quarta-feira, 13 de novembro de 2013

O estratégico nióbio

12/11/2013 - Adriano Benayon [*] - Redecastorphoto

1. As chapas de ferro-nióbio são o principal dos produtos do nióbio nas exportações brasileiras, tendo totalizado US$ 4,8 bilhões, de 1996 a 2013.

Somamos os dados, ano a ano, que estão na tabela do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.



2. O mercado é fechado, estando concentrado em poucas empresas importadoras e pouquíssimas empresas exportadoras. São transações entre empresas dos mesmos grupos ou entre grupos associados. A CBMM, de Araxá, que exporta 90% do total, vende o produto às suas próprias subsidiárias no exterior.

3. O preço seria muito mais alto, se houvesse mercados abertos ou algum tipo de concorrência, a não ser entre indústrias utilizadoras do metal.

4. A Bolsa de Metais de Londres não informa sobre negociações com o nióbio. Muitas fontes dizem que o nióbio não é negociado nessa bolsa nem em outras.

5. Encontrei na internet notícia recente, 6 de setembro, da Bolsa de Metais de Bejing (Pekim) nestes termos:“Os preços do nióbio metálico a 99,9% de pureza permanecem estáveis em 115 a 120 dólares por quilo, na Comunidade de Estados Independentes” [Rússia, Ucrânia e outros].

Nióbio - Características Físico-Químicas do elemento

6. Guardei também uma cotação, de 22.01.2011, do sítio eletrônico Chemicool/ elements/ niobium, de nióbio puro (óxido de nióbio), a US$ 18.00 por 100 g = US$ 180.00 por quilo.

Além disso, outra, do mesmo ano, em que a barra de nióbio era cotada a US$ 315,70 por quilo.

7. Isso é mais de 10 vezes o preço oficial da exportação brasileira desse insumo, i.é., US$ 30,00 por quilo, no último ano. Já o preço oficial da chapa de ferro-nióbio é menor ainda (R$ 25,00), mesmo porque não se refere propriamente ao nióbio incorporado às chapas de ferro-nióbio, nas quais o conteúdo de nióbio é diminuto, embora suficiente para lhes dar qualidade muitíssimo acima das outras ligas metálicas.

8. Para ter uma ideia, o preço oficial das exportações das chapas de ferro-silício e ferro-manganês, têm estado em US$ 1,77 e US$ 2,25, respectivamente. Dez vezes inferiores aos do ferro-nióbio.

9. Embora o óxido de nióbio tenha muito valor no exterior, mormente transformado, após o processo de redução, ele é de pouca significação nas exportações oficiais brasileiras.

O valor oficial de suas vendas ao exterior quase dobrou de 2009 para 2010, mas não é expressivo: foi para US$ 44 milhões, com preço médio de US$ 30,00, para quase 1.500 toneladas.

10. Esse preço de um produto processado em pouco supera o do minério bruto, que vem associado ao tântalo e ao vanádio. As exportações oficiais desse minério chegaram, em 2012, a quase US$ 50 milhões, com valor unitário  de US$ 24,00.

11. Note-se que as mineradoras instaladas no Brasil, a CBMM e a Anglo-American, têm, com as chapas de ferro-nióbio, receita 36 vezes maior que a obtida com o minério bruto e 41 vezes maior que a obtida com o óxido de nióbio, mesmo contando-se só suas provavelmente subfaturadas exportações.

12. Devem isso à iniciativa do professor Bautista Vidal [foto], titular, nos anos 70, da Secretaria de Tecnologia Industrial.

Ele mobilizou técnicos para criar o processo de incorporar o óxido às ligas metálicas, através do Departamento de Engenharia de Materiais - da Escola de Engenharia de Lorena- USP.

13. As exportações oficiais das chapas de ferro-nióbio certamente não chegam a US$ 6 bilhões, desde que começaram, nos anos 80, até hoje. Pois, em 1996, o volume ainda era diminuto, e os preços, muito baixos. De então até 2013, conforme a Tabela do MDIC, foram US$ 4,8 bilhões.

Mineração da CBMM/Grupo Moreira Salles e Anglo American em Araxá

14. Causa, pois surpresa esta notícia da Agência Bloomberg, dos EUA, publicada em 03/03/2013, no Valor Econômico: Família mais rica do Brasil fez US$ 13 bilhões com o sonho do nióbio.

15. Nela foi reportado:
Ela [a CBMM, Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração] vale pelo menos US$ 13 bilhões, baseado na venda da família de uma parte de 30% para um grupo de produtores de aço asiático por US$ 3,9 bilhões em 2011.

16. O dado mais notável da notícia da Bloomberg/Valor Econômico é este:
(...) os herdeiros de Moreira Salles, a família mais rica do Brasil, seus quatro filhos, Fernando, Pedro, João e Walter, controlam uma fortuna combinada de US$ 27 bilhões, segundo o “Bloomberg Billionaires Índex”.

17. Levando em conta que o outro patrimônio mais importante do grupo Moreira Salles era o UNIBANCO, um banco que, há alguns anos, entrou em dificuldades e foi absorvido pelo Itaú, parece nebuloso como foi possível acumular US$ 27 bilhões, com os lucros decorrentes fundamentalmente das exportações de nióbio, valoradas conforme as cifras oficiais.

18. De fato, os lucros disso para a CBMM não poderiam passar muito de US$ 1 bilhão, diante destes fatos:

1.      faturamento de $ 6 bilhões;
2.     mesmo que os lucros tivessem sido sempre 50% do faturamento, não passariam de US$ 3 bilhões;
3.     até 2007, a CBMM só tinha 50% das ações, além de que a tecnologia e o provável controle serem da Molybdenum Corp; dos EUA, do grupo Rockefeller;
4.     desde 2011, há grupos siderúrgicos asiáticos com 30% de participação na CBMM;
5.     a CODEMIG (estatal de Minas Gerais) tem 25% de participação nos “lucros operacionais” da CBMM;
6.     10% das exportações oficiais provêm da Anglo-American.

19. Com cerca de US$ 1 bilhão de lucros acumulados, e mais os US$ 3,9 bilhões da venda de 30% do capital da CBMM, admitindo que tenham ido inteiramente para o grupo Moreira Salles, ainda se fica muito longe dos US$ 27 bilhões referidos na notícia mencionada.

20. Fica, pois, demonstrado que o Brasil está longe de ter, em seu proveito, as receitas reais ou, no mínimo, as receitas reais possíveis, da extração de seu subsolo de um metal tão precioso e estratégico como o nióbio.

21. A Constituição nasceu com deficiências, e até fraudes, como a que privilegia o serviço da dívida, e foi sendo emendada, quase que invariavelmente, para pior.

E o que tem de bom, fica, nas atuais condições, sem serventia. Exemplo: a propriedade do subsolo e dos recursos minerais definidos como bens da União (art. 20, VIII, IX e X).

22. Seria a base para garantir o interesse do País nessa área. Entretanto, o Estado tornou-se demissionário: praticamente tudo é objeto de concessões.

No caso da principal reserva de nióbio, a União a cedeu ao Estado de Minas. Este, depois de mais de trinta anos de concessão à CBMM, renovou-a, em 2003, por mais 30 anos, sem licitação.

23. Cabe indagar por que as coisas são assim? Creio que vêm de longe e se foram agravando.

Aí pelos anos 50, alguns líderes ainda tentavam consolidar a consciência dos interesses nacionais, e o País fazia progressos para o desenvolvimento.

Nisso, o País sofreu intervenções, como a conspiração que derrubou Vargas em 1954.

Logo após esse golpe, foram dados privilégios às empresas transnacionais, cujos cartéis foram esmagando, em crescente quantidade, promissoras indústrias nacionais.

24. Isso acentuou-se sob JK, com a mesma política de atração de capitais estrangeiros, a qual fez implantar o cartel da indústria automobilística. Esse, até hoje, produz déficits externos e ainda se ceva de isenções fiscais e subsídios da União, dos Estados e dos Municípios.

25. Ora, a desnacionalização implica inviabilizar o desenvolvimento tecnológico e faz que o apoio governamental à ciência e a tecnologia seja, na maior parte, desperdiçado, pois as tecnologias só se desenvolvem em empresas atuantes no mercado. E dele as nacionais têm hoje poucos nichos.

A consequência é a desindustrialização, entendida não só como regressão à produção primária, mas também como confinamento da indústria a produções de baixo valor agregado.

Minério de nióbio bruto
26. Os capitais estrangeiros tornaram-se dominantes inclusive na informação, nas comunicações e na política. As políticas passaram a ser desenhadas no seu interesse.

Entre os inumeráveis exemplos, está a lei Kandir, que isenta a exportação, inclusive de produtos primários, de IPI, ICMS e contribuições sociais. Primeiro lei complementar, ela ganhou mais status em 2003: através de EC, foi incorporada à Constituição.

27. Então, a sociedade fica sem forças para reagir, já que os empresários industriais nacionais foram dizimados, e os que restam são acuados por políticas adversas.

Tampouco os trabalhadores estão bem organizados para defenderem o País, o que seria a própria defesa deles.

28. Tivesse o País evoluído nos últimos 59 anos, a economia ter-se-ia diversificado para patamares crescentes de intensidade tecnológica, e, como no quartzo para os chips e a eletrônica avançada, o nióbio estaria sendo utilizado, em grande escala, nos bens de altíssimo valor agregado.

29. Nesse caso, não estaríamos falando das perdas atuais com subpreços. Nem precisaríamos lembrar que nosso percentual da oferta do nióbio é muito maior que a de todos os membros da OPEP, juntos, no tocante ao petróleo. Poderíamos criar a Bolsa do Nióbio e defender seus preços.

30. E ganharíamos centenas de vezes mais ao fabricarmos bens de elevada tecnologia, competitivos, livres dos cartéis e de grupos concentradores.

31. Esse padrão de desenvolvimento e de consciência dos interesses nacionais, por parte das lideranças políticas, faria  conhecer o real valor do nióbio e de outros recursos naturais, e, assim,  eles não seriam alienados por praticamente nada.

O Brasil teria também ganhado poder suficiente para defender seu povo e seus bens.

Notas de rodapé:
1. a CBMM pertence à holding financeira, Brasil Warrants, originalmente Brazilian Warrants, adquirida em Londres, a qual seria controlada pela família Moreira Salles;
2. documentos oficiais classificam como de seu interesse estratégico dos EUA as reservas de nióbio situadas em Araxá (MG), concedidas à CMBB e Catalão (GO), à mineradora britânica Anglo-American.

[*] Adriano Benayon [foto] é consultor em finanças e em biomassa. Doutor em Economia, pela Universidade de Hamburgo, Bacharel em Direito, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Diplomado no Curso de Altos Estudos do Instituto Rio Branco, Itamaraty. Diplomata de carreira, postos na Holanda, Paraguai, Bulgária, Alemanha, Estados Unidos e México.

Delegado do Brasil em reuniões multilaterais nas áreas econômica e tecnológica. Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados e do Senado Federal na área de economia. Professor da Universidade de Brasília (Empresas Multinacionais; Sistema Financeiro Internacional; Estado e Desenvolvimento no Brasil). Autor de Globalização versus Desenvolvimento,2ª ed. Editora Escrituras, São Paulo.

Fonte:
http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2013/11/o-estrategico-niobio.html

Não deixe de ler:
- Marina na rede do Itaú - Antonio Mello e Marcelo Mirisola

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Carta a um jornal de Wall Street

10/11/2013 - Mauro Santayana em seu blog

(JB) - Ao Senhor Paul Gigot [foto], Vice-Presidente e Diretor Editorial do Wall Street Journal.

Normalmente, eu não me dirigiria a um jornal pertencente a um grupo que tem, desde a semana passada, oito ex-funcionários e ex-diretores sentados nos bancos dos réus por suborno e espionagem ilegal, até mesmo do email de uma vítima de homicídio, como é o caso da News Corporation.

Um jornal que sonega e manipula informações para seus leitores, sempre que é conveniente para o dono, como no caso do escândalo das escutas do tabloide sensacionalista News from the World, como revelado agora pelo jornalista David Folkenflik [foto], no livro Murdoch´s world: the last of the media empires, lançado na semana passada pela Perseus Books, que talvez o senhor não tenha tido ainda a oportunidade de ler.

Por essa razão, não merecem consideração as costumeiras sandices da página editorial de vocês, escritas por seus “editorialistas”, como fez Mary O´Grady [abaixo], na semana passada, sobre o Brasil.

Quem entenda um mínimo de jornalismo conhece as contradições do Wall Street Journal [WSJ], e a orientação fascista e de extrema direita e o ultra-relativismo de sua linha editorial.

O WSJ é aquele jornal que afirma, em editorial, que não dá para confiar em detectores de mentiras, no caso da acusação de assédio sexual de Anita Hill contra o Juiz conservador, então candidato à Suprema Corte, Clarence Thomas; e oito meses depois, diz que o detector de mentiras é totalmente confiável, ao tentar salvar o Secretário de Estado Caspar Weinberger de indiciamento por perjúrio, no caso Irã-Contras, de venda de armas para iranianos para enviar dinheiro para as milícias assassinas de extrema direita na Nicarágua .

É da tradição do Journal confundir, interessadamente, alhos com bugalhos, como fez no caso de Jonas Savimbi [foto], líder da UNITA, ao citá-lo, por duas vezes, em 1979 e 1989, como um combatente contra os portugueses pela independência angolana, quando então já havia documentos provando que, na verdade, ele era financiado pelo regime colonial português para combater e enfraquecer o MPLA, o movimento que lutou depois da independência contra o próprio Savimbi, mercenários ocidentais, e sul-africanos, para libertar o país.

O seu jornal chamou de um “bando de bandidos árabes” os paquistaneses e indianos envolvidos com o caso do banco BBCI; escreveu um editorial contra o New York Times, acusando-o de acusar injustamente o militar e político salvadorenho Roberto D'Aubuisson [foto], com esquadrões da morte - quando documentos da própria administração Reagan comprovavam esse envolvimento, em milhares de assassinatos de opositores.

Não se pode esperar outra coisa de um jornal que mente, mente, mente, descaradamente quando se trata de defender, dentro dos Estados Unidos, o mais abjeto fundamentalismo de direita.

E, fora dele, o pretenso destino manifesto norte-americano de se meter em outros países e se arvorar em “guardiões do mundo”.

Para saber mais sobre a reputação da linha editorial de seu jornal, sugiro ler 20 Reasons Not to Trust the Journal Editorial Page (20 razões para não ler a página editorial do Journal), de Jim Naureckas e Seteve Rendall e By any Means necessary, the ultrarelativism of the Wall Street Journal Editorial Page (pelos meios necessários, o ultrarelativismo da página editorial do Wall Street Journal), de Edward S. Herman [abaixo], professor emérito da Wharton School da Universidade da Pensilvânia.

Como o papel aceita tudo, como dizemos por aqui, o Wall Street Journal tem o direito de publicar o que quiser, só não pode dizer que é um paladino da liberdade e da democracia depois de ter afirmado, em editorial, em julho deste ano, que o Egito precisa é de um Pinochet, ditador que, aliás, os senhores não se cansavam de elogiar quando estava no poder.

E é isso que sua editorialista, Mary O´Grady, quis dar a entender – que estava defendendo a “liberdade” e a democracia estilo “Wall Street Journal”, quando publicou, na semana passada, um artigo denominado Why The NSA Watches Brazil – Porque a NSA espiona o Brasil.

Se o artigo tivesse ficado restrito aos seus leitores, provavelmente não faria nenhuma diferença, mas, como foi publicado aqui, e ninguém se dispôs a contestá-lo, estou tentando fazê-lo agora.

O texto de Mary O´Grady, é filho de um outro texto, chamado “Porque os Estados Unidos espionam o Brasil”, de Carlos Alberto Montaner [foto], um perfeito  “gusano” cubano, co-autor de um livro denominado “o perfeito idiota latino-americano”, cuja conclusão é a de que somos todos idiotas, os que defendemos a soberania e a independência de nossos países, ao contrário dos “inteligentes” e “brilhantes” defensores da total submissão ao Consenso de Washington e aos interesses dos Estados Unidos.

Segundo Montaner, que inventa uma suposta “conversa” com um embaixador norte-americano não identificado, os EUA espionam o Brasil porque apoiamos regimes como Cuba, Venezuela, a Bolivia, a Siria, e votamos com o BRICS na ONU.

Ou seja, os Estados Unidos espionam o Brasil porque não fazemos o que o seu país, senhor Paul Gigot, quer que nós façamos.  

Para o seu país, seria uma maravilha, se no lugar do Mercosul, tivéssemos uma ALCA, e fôssemos todos imenso México, que apenas maquila produtos para o mercado norte-americano – e que, apesar do “excelente” negócio que fez ao entrar para o NAFTA, crescerá apenas a metade do que nós iremos crescer este ano.

Para Mary O´Grady, temos que “mudar” nossa geopolítica. Para os EUA, teria sido ótimo se não tivéssemos fundado o G-20, e o mundo ainda fosse comandado pelo G-8, se não existisse o BRICS, nem o Conselho de Segurança da ONU.

E eles pudessem invadir e bombardear quem quisessem, para, depois de perder trilhões de dólares e milhares de homens, sair com o rabo entre as pernas, como estão fazendo de países como o Iraque e o Afeganistão, com suas guerras inúteis.

Mas isso não vai ocorrer, senhor Gigot.

O Brasil vai continuar sendo – ou tentando ser - um país independente, que apoia e integra a América do Sul por meio da UNASUL e do Conselho de Segurança da América do Sul.

Vamos continuar pesquisando o urânio, construindo nossos submarinos nucleares, desenvolvendo nossa indústria de defesa, fazendo parcerias com outros países, inclusive do BRICS, porque todo país tem direito a proteger-se.

Vamos fazê-lo porque somos o quinto maior país do mundo em extensão territorial e população, com todos nossos problemas, a sétima economia do mundo e – entre outras coisas - o terceiro maior credor individual externo de seu país, senhor Paul Gigot.

É essa a responsabilidade que temos com o nosso povo. E com a nossa visão de mundo e nosso projeto geopolítico, multilateralista e democrático, que não é o dos Estados Unidos da América do Norte.

Continuem nos espionando.

A Alemanha e a França são seus aliados na OTAN.

Eles não são do BRICS, nem estão construindo um novo porto em Cuba, nem mandam comida para a Venezuela, nem compram gás boliviano.

E vocês não os espionam também, da mesma forma?

Lembre à senhorita Mary O´Grady que há mais razões para que os EUA nos espionem do que as que ela colocou em seu artigo.

Mas são menos razões do que as que vocês nos dão para desconfiar – e passar realmente a espionar - dos Estados Unidos.

Fonte:
http://www.maurosantayana.com/2013/11/carta-um-jornal-de-wall-street.html

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade e, excetuando uma ou outra, inexistem no texto original.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Eleições 2014 e o Bolsa Família

30/10/2013 - Bolsa Família e o debate eleitoral em 2014
- Fabiano Santos - Carta Maior

É importante que o governo, partidos aliados, assim como seus principais contendores definam o que percebem como sendo a agenda mais promissora para o país

O programa Bolsa Família do governo federal completa 10 anos de existência.

A marcar a data, além de evento de vulto organizado pela própria Presidência da República, duas contribuições importantes no âmbito das ciências sociais: os livros Vozes do Bolsa Família, de autoria da socióloga Walquiria Domingues Leão [E] e O Bolsa Família e a social-democracia, escrito pela cientista política e jornalista Débora Thomé [D].

O primeiro inscreve sua pesquisa na tradição de se ouvir a clientela beneficiada ou atingida por uma política pública e enfatiza as mudanças ocorridas no imaginário deste segmento da população no que tange suas relações com o estado e o setor público.

O segundo contextualiza o programa no seio das disputas eleitorais entre partidos de orientação mais à esquerda versus partidos de persuasão conservadora ou neoliberal.

Constata um forte efeito de desmercantilização de famílias situadas nos extratos de renda mais baixos, aproximando o Programa, assim, das experiências social democratas europeias do pós segunda-guerra, experiências nas quais o aprofundamento das premissas do estado de bem estar promoveu inflexão relevante no perfil da distribuição da renda e da riqueza nos países daquele continente.

Os dois livros, embora partindo de abordagens e metodologias distintas, possuem, em comum, a aposta na dimensão política como sendo talvez a
mais fundamental consequência do Programa.

Dimensão que se revela com nitidez em dois traços essenciais da política brasileira contemporânea, a saber: que a pobreza e a miséria não são estados impostos pelo destino ou pela vontade divina, mas sim condição inaceitável que exige pronta e eficiente resposta do setor público; e, que políticas públicas visando o equacionamento do problema da exclusão e da pobreza têm peso eleitoral decisivo.

Nenhum partido, nenhuma candidatura com reais condições de competição em pleitos majoritários no Brasil hoje pode sustentar que o Programa não passa de uma esmola, focada nos pobres tendo em vista auferir dividendos eleitorais, uma espécie de compra dos votos dos pobres e miseráveis brasileiros.

A opinião existe, é razoavelmente disseminada em círculos da elite, à direita e às vezes à esquerda, mas não alcança o discurso dos principais candidatos de oposição.

O forte componente eleitoral do Programa, assim como a pouca relevância de questões doutrinárias, aliás, são outras duas características relevantes a aproximá-lo das experiências europeias do estado de bem estar.

Desde seus primórdios, no nascimento das primeiras medidas de proteção ao trabalho, aos idosos e inválidos, a disputa política entre liberais e conservadores já empolgava defensores e críticos da atuação do estado na economia e na questão social.

O espectro de uma classe operária revolucionária, ademais, sempre orientou a atuação das elites na aprovação de medidas de alívio das condições extremas de exclusão e privação.

O pós segunda-guerra, contudo, marcou fundamental inflexão nas políticas de welfare [bem estar], já agora impulsionadas por décadas acumuladas de passagem de partidos socialistas e de esquerda, em sentido mais amplo, pelos governos e parlamentos de diversos países.

O mote passou a ser não mais a aprovação de medidas tópicas de proteção aos trabalhadores, mas sim uma ampla alteração nos fundamentos da intervenção do estado na economia de forma a reconfigurar o padrão de distribuição dos benefícios da acumulação capitalista e da propriedade.

Desmercantilizar, isto é, reduzir drasticamente a dependência das famílias às idas e vindas do mercado de trabalho e do ciclo de negócios passou a ser a palavra chave da luta dos socialistas na Europa.

A extensão com que foi montado o estado de bem estar e o alcance do keynesianismo dependeram em cada país de vários fatores, sendo políticas específicas nas áreas do emprego, educação, saúde e habitação, vetores resultantes de diversas variáveis, políticas, econômicas e societais.

Uma vez geradas, todavia, e seus efeitos redistributivos produzidos, a ancoragem eleitoral foi sempre a garantia da manutenção de patamares civilizados de desigualdade e índices ínfimos de pobreza.

Não é o caso de se discutir aqui o aparente declínio dos fundamentos do socialismo europeu. A discussão é relevante e será objeto de intervenções
posteriores.

Por ora, trata-se de enfatizar o fato de que sempre existiu um vínculo entre a presença decisiva do estado no combate á pobreza e à desigualdade, por um lado, e o fator voto popular como mecanismo de legitimação e assunção de grupos e partidos ao poder e ocupação dos governos.

A versão sul-americana mais evidente de tal agenda é o Programa Bolsa Família.

Por óbvio, trata-se de um início e que uma vez instalado, diversos e cruciais desafios precisam ser enfrentados no sentido de se alcançar indicadores sociais mais compatíveis com uma economia em modernização acelerada como é o caso da brasileira.

Crucial neste momento a promoção de políticas de inclusão e treinamento das primeiras gerações de jovens beneficiados pelo programa.

Serão estes encaminhados para o ensino superior, na busca de um diploma universitário, ou buscarão cursos de formação técnica, visando perfil mais especializado?

Optarão pelo PRO-UNI/REUNI ou pelo PRONATEC? Uma distribuição mais uniforme pelos dois modelos?

Desde logo, é importante que o governo, partidos aliados, assim como seus principais contendores definam o que percebem como sendo a agenda mais factível e promissora para o país.

Do lado do eleitorado popular e mais à esquerda, assim parece, a opção será por aquela que com mais clareza vier a representar a agenda do desenvolvimento com desmercantilização.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Bolsa-Familia-e-o-debate-eleitoral-em-2014/4/29393

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

domingo, 10 de novembro de 2013

Manipulação comercial da consciência infantil

01/11/2013 -  - Por Maurício Andrés Ribeiro (*)
- no Portal do Meio Ambiente
- da Rede Brasileira de Informação Ambiental (REBIA)

A consciência infantil é altamente vulnerável às mensagens que recebe nas escolas, na família e quando exposta aos meios de comunicação.

Por isso, marqueteiros e publicitários, com o apoio de psicólogos, neurocientistas, e com a criatividade artística de designers e escritores, transformaram a criança em alvo preferencial de suas mensagens.

Na pesquisa acadêmica avançada, há especialistas em marketing infantil.

Enquanto os pais trabalham, profissionais com conhecimento e talento produzem comerciais para vender de tudo.

As crianças deixaram de ser uma faixa etária e passaram a ser consideradas como uma faixa de consumidores.

Crianças são um segmento da população extremamente vulnerável à propaganda.

No Brasil, pesquisa Ibope realizada em 2011, mostrou que as crianças estão expostas a mais de 5 horas de tempo médio diário diante da TV, a babá eletrônica que as bombardeia nos merchandisings e na propaganda subliminar que sequer percebem que estão recebendo.

Elas navegam ao mesmo tempo na web, na MTV, no iPod, e são como esponjas que recebem e absorvem 3000 comerciais por dia.

A infância e a pré-adolescência são estágios da vida humana especialmente sensíveis e receptivos.

Comerciais de 30 segundos são suficientes para uma marca influir na criança. As crianças hoje reconhecem marcas com maior facilidade do que identificam animais ou frutas.

Nos últimos anos, tem surgido várias análises e denúncias sobre tal questão, na forma de livros, teses, filmes.

Também têm sido formuladas respostas a esse problema na forma de leis que regulamentam a publicidade infantil, e de programas de orientação para escolas e pais.

Um filme contundente, disponível no Youtube, é “A comercialização da infância”.



Realizado em 2008, tem 60 minutos de duração e legendas em português.

O filme mostra que a criança é uma faixa de consumidores que, nos Estados Unidos, movimenta US$40 bi/ano em roupas, música e eletrônicos; ela movimenta US$700bi/ano ao influenciar na compra de computadores, carros, celulares, das férias da família.

Por seu poder na economia são alvos do marketing de marcas, do marketing viral, do marketing de imersão e muitas outras formas. Crianças pressionam pelo consumo; mães de família não são apenas influenciadas pelos filhos, mas são pressionadas por eles para comprarem algo. Reclamação, birra, insistência são armas que as crianças usam para conseguirem seus objetivos.

O filme mostra que desde os anos 70 se pensava em proibir a publicidade voltada para menores de 8 anos, pois essa faixa etária é facilmente enganada pela persuasão.

Nos anos 80, nos Estados Unidos, o governo Reagan decidiu desregulamentar a publicidade, com o argumento que não é necessária uma babá federal para proteger as crianças.

Isso levou a um aumento exponencial no volume de publicidade voltada para crianças, de 4,2 bilhões de dólares em 1984 para 40 bilhões de dólares em 2010.

Os marqueteiros procuram forjar vínculos emocionais, por meio do bombardeio de mensagens e histórias em quadrinhos. Usam-se personagens que elas compreendem e amam, que as confortam e lhes dão referências para sua estabilidade.

A publicidade busca a lealdade da criança a uma marca, do berço ao túmulo. Procura viciar a criança em produtos variados: biscoitos e junk food, roupas de cama, camisetas. Anúncios são personalizados.

Marqueteiros agem como pedófilos, mapeiam os hábitos infantis, querem imprimir suas marcas nas crianças; tornam-se especialistas em crianças, possuem suas mentes e emoções, que são examinadas e dissecadas detalhada e sistematicamente; por meio de testes de piscar de olhos e outros, estuda-se o que ocorre os cérebros das crianças.

Estuda-se como o produto as afeta, como usam o shampoo no banheiro; promovem-se festas de marketing de grupos que ensinam as crianças a explorar os amigos.

Em laboratórios de controle mental, criam-se sonhos, desejos, ambições, controlam-se as crianças pelo controle remoto, e elas influenciam na tomada de decisão dos pais.

A identidade é definida em termos simbólicos e de status pelo que compra, o que tem e o que possui.

Uma criança que não tem uma roupa, um tênis, um celular, não vale nada, fica sem autoestima. A mensagem é que, para ser, é preciso ter.

Mais do que objetos, produtos e serviços, vendem-se valores simbólicos e culturais. Elas não são poupadas sequer na escola, com anúncios nas paredes das salas de aula. A escola leva alunos para passear em shoppings e publicidade é afixada nos ônibus escolares.

No Brasil, o Instituto Alana formula propostas sobre como enfrentar essa questão. Em Mercantilização da infância, um problema de todos, Isabella Henriques e Laís Fontenelle mostram que o consumismo infantil decorre da formação de valores materialistas.

Ele provoca distúrbios alimentares, erotização precoce, estresse familiar, diminuição de brincadeiras criativas, violência pela busca de produtos caros, consumo precoce de álcool e tabaco, encorajamento do egoísmo, da passividade, do conformismo, enfraquecimento dos valores culturais e democráticos.

Aumenta a obesidade infantil, diabetes, e agudiza crise na saúde pública. 16% das crianças americanas hoje são obesas.

O trabalho afirma que “a publicidade voltada ao público infantil é intrinsecamente carregada de abusividade, pois para seu sucesso se vale justamente da deficiência de julgamento e experiência da criança. A comunicação mercadológica que se dirige à criança não é ética ao utilizar técnicas e subterfúgios de convencimento dirigidos a uma pessoa vulnerável. 

As crianças não têm condições de entender as mensagens publicitárias que lhes são dirigidas; não conseguem distingui-las da programação; compreender seu caráter persuasivo e não conseguem identificar a publicidade como tal”.

Em 2012, o Ministério do Meio Ambiente e o Instituto Alana lançaram a cartilha Consumismo infantil: na contramão da sustentabilidade.

Nela se realça a importância da ação conjunta da família, das escolas, dos movimentos sociais e organizações do 3º setor, do empresariado e do Estado.

Propõe-se valorizar o brincar, ocupar espaços públicos, ganhar doar, trocar, consumir lanches saudáveis, ter contato com a natureza, cuidar das embalagens.

Essa cartilha afirma que “Também é fundamental que até os 12 anos as crianças sejam protegidas dos apelos para o consumo e que aprendam a lidar com o consumo sempre com a mediação de adultos. Só assim elas serão capazes de desenvolver espírito crítico”. Nos estágios evolutivos da criança, é dos 10 aos 12 anos que se inicia o senso crítico autônomo.

Em março de 2012 surgiu no Brasil o Movimento por uma infância livre de consumismo. Ele se apresenta como um coletivo de mães, pais e cidadãos inconformados com a publicidade dirigida às crianças.

Considera que a regulamentação feita pelo próprio setor atende aos interesses empresariais e não está preocupada com a saúde e o bem-estar das crianças.

Acredita que o Estado deve intervir e que não se pode responsabilizar somente os pais e as mães por um problema que afeta toda a sociedade.

Juristas e políticos debatem a necessidade do Congresso regular a publicidade voltada para as crianças.

A Constituição Federal, no Art. 227 postula que “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (...)”

O Código de Defesa do consumidor proíbe toda publicidade enganosa ou abusiva e diz que “É abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeite valores ambientais.”

Recentemente o Congresso discutiu projeto de lei que proíbe a vinculação de brindes à venda de alimentos, para evitar essa manipulação comercial das consciências das crianças.

Os congressistas têm o poder e a atribuição de elaborar leis que regulem ou coíbam a propaganda abusiva, e são alvo dos lobbies das indústrias no sentido de neutralizar tais iniciativas.

Sobre a regulação, uma publicitária me escreveu a seguinte mensagem:
“Eu achava que a proibição da publicidade infantil era um caminho simplista demais, já que o problema está também no conteúdo dos programas infantis, que são largamente consumidos nos lares brasileiros sem acompanhamento dos pais ou responsáveis. Mas depois que passei férias na casa de uma amiga, mudei de ideia.

Essa amiga e o marido sempre proibiram os três filhos de assistirem TV. A TV na casa deles só é ligada para a família assistir filmes/DVD.

Fiquei muito impressionada com as coisas que vi naquela casa: pais e filhos integrados e participativos, crianças felizes, calmas, de hábitos saudáveis, sem nenhum consumismo, com uma estrutura intelectual sólida, enfim, com uma moral que lhes valerá para o resto da vida”.

Em vários países, tais como a Suécia, a Inglaterra, os Estados Unidos, o Canadá, a Noruega, a Irlanda, a Dinamarca, a Holanda, a Bélgica, a Áustria, Portugal e Luxemburgo, há legislação que regula o tema.

Ela comenta sobre isso:
“Para essas sociedades, eleger uma programação televisiva livre de conteúdos publicitários direcionados a crianças/adolescentes é uma opção por colocar os direitos dessas crianças acima de outros interesses.

É tratá-las como pessoas em processo de desenvolvimento, e não como consumidores.

É fortalecer as famílias, ampliando seu poder de escolha ao eliminar a influência da publicidade no diálogo com os filhos.

É fazer valer a máxima de que crianças e adolescentes são prioridade absoluta.

E foi exatamente isso que senti com eles, as crianças são realmente crianças, o adolescente é realmente adolescente e os pais são realmente maduros”.

Empresas e organizações podem atuar com responsabilidade e ética, dirigindo apelos de consumo aos pais e não às crianças; o estado deve atuar na regulação.

Assim, por exemplo, pode-se contrapor à publicidade comercial que exacerba desejos de consumo, outras forças, que neutralizem e minimizem os impulsos em direção a esse tipo de desejo, que pressiona a natureza.

Da mesma forma como o marketing e a publicidade atuam sobre o inconsciente e excitam o desejo de consumo, também poderiam, caso houvesse consciência, vontade e impulso coletivos, promover o desejo por saúde ambiental, bem como a redução da demanda por bens cujo processo de produção é destrutivo, degradador, poluidor, emissor de gases de efeito estufa.

A ecologização da publicidade é um dos caminhos para se ecologizar as consciências.

(*) Maurício Andrés Ribeiro [foto] é autor de Ecologizar, de Tesouros da Índia e de Meio Ambiente & Evolução humana.
ecologizar@gmail.com - www.ecologizar.com.br


Fonte:
https://www.portaldomeioambiente.org.br/blogs/mauricio-andres-ribeiro/7100-consumismo-infantil-e-descondicionamento-da-consciencia