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domingo, 12 de fevereiro de 2012

Os EUA na segunda armadilha de Bin Laden

08/02/2012 - Immanuel Wallerstein - Tradução: Antonio Martins em seu blog
Outras Palavras


Wallerstein antecipa: depois de perder influência sobre o Paquistão, Washington arrisca-se a ficar sem aliado ainda mais estratégico: a Arábia Saudita

Em outubro de 2001, logo depois do 11 de Setembro, escrevi o seguinte:

“Os regimes [do Paquistão e Arábia Saudita] apoiam-se numa coalizão entre as elites modernizantes pró-ocidentais e um establishment islâmico extremamente conservador, com bases populares. Os regimes mantêm-se estáveis por serem capazes de articular esta combinação. E podem alimentá-la graças à ambivalência de suas políticas e pronunciamentos públicos."
“Os Estados unidos dizem agora que chega de ambiguidades. Esta posição pode prevalecer, é claro. Mas no processo, os regimes saudita e paquistanês poderão descobrir que sua base popular está irremediavelmente erodida…"
“Considere que este pode ter sido o plano de Bin Laden. O objetivo de sua própria missão suicida pode ter sido conduzir os Estados Unidos a tal armadilha”

Acredito que Bin Laden conseguiu agora o que planejou no Paquistão. O fim das ambiguidades acabou significando que o país já não opera geopoliticamente em favor dos interesses dos Estados Unidos. Bem ao contrário! Tomou distância e está promovendo, no Afeganistão e não só lá, políticas às quais os EUA opõem-se firmemente. Falta, agora, o segundo objetivo.

Que está ocorrendo na Arábia Saudita? Não há dúvidas de que, de alguma maneira, o país passou a agir mais independentemente dos Estados Unidos do que fizera nos últimos 70 anos. Mas não houve, ainda, uma ruptura definitiva, como no Paquistão. Ela ocorrerá, em futuro próximo? Penso que talvez.

Analise os múltiplos dilemas internos do regime. A riqueza de cerca de 10% dos sauditas provocou o crescimento agudo das demandas por “modernização” do Estado. São mais visíveis em temas ligados às mulheres (direito ao emprego e a conduzir carros). Mas tais reivindicações por mais direitos são a ponta de um iceberg, de um clamor mais amplo pelo afrouxamento das restrições impostas pela ortodoxia wahhabista. À medida em que o rei se move numa trajetória contínua, mas cautelosa, para atender a estas demandas, ele antagoniza-se ainda mais com o establishment religioso – que está se tornando muito inquieto.

Além disso, as elites “modernizantes” têm outras queixas. O governo saudita é, essencialmente, uma gerontocracia, conduzida por homens na faixa dos 70 e 80 anos. No curioso sistema de sucessão o regime lembra o da antiga União Soviética. Há algo similar a uma votação, no processo sucessório – mas ela se dá entre uma dezena de pessoas, ou um pouco mais. A probabilidade de que o poder passe para gente na faixa dos 50 e 60 é extremamente baixa, se não inexistente. Repare, no entanto, que este grupo de “jovens”, mesmo que formado apenas no interior da família real, cresceu consideravelmente em número, e está impaciente. Isso pode levar a uma séria cisão no próprio topo da elite? É bem possível que sim.

O regime saudita maneja algo como um estado de bem-estar social para os cidadãos comuns. Porém, as desigualdades de renda e riqueza estão crescendo, como em toda parte. E pequenas redistribuições, de tempos em tempos, não vão acalmar as camadas inferiores, mas apenas aguçar seu apetite por novas demandas. Os extratos médios e baixos podem inclusive (surpresa, surpresa!) ecoar os apelos da Primavera Árabe por “democracia”.

E há uma minoria xiita. Afirma-se que ela representa apenas cerca de 10% da população; mas é provável que seja maior e – mais importante – está estrategicamente localizada no sudeste do país, sobre as maiores reservas de petróleo. Por que tais xiitas seriam os únicos, nas nações do Oriente Médio dominadas por sunitas, a não lutar por suas reivindicações identitárias?

O regime saudita tem tentado jogar um papel de destaque na geopolítica da região. Está insatisfeito com as políticas e aspirações do Irã e com a intransigência do presidente Assad, na Síria. Mas, no frigir dos ovos, comporta-se de modo muito moderado, em relação a estes temas. Teme as consequências de guinadas bruscas. E julga as políticas norte-americanas orientadas demais pelos interesses internos dos EUA, e por seus infinitos compromissos com Israel.

Os sauditas têm sido muito “razoáveis” também com Israel. Não creem que esta moderação tenha sido bem recompensada – quer por Israel, quer pelos Estados Unidos. Podem estar prontos, agora, para apoiar o Hamas de forma muito mais aberta. Não enxergam nada “razoável” nas políticas do governo israelense, nem perspetiva alguma de que estas políticas sejam alteradas em breve.

Este quadro não contribui para um regime politicamente estável. Certamente, não ajuda a manter as “ambiguidades” que permitiram ao regime ser, no passado, um aliado inabalável dos Estados Unidos na região.

 A segunda armadilha irá se fechar?

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

EUA-CCG - atração fatal

 Pepe Escobar - 20/1/2012, Asia Times Online - “The U.S. – GCC fatal attraction” - Redecastorphoto - Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


Não há como entender o affair EUA-Irã, psicodrama maior que a vida, o ímpeto ocidental para mudar os regimes de Síria e Irã e os padecimentos e atribulações da(s) Primavera(s) Árabe(s) – já ameaçada(s) de inverno perpétuo – sem examinar de perto a atração fatal entre Washington e o Conselho de Cooperação do Golfo (CCG). [1]

O Conselho de Cooperação do Golfo (CCG), clube de seis ricas monarquias do Golfo Persa (Arábia Saudita, Qatar, Omã, Kuwait, Bahrain e os Emirados Árabes Unidos, EAU), foi fundado em 1981 e imediatamente configurado como principal quintal estratégico dos EUA para as invasões do Afeganistão em 2001 e do Iraque em 2003, para a longa batalha no Novo Grande Jogo na Eurásia, e, também, como quartel-general para “conter” o Irã.

A 5a. Frota dos EUA está estacionada no Bahrain e o quartel-general avançado do Comando Central (Centcom) dos EUA está localizado no Qatar; o Centcom policia nada menos de 27 países, do Chifre da África à Ásia Central – que o Pentágono, até recentemente definia como “o arco de instabilidade”. Em resumo, o Conselho de Cooperação do Golfo é como um porta-aviões dos EUA no Golfo, ampliado para dimensões de Star Trek.


Prefiro falar do CCG como Clube Contrarrevolucionário do Golfo – por causa da performance destacada que teve na supressão da democracia no mundo árabe, desde antes de Mohammed Bouazizi atear fogo ao próprio corpo na Tunísia há mais de um ano.

Na linha de Orson Welles em Cidadão Kane, o Rosebud do CCG é que a Casa de Saud só vende seu petróleo em troca de dólares dos EUA – daí a proeminência do petrodólar – e, em troca disso, recebe apoio militar e político massivo e incondicional dos EUA. Além disso, os sauditas impedem que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEC) – afinal, a Arábia Saudita é o maior produtor mundial de petróleo – faça preço e venda petróleo numa cesta de moedas. Assim, esses rios de petróleo fluem diretamente para comprar produtos financeiros à venda na bolsa dos EUA e para os papéis do Tesouro dos EUA.

Durante décadas, todo o planeta viveu como refém dessa atração fatal. Até agora.

Quero todos os seus brinquedos! O Conselho de Cooperação do Golfo é, essencialmente, o núcleo duro do império no mundo árabe. Sim, trata-se essencialmente de petróleo; o Conselho de Cooperação do Golfo será responsável por mais de 25% da produção global de petróleo nas décadas imediatamente futuras. Aquela microscópica classe dominante – as monarquias e seus sócios comerciais – opera como um anexo crucialmente decisivo para que o poder dos EUA se projete pelo Oriente Médio e adiante.

(Clique no link abaixo para ampliar o mapa)

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Isso explica, dentre outros fatores, por que em outubro do ano passado Washington fechou sumarento negócio de US$67 bilhões – o maior negócio bilateral na história dos EUA – para abastecer a Casa de Saud com monumental coleção de flamantes modelos F-15s, Black Hawks, Apaches, bombas explode-bunker, mísseis Patriot-2 e navios de guerra último tipo.

Isso explica por que Washington encheu os arsenais dos Emirados Árabes Unidos com milhares de bombas explode-bunker; e os arsenais de Omã, com mísseis Stinger. Para nem falar de outro mega sumarento mega negócio – de US$ 53 bilhões – com o Bahrain, que só não está ainda assinado porque organizações de direitos humanos – diga-se a favor delas – denunciaram ferozmente o negócio.

E há também o deslocamento – ou, em idioma do Pentágono, o “reposicionamento” – de 15 mil soldados dos EUA, do Iraque para o Kuwait.

A justificativa para toda essa orgia armamentista nos é impingida pela lógica suspeita de sempre: seria necessário construir uma “coalizão de vontades” para “conter” o Irã. Por que o Irã? Meio-piada, meio a sério: porque o Irã não faz parte do Conselho de Cooperação do Golfo – quer dizer, porque já não é satrapia subserviente dos EUA, como antigamente, naqueles bons velhos tempos do Xá.

Adam Hanieh, professor de estudos do desenvolvimento na School of Oriental and African Studies (SOAS) em Londres, e autor de Capitalism and Class in the Gulf Arab States [Capitalismo e Classes nos Estados Árabes do Golfo] foi dos poucos analistas globais que se empenhou em decodificar a centralidade do Conselho de Cooperação do Golfo na estratégia imperial. Em entrevista radicalmente importante, alinha o que é preciso saber. E não é bonito. [2]

Como Asia Times Online tem documentado extensamente, a Primavera Árabe morreu, praticamente, quando o Conselho de Cooperação do Golfo entrou em cena. Em Omã, o sultão Qaboos basicamente distribuiu montanhas de dinheiro. Na Arábia Saudita, houve feroz prevenção e repressão hardcore sustentada, na província do Leste, de maioria xiita, próxima do Bahrain, e província onde está o petróleo dos sauditas.

E no próprio Bahrain, houve não só repressão violentíssima – com prisões e tortura documentadas de centenas de manifestantes pró-democracia – mas o país foi invadido por soldados e tanques da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos.

A invasão talvez tenha dado ao Conselho de Cooperação do Golfo o prazer adocicado da expansão territorial. O Marrocos e a Jordânia – embora, em termos geográficos básicos, não estejam no Golfo – foram “convidados” a participar do clube dos ricos: afinal, são também monarquias sunitas reacionárias como se exige; não são repúblicas árabes seculares “decadentes” como Líbia e Síria.

Questão interessante é por que a Primavera Árabe não irrompeu na Jordânia – uma vez que o mesmo vulcão socioeconômico que entrou em erupção na Tunísia e no Egito é ativo também na Jordânia. A parte chave da resposta é que o Conselho de Cooperação do Golfo – ainda mais que Washington, capitais europeias e Israel – vive sob medo pânico de que o trono hashemita seja derrubado.

Para a imensa riqueza do CCG, é facílimo controlar a Jordânia – país pequeno, onde a maior parte da população é, de fato, de palestinos, com oposição mínima (não é surpresa: a inteligência jordaniana prendeu ou matou todos os dissidentes). O que gasta para manter essa situação é dinheiro de bolso para o Conselho de Cooperação do Golfo, se comparado aos bilhões de dólares destinados a Egito e Tunísia, para que ninguém ali se atreva a tornar-se democrático “demais”.

Não havia outra via, para o Conselho de Cooperação do Golfo, além de converter-se em Central da Contrarrevolução, depois da onda democrática inicial que varreu o Norte da África. Como Hanieh destaca, as massas empobrecidas no Oriente Médio/Norte da África [ing. MENA (Middle East-Northern Africa)] jamais preocuparam os autocratas reinantes no Golfo.

A culminação desse processo foi o nascimento de uma nova monstruosidade geopolítica – OTANCCG ou CCGOTAN, na qual se corporificou o papel central que Qatar e os Emirados Árabes Unidos tiveram na invasão – e destruição – da Líbia, pela OTAN. A Líbia foi "operação especial” do CCG – do dinheiro vivo e armas entregues diretamente aos “rebeldes”, aos agentes treinados e à inteligência e por fim, mas não menos importante, à legitimação política (que obtiveram num arremedo de votação na Liga Árabe, para conseguir que a ONU aprovasse a implantação de uma zona aérea de exclusão; nesse arremedo de votação só 22 membros da Liga Árabe votaram “sim”; e, desses, seis eram membros do CCG; os outros três outros votos foram comprados; e Síria e Argélia votaram “não”).

A piada trágica mãe de todas as piadas trágicas vem agora: o CCG está tentando intervir e, de fato, já financia os sunitas fundamentalistas extremistas na Síria, que aparecem travestidos como manifestantes pró-democracia. Quando o débil secretário-geral da ONU Ban Ki-moon conclama o presidente Bashar al-Assad a pôr fim à violência contra manifestantes sírios e diz que acabou o tempo das dinastias e ditaduras de um só homem no mundo árabe, ele crê, obviamente, que o Conselho de Cooperação do Golfo seja colônia instalada num dos anéis de Saturno.

Depois que venceu na Líbia, o monstro CCGOTAN ganhou ímpeto. A estratégia do CCG de mudança de regime na Síria foi selecionada porque pareceu ser a melhor para enfraquecer o Irã e o chamado “crescente xiita” – ficção inventada durante o governo de George W Bush, pelo reizinho de Playstation da Jordânia e pela Casa de Saud.

O que nos leva a uma pergunta inevitável: e o que os dois principais BRICS – Rússia e China – estão fazendo em relação a tudo isso?

E entra o dragão!

O imensamente poderoso secretário do Conselho Nacional de Segurança da Rússia e ex-chefe da FSB (sucessora da KGB), Nikolai Patrushev – que visita frequentemente o Irã – já alertou sobre “o perigo real” de os EUA atacarem o Irã; os EUA, diz ele, “querem converter o Irã, de inimigo, em parceiro apoiador; e, para conseguir isso, o plano é mudar o atual regime, pelos meios necessários.” [3]

Para a Rússia, mudança de regime no Irã é questão “não-não”. O vice-primeiro ministro da Rússia e ex-enviado à OTAN, Dmitry Rogozin, já declarou, sem meias palavras: “o Irã é nosso vizinho próximo, logo ao sul do Cáucaso. Se algo acontecer ao Irã, se o Irã for arrastado a dificuldades políticas e militares, o que acontecer ali ameaçará diretamente nossa segurança nacional”. [4]

O que implica que, de um lado, temos Washington, OTAN, Israel e o CCG. Não se pode chamar de “comunidade internacional” como diz o coro de especialistas nos jornais. E, do outro lado, temos Irã, Síria, um Paquistão-já-farto-das-conversas-de-Washington, Rússia, China e vários dos 120 países reunidos no Movimento dos Não Alinhados [ing. Non-Aligned Movement (NAM)].

A posição da China frente ao CCG provoca deslumbramento, suprema fascinação. O primeiro-ministro chinês Wen Jiabao acaba de visitar os três países chave do Conselho de Cooperação do Golfo – Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Qatar.

Imaginem Wen Jiabao a dizer ao Príncipe Coroado Nayef (meio irmão do rei Abdullah), em Riad, que Pequim deseja que “empresas chinesas fortes e de sólida reputação” invistam fortunas em portos, estradas e no desenvolvimento da infra-estrutura na Arábia Saudita – como parte de uma “cooperação ampliada”, para enfrentar tendências regionais e internacionais complexas e mutáveis”. Imaginem Nayef salivando por baixo daquele poderoso bigode, reafirmando que a Casa de Saud, sim, sim, deseja “expandir a cooperação” em energia e infraestrutura.

O que acrescenta tempero à mistura é que Pequim também mantém relacionamento estratégico com o Irã – e saudável relacionamento comercial com a Síria. Assim sendo, no que tenha a ver com o Oriente Médio e a Ásia Central, Pequim está apostando – diferente do Pentágono – num verdadeiro “arco de estabilidade”.

Como a agência Xinhua noticiou, naquele estilo amplamente inclusivo que não tem rival no mundo, o que interessa à liderança em Pequim é que China, sudoeste asiático e Ásia Central tirem “pleno proveito de suas potencialidades respectivas e busquem, juntas, o desenvolvimento comum”. Por que, diabos, Washington nunca aparece com ideia simples assim?

É verdade que quem domine o Conselho de Cooperação do Golfo – com armas e apoio político – projeta globalmente o próprio poder. O Conselho de Cooperação do Golfo tem sido absolutamente decisivo para a hegemonia dos EUA dentro do que Immanuel Wallerstein define como sistema-mundo.

Passemos os olhos por alguns números. Desde o ano passado, a Arábia Saudita exporta mais petróleo para a China que para os EUA – parte de um processo inexorável pelo qual as exportações de bens e energia dos países do CCG estão-se mudando para a Ásia.

Ano que vem, com o petróleo a $70/barril, o CCG acumulará $3,8 trilhões em recebimentos estrangeiros. Com a infindável “tensão” no Golfo Persa, nada sugere, no futuro próximo, que o petróleo seja vendido a menos de $100. Nesse caso, os recebimentos com que o CCG contará alcançarão espantosos $5,7 trilhões – 160% a mais que antes da crise de 2008, e mais de $1 trilhão acima das reservas chinesas em moeda estrangeira.

Simultaneamente, a China estará fazendo mais negócios com o GCC. O GCC está importando mais da Ásia – embora a principal fonte de importações ainda seja a União Europeia. E o comércio entre EUA e o CCG está encolhendo. Em 2025, a China estará importando três vezes mais petróleo do CCG, que os EUA. Claro que a Casa de Saud está – para não exagerar – loucamente entusiasmada com Pequim.

No momento, vê-se predomínio militar do CCGOTAN e, em termos geopolíticos, do CCGEUA. Mas antes do que se supõe Pequim pode chegar ao ouvido da Casa de Saud e sussurrar “E se eu lhe pagar por esse petróleo, em Yuan?”. A China já compra petróleo e gás iranianos em Yuan. Quem sabe... petroyuan, em vez de petrodólar? Quem sabe? Afinal, sim, pode ser Star Trek.

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Notas dos tradutores
[1] 18/1/2012. Pepe Escobar “O mito do Irã isolado”, Ásia Times & Tom Dispatch
[2] LEWIS, Ed & HANIEH, Adam (entrevista) sobre Capitalism and Class in the Gulf Arab States, New Left Project,
[3] 14/1/2012 MK Bhadrakumar; “A avaliação dos russos: “Já se vê no horizonte uma nova guerra dos EUA no Oriente Médio”
[4] 15/1/2012, Washington’s blog: Rússia: “Shoud Anything Happen to Iran... This Will Be a Direct Threat to our National Security”

domingo, 15 de janeiro de 2012

Um olho em Obama, outro em Ahmadinejad - Rossi não conta

Antonio Fernando Araujo


Quando se lê o artigo de Clóvis Rossi, publicado em 08/01 passado na Folha de S. Paulo não é difícil percebermos que nada mudou na sua maneira (pelo menos no que se refere a questão EUA-Irã) de encaminhar suas análises, desde que em 13/04/2010 escreveu na Folha On Line - "Não é o Irã, é a Al Qaeda": "Por mais que os Estados Unidos, principalmente, mas também França e Alemanha, estejam incomodados com o programa nuclear iraniano, o fato é que a Cúpula sobre Segurança Nuclear, encerrada nesta terça-feira em Washington, não tinha o Irã como alvo principal, mas a Al Qaeda, se se tomar essa expressão como sinônimo de terrorismo global. Não é impressão pessoal nem informação privilegiada. O próprio presidente Barack Obama, em conversa com jornalistas difundida pelo hiper-ativo serviço de imprensa da Casa Branca, deixou claro que a possibilidade de uma organização terrorista conseguir uma arma nuclear 'é a maior ameaça à segurança dos Estados Unidos, tanto no curto prazo como no médio e no longo prazo'." Isso foi o bastante para que Rossi assumisse a tese mestra com que costuma induzir seus leitores, levando-os a acreditar que tudo não passa de uma guerra entre o Bem e o Mal, cujo vilão na época era encarnado na aterrorizante figura de Bin Laden.

Como estamos comprovando agora, tudo isso não passava de conversa fiada. Como, em maio último, Obama - Prêmio Nobel da Paz - teve que mandar "matar" o Bin Laden meios às pressas (no imaginário americano e no de muitos brasileiros bem informados, a Al-Qaeda sucumbiu nesse mesmo dia, também lançada ao fundo do mar) o alvo agora tem mesmo que ser modificado, passa a ser o "desenvolvimento de armamento nuclear", por homens do Mal que ameaçam o mundo. Não importa que tanta gente boa ou do Bem já tenha escancarado os reais motivos: não tem nada de armamento nuclear sendo desenvolvido no Irã (como não havia no Iraque), o que Obama quer mesmo é se apropriar do petróleo iraniano e se reelejer presidente, o tal dos "dois coelhos em uma única cajadada". Mas o "discurso nuclear" funciona como a Comissão de Frente. O(s) carro(s) Abre-alas, a(s) frota(s) que já se desloca(m) rumo aos golfos Pérsico, de Omã e de Aden e aos mares Mediterrâneo, Vermelho e Arábico (onde "estão sepultados" Bin Laden e a Al-Qaeda) já estão praticamente posicionados, estando prestes a completar o cerco do Irã para que Israel também contribua com sua parte na Síria e no Líbano, no esforço de tornar o Mediterrâneo, finalmente, o almejado Lago da OTAN e, de lambujo, caso seja possível - dentro de uma ampla visão estratégica de evitar o golfo Persa para o transporte do óleo e que incluiria outros oleodutos -, ainda ressuscitar o falecido “Trans-Arabian” (Tapline) que liga Ras-Tannurah, na costa saudita desse golfo com o porto de Trípoli, no Líbano, com um mínimo de prejuízo, de olho na redução dos custos e na minimização da importância do estreito de Ormuz e o consequente enfraquecimento estratégico do Irã. Será que daria então para o Rossi explicar aos seus leitores o porque dos atuais esforços de Washington para derrubar o governo sírio (caindo este, o do Líbano cai em seguida), que diariamente nossa imprensa subalterna alardeia como se o facínora fosse unicamente o sírio Bachar El-Assad e Obama - Prêmio Nobel da Paz, insisto - não estivesse nem um pouco interessado em primeiro isolar o Irã, antes de atacar diretamente Teerã.



Embora tudo isso esteja acontecendo a olhos vistos o Rossi nada percebe, prefere desdenhar sobre a visita de Ahmedinejad à América Latina, não ligando a mínima para o que disse Chavez ao iraniano ao recebê-lo na Venezuela: - "Somos vítimas da ganância das superpotências”. Quem duvida? Talvez o Rossi, que também não notou que os EUA estão enfurecidos: o Irã não parece nada “isolado” internacionalmente. - "O regime iraniano rejeitou todas as aberturas propostas pelos EUA e o regime de Castro nunca alterará suas posições”, bradou, no último dia 09/01, a presidente do Comitê de Assuntos Internacionais da Câmara de Deputados em Washington, Ileana Ros-Lehtinen, republicana da Flórida.

Nem esperaria que o Rossi se inteirasse do que escreveu o ex-diplomata indiano MK Bhadrakumar, no Indian Punchline, em 12/01, sob o título "When Fidel meets Ahmadinejad", reproduzido no blog Redecastorphoto, onde, "vê-se hoje já bem evidente uma acomodação politicamente articulada entre o islamismo como força política e a esquerda latino-americana. Ahmedinejad é visto como agente de uma nova forma exemplar de antiimperialismo internacionalmente ativo, que sabe operar em ressonância com a consciência política da esquerda latino-americana, e vê nela traços pelos quais pode identificar o seu próprio projeto histórico. A atual viagem de Ahmadinejad reforça essa nova sintaxe da acomodação política entre os dois lados, e deixa para trás a patética história da Guerra Fria, quando o ocidente conspirava para jogar os marxistas contra os islâmicos, tentando assim abrir caminho para obter vantagens geopolíticas no Oriente Médio rico em petróleo." Mas Rossi nada nota sobre isso, assim como não vê coerência entre as posições anteriormente assumidas por Dilma - que ele mesmo cita - de constestações relacionadas com os "direitos humanos" praticados no Irã e essa "frieza" atual em convidar Ahmadinejad para nos visitar. Prefere então lançar mão de outro trecho daquela declaração de Ileana Ros-Lehtinen - "A atividade iraniana no Hemisfério Ocidental ameaça a segurança regional e a estabilidade" - para tentar associá-la, não à resistência dos que se consideram vítimas da ganância das superpotências, como disse Chavez, mas a uma fantasiosa e "perigosa infiltração iraniana na América Latina", com ares de subversão ideológica, como se agora o islamismo assumisse o papel, deixado para trás, que o comunismo soviético já desempenhara na época da Guerra Fria EUA-URSS, no século passado.

Claro que o Irã, como qualquer outro país do mundo, tem interesses de sobra para se mostrar ativo na América Latina atual, uma ilha de relativa prosperidade sócio-econômica em meio ao caos econômico EUA-Europa. E, se no caso do Irã, esses interesses vão mais além e transcendem o aspecto puramente econômico, se deve certamente à insaciável ambição imperialista norte-americana, ao vergonhoso isolamento econômico que mantém com a frágil Cuba há cerca de 60 anos e o desejo incontrolável de se apossar das riquezas petrolíferas, tanto as de cá - Brasil incluído - quanto as de acolá.

Seria, talvez, desejar demais que o Rossi também tivesse atentado para o idioma político escutado na atual viagem de Ahmedinejad: - “Meu irmão revolucionário”, pronunciou o iraniano ao saudar seu colega Ortega, da Nicarágua, “nossos dois povos, em diferentes partes do mundo, lutamos para estabelecer a solidariedade entre todos e a justiça para todos.” Ora, ninguém fala uma coisa dessas à toa, no mesmo instante em que os "Carros Abre-alas" se movimentam pelos golfos e mares de suas praias. Mas é dessa solidariedade internacional - ainda que originária de "inexpressivas" nações latino-americanas - que provém o temor da Ileana Ros-Lehtinen, a republicana da Flórida que, por viver tão perto de Cuba, tem sabedoria suficiente para avaliar do que é capaz a resistência de um povo quando está forjado "para estabelecer a solidariedade entre todos e a justiça para todos.” Ela certamente entende o que fala o Ahmedinejad. Rossi, infelizmente, passa batido.

sábado, 14 de janeiro de 2012

A POSSÍVEL BATALHA PELO ESTREITO DE ORMUZ

sábado, 14 de janeiro de 2012 - Mahdi Darius Nazemroaya - blog Democracia & Política

Depois de ouvir ameaças dos EUA durante anos, o Irã está tomando medidas que sugerem que considera fechar o Estreito de Ormuz e que tem capacidade para fazê-lo. No dia 24 de dezembro, o Irã iniciou exercícios navais (Operação Velayat-90) no e à volta do Estreito de Ormuz, do Golfo Persa e Golfo de Omã (Mar de Omã), ao Golfo de Aden e Mar da Arábia.


Desde o início daqueles exercícios, cresce a guerra de palavras entre Washington e Teerã. Mas nada do que o governo Obama ou o Pentágono disseram ou fizeram, até agora, dissuadiu Teerã de dar prosseguimento aos seus exercícios navais.

A NATUREZA GEOPOLÍTICA DO ESTREITO DE ORMUZ
À parte ser ponto vital de trânsito para recursos energéticos globais e gargalo estratégico, dois outros aspectos devem ser considerados se se analisa o Estreito de Ormuz e a importância que tem para o Irã:

(1) a própria geografia do Estreito; e
(2) o papel do Irã na coadministração do estreito, nos termos da legislação internacional e das leis nacionais iranianas.

As embarcações de todos os tipos que passam pelo Estreito de Ormuz sempre mantiveram contato com as forças navais iranianas – a Marinha Regular Iraniana e a Marinha da Guarda Revolucionária do Irã. As forças navais iranianas monitoram e policiam o Estreito de Ormuz, administração compartilhada com o Sultanato de Omã, através de um enclave omanita que há ali, Musandam. Mais importante que isso: para navegar através do Estreito de Ormuz, todo o tráfego marítimo, inclusive a Marinha dos EUA, é obrigado a navegar por águas territoriais iranianas; para sair, em muitos casos, cruzam-se águas territoriais de Omã.

O Irã sempre permitiu que embarcações estrangeiras amigas cruzem suas águas territoriais, nos termos, também, da Parte III da Convenção da ONU sobre “Lei do Mar e de trânsito por mar”, que estipula que as embarcações são livres para navegar pelo Estreito de Ormuz e outros corpos d’água semelhantes, em velocidade constante e sem se deterem, de um porto aberto até águas internacionais. Embora as autoridades de Teerã sigam as rotinas da “Lei do Mar”, Teerã não é legalmente obrigada a segui-las. Como Washington, Teerã também assinou seu específico tratado internacional e jamais o ratificou.

TENSÕES ENTRE EUA E IRÃ NO GOLFO PERSA
Atualmente, o Parlamento (Majlis) iraniano está reexaminando o uso de águas iranianas no Estreito de Ormuz por embarcações estrangeiras. Há projetos de lei em exame, para bloquear o trânsito de embarcações de guerra estrangeiras por águas territoriais iranianas através do Estreito de Ormuz sem prévia permissão das autoridades iranianas; a Comissão de Segurança Nacional e Política Exterior do Parlamento do Irã está examinando projetos de lei que manifestarão a posição oficial do Irã, orientada pelos interesses estratégicos e da segurança nacional do Irã. [1]

Dia 30/12/2011, o porta-aviões USS John C. Stennis passou pela área na qual o Irã desenvolvia exercícios navais. O Comandante das Forças Iranianas Regulares, major-general Ataollah Salehi, alertou o USS John C. Stennis e outros navios dos EUA para que não voltassem ao Golfo Persa enquanto durassem as manobras navais do Irã; acrescentou que o Irã não tem o hábito de dar o mesmo aviso duas vezes. [2] Pouco depois do duro aviso iraniano, o secretário de imprensa do Pentágono respondeu, em declaração em que se lia: “Ninguém, neste governo procura confrontação [com o Irã] no Estreito de Ormuz. É importante baixar a temperatura.” [3]

Num cenário real de conflito militar com o Irã, é bastante provável que porta-aviões dos EUA tenham de, realmente, operar de fora do Golfo Persa, do sul, do Golfo de Omã e do Mar da Arábia. A menos que já seja operacional o sistema de mísseis que Washington está desenvolvendo nas petromonarquias ao sul do Golfo Persa, deve-se contar com a proibição de que grandes naves de guerra dos EUA cheguem ao Golfo Persa. Isso por causas associadas à geografia local e às capacidades de defesa do Irã.

A GEOGRAFIA CONTRA O PENTÁGONO: NO GOLFO PERSA, A FORÇA NAVAL DOS EUA É LIMITADA
As forças navais dos EUA – a Marinha e a Guarda Costeira dos EUA – são as maiores do mundo. Nada se compara às capacidades dos EUA em águas profundas e oceânicas. Mas ser a maior e a mais potente não implica que seja invencível. No Golfo Persa e no Estreito de Ormuz, as forças navais dos EUA são vulneráveis.

Apesar do poder e das muitas capacidades, a geografia trabalha literalmente contra o poder naval dos EUA no Estreito de Ormuz e no Golfo Persa. O Golfo Persa, pelo menos em contexto estratégico e militar, é como um canal. Em termos figurativos, os porta-aviões e grandes navios de guerra dos EUA ficam ali confinados, pode-se dizer, “presos”, nas águas costeiras do Golfo Persa.

É isso, precisamente, que amplia muito as já altas capacidades dos mísseis iranianos. O arsenal de mísseis e torpedos do Irã tem potencial para neutralizar as armas navais dos EUA em águas do Golfo Persa. Por isso, os EUA tanto se empenham hoje para construir um “escudo” de mísseis no Golfo Persa, associando nessa empreitada os países do Conselho de Cooperação do Golfo, já há alguns anos.

Até os pequenos barcos-patrulha iranianos no Golfo Persa, que parecem insignificantes e muito pequenos comparados a um porta-aviões ou a um destróier gigantes, são ameaça considerável às naves de guerra dos EUA naquele cenário. Os barcos-patrulha podem disparar uma barreira de mísseis que, sim, podem danificar muito e, mesmo, destruir grandes navios de guerra. Além disso, os barcos-patrulha iranianos são quase indetectáveis e são alvos difíceis, porque são pequenos e rápidos.

As forças iranianas também podem minar as capacidades navais dos EUA no Golfo com mísseis lançados de terra, do interior do país, nas áreas próximas do norte do Golfo Persa. Já em 2008, o ‘Washington Institute for Near East Policy’ reconheceu a ameaça, para forças navais dos EUA no Golfo, das baterias de mísseis costeiros, dos mísseis terra-mar e dos pequenos barcos armados com mísseis. [4] A Marinha do Irã também conta com drones, veículos anfíbios, minas, equipes de mergulhadores e minissubmarinos, que serão mobilizados em qualquer guerra naval assimétrica contra a 5ª Frota dos EUA.

O próprio Pentágono já comprovou, em simulações, que uma guerra no Golfo Persa seria desastrosa para os EUA. Exemplo disso é a operação “Millennium Challenge 2002” (MC02), simulação de guerra no Golfo Persa, feita entre 24/7/2002 e 15/8/2002, cuja preparação consumiu quase dois anos. Essa manobra naval gigante foi das maiores e mais caras jamais organizadas pelo Pentágono. “Millennium Challenge 2002” foi criada pouco depois de o Pentágono decidir que poderia fazer avançar a guerra no Afeganistão se atacasse Iraque, Somália, Sudão, Líbia, Líbano e Síria, recolhendo, ao final, como grande prêmio, o Irã – numa ampla campanha militar que daria aos EUA a primazia no milênio que se iniciava.

Depois de terminada a operação “Millennium Challenge 2002”, a operação foi oficialmente apresentada como simulação de guerra contra o Iraque de Saddam Hussein. De fato, sempre se tratou do Irã. [5] Os EUA já tinham as avaliações necessárias para a invasão do Iraque, por EUA e Grã-Bretanha, que aconteceria pouco depois. E, detalhe importante, o Iraque jamais teve força naval que exigisse empenho total da Marinha dos EUA.

A Operação “Millennium Challenge 2002” foi, sim, simulação de guerra contra o Irã (na simulação chamado de “Red” [Vermelho] e apresentado como estado “bandido” [orig. “rogue”] do Oriente Médio no Golfo Persa). Só o Irã tem todas as características de território e forças militares apresentadas como de “Red” – dos botes-patrulha armados com mísseis até as unidades de motociclistas. Aquela simulação monstro foi feita porque Washington planejava atacar o Irã imediatamente depois de invadir o Iraque em 2003. (…)

Não há qualquer dúvida entre os especialistas de que o formidável poder naval dos EUA resulta muito reduzido, pela geografia e pelas capacidades militares dos iranianos, no caso de combate no Golfo Persa e, de fato, em grandes partes também do Golfo de Omã. Longe de águas abertas, como no Oceano Índico ou no Oceano Pacífico, os EUA teriam de combater sob condições extremas, sem a garantia de suficiente tempo de resposta e, mais importante, ficarão impedidos de combater de distância (considerada militarmente) segura. Setores inteiros das defesas navais dos EUA, concebidos para combates navais em águas abertas e grandes distâncias entre os combatentes, são absolutamente imprestáveis nas condições de combate no Golfo Persa.

REDUZIR A IMPORTÂNCIA DO ESTREITO DE ORMUZ, PARA ENFRAQUECER O IRÃ?
O mundo inteiro sabe da importância do Estreito de Ormuz. E Washington e seus aliados sabem perfeitamente que os iranianos podem fechar militarmente o estreito por período significativo de tempo. Essa é a razão pela qual os EUA estão trabalhando com países do Conselho de Cooperação do Golfo – Arábia Saudita, Qatar, Bahrain, Kuwait, Omã e Emirados Árabes Unidos – para alterar o trajeto de oleodutos que evitem o Estreito de Ormuz e levem o petróleo do CCG diretamente ao Oceano Índico, Mar Vermelho e Mar Mediterrâneo. Washington também tem pressionado o Iraque para que busque vias alternativas em conversações com a Turquia, a Jordânia e a Arábia Saudita.

Esse projeto estratégico interessa muito também a Israel e à Turquia. Ancara tem mantido discussões com o Qatar sobre a instalação de um oleoduto que chegaria à Turquia através do Iraque. O governo turco tentou que o Iraque se interessasse por ligar os campos de petróleo do sul e do norte a rotas de trânsito que atravessariam a Turquia. É o projeto dos turcos, que se vêem, no futuro, como corredor e importante elo de trânsito e ligação de energia.

Se o petróleo puder ser “desviado”, de modo a não ter de passar pelo Golfo Persa, ter-se-á removido importante elemento de vantagem estratégica a favor do Irã e contra Washington e seus aliados (removendo-se, ao mesmo tempo, parte considerável da importância do Estreito de Ormuz. Esse “desvio” do petróleo pode bem ser considerado exigência importante, em qualquer preparação dos EUA para guerra contra o Irã. Sem isso, pode-se dizer que os EUA não farão guerra ao Irã.

Nesse contexto, inscrevem-se os oleodutos "Abu Dhabi Crude Oil Pipeline” ou “Hashan-Fujairah Oil Pipeline”, projeto patrocinado pelos Emirados Árabes Unidos e que dispensaria rota marítima pelo Golfo Persa e o Estreito de Ormuz. O projeto foi concluído em 2006, o contrato assinado em 2007 e a construção começou em 2008. [8] Esse oleoduto liga diretamente Abdu Dhabi ao porto de Fujairah no litoral do Golfo de Omã, no Mar da Arábia. Em outras palavras, levará o petróleo exportado pelos Emirados Árabes Unidos diretamente ao Oceano Índico. Foi apresentado oficialmente como meio para garantir segurança energética, evitando Ormuz (e tentando evitar também o exército iraniano). Além do oleoduto, o projeto prevê, também, a construção de um reservatório para armazenamento de petróleo em Fujairah – que está previsto para manter o fluxo de petróleo para o mercado internacional, no caso de o Golfo Persa ser fechado. [9]

Além do oleoduto “Petroline” (oleoduto saudita, leste-oeste), a Arábia Saudita também procura rotas alternativas, examinando portos vizinhos na costa sul, na Península Arábica, em Omã e no Iêmen. O porto de Mukalla, no Iêmen, no litoral do Golfo de Aden tem atraído especial atenção de Riad. Em 2007, fontes israelenses informaram, com algum alarde, que começava a ser projetado um oleoduto que ligaria os campos de petróleo sauditas aos portos de Fujairah nos Emirados Árabes, Muscat em Omã e Mukalla no Iêmen. A reabertura do “Oleoduto Iraque-Arábia Saudita” [orig. Iraq-Saudi Arabia Pipeline (IPSA)] – o qual, por ironia, foi construído por Saddam Hussein, que tentava escapar também do Estreito de Ormuz e do Irã – também foi discutida entre sauditas e governo do Iraque em Bagdá.

Se Síria e Líbano fossem convertidos em estados-clientes de Washington, seria possível ressuscitar o falecido oleoduto “Trans-Arabian” (Tapline), além de outras rotas que vão da Península Arábica à costa do Mediterrâneo pelo Levante. Cronologicamente, esse projeto explica os esforços de Washington para derrubar os governos de Síria e Líbano, tentando isolar o Irã, antes de os EUA atacarem diretamente Teerã.

Os exercícios navais da Marinha do Irã, “Operação Velayat-90”, que se realizaram em área bem próxima da entrada do Mar Vermelho no Golfo de Aden, fora de águas territoriais do Iêmen, também se estenderam pela parte do Golfo de Omã frente ao litoral de Omã e litoral leste dos Emirados Árabes Unidos. Dentre outras coisas, a operação “Velayat-90“ deve ser interpretada como sinal de que Teerã está preparada para operar também fora do Golfo Persa; e que pode bombardear ou bloquear também os oleodutos que tentam ‘desviar’ do Estreito de Ormuz.

Também nesse caso, a geografia joga a favor do Irã. As rotas ditas “alternativas”, porque evitam o Estreito de Ormuz, nem por isso alteram o fato de que a maioria dos campos de petróleo dos países que integram o “Conselho de Cooperação do Golfo” localiza-se no Golfo Persa ou em áreas próximas do litoral – o que implica que são alcançáveis pelos mísseis de longa distância dos iranianos. Como no caso do “oleoduto Hashan-Fujairah”, os iranianos podem facilmente interromper o fluxo de petróleo, pode-se dizer, na origem. Teerã, sem dúvida, deslocaria forças de terra, mar e ar, além dos mísseis, e forças anfíbias para todas essas áreas. De fato, o Irã nem precisa fechar o Estreito de Ormuz; os iranianos, de fato, têm ameaçado bloquear o fluxo de petróleo (o que não precisa ser feito, necessariamente, com bloqueio do Estreito de Ormuz).

AOS EUA SÓ RESTOU GUERRA FRIA, NA DISPUTA CONTRA O IRÃ
Washington está em ofensiva contra o Irã, usando todos os meios ao seu alcance. As tensões em torno do Estreito de Ormuz e do Golfo Persa são apenas um dos fronts de uma muito perigosa guerra fria regional, de muitos fronts no Oriente Médio expandido, entre Teerã e Washington. Desde 2001, o Pentágono está em processo de reestruturação para “guerras não convencionais”, pensando em inimigos como o Irã [10]. Mas a geografia sempre operou contra o Pentágono e os EUA – e é o que explica que ainda não tenham encontrado solução para o dilema naval no Golfo Persa. Sem poder recorrer à guerra convencional, os EUA tiveram de recorrer, no caso do Irã, à guerra de espionagem, guerra econômica e guerra diplomática.


NOTAS DO AUTOR
[1] 4/1/2012, Xinhuanet, “Foreign Warships Will Need Iran’s Permission to Pass through Strait of Hormuz”.
[2] 4/1/2012, Fars News Agency, “Iran Warns US against Sending Back Aircraft Carrier to Persian Gulf” January 4, 2011.
[3] 4/1/2012, Reuters, Parisa Hafezi, “Iran threatens U.S Navy as sanctions hit economy”.[4] Fariborz Haghshenass, “Iran’s Asymmetric Naval Warfare” Policy Focus, no.87 (Washington, D.C.: Washington Institute for Near Eastern Policy, September 2010). Livro para download.
[5] 6/9/2002, Julian Borger, “Wake-up call” - The Guardian.
[8] 12/6/2011, Himendra Mohan Kumar, “Fujairah poised to be become oil export hub” Gulf News.
[9] Ibid.
[10] John Arquilla, “The New Rules of War” Foreign Policy, 178 (March-April, 2010): pp. 60-67.”



segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Lá como cá a praga se alastra

04/01/2012 - Laerte Braga


A maioria dos analistas políticos que se debruçaram sobre os resultados das primeiras primárias do Partido Republicano no estado de Yowa destacaram o aspecto religioso que pode influir de forma decisiva na indicação do adversário de Barack Obama no final do ano.


Mitt Romney

Oito votos separaram o mórmon Mitt Romney do evangélico – chamado de direita cristã – Rick Santorum mantendo um suspense até o último momento da apuração. Romney disse que os EUA não darão um dólar para salvar a Europa da crise que devasta a zona do euro e Santorum já anunciou que é contra o aborto, contra o homossexualismo e defende políticas duras – vale dizer guerras – contra os “adversários” de seu país (na verdade os EUA são adversários do mundo, da vida).

Na reta final da campanha de 1980, quando Jimmy Carter pleiteava a reeleição contra Ronald Reagan, os números mostravam alguma indecisão do eleitorado e num determinado momento as chances de Carter eram maiores. A ocupação da embaixada dos EUA no Irã trabalhou a favor de Reagan.

Anos mais tarde revelou-se que o acordo para desocupação da embaixada havia sido fechado antes das eleições e foi seguro até alguns dias depois para favorecer Reagan, um fantoche de grupos de extrema-direita. A operação foi conduzida pela CIA e a descoberta veio através de documentos confidenciais trazidos a público nos termos da legislação americana que estipula um prazo para que documentos dessa natureza permaneçam fora do alcance do conhecimento público.

Tal e qual a vitória de George Bush na Flórida em 2000, através de uma fraude num distrito de Miami.


Praça Esfahan-shah-sq, Teerã

O Irã vai ser novamente o centro das eleições nos EUA. O que não exclui, pelo contrário aumenta, as chances de uma nova guerra do terror de Estado contra um país muçulmano.

Teerã, à noite

Obama, ao contrário de Carter, é cínico e frio o bastante para isso se perceber que sua vitória depende de atacar aquele país. Não importa quantas pessoas possam morrer, importa a vitória eleitoral.

Se juntarmos a imensa e esmagadora maioria da população norte-americana teremos a maior concentração de idiotas arrogantes de todo o mundo, só comparáveis a britânicos e franceses.

Por essa razão vulneráveis a pregação de superioridade racial, de supremacia branca, de farol do mundo (embora FHC reivindique para si essa condição, mas no caso do brasileiro é uma patologia mais simples) e consciência terrorista/hipócrita que sobrevivem do saque e da exploração de povos em todos os cantos do mundo.

Mitt Romney e a esposa Ann

Quando o mórmon republicano Mitt Romney diz que não dará um dólar para a Europa está apenas fazendo um discurso eleitoral. Sabe que os países da Comunidade Européia são colônias norte-americanas, imensas bases militares chamadas de OTAN – Organização do Tratado Atlântico Norte – e que as responsabilidades de seu país em relação àquela parte do mundo (em processo de extinção como a conhecemos) são plenas.

O debate religioso que encobre campanhas eleitorais em vários países do mundo é tão somente a hipocrisia de um lado, o fanatismo de outro, não deve demorar muito para que algum candidato se proclame o novo messias. Sarah Palin tentou. A despeito das belas pernas (que fazia e faz questão de exibir quando defende a moral e os bons costumes a moda medieval) não conseguiu.

Santorum tenta recuperar o discurso.

Rick Santorum
 A rigor os EUA vivem um processo de decadência. É a História implacável com os grandes impérios. O risco é a clássica boçalidade de norte-americanos montados em perto de cinco mil ogivas nucleares prontas a destruir o planeta cem vezes se necessário for.

Rambo Santorum

Não é impossível que a estátua da Liberdade seja devolvida aos franceses e Silvester Stalone vá ocupar o seu lugar, travestido de Rambo num misto com Rocky o Lutador.

As eleições nos EUA têm, neste ano, um novo ingrediente. O aumento das forças chamadas de “direita cristã” traz consigo grupos anti semitas, o que vai obrigar a banqueiros e empresários que controlam ISRAEL/EUA TERRORISMO S/A a gastos maiores para manter o controle do complexo.

Começa a ganhar força nos EUA – um fato constatado nos últimos anos – o anti semitismo, fenômeno clássico em países com características nazi/fascistas, mesmo que o sionismo seja uma variável desse espectro terrorista.

Por aqui a GLOBO (em todas as suas frentes) começa o delírio de transformar essas eleições em algo vital para o Brasil e criar em cada brasileiro um torcedor por esse ou aquele candidato. Vários especialistas já estão sendo convocados a opinar sobre o assunto.

São os deveres com a matriz. Se não houver cuidados especiais William Waack pode ter orgasmos ao vivo em seus programas todas as vezes que o tema for tratado e a bandeira norte-americana aparecer.

Isso deve ser depois do Big Brother Brasil, o bordel televisivo da família brasileira. Cristã e ocidental e cada vez mais sem rumo e direção, acreditando piamente que Edir Macedo salva alguma coisa além do seu.

Ayatollah Ali Khamenei

Esse debate religioso na política seria uma comédia não fosse trágico. Em Israel, uma das matrizes do terror de Estado, a menina Naama Margolese, filha de imigrantes norte-americanos – judeus – foi chamada de prostituta por grupos radicais (apóiam o governo de Benjamin Netanyahu) por não se vestir de acordo com as “tradições”. No caminho para a escola além de insultada recebe cusparadas dos “emissários divinos) o que tem lhe valido proteção policial desde que denunciado o fato.

Papa Bento XVI

Na fúria religiosa que parece vai ser o centro do debate eleitoral nos EUA, mesmo disfarçada em temas políticos, econômicos, sociais e militares, com toda a certeza vai sobrar para o líder nazista que governa o Vaticano, Bento XVI. A pedofilia deve ser um dos alvos da “direita cristã” e grupos não cristãos.

No fundo o que é interessa aos que controlam o complexo ISRAEL/EUA TERRORISMO S/A é manter intactos e sempre crescentes os arsenais para ações como a contra a Líbia. Destruir para depois “reconstruir”. O resto é adereço, um prolongamento do BBB que a GLOBO vai impingir aos brasileiros até o dia da eleição. Haja William Waack, haja Miriam Leitão.

Lá como cá a praga da religião como instrumento político se mantém intacta e se alastra cada vez mais, mesmo depois de Billy Graham ter ascendido aos céus.