridas para validar o aniquilamento da YPF. A iniciativa da expropriação é positiva, mas seus efeitos reais dependerão das próximas medidas.

Uma decisão chave joga-se no manejo da indemnização. Não se pode pagar pelo que é nosso, nem premiar com maiores fundos aqueles que descapitalizaram a empresa.

Ainda há que averiguar quais foram os lucros reais que a REPSOL acumulou com a distribuição de lucros à custa dos activos energéticos e com a expansão internacional da companhia, utilizando os recursos do subsolo nacional. Antes de falar de qualquer avaliação da empresa (por cotação na bolsa, contabilística ou patrimonial) há que ver os resultados de uma auditoria, que esclareça o estado dos poços e dos danos ambientais. Se se utilizam os fundos do ANSES, as reservas do Banco Central ou a emissão de nova dívida para pagar a REPSOL, repetir-se-á a velha história de um estado bobo que se encarrega das perdas provocadas por ex-concessionários.

A nova YPF é concebida como uma sociedade anónima, seguindo um modelo de empresa mista muito distante da velha companhia inteiramente estatal.

Esta decisão é errada e conspira contra o projecto de reconstrução energética.

Não é casual que existam tantos exemplos internacionais de manejo totalmente público de um recurso vital. Esse modelo de propriedade pública manteve a taxa de exploração requerida no passado para um país como a Argentina, que tem reservas limitadas e de extracção custosa.

A necessidade de um longo processo de investimento não é compatível com os esquemas idealizados de companhias mistas, que já foram ensaiados na primeira etapa de privatização da YPF. Um teste próximo dos problemas que este modelo enfrentará verificar-se-á quando tiver de ser resolvida a situação do grupo Eskenazi. Esta família ficou como sócia minoritária da nova YPF, depois de haver perpetrado uma fraude superior às tropelias cometidas pela REPSOL. Comprou a sua participação sem por um só peso, recorrendo a um crédito a pagar com a distribuição de lucros. Sua permanência está em dúvida, a partir do momento em que terá de cancelar esse empréstimo com o seu próprio dinheiro.

Se se concretiza a sua deserção, quem se encarregará desse pacote?
Ou o estado mediante perdas adicionais?
Ou haverá uma transferência para outros "capitalistas amigos" (Bulgheroni, Cristóbal López, Lázaro Báez, Eurekian), que já ficaram com várias áreas sem realizar nenhum investimento?

O perigo da sociedade mista não reside só nesses favoritismos. A forte presença do capital privado dentro da companhia exige que se opere com critérios de rentabilidade imediata, que obstruem a prioridade investidora. Este modelo induz, além disso, ao aumento dos preços na boca do poço pela pressão para alcançar maiores lucros, gerando um encarecimento adicional do combustível.

Gestão, legislação e propriedade
O governo promete uma administração profissional da nova YPF. Mas esta meta exige não só conhecimentos técnicos como também grande independência do lobby petrolífero.

Se as firmas privadas participam do directório, aumentará o perigo de repetir os vícios do passado (endividamento desnecessário da companhia) ou incorrer em novos desacertos (uso dos recursos para financiar o buraco de importações).

É evidente que a transcendência de definir como se administrará a companhia e a ENARSA [5] é um mau antecedente imediato. Torna-se imprescindível dotar a YPF de um genuíno controle social, popular e dos trabalhadores.

Mas o maior problema está no que sucederá com os 70% da actividade petrolífera que actualmente é desenvolvida fora da YPF. O governo não definiu que tipo de modificações serão introduzidas, num sector regido por princípios neoliberais de livre disponibilidade do petróleo bruto por parte dos concessionários.
A revisão dos contratos subscritos com essas normas mal começou e na sua grande maioria afectou poços marginais. O projecto de lei em curso não esclarece o que ocorrerá com o marco legal que permitiu a atomização do sector e a proliferação de uma grande variedade de convénios gravosos.

Impõe-se aqui a imediata recuperação da atribuição do estado para controlar toda a comercialização interna e externa, fixando as condições e os preços de extracção e processamento.

A propriedade provincial do subsolo constitui outro impedimento para alcançar essa meta. Mantém o poder discricionário dos governadores no manejo de um recurso de toda a nação. O compromisso da sindicatura comum [de accionistas] que se estabeleceu com as províncias para o manejo da YPF não se estende ao resto do sector e só adia a necessidade de reintroduzir a propriedade nacional. Marginalizar as províncias não petrolíferas da nova condução da YPF não contribui para essa recomposição.

Com a expropriação abre-se um novo capítulo da história petrolífera.


Há condições nacionais e internacionais muito favoráveis para reconstruir nosso cimento energético, avançando rumo a uma empresa totalmente pública.

Só este esquema permitirá equilibrar os custos de extracção com os preços requeridos para o desenvolvimento industrial.

Este manejo é indispensável para diversificar a matriz energética, reduzir a dependência dos hidrocarbonetos e evitar uma maior deterioração do meio ambiente.

O alcance destes objectivos exige que se afecte os interesses capitalistas que até agora o governo protegeu e adoptar uma atitude soberana frente às pressões externas.



A mobilização popular com bandeiras próprias é o grande instrumento para esta acção.



Claudio Katz

[*] Professor da Universidade de Buenos Aires – Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas (UBA-CONICET) e membro da rede Economistas de Izquierda (EDI).

[1] Centro Internacional para a Arbitragem de Disputas sobre Investimentos
Fonte: Wikipédia
O CIADI significa Centro Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos,criado a partir de uma Convenção Internacional de 1966, sob a égide do Banco Mundial. O CIADI proporciona instalações para a resolução mediante conciliação ou arbitragem de disputas referentes a investimentos entre investidores estrangeiros e os seus países anfitriões. O Brasil não faz parte do CIADI (também conhecido como ICSID, na sigla em inglês).

[2] ANRed (Agencia de Noticias Red Accion) - 15 de abril de 2012 - Ciadi: una herramienta de las multinacionales - http://www.anred.org/article.php3?id_article=4948

[3] Julio de Vido, ministro do Planejamento argentino

[4] General Enrique Mosconi, militar nacionalista, defensor da YPF, foi seu presidente de 1922 a 1930

[5] ENARSA (acrónimo de Energía Argentina S.A.) es una empresa pública argentina creada el 29 de diciembre de 2004 por la administración de Néstor Kirchner dedicada al estudio, exploración y explotación de yacimientos de hidrocarburos, el transporte, almacenaje, distribución, comercialización e industrialización de estos productos y sus derivados, el transporte y distribución de gas natural, y la generación, transporte, distribución y comercialización de energía eléctrica. Fonte: Wikipedia - http://es.wikipedia.org/wiki/Enarsa


Este artigo encontra-se em português (Portugal) em: http://resistir.info/ .

Ver também: Argentina: Recuperación (parcial) de YPF, de Alejandro Teitelbaum, em espanhol, em: http://www.argenpress.info/2012/04/argentina-recuperacion-parcial-de-ypf.html