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segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Sobrevivência e terrorismo: a sina da oposição

05/12/2013 - A sina da oposição: sobrevivência e terrorismo
- Jeferson Miola (*) - de Porto Alegre - Correio do Brasil

Depois da incandescência das ruas em junho, análises apressadas pintavam um cenário de terra arrasada para a Dilma.

Foi incrível a seletividade de determinados analistas, que alardeavam o pior dos mundos para a Presidenta, mas omitiam que a insatisfação era generalizada e difusa, e abarcava todo o sistema político, a política, os governos e os políticos.

Passado o rescaldo daqueles acontecimentos, sucessivas pesquisas de opinião indicam um ambiente de melhora do desempenho eleitoral de Dilma.

Em todas as simulações – de todos os institutos de pesquisa -, a Presidenta ostenta considerável chance de reeleição, inclusive no primeiro turno.

A oposição, entretanto, segue colecionando dificuldades.

Para ela, o cenário mais alentador é, curiosamente, aquele no qual figuram as “candidaturas-sombras” de Marina Silva e José Serra.

Os até agora “candidatos titulares” Eduardo Campos e Aécio Neves [acima] peleiam com seus fantasmas para manterem suas candidaturas, podendo chegar em 2014 menores do que são hoje.

A potencial reeleição de Dilma, que culminaria um ciclo de 16 anos de governos dirigidos pelo PT, levará o reacionarismo capitaneado pelo PSDB, PPS e DEM ao ocaso.

Com sua visão de um país arcaico, excludente e colonizado, aqueles partidos perdem a capacidade de interpretação e de aderência ao Brasil contemporâneo.

A profecia deles, do “fim da raça”, [1] finalmente terá se realizado; porém, com as setas invertidas – em desfavor deles mesmos.

Nesse contexto, a candidatura do Aécio é tão sólida quanto a chance de se converter em pó.

O PSDB, pela primeira vez na trajetória do partido, enfrenta a perspectiva real de uma derrota acachapante no próximo ano.

Para os tucanos [mas também para seus satélites PPS e DEM], a eleição de 2014 terá como prioridade a sobrevivência partidária e a preservação dos espaços de poder ameaçados de mudar de guarda.

Não se pode descartar, por isso, a hipótese da candidatura presidencial de José Serra em lugar da de Aécio.

Alckmin e Aécio teriam, assim, a função de proteger a joia da coroa do PSDB: os governos de SP e MG.

Aliás, uma tarefa difícil, para quem terá de se explicar sobre escândalos escabrosos: cartel do metrô e o genuíno mensalão.

Adicionalmente, outros dois espectros rondam as eleições.

O primeiro, de nome Joaquim Barbosa.

Sua candidatura, se confirmada, materializaria eleitoralmente o bloco de poder conformado pela mídia conservadora e setores reacionários do Judiciário.

É esse bloco que, na realidade, agenda e articula o combate ideológico ao PT e ao governo Dilma, substituindo os partidos da direita, que estão aos frangalhos e minguando sua audiência na sociedade.

Não existe espaço no Brasil contemporâneo para uma nova farsa do gênero “caçador de marajás”.

A Rede Globo não conseguirá converter Joaquim Barbosa em um santo; aliás, um Ministro adepto de manobras fiscais para investir em Miami.

O império da família Marinho não conseguirá construir essa nova mitificação da política brasileira, como fez com Fernando Collor em 1989 para derrotar Lula.

A opção Joaquim será calculada não pela aspiração de vitória com ele, mas como variável para levar a eleição para o segundo turno.

O contexto proclive para a ocorrência de segundo turno é aquele que apresenta na cédula eleitoral os nomes de Dilma, Serra, Marina e Joaquim.

O justiceiro, jacobino, vingativo, exemplar e inexpugnável Barbosa seria um veículo para se tentar barrar a reeleição direta de Dilma.

O outro espectro que ronda a próxima eleição de 2014 atende pelo nome de Lula.

Com considerável insistência é cogitada a candidatura dele em lugar da de Dilma; insinuação que se propaga na base de apoio do governo, nos meios empresariais, no sistema financeiro e junto a setores militantes.

Os pretextos são uníssonos, tanto dentro como fora do PT: a heterodoxia econômica e o estilo da Presidenta.

Embora o próprio Lula rechace, essa insinuação paira no ar como uma bruma, fomentada na mídia pelas manjadas “fontes próximas ao ex-Presidente”.

É problemático esse procedimento, porque involuntariamente [ou deliberadamente?] expõe Dilma a tensões conservadoras [e inclusive regressivas] na definição do programa e no perfil do eventual segundo governo.

Porém, ao mesmo tempo, não deixa de ser cômodo para o governo – e terrível para a oposição – saber que pode contar com um suplente eleitoralmente insuperável, caso a conjuntura econômica e política degringole.

Hoy por hoy – como se diz em castelhano -, a perspectiva é desalentadora para a oposição conservadora, que vive o dilema de tentar sobreviver enfrentando uma tendência de derrota e de definhamento de sua representação política.

A realidade para a direita é tão mais dramática quanto mais evidente é a obsolescência programática e a incapacidade de oferecer uma visão generosa de futuro para um país que, não sem importantes limites e contradições, finalmente passou a ingressar na modernidade.

Devemos nos preparar para uma conjuntura complicada até as eleições de 2014.

A oposição não se dará por vencida, e poderá promover um terrorismo político, econômico, moral e midiático jamais visto na política brasileira.

Não se pode menosprezar a capacidade de sabotagem, de difusão de ódio e a vilania deles nessa luta derradeira de sobrevivência.

Eles querem sequestrar o Brasil dos brasileiros.

(*) Jeferson Miola, integrante do Instituto de Debates, Estudos e Alternativas de Porto Alegre (Idea), foi coordenador-executivo do 5º Fórum Social Mundial.

Fonte:
http://correiodobrasil.com.br/noticias/opiniao/a-sina-da-oposicao-sobrevivencia-e-terrorismo/667678/?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm_campaign=b20131206

[1] Proferido por Jorge Bornhausen, do DEM

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Eleições 2014 e o Bolsa Família

30/10/2013 - Bolsa Família e o debate eleitoral em 2014
- Fabiano Santos - Carta Maior

É importante que o governo, partidos aliados, assim como seus principais contendores definam o que percebem como sendo a agenda mais promissora para o país

O programa Bolsa Família do governo federal completa 10 anos de existência.

A marcar a data, além de evento de vulto organizado pela própria Presidência da República, duas contribuições importantes no âmbito das ciências sociais: os livros Vozes do Bolsa Família, de autoria da socióloga Walquiria Domingues Leão [E] e O Bolsa Família e a social-democracia, escrito pela cientista política e jornalista Débora Thomé [D].

O primeiro inscreve sua pesquisa na tradição de se ouvir a clientela beneficiada ou atingida por uma política pública e enfatiza as mudanças ocorridas no imaginário deste segmento da população no que tange suas relações com o estado e o setor público.

O segundo contextualiza o programa no seio das disputas eleitorais entre partidos de orientação mais à esquerda versus partidos de persuasão conservadora ou neoliberal.

Constata um forte efeito de desmercantilização de famílias situadas nos extratos de renda mais baixos, aproximando o Programa, assim, das experiências social democratas europeias do pós segunda-guerra, experiências nas quais o aprofundamento das premissas do estado de bem estar promoveu inflexão relevante no perfil da distribuição da renda e da riqueza nos países daquele continente.

Os dois livros, embora partindo de abordagens e metodologias distintas, possuem, em comum, a aposta na dimensão política como sendo talvez a
mais fundamental consequência do Programa.

Dimensão que se revela com nitidez em dois traços essenciais da política brasileira contemporânea, a saber: que a pobreza e a miséria não são estados impostos pelo destino ou pela vontade divina, mas sim condição inaceitável que exige pronta e eficiente resposta do setor público; e, que políticas públicas visando o equacionamento do problema da exclusão e da pobreza têm peso eleitoral decisivo.

Nenhum partido, nenhuma candidatura com reais condições de competição em pleitos majoritários no Brasil hoje pode sustentar que o Programa não passa de uma esmola, focada nos pobres tendo em vista auferir dividendos eleitorais, uma espécie de compra dos votos dos pobres e miseráveis brasileiros.

A opinião existe, é razoavelmente disseminada em círculos da elite, à direita e às vezes à esquerda, mas não alcança o discurso dos principais candidatos de oposição.

O forte componente eleitoral do Programa, assim como a pouca relevância de questões doutrinárias, aliás, são outras duas características relevantes a aproximá-lo das experiências europeias do estado de bem estar.

Desde seus primórdios, no nascimento das primeiras medidas de proteção ao trabalho, aos idosos e inválidos, a disputa política entre liberais e conservadores já empolgava defensores e críticos da atuação do estado na economia e na questão social.

O espectro de uma classe operária revolucionária, ademais, sempre orientou a atuação das elites na aprovação de medidas de alívio das condições extremas de exclusão e privação.

O pós segunda-guerra, contudo, marcou fundamental inflexão nas políticas de welfare [bem estar], já agora impulsionadas por décadas acumuladas de passagem de partidos socialistas e de esquerda, em sentido mais amplo, pelos governos e parlamentos de diversos países.

O mote passou a ser não mais a aprovação de medidas tópicas de proteção aos trabalhadores, mas sim uma ampla alteração nos fundamentos da intervenção do estado na economia de forma a reconfigurar o padrão de distribuição dos benefícios da acumulação capitalista e da propriedade.

Desmercantilizar, isto é, reduzir drasticamente a dependência das famílias às idas e vindas do mercado de trabalho e do ciclo de negócios passou a ser a palavra chave da luta dos socialistas na Europa.

A extensão com que foi montado o estado de bem estar e o alcance do keynesianismo dependeram em cada país de vários fatores, sendo políticas específicas nas áreas do emprego, educação, saúde e habitação, vetores resultantes de diversas variáveis, políticas, econômicas e societais.

Uma vez geradas, todavia, e seus efeitos redistributivos produzidos, a ancoragem eleitoral foi sempre a garantia da manutenção de patamares civilizados de desigualdade e índices ínfimos de pobreza.

Não é o caso de se discutir aqui o aparente declínio dos fundamentos do socialismo europeu. A discussão é relevante e será objeto de intervenções
posteriores.

Por ora, trata-se de enfatizar o fato de que sempre existiu um vínculo entre a presença decisiva do estado no combate á pobreza e à desigualdade, por um lado, e o fator voto popular como mecanismo de legitimação e assunção de grupos e partidos ao poder e ocupação dos governos.

A versão sul-americana mais evidente de tal agenda é o Programa Bolsa Família.

Por óbvio, trata-se de um início e que uma vez instalado, diversos e cruciais desafios precisam ser enfrentados no sentido de se alcançar indicadores sociais mais compatíveis com uma economia em modernização acelerada como é o caso da brasileira.

Crucial neste momento a promoção de políticas de inclusão e treinamento das primeiras gerações de jovens beneficiados pelo programa.

Serão estes encaminhados para o ensino superior, na busca de um diploma universitário, ou buscarão cursos de formação técnica, visando perfil mais especializado?

Optarão pelo PRO-UNI/REUNI ou pelo PRONATEC? Uma distribuição mais uniforme pelos dois modelos?

Desde logo, é importante que o governo, partidos aliados, assim como seus principais contendores definam o que percebem como sendo a agenda mais factível e promissora para o país.

Do lado do eleitorado popular e mais à esquerda, assim parece, a opção será por aquela que com mais clareza vier a representar a agenda do desenvolvimento com desmercantilização.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Bolsa-Familia-e-o-debate-eleitoral-em-2014/4/29393

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Marina na Rede do Itaú

25/10/2013 - A Rede da Marina, a Rede do Itaú, Marina na Rede do Itaú, e Marcelo Mirisola.
Ou 'Caiu na Rede é...trouxa'.
- Antonio Mello em seu blog do Mello

- Teria sido apenas uma incrível coincidência?
- Teria sido feito de caso pensado?

- Quem nasceu primeiro, o ovo (Rede) da Marina ou a galinha (Rede) do Itaú?


Logo após a ex-senadora Marina Silva tentar e não conseguir registrar seu Rede, no TSE, o banco Itaú, que tem uma das herdeiras da família Setúbal, Maria Alice Setúbal [foto], como uma das principais apoiadoras da Rede, o banco Itaú, eu dizia, resolveu que seu Redecard passaria a se chamar apenas Rede.

Num notável sincronismo, uma Rede balança a outra, tentando pegar os peixes-otários, os trouxas que somos nós - pelo jeito é o que pensam que somos.

Não vejo chiadeira contra essa tramoia canalha do partido sem registro com o banco sem vergonha, que quanto mais fatura e lucra, mais demite. Ou alguém aí leu alguma declaração de 
Marina sobre este excesso de Redes?

Para comentar essa miscelânea política, ou melhor, essa promiscuidade safada que nos tenta impingir gato (Rede de Marina) por lebre (Rede do Itaú), fui buscar trechos de um artigo do escritor Marcelo Mirisola, na época comentando outra miscelânea, esta cultural, envolvendo o mesmo banco e a mesma Maria Alice Setúbal: A nova senzala (transversalidades)

Fonte:
http://blogdomello.blogspot.co.at/2013/10/a-rede-da-marina-rede-do-itau-marina-na.html


31/03/2013 - A nova senzala (transversalidades)
- Por Marcelo Mirisola
- blog Congresso em foco

Não foi uma, nem duas, nem meia dúzia de vezes que tentei publicar um artigo na segunda página da Folha, na seção Tendências/ Debates. Jamais consegui.

Fiquei especialmente contrariado com duas recusas. O primeiro texto, “Boilesen ontem, hoje e sempre”, trata, como todo mundo está careca de saber, da Operação Oban [Operação Bandeirantes, evento da época da ditadura civil-militar].

No segundo texto, “Setubão no forévis”, discorro sobre a morte de Olávo Setúbal, que foi banqueiro desde sempre e prefeito biônico da cidade de São Paulo, indicado por Paulo Egydio Martins num dos períodos mais turbulentos da ditadura militar 
(1975-79).

Não me interessa, agora, divagar sobre esses textos. Vale que, no final das contas, os publiquei aqui no Congresso em Foco. Nenhuma vírgula foi censurada. Só tenho a agradecer a Sylvio Costa, editor deste site.

Pois bem, não é de hoje que me chama a atenção a presença constante de dona Maria Alice Setúbal na seção Tendências/ Debates”, o filé mignon da Folha de S. Paulo.

Dona Maria Alice [foto], como indica o nome, é herdeira de Olavo Setúbal, e provavelmente deve ser acionista do banco Itaú.

Nos créditos de seus artigos, consta que é doutora em Psicologia e presidente dos conselhos do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária da Fundação Tide Setúbal. 

Seus artigos são redundantes. Ela gosta de usar a palavra “transversalidade”.

Não faz muito tempo que os Setúbal se uniram aos Moreira Salles, hoje, os negócios das duas famílias se ramificam em vários segmentos “comunitários” e “culturais”; Waltinho Salles é o mais notório sintoma, digo, o mais notório representante da aliança entre os Salles e os Setúbal.

Quem viu Diários de Motocicleta poderia jurar que o diretor é um revolucionário que, no lugar das armas, teria optado pelo lirismo para combater o monstro das injustiças e do capitalismo. 


Mas é sempre bom lembrar que tanto ele como dona Maria Alice são – antes de qualquer coisa – banqueiros.

O Instituto Moreira Salles é um exemplo impecável de cuidado com o patrimônio artístico brasileiro.

Só para se ter uma pequena ideia, o acervo do IMS reúne cerca de 550 mil fotografias, 100 mil músicas, uma biblioteca com 400 mil itens e uma pinacoteca com mais de 3 mil obras.

As partituras, os arranjos, os suores e piolhos, tudo de Pixinguinha [foto], inclusive a alma, está lá.

As obras de Millôr, Vinicius de Moraes, Décio de Almeida Prado, entre dezenas de músicos, artistas plásticos e escritores, constam do espólio Moreira Salles.

Aqui, eu me pergunto: esse tesouro foi comprado ou doado? Caso a primeira opção seja verdadeira, seria correto dizer que as almas desses artistas – embora estejam abertas a visitação – são de propriedade dos Moreira Salles? Tudo estaria perdido se não fosse a benevolência dos Salles? O que o Estado brasileiro tem a dizer a respeito? E das calcinhas do Wando, quem é que cuida?

O império cultural dos banqueiros abarca, além do IML, digo, IMS, a folha de pagamento das mais ilustres mentes do país (estes – ainda – não morreram), e contabiliza, além da revista de ensaios Serrote, a revista Piauí, cujo editor-chefe é Joaozinho Salles, irmão de Waltinho.

Às vezes, é curioso notar que a Piauí deixa escapar um certo ranço da praça Vilaboim, sobretudo na publicidade inteligente” que vende antes das sessões de cinema, cujas salas de exibição são deles mesmos.

Pois os irmãos Salles têm o domínio, digamos assim, de toda cadeia produtiva: desde os sets de filmagem até a pipoca antes, durante e depois dos Dogvilles aos quais somos
pleonasticamente (e sem vaselina) incluídos.

Existe – reparem – uma inércia materna (ou imanência…) que paira sobre os caixas eletrônicos e os cines-Itaú. A gente se ferra e acha que banco é cinema.

Do que eu falava? Ah, sim de dona Maria Alice. Já volto à dona Maria Alice, agora vou falar um pouco da revista Piauí.

Ah, como eu queria escrever na Piauí! Uma revista que disfarça a afetação como quem não quer exatamente disfarçar a afetação que, afinal de contas, é sinônimo de qualidade e marca registrada da Pça. Villaboim, sabem aquele ricaço que não usa meia?

A revista dos Moreira Salles, além de forçar uma casualidade, cultiva um humor elegante na medida exata de um aparente descompromisso com a grossura e vulgaridade das demais publicações do ramo.

Como se a Piauí, enfadada por natureza, proclamasse: “vejam só que lixo é a Bravo! … mais um produto da linha de montagem da Abril, os bregas publicam Capricho e Veja, nós não: somos iguais mas somos diferentes”.

Piauí faz o tipo cínico elegante, avant-garde goiabada cascão, PT do PSDB, mocassim sem meia.

Mas não se enganem! Os publishers são banqueiros e esse descompromisso serve apenas para distrair os órfãos de uma direita envergonhada que sofre porque a calle 23 em El Vedado não é uma travessa da Rua Maranhão (eu penso que isso é positivo, e já enviei dois textos pra lá que foram recusados… será que dona Maria Alice também é colaboradora da Piauí?);

E assim, resumidamente, numa barafunda de boas intenções e um inferno que está repleto de casualidades premeditadas, canelas nuas e um charme indisfarçável, guichês intransponíveis e juros estratosféricos, ficamos com a impressão de que a agiotagem é apenas um insignificante detalhe diante das inegáveis contribuições dos clãs Moreira Salles e Setúbal para a cultura brasileira.

Painel - Burle Marx - IML
Mas não é. Evidentemente não é. E eu digo isso porque sou correntista do banco Itaú, pago altos juros pra dona Maria Alice Setúbal e também sou leitor de suas intervenções na seção 
Tendências/ Debates da Folha de S. Paulo. Gostaria de acreditar que o jornal ainda não foi absorvido pelo acervo do Instituto Moreira Salles (IML).

Voltando à dona Maria Alice Setúbal.

O que madame teria de tão importante para acrescentar, tirante suas “transversalidades”, ao debate de ideias, ou, mais especificamente, por que as idéias dela são tão relevantes para desfilar na seção Tendências/ Debates da Folha?

Vou arriscar um diagnóstico.

Os textos de madame costumam ter a marca indelével que conduz do óbvio ao ululante, são como folders, propagandas de condomínio que indicam, ou melhor, cobram o caminho da felicidade, apesar de a felicidade, pobre e acuada felicidade, não ter sido consultada a respeito de tão nobre encaminhamento. 

Mas uma coisa dona Maria Alice sabe fazer, algo que circula em seu sangue de agiota, ela sabe cobrar.

No seu último artigo, “Novas formas de aprender e ensinar”, publicado no dia 27 de março, dona Maria Alice Setúbal aposta na “inteligência coletiva” que – segundo sua bola de cristal high-tech – está na iminência de ser consumada pela força da revolução tecnológica.

Madame não costuma deixar lacunas porque cumpre sua função, repito, que é levar o nada a lugar nenhum com a marca da excelência, como se o mundo fosse uma agência bancária cor-de-laranja protegido por portas giratórias e slogans de publicidade.

Não obstante, dessa vez, madame deu uma vacilada.

Dona Maria Alice Setúbal esquece que o lado de fora não tem ar condicionado. Revolucionária, decreta o fim do ensino linear. 

Para madame, o ensino da maioria das escolas – que ainda trabalham com aulas expositivas e livros didáticos – não faz mais sentido diante do conhecimento que é “transversal e produzido nas conexões entre várias informações”.

Bem, esses conhecimentos ou essas conexões, que eu saiba, só existem e funcionam em sua plenitude nos sistemas de cobrança do banco de madame e na bolsa de valores. No mínimo, dona Maria Alice Setúbal, que se imagina mensageira do futuro, é uma debochada.

Convenhamos que a “realidade transversal” que os nossos professores experimentam nas salas de aula têm outros nomes que nem o eufemismo mais engenhoso poderia disfarçar, tais como humilhação, porradaria, salário de merda.

Para coroar seu pensamento revolucionário, dona Maria Alice, sentencia: “Essa transversalidade se expressa nas demandas das empresas e nas expectativas dos jovens”.

Que jovens são esses? Aqueles que madame adestra em seus canis cor-de-laranja? Qual a expectativa deles? Telefonar pras nossas casas às sete horas da manhã para nos lembrar que somos devedores do Itaú? Ou a expectativa desses jovens é subir na vida, e virar gerente de banco?

Dona Maria Alice vai além e se entrega, ela acredita que a tecnologia vai produzir “pessoas que saibam resolver problemas, comunicar-se claramente, trabalhar em equipe e de forma colaborativa. Que usem as tecnologias com desenvoltura para selecionar, sistematizar e criticar informações. E que sejam inovadoras e criativas”.

Ora, madame quer empregados que não a incomodem, e encerra seu raciocínio ou exige, de forma impositiva e castradora: “E que sejam inovadoras e criativas”.

Não querendo fazer leitura subliminar, nem ser Lacaniano de buteco, mas esse “E que sejam inovadoras e criativas” é de amargar, hein, madame?

O artigo de dona Maria Alice é uma ordem de comando. A voz da dona, a mulher que visivelmente não pode ser contrariada. Difícil ler e não sentir-se um empregadinho dela.

Ao mesmo tempo em que ordena “inovação e criatividade”, elimina a possibilidade de reação: “para fazer da tecnologia uma aliada da educação, é preciso vencer o medo do novo e superar a cultura da queixa”.

Como se madame dissesse: “Publiquem meu artigo genial, obedeçam, e calem a boca. O futuro é meu, e se eu disser que é coletivo e cor-de-laranja, dá na mesma”.

O pior é que os filmes do Waltinho Salles são feitos no mesmo diapasão. A mesma lógica, a diferença é que ele ordena lirismo.

Eles são banqueiros! Em vez de desfilarem seus preconceitos e visões de mundo revolucionárias nas páginas dos jornais, na “pedagogia”, nos cinemas, no mundo do entretenimento e nas artes em geral, essa gente faria muito mais pela sociedade e pela cultura se extinguisse suas financeiras e baixasse os juros pros pobres coitados de seus correntistas.

Não desejo a fila da Taií pros meus coleguinhas escritores nem pros rappers que frequentam os saraus do Itaú cultural.

Até a alma do Leminski (“ocupação Leminski”) eles compraram.

Eu falava de madame (versão 2013) que diz que samba é coisa de gente elegante. Dessa vez a visita periódica que madame faz à sua cozinha, também conhecida como “Tendências/Debates”, 
ultrapassou o terror costumeiro, e, no lugar de marcar presença e autoridade, madame só fez azedar o cuscuz.

Ela devia ser mais discreta, como Olavão, [Olavo Setúbal, foto] o patriarca, o banqueiro. Não se deve confiar demais na vassalagem (leia-se correntistas e leitores).

No mesmo dia que madame publicou seu artigo, aconteceu uma coincidência reveladora, logo acima do texto de sinhá, no “Painel do leitor”, uma dona de casa, Mara Chagas, reclamava enfurecida da nova lei das empregadas domésticas, e fazia coro – às avessas, mas coro – à mme. Setúbal: 

As empregadas domésticas não trabalham aos sábados, não cumprem as oito horas diárias, o serviço tem que ser ensinado (não são mão de obra especializada), almoçam e lancham na casa dos patrões sem cobrança alguma e faltam sem avisar. Como ficará o empregador diante disso?

Eis a questão.

Pelo menos dona Mara Chagas, a leitora, foi honesta e direta, e não precisou de transversalidades” para exprimir suas ideias revolucionárias.

E o melhor: ela não vai concorrer ao Oscar, e jamais vai se manifestar no “Tendências/ Debates”. Nem ela, nem eu.

(*) Marcelo Mirisola é uma das grandes revelações da literatura brasileira dos anos 1990. Formou-se em Direito, mas jamais exerceu a profissão. É conhecido pelo estilo inovador e pela ousadia, e em muitos casos virulência, com que se insurge contra as panelinhas do mundo cultural. É autor de Proibidão (Editora Demônio Negro), O herói devolvido, Bangalô e O azul do filho morto (os três pela Ed. 34) e Joana a contragosto (Record), entre outros.

Fonte:
http://congressoemfoco.uol.com.br/opiniao/colunistas/a-nova-senzala-transversalidades/


Perguntinha do blog: Será que a recente proposta de "disruptura" da Marina [foto] foi inspirada nas "transversalidades" da sua, agora, amiga de infância Maria Alice?

sábado, 26 de outubro de 2013

Os lances de Libra e o lance de 2014

25/10/2013 - Wanderley Guilherme dos Santos (*)
- no site Carta Maior

Os conservadores quase acertaram: o exitoso leilão de Libra pode não conquistar muitos votos em 2014, como seria, segundo eles, uma das idéias subliminares da decisão do governo.

Mas tirou-lhes da boca o açúcar que o fracasso da licitação proporcionaria.

Eleições são assim mesmo, desafinadas. Em alguns casos ganha-se pouco, mas deixa-se de perder muito. Era o caso de Libra e faltou aos conservadores o domínio do fato.

Primeiro, batalharam para derrotar, no Congresso, a mudança do regime de concessão para partilha das reservas do pré-sal.

Depois previram que o edital era inteiramente hostil ao setor privado, e apontavam para a desistência de duas conhecidas predadoras dos recursos naturais do planeta como prova da denúncia.

Por fim, torceram para que não se formasse qualquer consórcio alternativo ao acordo entre a estatal brasileira, Petrobrás, e as estatais chinesas, configurando quiçá uma das “resignificações identitárias” do chavismo estatal no esquisito vocabulário do ambientalismo marineiro. Outra bola fora.

Além das estatais, participaram do conglomerado duas outras respeitáveis senhoras do comércio internacional do óleo: Shell e Total.

Para estragar definitivamente a digestão dos conservadores, o governo ainda criou, de quebra, uma empresa para controlar a exploração do campo de Libra e assegurar que sejam destinados à educação e à saúde os milhões de reais determinados em lei.

Dizem agora que as condições apresentadas pelo consórcio vencedor seriam melhores se forçado a uma concorrência, inviabilizada pelo edital.

Dá-se que a concorrência processou-se antes, tal como confessado pelo representante da Repsol, quando as demais se deram conta de que não poderiam oferecer condições melhores do que as propostas pelo consórcio vencedor. 

Ou melhor, quando perceberam que o representante do consórcio vitorioso estava preparado para cobrir propostas concorrentes.

Não foi por acaso que só depositou seu lance aos quarenta e cinco segundos do terceiro e último minuto da disputa.

Fazer pouco caso do resultado com que agora desfilam os conservadores lembra a fábula da raposa e as uvas com a adaptação de que, no caso, foram elas as uvas, bem degustadas pela raposa.

Os frutos mais suculentos do leilão histórico estão no futuro e, em 2014, mencionar o evento seja algo abstrato para o eleitor médio.

Um fracasso, contudo, carregaria um potencial de desânimo e descrédito governamental bastante superior aos votos que, ocasionalmente, a memorável vitória propicie. O que nos trás de volta ao desafinado das eleições.

Tanto quanto e por vezes mais do que o apoio conquistado pelo trabalho realizado é o que se subtrai ao que o adversário conquistaria caso contrário.

Importa menos, por exemplo, que os governos Lula-Dilma tenham construído mais universidades do que em toda a história da República, não obstante ter sido e reeleito um presidente da República professor universitário, do que impedir a oposição de alegar ausência de atenção ao ensino superior.

E o mesmo se aplica ao ensino médio, fundamental e técnico. No limite, a vitória é certa quando o adversário não tem discurso.

Sem ter o que anunciar que fariam, resta aos candidatos a candidatos da oposição enfatizar o “como” fazer.

Por enquanto tem sido o blá,blá,blá de sempre: mais eficiência e mais honestidade. Nenhum deles, todavia, por si ou por seus familiares, possui currículo impecável em qualquer dos dois tópicos.

Marina [Silva, acima] não é sombria e prá baixo só quando se apresenta e fala. Ela confunde eficiência com inação e negativismo, tal o legado que deixou no ministério que ocupou quase até o fim do governo Lula.


E passada a lua de mel com a oposição tradicional, Eduardo Campos [acima com Aécio Neves], se ainda for candidato, terá que se haver com o tratamento que lhe darão Aécio Neves e/ou José Serra. E estes entre si e com Campos. Problemão.

Eleições não se decidem apenas com votos pessoalmente conquistados, mas também com aqueles perdidos pelos outros.

Conquistar o máximo com um mínimo de perdas é o cálculo de ouro em que são mestres os grandes estadistas.

Lula, por exemplo.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Os-lances-de-Libra-e-o-lance-de-2014/4/29324

(*) Wanderley Guilherme dos Santos [foto] é professor e cientista político.