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segunda-feira, 15 de outubro de 2012

O TRATADO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA RIO+20

Por Zilda Ferreira


Hoje é dia do mestre. Para homenagear os professores que sonham o mesmo sonho de Moema Viezzer reproduzimos a entrevista que essa grande educadora concedeu à jornalista Zilda Ferreira, durante a Rio+20.


O sonho de Moema Viezzer de conquistar corações e mentes à causa ambiental, para promoção do desenvolvimento sustentável emancipatório com cidadania plena, tocou muitos dos participantes que estiveram presentes nas atividades de lançamento da Rede Planetária do Tratado de Educação Ambiental.



Tornar esse sonho realidade é a meta dessa incansável professora, pesquisadora, indicada ao prêmio Nobel da Paz em 2005 e autora do famoso livro “Se Me Deixam Falar” traduzido em vários idiomas. Ela nasceu há 74 anos, em Caxias do Sul.

Durante o evento, perguntamos a Moema Viezzer se não estava na hora de promover uma atualização do Tratado, que é de 1992 e foi coordenado por ela. Respondeu: “Ele é muito atual e o importante é implementá-lo de fato” - depois de um breve silêncio – “Isso... É tudo que gostaria de ver antes de morrer”...

Quais foram os pontos positivos da Rio+20 e quais foram os negativos?

 MV - Com certeza um dos pontos positivos foi a própria realização da Rio+20 . Para não deixar cair no esquecimento tudo o que já foi prometido, correto?
Também me pareceu muito importante o crescimento da consciência ambiental visível nas posições colocadas pela sociedade civil.
Quanto aos pontos negativos, houve vários no processo de preparação, especialmente naqueles que se apresentavam como "novas tentativas de aproximação entre governos sociedade civil”, não entendido como tal tanto de um lado como de outro. E como sempre, o "peso imenso" da máquina, da estrutura que a ONU carrega e a forma de trabalhar que é lenta, muito lenta, por necessitar o consenso de governantes de 194 países, com posições tão diferenciadas.
Acho que também foi negativo não termos alguns compromissos dos governos mais propositivos em relação a tantos objetivos já traçados anteriormente.

Por que o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, que foi aprovado na ECO-92, sob sua coordenação, considerado um documento de vanguarda e uma ferramenta para conscientização ambiental não é conhecido e nem divulgado?

MV - O Tratado de EA não teve a divulgação necessária por falta de condições do grupo que o promoveu na Rio+20. Diferentemente da Carta da Terra que contou desde o início com forte apoio até de Maurice Strong que presidiu a II Conferencia das Nações Unidas em 92. No Brasil ele foi, sim, amplamente divulgado nas redes de educadoras e educadores socioambientais e inclusive tornou-se a base e a inspiração de nossa atual política nacional de educação ambiental. Em alguns outros países ele esteve em pauta na revisão de redes de alfabetização e de educação de adultos, como na Ásia e Pacífico do Sul. Na América Central o Tratado tem sido bastante divulgado, particularmente em El Salvador. E houve também uma aproximação com a CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) que agora está sendo retomada. Mas uma divulgação em âmbito planetário requer muita sinergia e também recursos básicos para se chegar a todos os lugares e todos os idiomas possíveis, o quê agora nós estamos propondo principalmente por podermos utilizar as redes sociais.

Na Rio+20 houve maior participação popular, maior engajamento da sociedade civil, dos movimentos sociais, muitas cobranças das ONGs e dos empresários. Mas, nenhum documento ou tratado determinante foi apresentado no final do evento. Por que?

MV - De fato, a Rio+20 não foi concebida como uma Conferência deliberativa, o que não levou a esta conclusão que você chama de tratado determinante. Mas houve outra forma de influir nas políticas públicas de todos os países, com o slogan da Economia Verde, que permeou as decisões tomadas em diversos âmbitos, independentemente de novos textos. E é sobre isto que as organizações da sociedade civil se debruçaram: "nós não queremos uma economia verde que ignore as cores da sociobiodiversidade existente no planeta" Queremos pensar em economias verdes a partir das realidades locais com seus respectivos atores sociais,com mercados verdes locais, regionais, nacionais, internacionais que levem em consideração o que está no coração da crise de valores que vivemos: a do capital hegemônico que no atual estado da globalização é, efetivamente, como costuma dizer Frei Betto, um processo de globocolonização. É isto que não queremos. Olha o que aconteceu com o golpe sofrido por nossos irmãs e irmãos do Paraguai logo agora pós a Rio+20 e veja a conexão direta com a Multinacional Monsanto. É isto que tem que ser revisto se queremos que a vida floresça neste planeta para o benefício de toda a comunidade de vida e não de uns poucos que se enriquecem desmesuradamente enquanto a maioria da população, por conta deste modelo insano, se empobrece e sofre cada vez mais juntamente com os demais seres da comunidade de vida afetado pelos produtos químicos utilizados.

Durante a Rio+20 a senhora coordenou o lançamento da Rede Global de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global, ou seja, uma proposta de ação para que as pessoas conheçam e implementem esse Tratado. Há como motivar os educadores e comunicadores para que esse esforço feito durante o evento não padeça?

MV - Estamos agora virando a página da Jornada para Rede Planetária. Nosso maior desejo é que a proposta implícita no título do Tratado "Educação para Sociedades Sustentáveis (com S) e Responsabilidade Global chegue a tornar-se parte nova cultura e da nova educação que precisamos para o mundo que queremos com justiça social e ambiental. E para tanto, é evidente que a motivação de educadores e educadoras, assim como de comunicadores e comunicadoras podem fazer a diferença. Na educação formal, não formal, informal, presencial e à distancia... somos todos aprendizes e educadores. E os meios de comunicação podem e devem tornar-se CANAIS de intercomunicação para que a vida floresça neste planeta.

A senhora que escreve muito, autora do famoso livro "Se Me Deixam Falar" pesquisadora social e sonha ver 180 milhões de brasileiros educados ambientalmente - exercendo cidadania plena -, qual seria o seu apelo à sociedade brasileira para atingir essa utopia?

Repito o que o Tratado sugere: independentemente de nossa formação acadêmica, de nossa idade, sexo, cor, religião, opção o política e de nossa atuação nas organizações sejam elas da sociedade civil, das empresas ou dos governos... Vamos tratar, com urgência de "ascender à condição de aprendizes da sustentabilidade". A Mãe Terra já deu vários recados: o tempo de rever nossos padrões de produção e consumo é agora. E se nós pessoas adultas não mudarmos radicalmente nosso modo de vida marcado pelo consumo materialista, sem respeito aos seres humanos e dos demais seres que compõem a comunidade de vida... Que possibilidades temos de falar em gerações futuras? Nem planeta haverá para elas... A educação socioambiental precisa definitivamente extrapolar os bancos da escola e entrar para a escola da vida. Todo e qualquer espaço habitado pode tornar-se um espaço onde aprendemos a ser sustentáveis: uma fábrica, uma farmácia, uma padaria, um sindicato, um clube, uma igreja, uma escola, uma universidade, uma nascente de rio, um parque... Tudo é lugar para aprender a ser sustentável. E como se costuma dizer na Universidade Brtahma Kumaris: "quando um ser humano se transforma... ele transforma o mundo ao seu redor". O sonho é este mesmo: De um em um, de muitos em muitos, chegar milhões de cidadãos e cidadãs do Brasil exercendo cidadania plena no âmbito local-planetário.

No final da entrevista Moema Viezzer destacou:

M.V - Acho que não toquei no ponto essencial do negativo da Rio+20. Penso que um dos grandes problemas atuais é a forma como as grandes corporações - até para sobreviverem - estão pretendendo "esverdear" a economia. Como bem assinalou Vandana Shiva em uma entrevista à Folha de São Paulo: "não podemos esverdear a besta". Isto é muito forte e bem real. A economia tem que voltar ao seu devido lugar e estar a serviço da sociedade e do meio ambiente e não ao inverso. Esta pirâmide tem que ser invertida, conforme sugere o conceito de sustentabilidade implícito nos princípios da Carta da Terra e do Tratado de Educação Ambiental.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Economia verde divide a Ásia

28/6/2012 - por Marwaan Macan-Markar, da IPS (Inter Press Service)
extraído do site Envolverde

Bangcoc, Tailândia, 28/6/2012 – A cúpula Rio+20 fez ressaltar o descontentamento de ativistas e de alguns governos da Ásia com os conceitos de “economia verde” e “crescimento verde”, considerados uma fachada para manter um modelo que depreda os recursos naturais.

A Comissão Econômica e Social para a Ásia e o Pacífico (Cespap), agência regional da Organização das Nações Unidas (ONU) integrada por 58 países, é favorável a empregar esses enfoques, mas gigantes como China, Índia, Irã e Rússia são contra.

A economia verde promove transformações nas formas de produção e de consumo para atender as problemáticas ambientais, mediante a inovação tecnológica e atribuindo valor econômico aos bens naturais. Ativistas afirmam que este enfoque só reforça o atual modelo de desenvolvimento, baseado na produção e no consumo excessivos. Esta divergência ficou evidente nos dias finais da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), realizada este mês no Rio de Janeiro.

O embaixador chinês na Tailândia, Guan Mu, publicou no dia 21 uma longa coluna no jornal The Nation, de Bangcoc, destacando a importância do desenvolvimento sustentável, mas evitando sempre usar conceitos como “economia verde” ou “crescimento verde”. “A China não só encontrou o caminho para um desenvolvimento sustentável adequado às suas condições nacionais, como fez importantes contribuições ao desenvolvimento sustentável em todo o mundo”, afirmou. “A China está disposta a fortalecer a cooperação e a unir esforços com outras partes para fazer mais contribuições ao desenvolvimento sustentável global sob o princípio de responsabilidades comuns mas diferenciadas”, destacou.

No dia anterior, em Manila, ativistas liderados pela Kalikasan, uma rede de grupos ambientalistas com sede nas Filipinas, protestaram diante da embaixada dos Estados Unidos contra a economia verde porque “enriquece as corporações”. “Nós, o povo, a quem não permitem falar na Rio+20 e que vemos nossos direitos pisoteados, não nos calaremos”, afirmou durante o protesto a secretária-geral da Asia Pacific Research Network, Lyn Pano. “Fortaleceremos nossas fileiras e lutaremos de forma constante” para rechaçar a economia verde, enfatizou.

Enquanto isso, o discurso da Cespap na Rio+20 sugeria que os países da Ásia e do Pacífico estavam a favor de adotar a economia verde em seus planos. “Estamos satisfeitos pelo fato de as políticas da economia verde serem reconhecidas como uma ferramenta importante para o desenvolvimento sustentável e para a erradicação da pobreza”, afirmou a secretária-executiva da agência, Noeleen Heyzer, durante uma reunião de alto nível.

A pressa das agências da ONU, incluindo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), para adotar as políticas de economia verde ignora temores asiáticos de que “sejam usados para prejudicar o marco aceito de desenvolvimento sustentável”, alertou Shalmali Guttal (foto ao lado), pesquisadora principal do centro de estudos Focus on the Global South, com sede em Bangcoc. “Preocupa que esta seja uma tentativa dos países industrializados, os maiores poluidores do mundo, para imporem o protecionismo verde no mercado internacional”, declarou Guttal à IPS.

As nações em desenvolvimento da Ásia têm uma razão para estarem nervosas, porque este é outro esforço dos países industrializados de evitar os compromissos que assumiram de ajudar as nações do Sul a cumprirem suas metas de desenvolvimento”, ressaltou.

Os órgãos da ONU deveriam ouvir o povo, a que, supõe-se, estão ajudando”, acrescentou.

Os desacordos entre a Cespap e alguns governos da região sobre economia verde já havia ficado evidentes na sexta Conferência Ministerial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da Ásia e do Pacífico (MCED-6), realizada no Cazaquistão em outubro de 2010. O comunicado de imprensa final desse encontro teve que ser reformulado. China, Índia, Irã e Rússia objetaram a expressão “economia verde” que tinha um grande destaque no texto e inclusive no título. O comunicado a mencionava como a estratégia apoiada pelos ministros asiáticos. A Cespap foi obrigada a divulgar novo comunicado de imprensa identificando o crescimento verde como “um enfoque (a mais) de desenvolvimento sustentável”.

Para um diplomata asiático em Bangcoc que pediu para não ser identificado, “este é um tema que se tornou polêmico. A partir de então, fiscalizamos a forma com a Cespap emprega os termos crescimento verde e economia verde sem seus documentos”, contou.

No âmbito interno, a maioria dos países contribui para o desenvolvimento de alternativas baixas em carbono e investimentos em tecnologia verde. Contudo, resistimos a sermos pressionados para apoiar a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável”, afirmou o diplomata.

A Cespap estava, de fato, na vanguarda do debate sobre crescimento verde, reconhecendo-o como uma alternativa de desenvolvimento sustentável. O conceito foi promovido na MCED-5, realizada na Coreia do Sul, em 2005. Três anos depois, após a crise financeira de 2008, muitos outros também apoiaram o conceito de economia verde, desde o Pnuma até o Grupo dos 20 países industrializados e emergentes.

Os países asiáticos enfrentam a restrição de recursos, o preço do combustível sobe e isto é um impedimento ao seu desenvolvimento”, afirmou Rae Kwon Chung (foto ao lado), diretor de meio ambiente e desenvolvimento da Cespap. “A pobreza não pode ser erradicada sem se resolver essa falta de recursos. As recentes crises energética e alimentar devem desatar uma grande mudança. Os países em desenvolvimento requerem um sistema energético distinto. A economia verde é uma das estratégias para pôr em prática o desenvolvimentos sustentável”, explicou à IPS.

A necessidade dessa mudança é evidente quando se observa que para produzir um dólar a região consome três vezes mais recursos naturais do que o resto do mundo, segundo informe da Cespap divulgado pouco antes da Rio+20. Muitas economias da Ásia e do Pacífico são importadoras de recursos e matérias-primas e sensíveis às altas de preços. Em 2011, as altas dos alimentos e do petróleo afundaram na pobreza 42 milhões de pessoas, enquanto no ano anterior 19 milhões haviam tido a mesma sorte.

Grandes nações, como China e Índia, e outras menores, como Camboja e Vietnã, são elogiadas no informe por adotarem programas para “reverdecer suas economias”.

No entanto, as maiores economias regionais erguem uma bandeira vermelha quando o crescimento verde é colocado em outro contexto, como uma nova receita internacional e vinculante para o desenvolvimento sustentável do Sul global.

Isto continuará sendo um tema de divisão e as sessões da Cespap vão refletir isso. Alguns governos já disseram basta”, afirmou a fonte diplomática.

Envolverde/IPS
Fonte:
http://envolverde.com.br/ips/inter-press-service-reportagens/economia-verde-divide-asia/?utm_source=CRM&utm_medium=cpc&utm_campaign=28

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Recursos naturais e dois mundos distintos

[Equipe Educom: optamos por colocar juntos esses dois artigos. Queremos mostrar ao leitor as maneiras distintas com que o mundo do capital das grandes corporações e a sociedade civil de ambientalistas, ecologistas e ativistas sociais se posicionam diante dos recursos naturais. De um lado a proposta de uma chamada "economia verde" que não esconde que tais recursos são um "capital natural ou fundamental", algo intrinsicamente associado a ideia de que são componentes de um patrimônio empresarial pelo qual é preciso zelar, desde que tal zelo não impacte a maximização do lucro, objetivo maior - sempre bom lembrar - de qualquer empreendimento capitalista.

Do contrário é explorá-lo até a exaustão, como fazem com as minas e com tudo o mais onde a escassez é a alavanca que valoriza a mercadoria e torna os ganhos mais robustos. Do outro a convicção de que a água, as florestas, o ar, as terras, a biomassa do planeta, sua biodiversidade enfim, são um direito, um bem comum do ser humano. Tais recursos finitos jamais deveriam ser propriedade de uma minoria que os explora em causa própria, conduz ao colapso ambiental pelo qual passamos e em momento algum contempla a melhor distribuição da riqueza, a eliminação da pobreza, uma equidade social enfim que associada a uma responsabilidade ambiental promova o desenvolvimento sustentável em outras bases, como almejam os opositores das soluções mercadológicas.

Assim o olhar de nossa Equipe se volta, não para o Rio Centro, mas para o Aterro do Flamengo, onde se pode ouvir a voz do bacharel em Ecologia e especialista em Gestão Ambiental Felipe Patela Amaral quando afirma que a força está nos locais de discussão promovidos pela sociedade civil. “É de lá que podem surgir as soluções. É ali que deve estar o foco dos meios de comunicação para que o tema ambiental tome a amplitude e maturidade necessária, ou que pelo menos os afetados pelos processos de exclusão socioambiental sejam ouvidos, colocando em descrédito as soluções de mercado”.]
 
 
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19/6/2012 - Setor financeiro abre as portas para o capital natural
por Fabiana Frayssinet, da IPS - Envolverde Rio + 20
 
Rio de Janeiro, Brasil, 19/6/2012 (TerraViva) – Diretores do setor financeiro de todo o mundo assumiram o compromisso de incorporar o conceito do “capital natural” em seus produtos e serviços, para defender um patrimônio que, segundo interpretam, tem que ter um preço para impedir maior devastação.

A Declaração do Capital Natural foi assinada por 37 máximos representantes de instituições bancárias, de seguros e de investimentos de 13 países, durante o Fórum Corporativo Sustentável, promovido pelas Nações Unidas como uma das atividades paralelas à Rio+20. A declaração sobre o capital natural é promovida pela Fundação Getulio Vargas (FGV), pela Iniciativa Financeira do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e pela Global Canopy Programme.

O objetivo é entender e fazer entender que “ativos” como a água, o ar, o solo e as florestas são um “capital fundamental”, e como eles afetam os negócios das empresas, explicou à IPS Roberta Simonetti, coordenadora do Programa de Financiamento Sustentável da FGV. Em uma segunda instância as instituições se propõem a implantar uma metodologia para incorporar estes ativos nos produtos e serviços. Depois será preciso estabelecer como refletir o impacto nos informes de risco e, finalmente, como contabilizá-lo, detalhou.

Simonetti recordou que o termo “capital natural” foi “emprestado” do mundo econômico, afirmando que, da mesma forma que um investidor quer preservar seu patrimônio e viver do ganho que este lhe gera, o desafio é não depredar recursos naturais para obter um benefício disso. “O que propomos é construir coletivamente uma metodologia que ainda não foi criada. Contudo, ao aderir à declaração reconheço a importância do capital natural, reconheço que tentarei entender os riscos, como me impactam, como informá-lo e como calculá-lo”, resumiu Simonetti.

Simonetti destacou que há empresas que já avaliam ecologicamente seus negócios, por seu próprio interesse empresarial. “O ideal seria que todos fôssemos altruístas, que reconhecêssemos que estamos usando mais do que devemos, dilapidando o patrimônio do planeta, que aceitássemos que não queremos aumentar a produção”. Porém, existem interesses diversos e isso não é possível, ponderou.

Por outro lado, prevalece o conceito empresarial. A especialista deu o exemplo de uma empresa de bebidas em uma região onde não há disponibilidade hídrica, e por isso não pode continuar seu negócio. A única alternativa para continuá-lo será pensar em como colaborar para manter os mananciais e o patrimônio hídrico, indicou. No entanto, organizações sociais participantes da Cúpula dos Povos criticam este modelo.

Especialistas como Larissa Packer, da organização Terra de Direitos, temem que, ao se atribuir um valor financeiro a um recurso natural, em lugar de cumprir sua função de conservar a natureza, se estimule a depredação porque, segundo essa lógica, quanto mais escasso um bem mais ele vale. Simonetti, por seu lado, considerou “mal-entendido” esse conceito. “Não é vender a natureza. É entender que, como um serviço ecossistêmico, tem um valor e que, por exemplo, se um fazendeiro conservar a floresta, tem que ter uma compensação para sobreviver sem cortá-la”, argumentou a especialista da FGV.

Em entrevista à IPS, Marcelo Cardoso, vice-presidente da Natura, uma multinacional brasileira de cosméticos, pioneira na produção sustentável no país, considera necessário e importante a discussão, mas tem reparos. “Como os recursos naturais são um bem comum, me parece fundamental a valorização dos serviços ambientais e dos ecossistemas. Entretanto, me parece que ainda temos que discutir limites e marcos legais”, alertou. Nesse sentido, Cardoso entende a preocupação das organizações sociais sobre esses ativos.

Existem sistemas como água, como a questão dos resíduos, que se não colocarmos limites claros à utilização, à necessidade de buscar ciclos fechados, à necessidade de sistemas fechados de água, e se só for feita uma avaliação sobre os serviços ambientais e seu uso, terminaremos criando mais devastação e destruição do que o que queremos construir”, ressaltou.

Ricardo Villaveces, da Confederação Cafeeira da Colômbia, que também participou do Fórum, afirmou à IPS que aprova a decisão. “Na medida em que os ativos ambientais tenham valor, tudo o que vamos cuidar vamos conservar mas também vamos nos beneficiar deles, porque parte da questão é que é preciso obter uma renda pelos serviços ambientais”, enfatizou.

Fonte: Envolverde/IPS
http://envolverde.com.br/noticias/setor-financeiro-abre-portas-para-o-capital-natural/?utm_source=CRM&utm_medium=cpc&utm_campaign=19


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19/6/2012 - Economia Verde - Steiner e Cúpula dos Povos se chocam quanto à economia verde
por Fabiana Frayssinet, da IPS


 Rio de Janeiro, Brasil, 18/6/2012 (TerraViva) O diretor-executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), Achim Steiner, acredita que ele a Cúpula dos Povos coincidem quanto ao atual modelo econômico ter causado o colapso ambiental. Porém, o diálogo sobre como substituí-lo se transformou em áspero debate.

O encontro com Steiner foi o mais esperado da Cúpula dos Povos: um alto representante da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, se deslocou para o outro lado da cidade, até a sede da reunião da sociedade civil no Aterro do Flamengo, para discutir com ecologistas e ativistas sociais sobre economia verde.

A economia verde é proposta como uma grande transformação dos modelos de produção e consumo para deter a contaminação e o esgotamento dos recursos naturais. Entretanto, para os movimentos sociais, não é mais do que outra cor para disfarçar o capitalismo.

A Cúpula dos Povos é crítica da economia verde, porque os povos é que sofrem a crise do capitalismo e desse modelo de produção que quanto mais se agrava mais avança sobre nossos direitos”, afirmou de início a brasileira Fátima Mello, uma das organizadoras do encontro.

"Entendemos que a economia verde, que se baseia na mercantilização de bens naturais, está estreitamente ligada a uma economia marrom”, de contaminação e depredação, disse a também brasileira Larissa Packer, da organização Terra de Direitos.

A verdadeira “economia verde não é o dólar verde, como a veem os governantes. É a nossa Amazônia verde”, defendeu o indígena boliviano Edwin Vásquez, que acusou as corporações transnacionais de invadirem e saquearem os recursos naturais.

Por sua vez, o argentino Juan Herrera, da rede internacional Via Camponesa, propôs um modelo de “economia popular, solidária e camponesa” que substitua o atual grande agronegócio, pois este “gerou verdadeiros desertos de soja e milho onde os camponeses já não têm um lugar”.

Diante desses pronunciamentos e críticas, Steiner, um especialista em políticas ambientais, se confessou “surpreso”. “No Pnuma estabelecemos que o modelo econômico atual não é o modelo do futuro. Estamos de acordo com vocês nisso”, afirmou, orientando os participantes a “lerem o documento oficial desta agência das Nações Unidas que aborda as diferentes interpretações sobre economia verde".

Sem seus habituais terno e gravata, Steiner explicou que o “fracasso” de não se ter evitado a degradação natural “tem a ver com o modelo econômico do mundo que trata o planeta como mineração: extrair, extrair e extrair”.

E quase adotou a mesma linguagem que a plateia adversária, ao se declarar crítico da “capacidade do mercado de alcançar o desenvolvimento sustentável”, e especificou: um mercado baseado, como se fosse uma “lei da física”, na livre oferta e demanda.

O atum de barbatana azul vale hoje no mercado US$ 4 mil. Por isto, as empresas poderiam capturar até o último exemplar”, deu como exemplo para justificar que o “mercado não ajuda a administrar o planeta de forma sustentável”.

As diferenças surgiram ao se buscar opções a esse modelo. Entre outras propostas, Steiner propôs atribuir um valor econômico ao ecossistema, para promover “leis que protejam a natureza ou negócios que não sejam destrutivos”.

Também se referiu a novas tecnologias “boas e possíveis”, como as energias limpas e renováveis, que não gerariam desemprego, porque, pelo contrário, “dão mais empregos do que a indústria automobilística”.

Seus argumentos não convenceram o especialista em biodiversidade Pat Mooney. Este canadense citou tecnologias danosas propostas pela economia verde, como a biologia sintética, que modifica micro-organismos, ou o desenvolvimento de variedades transgênicas, que concentrou o controle das sementes em um punhado de multinacionais.

Mooney se disse espantado por uma economia verde que agora busca controlar a biomassa do planeta. Tampouco o embaixador da Bolívia perante a Organização das Nações Unidas (ONU), Pablo Solón, ficou convencido, acusando Steiner de “não ter sido honesto”.

Por trás desse conceito está o assumir que a natureza é um quintal”, enfatizou Solón elevando a voz, e afirmou que “não estamos inventando isso”, que está no rascunho em discussão pelos governos na Rio+20.

Steiner “disse que buscam desacoplar o crescimento com a deterioração ambiental. Não se pode crescer eternamente, o limite é a biodiversidade! O que necessitamos é redistribuir a riqueza!”, polemizou.

Não por ter elevado o tom de voz e o da plateia, tudo o que você disse é correto”, respondeu Steiner. Nessa polarização entre capitalismo e anticapitalismo “o mundo não avançará”, ressaltou ao argumentar o difícil que é conseguir consenso entre todos os Estados-membros da ONU.

Propor uma economia verde sem regulamentar o mercado financeiro causará o contrário da conservação: “uma bolha financeira imprevisível”, apontou Packer ao TerraViva. “Quando há escassez de uma mercadoria, seu valor sobe. Portanto, quanto mais se destruir a natureza, maior será o valor dos ativos naturais”, alertou.

* Publicado originalmente no site TerraViva.

Fonte: IPS/TerraViva
http://envolverde.com.br/ips/inter-press-service-reportagens/steiner-e-cupula-dos-povos-se-chocam-quanto-economia-verde/?utm_source=CRM&utm_medium=cpc&utm_campaign=19

terça-feira, 19 de junho de 2012

Na Cúpula dos Povos, Marchas para deixar marcas

18/06/2011 - Marcha das Mulheres reúne 8 mil pessoas no Rio de Janeiro
da Agência Pulsar - site do MST

A Marcha das Mulheres foi realizada na manhã hoje (18) [ontem] no Centro do Rio de Janeiro e reuniu cerca 8 mil pessoas de várias partes do mundo.

Este foi o primeiro ato público realizado dentro da Cúpula dos Povos, evento paralelo à Rio+20.

A manifestação reuniu mulheres e homens do campo e da cidade para lutar contra a desigualdade de gênero, o racismo e todas as formas de preconceito. As feministas defenderam a mudança do atual modelo econômico, que, segundo elas, aprofunda as desigualdades e que coloca as mulheres em um regime de submissão e muita pobreza.

A representante da Via Campesina Internacional Marta Cecília afirmou que as mulheres estão na luta pela defesa da “Mãe Terra”, da soberania alimentar, agroecologia e pela reforma agrária. A campesina fez um chamado pela união latino-americana.

Graciela Rodrigues

A integrante da Marcha das Mulheres Graciela Rodrigues alertou para a importância dos temas que estão sendo discutidas na Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20). No entanto, de acordo com ela, as propostas apresentadas na conferência não garantem um futuro melhor para o planeta.

Durante a marcha um grupo de mulheres ocupou a sede do Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O grupo questiona a atuação do banco que tem realizado diversos investimentos em atividades consideradas de grande impacto social e ambiental como: produção de etanol, construção de hidrelétricas e monocultivos.

Mais fotos: http://mstrio.casadomato.org/marcha-das-mulheres-na-cupula-dos-povos-rio-2012/
 
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19/06/2012 - Manifestação denuncia retrocessos socioambientais do governo
Brasil de Fato - redação
 
Cerca de duas mil pessoas saíram às ruas dos Rio de Janeiro para protestar contra as contradições desenvolvimentistas do governo Dilma
 
Nesta segunda-feira (18), cerca de duas mil pessoas saíram às ruas do Rio de Janeiro para denunciar os retrocessos socioambientais do governo Dilma. Diante do falso discurso de progresso levado pelo Brasil à Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a manifestação, chamada de Marcha à Ré da Rio +20, teve como objetivo protestar contra a presidenta Dilma Rousseff, apontando suas contradições desenvolvimentistas que retrocederam à agenda socioambiental.
 
Segundo a organização da manifestação, mesmo com toda a mobilização nacional pelo “Veta, Dilma”, a presidenta não atendeu aos pedidos da população de vetar integralmente o texto que altera o Código Florestal, "incitando o desmatamento e a impunidade". Além disso, a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte é marcada pelo desprezo às regras de licenciamento, às condicionantes ambientais e à necessidade de consulta à população indígena afetada.

"A gestão atual reduziu ainda as unidades de conservação, o poder de fiscalização do Ibama e a regularização fundiária, o que resultou no aumento da violência no campo", disse em nota a coordenação da manifestação. Nesse sentido, a marcha critica o atual modelo de desenvolvimento do país e encontra embasamento na declaração feita pelos próprios funcionários do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Instituto Chico Mendes e Ministério do Meio Ambiente que, recentemente, denunciaram as pressões que sofrem do governo federal.

O protesto integra a campanha "Rio+20: Dilma, com que cara você chega?", uma ação articulada pelo Brasil Pelas Florestas, de São Paulo (SP); Comitê Fluminense em Defesa das Florestas, do Rio de Janeiro (RJ); e Comitê Universitário em Defesa das Florestas, de Brasília (DF).

"Os três movimentos sociais são pacíficos, apartidários, sem vínculos com instituições ou empresas, e representam brasileiros conscientes e mobilizados por um país que vá além do discurso e parta para uma real política de sustentabilidade", explicou a organização da campanha em nota. (do Brasil pelas Florestas)
 
Fonte: http://www.brasildefato.com.br/node/9848
Fotos: Fora do Eixo/CC

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Deixem tudo na Mãe Terra

11/06/2012 - por Stephen Leahy (*) para o Terramérica
extraído do site Envolverde (Rio + 20)

Uma caravana indígena levará à cúpula Rio+20 o “bem viver” – equilíbrio entre as comunidades humanas e a natureza – como remédio para as crises ambiental e econômica.

Moi Enomenga, antes de entrar no ônibus em Quito, Equador, ponto de partida da caravana até o Rio de Janeiro. Foto: Cortesia Moi Enomenga.










Uxbridge, Canadá, 11 de junho de 2012 (Terramérica) - Delegados indígenas da América do Sul se integram, a pé, em lanchas ou ônibus, à Caravana Kari-Oca, que os levará à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, onde esperam interpelar os governantes do mundo. “Representaremos milhares de comunidades aborígines da América do Sul”, disse ao Terramérica o líder huaorani Moi Enomenga, momentos antes de tomar em Quito o ônibus que demorará nove dias para chegar ao Rio de Janeiro, sede da Rio+20.

Outros dirigentes indígenas se unirão a eles durante a viagem. Os huaoranis são um povo amazônico que habita o leste do Equador, em uma área de exploração petrolífera. A Rio+20 se apresenta como um espaço intergovernamental para adotar soluções para a crise mundial de sustentabilidade, que se manifesta no reiterado fracasso da economia globalizada, na carestia de alimentos, nos problemas energéticos e nos males ambientais globais, como a mudança climática e a perda de biodiversidade.

Nós, indígenas, estivemos divididos durante anos. Agora vamos nos unir”, declarou Moi, que nasceu em uma comunidade sem contato com o mundo ocidental, ou em isolamento voluntário, e atualmente preside a Associação Quehueri’ono. “Nem todos podem ouvir a voz que chega da Mãe Terra vinda da selva, e queremos levar essa voz ao Rio”, acrescentou. De 14 a 22 deste mês acontecerá a Cúpula Mundial dos Povos Indígenas sobre Territórios, Direitos e Desenvolvimento Sustentável na aldeia Kari-Oca II, especialmente construída por indígenas brasileiros a cinco quilômetros da sede da conferência oficial.

Kari-Oca” é uma palavra tupi-guarani que significa “casa de branco”. Assim se referiam os indígenas da região onde hoje se encontra a cidade do Rio de Janeiro às primeiras urbanizações dos colonizadores portugueses. Daí a palavra “carioca”, gentílico dos habitantes do Rio, onde há duas décadas aconteceu o encontro na primeira aldeia Kari-Oca, paralela à Cúpula da Terra de 1992. O Comitê Intertribal do Brasil, organizador do encontro, prevê a participação de aproximadamente 600 indígenas de todo o mundo, que prepararão uma mensagem e recomendações para o encontro de alto nível da Rio+20, que ocorrerá entre os dias 20 e 22.
Hortencia Hidalgo Cáceres

A situação dos povos indígenas no mundo me preocupa”, ressaltou Moi. Em todas as partes, os governos ignoram seus direitos. E em todas as partes, Índia, África, América do Sul, estão à caça do petróleo e de outros recursos, acrescentou. Hortencia Hidalgo Cáceres, uma aymara chilena que integra a Rede de Mulheres Indígenas sobre Biodiversidade da América Latina e do Caribe, afirmou ao Terramérica que “é necessária uma mudança real. Queremos convidar o mundo para um futuro mais brilhante, baseado nos valores e princípios indígenas do bem viver”.

Oposto à ideia ocidental de “viver melhor” – o crescimento econômico traz consigo o progresso e este leva à eliminação da pobreza –, o bem viver propõe o equilíbrio e a cooperação entre as comunidades humanas e sua integração com a natureza, da qual se retira o necessário para uma vida digna, sem o afã de acumular. Por outro lado, a “economia verde”, que muitas nações querem plasmar no documento final da Rio+20, representa uma “falsa solução” para a crise de degradação ambiental e injustiça social, ponderou Hortencia.

Para Casey Box, coordenador de programas da organização não governamental Land is Life (Terra é Vida), “os povos indígenas têm muito a oferecer à comunidade internacional, que tenta abrir caminho para um desenvolvimento verdadeiramente sustentável”. A Land is Life, com sede nos Estados Unidos, é uma coalizão internacional de comunidades autóctones que arrecadou fundos e ajudou a coordenar a caravana e a cúpula. Segundo Casey, “será impossível alcançar os objetivos da Rio+20 sem os conhecimentos tradicionais e as práticas de manejo de recursos dos indígenas”.

Estima-se que da Rio+20 participarão cerca de 50 mil pessoas, entre elas 130 chefes de Estado e de governo. Da antecessora, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1992, também conhecida como Cúpula da Terra, surgiram os três dos principais tratados ambientais: as convenções sobre mudança climática, biodiversidade e desertificação. Mais de 700 povos indígenas participaram da primeira cúpula Kari-Oca, em 1992, que originou um movimento internacional pelos direitos dos povos indígenas e colocou em evidência o papel dessas comunidades na conservação e no desenvolvimento sustentável.

Nos emociona ir ao Rio porque há um espaço para os povos indígenas, onde poderemos falar sobre nossas preocupações e compartilhar nossos conhecimentos e nossa experiência”, destacou Hortencia. Participantes procedentes da austral Patagônia chilena precisarão percorrer 60 horas de estrada até La Paz, na Bolívia, onde se reunirão com Moi e outros delegados que iniciaram a viagem no Equador, passando pelo Peru. A caravana Kari-Oca demorará cerca de cinco dias para percorrer o último trecho dos Andes e atravessar Bolívia, Paraguai e o sul do Brasil até chegar ao Rio de Janeiro, às margens do Oceano Atlântico.

Gloria Ushigua 

Os indígenas estão ansiosos para participar porque somente nessas reuniões internacionais é que têm a oportunidade de serem ouvidos pelos governantes e pelo público em geral, explicou Hortencia. “Quando voltamos para casa, essas portas estão fechadas”. Moi e os demais equatorianos esperam que os governos respeitem mais os direitos e pontos de vista de suas comunidades. “Perto de onde vivo existem duas comunidades não contatadas, mas estão ameaçadas pela exploração petrolífera, eles não a querem. Para eles, tirar petróleo do solo é como tirar o sangue de seus corpos”, apontou. Os delegados também esperam denunciar iniciativas governamentais que consideram nocivas.






Gloria Ushigua, presidente da Associação de Mulheres Záparas, afirmou que o Programa Sócio Floresta, do Ministério do Meio Ambiente do Equador para combater o desmatamento, causa muitos problemas para as comunidades locais. A nação zápara habita o leste da província de Pastaza, no oriente amazônico equatoriano. “Tenho a esperança de compartilhar a história da minha comunidade e de debater sobre os direitos territoriais”, manifestou Gloria em um comunicado.

Celso Aranda

Na caravana também viaja Celso Aranda do povo kichwa de Sarayaku, outro território de Pastaza, que na cúpula apresentará a proposta “Kawsak Sacha” (Floresta Vivente). Esta será a resposta do Sarayaku à mudança climática e à destruição da natureza, e detalhará a forma como as comunidades nativas podem proteger os ecossistemas, mantendo práticas ancestrais de manejo da terra.

Vamos continuar trabalhando para fortalecer nossas culturas e resistir à exploração de nossos territórios. Temos uma mensagem muito clara. Deixem tudo sob a terra”, resumiu Moi.


(*) Correspondente da IPS (International Press Service)

http://envolverde.com.br/ambiente/rio20-ambiente/terramerica-deixem-tudo-na-mae-terra/?utm_source=CRM&utm_medium=cpc&utm_campaign=11

domingo, 10 de junho de 2012

Rio+20 e justiça ambiental: por uma economia política do meio ambiente

Sérgio Ricardo (*)
extraído do Jornal dos Economistas - Edição de maio/2012

Do ponto de vista diplomático e propriamente ambiental, é possível esperar que ocorra um grande fracasso político na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, que acontecerá em junho na cidade do Rio de Janeiro.

Os principais países economicamente desenvolvidos, mesmo que atualmente estejam à beira da insolvência, e as corporações transnacionais, a exemplo do que ocorreu nas últimas Conferências sobre Mudanças Climáticas, não abrem mão de manter inalterado o modus operandi predatório e ambientalmente perverso de suas economias, exportadoras de poluição e degradação ambiental para os subúrbios do Império: os países periféricos pobres ou em desenvolvimento, cujas elites corrompidas e a falácia do discurso desenvolvimentista tratam de facilitar e muitas vezes financiam a instalação de megaempreendimentos sujos, poluentes e que fazem uso intensivo e privado de recursos naturais comuns, gerando “empregos verdesde qualidade duvidosa, inclusive como parte da estratégia adotada pela Europa e EUA para saírem da atual crise em que se encontram.

Ou seja: apesar dos discursos oficiais e corporativos por uma nova ordem econômica global ambientalmente sustentável, que chamam singelamente de “Economia Verde”, as instituições que há séculos – desde a Revolução Industrial – representam o status quo dominante não pretendem ceder um centímetro sequer em favor de uma verdadeira sustentabilidade social, ambiental e econômica, já que pretendem manter inalterado seu padrão capitalista de produção e consumo altamente predatório dos bens da natureza, e com isso preservar e multiplicar seus lucros, que têm levado a alta concentração de renda em favor de alguns poucos e desigualdades generalizadas por toda parte do planeta.

Os dados que são divulgados periodicamente são cada vez mais assustadores e colocam em xeque o atual modelo civilizatório: 40% da população mundial vive abaixo dos níveis de pobreza; 1 bilhão de pessoas atualmente vivem em áreas desertificadas, onde o acesso à água é escasso e a agricultura tornou-se inviável; e mais de 50 milhões de seres humanos são considerados pela própria ONU como “refugiados climáticosou “refugiados ambientais” segundo o movimento internacional de Justiça Ambiental. Soma-se a isso a incalculável perda de biodiversidade e de patrimônio genético oriundas da crescente extinção de espécies da fauna e flora e dos produtivos ambientes marinhos, que estimulam a lucrativa biopirataria. O Brasil, por sua riqueza ecológica, é uma das principais rotas mundiais deste verdadeiro mercado da rapinagem.

A crescente poluição dos oceanos e rios, além de representar ausência de compromisso efetivo em se promover investimentos massivos em saneamento ambiental – disposição adequada de lixo, água tratada, tratamento de esgotos e controle de inundações, em especial nas áreas mais pobres e vulneráveis, o que reduziria significativamente as altas taxas de mortalidade por doenças de veiculação hídrica, onde as crianças de famílias pobres são as principais vítimas –, também provoca perdas incalculáveis na produção de alimentos e ameaça de extinção de riquezas ecológicas ainda pouco conhecidas, onde podem repousar as soluções e curas que a humanidade tanto necessita.

Quando se discute meio ambiente hoje, inclusive as macromudanças climáticas que afetam e redesenham as cidades onde hoje em dia vive a maior parte da população do planeta, não é razoável deixar de fora do debate sobre as favelas, loteamentos e comunidades periféricas, aquelas que se encontram nas franjas das cidades: ou seja, o capitalismo atual está para as cidades hoje como estava para a indústria nos séculos XX e XIX.

O regime de acumulação da atual fase do capitalismo está organicamente vinculado às cidades e ao controle e exploração de seus fluxos e territórios. A mais-valia é então extraída de toda a produção social que tem hoje, nos territórios da cidade e não somente no chão da fábrica, seu lastro e capital fixo. Na lógica vigente da acumulação e do lucro exponencial, os bens comuns como água, solo e energia, entre outros, valem tanto ou mais que um vasto exército de mão de obra a ser explorada.
Os países desenvolvidos em geral não gostam de tratar nas negociações internacionais de temas considerados sensíveis para os detentores do poder, como transferência de tecnologias e direitos de acesso ao conhecimento e ao desenvolvimento tecnológico-científico, inclusive das novas tecnologias da informação, por parte das nações menos desenvolvidas. Ao mesmo tempo, incentivam o deslocamento de indústrias transnacionais poluidoras e de tecnologias sujas e obsoletas, que ainda consomem grande volume de água e de energia nos seus processos de produção e emitem elevadas taxas de poluentes e resíduos (lixo tóxico), que migram dos seus países de origem na Europa e EUA e buscam se instalar nos países menos desenvolvidos ou periféricos, configurando o que teóricos e movimentos sociais têm chamado de Racismo Ambiental, ou seja, a desigualdade socioambiental que se materializa nos territórios onde vivem as populações mais empobrecidas e vulneráveis.

Por aqui, estas empresas altamente poluidoras ainda por cima recebem fartos incentivos fiscais e benesses do setor público. Em geral contam com financiamento do BNDES, mas na verdade as promessas de empregos não se cumprem após a fase de instalação e obras estes megaempreendimentos industriais.

A exposição a riscos e a poluentes de tipologias diferentes por parte de trabalhadores (as) e das populações vizinhas a estes pólos industriais altamente poluentes ainda não é compatibilizada no PIB (Produto Interno Bruto) do país, nem muito menos consta dos “balanços sociais” ou da contabilidade financeira das grandes empresas.

Ou seja: O PIB cresce e os direitos da cidadania diminuem.

Não é a toa que o câncer e outras doenças ambientais se transformaram numa epidemia global, haja vista a excessiva exposição cotidiana a que estamos submetidos por meio de poluentes atmosféricos; a alimentação a base de venenos químicos como agrotóxicos e transgênicos; os meios de transportes estressantes, que numa cidade como o Rio de Janeiro consomem em média quatro horas por dia da vida do trabalhador; e a vulnerabilidade do abastecimento público das cidades, que juntos ameaçam e adoecem o corpo das pessoas, com impactos negativos na saúde coletiva.

A Conferência oficial não tratará em profundidade de nenhum destes importantes temas, todos de grande interesse para toda a humanidade, e que seriam assuntos necessariamente obrigatórios caso se desejasse que a Rio+20, de fato, servisse para começarmos a desconstruir a velha ordem capitalista e a construir uma nova sociedade mais igualitária, justa e democrática, assim como uma economia de fato mais limpa, menos poluente e que promova efetiva distribuição de renda.

Neste aspecto o encontro internacional de chefes de Estado, a ser sediado no Rio, será um retumbante fracasso anunciado, já que está deslocado da realidade social, o que deverá ser potencializado e visibilizado de forma inédita através das redes sociais e na mídia: sequer está prevista a definição de metas ambientais modestas que necessariamente deveriam fazer parte dos acordos multilaterais a serem firmados entre as nações durante o evento.

Conceitos como “governança global”, criação de “fundos ambientais” e “combate à pobreza”, bases de uma suposta economia verde” que na prática visa preservar intacto o regime de acumulação capitalista não deverão sair do papel, se limitando às declarações oficiais dos políticos e empresários, que quase sempre buscam demonstrar otimismo diante das câmeras de TV e contam para isso com o papel estratégico exercido pelas oligopólicas corporações de comunicação social, que contam e reproduzem a História na ótica do poder e das elites.

Diante das crises climática e ambiental e da insolvência da economia das grandes potências, fenômeno sem precedentes, o Brasil, atualmente considerado uma das maiores economias do mundo, tem um importante papel a desempenhar neste cenário, uma vez que é uma reconhecida potência ambiental, com sua imensa biodiversidade e mananciais de água.

Somos uma nação detentora de grandes riquezas minerais, solos férteis e diversificados, enorme volume de água doce e extenso litoral, biodiversidade abundante e rara. Destaca-se no jogo das nações o grande potencial de nosso país em se desenvolver nas áreas da ciência e tecnologia, comunicações e inovação, assim como as condições singulares de segurança energética, com a possibilidade de geração através de diferentes fontes de energias renováveis e menos poluentes. Soma-se a isso a reconhecida diversidade cultural e de manifestações artísticas de nosso povo, com sua criatividade, ritmos, sabores e beleza, que nos torna uma nação singulare plural, apesar de ainda lamentavelmente convivermos com histórico déficit de democracia participativa, baixos níveis de educação, fortes desigualdades regionais e bolsões de pobreza e de exclusão social.

Apesar disso, o PAC, símbolo maior da retomada econômica do país, tem servido basicamente para repassar dinheiro público em grande volume, via BNDES, para grandes
empreiteiras, bancos privados e fundos de pensão travestidos de “investidores” nacionais
e estrangeiros, seguindo o tradicional receituário neoliberal das Instituições Financeiras Multilaterais (FMIs).

É possível destacar o péssimo mau exemplo que o anfitrião, o Estado do Rio de Janeiro, mostrará ao mundo com seus impactantes megapolos de desenvolvimento industrial (de celulose no noroeste fluminense, siderúrgico na Baía de Sepetiba, petrolífero na Baía de Guanabara, portuário-industrial em Barra de São João e Campos, entre outros), onde os acelerados licenciamentos ambientais fast food” (ver blog http://), que se transformaram pedlowski.blogspot.com.br/num balcão de negócios em favor dos interesses econômicos de grandes empresas poluidoras e da especulação imobiliária predatória, e têm gerado um novo ciclo desenvolvimentista poluidor com formação de passivos socioambientais.

As regiões mais pobres e distantes dos centros financeiros e de decisão política têm sido transformadas em verdadeiras zonas de sacrifício ambiental e social – onde a ausência de políticas públicas gerou uma dívida socioambiental histórica que precisa ser reparada para ser superada.

Portanto, está em formação uma “Economia cinzaou um “desenvolvimento econômico marrom” no estado do Rio de Janeiro, em profunda contradição e em conflito com as metas ousadas de redução dos gases de efeito estufa assumidas, em 2009, pelo Brasil em Copenhague, durante a COP-15, onde mais uma vez a comunidade internacional buscou –sem obter consenso – limitar ou reduzir o crescimento das emissões de gases de efeito estufa.

Para de fato enfrentar o debate sobre as soluções viáveis para reverter os problemas em larga escala decorrentes do aquecimento global e das mudanças climáticas cada vez mais presentes, a Rio+20 precisa analisar com atenção a origem destas vulnerabilidades socioambientais e dos atuais níveis de poluição e enfrentá-la. Essas vulnerabilidades não têm nada de democráticas, uma vez que afetam de forma desigual e injusta os mais pobres, os trabalhadores e as comunidades impactadas pelo atual modelo dedesenvolvimento.

A questão ambiental, materialmente falando, é por definição socioambiental. Os problemas decorrentes do aquecimento global, que afetam o regime de águas e chuvas, são agravados pelas más condições de vida nestas áreas periféricas: falta de saneamento, dificuldade de acesso à água tratada, precárias condições de moradia, e meios de transportes insuficientes e onde os riscos de deslizamentos de encostas e as inundações
são mais frequentes.

Não é possível admitir que as nações do Sul tenham que agora pagar a conta (ou a dívida)com a limitação drástica do crescimento econômico dos países periféricos e menos desenvolvidos, sob o argumento de que é preciso “salvar o planeta e a humanidade”, enquanto as nações mais poderosas, inclusive do ponto de vista industrial e militar, mantêm inalterado seu padrão de desenvolvimento predatório. Afinal, há séculos são os países do Norte – com suas economias sem limites e sem escrúpulos – os maiores vilões entre os emissores de gases de efeito estufa.

A Rio+20 daria um grande passo se ao menos abolisse de vez a estratégia mercantil da obsolescência planejada, onde por decisões de cunho meramente mercadológico os produtos e bens são fabricados para terem vida curta e com isso terem sua durabilidade ou funcionamento por um tempo bastante reduzido.

Mais que isso: deveria exigir que ao menos a economia passasse a levar em conta (e contabilizar) o ciclo de vida dos materiais e produtos, desde sua fase de extração na natureza, produção, consumo e destino final, ao invés de se limitar a fomentar desejos de consumo desenfreado e ilimitado.

O mundo dos negócios e o “deus mercado” tradicionalmente gananciosos como os conhecemos sobreviveriam a isso?!

Temos a certeza que, apesar de não pautado na Rio+20, é necessário um combate sem tréguas ao Racismo Ambiental e às desigualdades sociais e de renda que são suas marcas.

E que esta solução é uma construção social no curto, médio e longo prazos para se conquistar coletivamente uma qualidade de vida decente, a proteção dos territórios, preservação da cultura dos povos originários e de sua riqueza ecológica e para a construção de uma Economia sustentável sim, mas na medida da escala humana e das demandas das maiorias, ou seja, dos pobres que são os que mais precisam destas profundas e necessárias transformações sociais e econômicas.

(*) Ambientalista, gestor e planejador ambiental. Foi coordenador da Comissão Permanente da Alerj, sub-secretário de Meio Ambiente da Prefeitura de Nova Iguaçu e membro fundador da Rede Brasileira de Justiça Ambiental.
sergioricardoverde@gmail.com