terça-feira, 8 de dezembro de 2009

A disputa pela terra em Copenhague

por Zilda Ferreira, da Equipe do Blog EDUCOM
Começou segunda, 7 de dezembro, em Copenhague, a COP15 - 15ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. Mais do que isso. Começou na última segunda e seguirá até o dia 18 o duelo entre os conservacionistas e os empresários do agronegócio. Os conservacionistas compram grandes extensões de terra em países ricos em biodiversidade para transformar em ativos ambientais. Os empresários do agronegócio compram solos férteis e ricos em água para produzir commodities.

Os dois grupos ameaçam a soberania dos países pobres e o equilíbrio do planeta. Veja como estão jogando e fique atento às grandes jogadas de ambos durante a Conferência de Copenhague. As mais sofisticadas podem ser as dos conservacionistas e as mais perigosas as do agronegócio.

Em 23 de abril de 2006, a Folha de S. Paulo destacava a compra de 160 mil hectares pelo milionário sueco-britânico Johan Eliasch para ajudar a preservar a Floresta Amazônica. O magnata, que é amigo do governador mineiro Aécio Neves (PSDB), disse na matéria que almejava modificar o Protocolo de Quioto, acordo internacional para reduzir a emissão de gases que causam o efeito estufa, de modo a permitir que proprietários de florestas preservadas possam também vender créditos de carbono.

Elizabeth Laville, uma francesa especialista em negócios verdes e que assessora grandes grupos econômicos, encerra assim sua entrevista à revista Veja, publicada nas páginas amarelas em setembro de 2009: "o ecossistema preservado pode ser trocado por créditos de carbono. Preservar a Amazônia pode ser ótimo negócio”.

A maior Organização Não-Governamental conservacionista do planeta, atualmente, é a Conservação Internacional (CI), presente em 40 países, criada e dirigida por Peter Seligman, que deixou em l987 a ONG estadunidense Nature Conservacy - especializada em compra de terras para instalação de reservas ecológicas. Dois anos mais tarde, em l989, Russell Mittermeier deixou a vice-presidência da World Wildlife Foundation (WWF) para integrar a CI, na ocasião modesta. A sede brasileira fica em Belo Horizonte e há escritórios estratégicos no mapa da biodiversidade brasileira. O Brasil é o primeiro país do mundo no ranking da megabiodiversidade.

A CI já identificou os 34 Jardins do Éden da biodiversidade mais importantes do planeta, com ajuda de seus executivos, que normalmente são cientistas com PhD em Harvard. É proprietária de várias publicações, incluindo a parceria com a revista Planeta. Alem disso, tem apoio de grandes empresas brasileiras e multinacionais, como Citibank, Intel, Bradesco, Banco Real e J.W Thompson entre outros.

No ranking das 17 áreas mais ricas em biodiversidade, os chamados paises de megabiodiversidade estão: em primeiro lugar o Brasil, campeão em água doce e terrestre; em segundo a Indonésia, graças ao grande número de ilhas, recifes e corais, que ganha em diversidade marinha. A seguir, nesta lista, vem Colômbia, México, Austrália, Filipinas, Madagascar, Peru, Equador, China, Índia e República Democrática do Congo (ex-Zaire). A CI recomenda investimentos nesses países em favor da natureza.

O agronegócio tem um jogo mais explícito, portanto mais visível, mas não menos perigoso, porque os danos podem ser irreversíveis.

Em 2004, empresários estadunidenses do agronegócio se reuniram, no estado do Texas, para cobrar do governo mais investimentos na compra de terras nos cerrados brasileiros, onde haveria o melhor solo e com equilibrada distribuição de recursos hídricos. Um jornalista brasileiro, que foi assessor de imprensa do consulado americano esteve presente, nessa reunião, e nos forneceu dados sobre o encontro.

Algum tempo depois, dessa reunião, uma surpresa: o todo poderoso Departamento de Defesa dos EUA permitia a divulgação de um estudo ao qual a revista Fortune teve acesso, sobre o Aquecimento Global. As previsões eram aterradoras.

Eis alguns trechos:

"(...) Milhões morrerão em consequência do superaquecimento do planeta. Outra parte será dizimada em conflitos na disputa por solos cultiváveis e reserva de água. As regiões do Nilo, Danúbio e Amazonas se tornarão zonas militarizadas... hordas de refugiados ambientais criarão êxodo jamais visto."

Provavelmente, esse estudo já era conhecido. Mas foi o alarme, tanto para os conservacionistas europeus como para os empresários estadunidenses de que era urgente a compra de terras em países ricos em recursos naturais, principalmente em água. E todos passaram a defender o desenvolvimento sustentável. Mas antes promoveram filmes e livros anunciando catástrofes iminentes. Em seguida, sequestraram o discurso dos ambientalistas e o imprimiram no marketing de suas corporações.

Em 2005, quando o Protocolo de Quioto entrou em vigor, o alerta foi reforçado. Porém, o maior barulho a respeito do assunto foi em 2007, quando o último Relatório do IPCC – Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas foi divulgado. Na época, a mídia anunciou com veemência a chegada de grandes desastres ambientais.

Agora, socioambientalistas, educadores, índios, quilombolas, comunidades tradicionais, pescadores, pequenos agricultores, sem terra e sem teto devem ficar atentos a esse grande jogo das nações hegemônicas em Copenhague. É preciso encontrar uma brecha que possa quebrar esse mecanismo de opressão cultural e econômica imposto aos pobres, principalmente aos africanos e latino-americanos. E assim, quem sabe, em 2012, quando forem realizadas mudanças no Protocolo de Quioto, viremos o jogo, priorizando realmente a defesa da terra e da vida e não os interesses econômicos dos países ricos.

confira esta reportagem do jornal "The New York Times", traduzida e publicada pelo blog Vi O Mundo...

Existe uma coisa chamada Agro-imperialismo?
22/11/2009
por Andrew Rice

O dr. Robert Zeigler, um eminente botânico estadunidense, voou para a Arábia Saudita em março para uma série de discussões de alto nível sobre o futuro do suprimento de alimentos do reino saudita. Os líderes sauditas estavam assustados: fortemente dependentes da importação de alimentos, eles tinham visto o preço do arroz e do trigo, base da dieta local, flutuarem violentamente no mercado internacional nos três anos anteriores, em um ponto dobrando de preço em apenas alguns meses. Os sauditas, ricos em dinheiro de petróleo mas pobres em terra arável, corriam atrás de uma estratégia para garantir que poderiam continuar a atender o apetite de uma população crescente, e queriam ouvir Zeigler.

Há duas formas básicas de aumentar a oferta de comida: encontrar novos campos para plantar ou inventar formas de multiplicar o que os campos existentes oferecem. Zeigler dirige o Instituto Internacional em Pesquisa do Arroz, que se dedica ao segundo modelo, usando a ciência para expandir o tamanho das colheitas. Durante a assim chamada Revolução Verde dos anos 60, os laboratórios do instituto desenvolveram o "arroz milagroso", uma variedade altamente produtiva que recebe crédito por ter salvo milhões de pessoas da fome. Zeigler foi à Arábia Saudita esperando que o reino milionário poderia oferecer dinheiro para a pesquisa básica necessária a novos saltos tecnológicos. Em vez disso, para surpresa dele, descobriu que os sauditas queriam atacar o problema de uma direção oposta. Estavam em busca de terra.

Em uma série de encontros, autoridades sauditas, banqueiros e executivos do agronegócio disseram a uma delegação do instituto liderado por Zeigler que queriam gastar bilhões de dólares para produzir arroz e outras culturas em nações africanas como o Mali, Senegal, Sudão e Etiópia. "Eles apresentaram esse plano incrível", Zeigler relembra. Ele ficou surpreso, não só pela escala dos projetos mas pela audácia da ideia. A África, o continente mais faminto do mundo, não consegue se alimentar atualmente, o que dizer de alimentar mercados estrangeiros...

O que o cientista norte-americano viu foi uma demonstração de um cenário emergente para os recursos alimentares do mundo, um cenário que começou a se formar no ano passado, longe do escrutínio internacional. Uma variedade de fatores -- alguns transitórios, como o aumento do preço dos alimentos, e outros intratáveis, como o crescimento da população global e a escassez de água -- criaram um mercado para terra arável, no momento em que países ricos mas sem recursos agrícolas, no Oriente Médio, na Ásia e em outros lugares procuram produzir seus alimentos em lugares onde há solo barato e abundante.

Uma vez que a maior parte da terra arável do mundo já está em uso - quase 90%, de acordo com uma estimativa, se você levar em conta as florestas e os ecossistemas frágeis - a busca levou a países menos tocados pelo desenvolvimento, na África. De acordo com um recente estudo do Banco Mundial e da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) , uma das últimas grandes reservas de terras subutilizadas é a zona da savana da Guiné, com um bilhão de acres, uma porção de terra em forma de crescente que vai do leste da África até a Etiópia e em direção ao sul, passando pelo Congo e Angola.

Investidores estrangeiros - alguns representando governos, outros interesses privados - estão prometendo construir infraestrutura, trazer novas tecnologias, criar empregos e aumentar a produtividade para abastecer mercados estrangeiros, mas também alimentar mais africanos. (Mais de um terço da população do continente é subnutrida). Eles descobriram que governos empobrecidos estão dando boas vindas, oferecendo terras a preço de banana. Algumas transações receberam grande publicidade, como o aluguel de 100 mil acres feito pelo governo do Quênia ao governo de Qatar em troca do financiamento de um novo porto ou a decisão da Coréia do Sul de desenvolver quase 400 milhas quadradas na Tanzânia. Mas muitos outros negócios envolvendo terras, muitas vezes de tamanho sem precendentes, foram fechados sem fazer barulho.

Investidores que participam dessa corrida à terra estão confrontando um medo primitivo, uma situação na qual os alimentos se tornam escassos mesmo que se ofereça qualquer preço. Durante os 30 anos entre a metade dos anos 70 e a metade desta década, a oferta de grãos disparou e os preços cairam pela metade, uma tendência que levou muitos especialistas a acreditar que não havia limite para a capacidade humana de se alimentar.

Mas em 2006 a situação reverteu, acompanhando o boom mais geral das commodities. Os preços dos alimentos cresceram um pouco naquele ano, cresceram 25% em 2007 e dispararam em 2008. Países que produzem além do consumo, como a Argentina e o Vietnã, preocupados em alimentar a própria população, colocaram restrições nas exportações. Os consumidores estadunidenses, se notaram a crise alimentar, a viram nas contas de supermercado, especialmente nos preços das carnes e laticínios. Mas em muitos países -- não apenas no Oriente Médio mas em nações dependentes de importados como a Coréia do Sul e o Japão -- o espectro da hiperinflação e do desabastecimento representam uma ameaça existencial.

"Quando alguns governos deixam de exportar arroz ou trigo, o problema se torna real e sério para povos que não são autosuficientes", diz Al Arabi Mohammed Hamdi, um assessor econômico da Autoridade Árabe para Investimento e Desenvolvimento Agrícola. Sentado em seu escritório em Dubai, de olho nos barcos de madeira ancorados na cidade, Hamdi me falou de sua visão, de que a única forma de ter segurança alimentar é controlando os meios de produção. Mais