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sexta-feira, 8 de novembro de 2013

O virtual e o real e a nossa catarse cotidiana

29/10/2013 - Lígia Deslandes em seu blog

Não é de hoje que venho observando os movimentos e atitudes de muitos de nós nas redes sociais. 

Digo "nós" porque eu também me incluo nisso.

Tento refletir sempre sobre o meu papel na sociedade e quando reflito sobre o meu papel invariavelmente reflito sobre o papel das pessoas com quem milito e convivo.

Não deixamos de ser o que somos quando acessamos uma rede social.

Todas nossas carências, preconceitos, crenças, limitações e qualidades de uma forma ou de outra são expostas nas redes queiramos ou não.

Alguns de nós pensam que podem mascarar ou esconder suas idiossincrasias atrás da tela de um computador, mas, o que compartilham, como e de que forma compartilham, o que comentam e curtem denuncia o que vai dentro de si.

Confesso que tenho andado um tanto cansada do que tenho visto.

A novidade de um primeiro momento quando a gente verifica o grande potencial comunicativo das redes e quer a todo custo espalhar a verdade e compartilhar a realidade já esgotou um pouco em mim.

Atualmente observo os "olhos", os "ouvidos" e os "sentidos" que a virtualidade da rede tem instigado em muitos de nós e volta e meia me assusto, me entristeço e me rebelo com o que vejo. 

Independentemente do que, enquanto militantes conseguimos fazer como ação política determinada, compartilhando verdades no meio de tantas mentiras, enganações, mascaramentos e falsas notícias criadas para atacar a esquerda e principalmente, o Partido dos Trabalhadores.

Tenho muitas dúvidas sobre o momento que estamos vivendo. Ainda bem que as tenho, pois, certezas cristalizadas não fazem bem a saúde.

Muitos se espantam da pancadaria e violência nas ruas. Por que se espantam? O que temos visto nas redes sociais é o espelho e o estopim do que vemos nas ruas. O ódio de classe, a intolerância para com o debate, a falta de vontade para a reflexão, o preconceito com o novo, a discriminação com a experiência reflete a cultura violenta que nos assola e as crenças coloniais que teimam em continuar se fazendo presentes em nossas mentes e corações.

É como se vivêssemos em estado de extrema "catarse", bitolados ainda por uma formação medieval que não reconhece a diversidade, o pluralismo e a complexidade presentes nas diversas situações da vida cotidiana.

Temos horror ao fundamentalismo religioso e político, mas, quantas vezes partimos para o ataque "demonizando" ou "santificando" pessoas porque elas não estão ao lado de nossos interesses...

Como é fácil simplificar as questões e anular o debate! Como é simples dar ênfase ao que não funciona em detrimento do funcional! Tanta coisa mudou no Brasil para melhor... Mas, e nós?




Estamos marcados ainda pelo opressor e oprimido que lutam dentro da gente, cada um puxando o tapete do outro.

Quando iremos expulsar os dois tendo coragem para assumir o que somos sem a máscara que roubamos do sistema?

Essa mesma crônica que me desnuda e desnuda muitos de nós que aprendemos a viver na hipocrisia será motivo de debate? Será que vão compartilhar no facebook, no orkut, no google? Será que vão curtir?

Me pergunto se lerão com vontade de questionar-se, de refletir, se passarão adiante o texto pelo simples fato de serem meus amigos na rede ou porque ele de fato lhes tocou a alma?

virtual e o real se misturam numa mesma visão de mundo.

Quem são os outros e quem somos nós?

É possível responder? O que é virtual e o que é realidade?

Quero continuar me questionando e tendo certezas transitórias...

São elas que estão me ajudando a compreender esse Brasil que vai pouco a pouco se mostrando como sempre foi.

Cabe uma última pergunta e tenho tantas... O que nos cabe fazer para mudar de fato?

Fonte:
http://ligiadeslandes.blogspot.com.br/2013/10/o-virtual-e-o-real-e-nossa-catarse.html

sábado, 15 de junho de 2013

O PT e o papel da militância

26/05/2013 - O papel da militância
- Maurício Caleiro em seu blog Cinema & Outras Artes

Dois artigos publicados recentemente procuram debater, a partir de ângulos diferenciados, uma contradição essencial da política brasileira na última década: a ascensão do conservadorismo e a persistência de uma pauta neoliberal durante um período em que, graças a vitória em três eleições presidenciais sucessivas, verifica-se a hegemonia de uma aliança dita progressista, capitaneada pelo PT.

Ambos os textos analisam, em maior ou menor grau, a postura e o papel da militância nesse processo e fornecem subsídios para uma reflexão mais aprofundada do tema, objetivo deste post.

O aumento de um sentimento de frustração entre a esquerda e da impressão de que os governos petistas estariam cada vez mais conservadores tornou-se ainda mais evidente nas últimas semanas, como se pode facilmente observar nos fóruns públicos e nas redes sociais.

Segundo essas fontes, tal conservadorismo se manifestaria na promoção de um novo ciclo de privatizações - desta feita com o agravante de utilizar o marco regulatório do governo FHC, ao invés do de Lula -, na recusa em regularizar a mídia, nos baixíssimos níveis de assentamento de terras contrapostos às regalias concedidas ao agronegócio, no desmonte da Funai e no genocídio indígena, na primazia dos pactos com o poder religioso em relação à pauta comportamental, entre outros itens.

Em São Paulo, principal vitrine do petismo no âmbito municipal, a reação truculenta de Haddad à greve dos professores estaria ajudando a disseminar a impressão de que não só o conservadorismo se impõe, mas, pior, que o petismo, que deveria combatê-lo, o reforça.

Genealogia do pragmatismo
"… E quando finalmente a esquerda chegou ao governo havia perdido a batalha das ideias."

No primeiro dos dois textos acima citados, "As esquerdas e a pauta conservadora", Roberto Amaral parte desta citação do historiador Perry Anderson - referente à França atual mas apropriadíssima para o caso brasileiro - para questionar porque, segundo o colunista, mesmo após mais de uma década de governo petista, "e apesar do agravante constituído pela tragédia europeia, é a visão neoliberal, reiteradamente desmentida pela realidade, que domina o debate, o noticiário e até mesmo ações de governo".

O articulista perfaz uma meticulosa revisão histórica das causas do fenômeno, culpando os militares e a forma como foi feita a transição à democracia, os partidos de esquerda que "fogem do debate ideológico, ensarilham suas teses, saem de campo, tudo em nome da conciliação" e, marcadamente, a mídia oligarquizada e dominada pelo ideário neoliberal.

Talvez por escrúpulos decorrentes do fato de ter sido ministro da Ciência e Tecnologia entre 2003 e 2004, deixa de examinar de forma apropriada o lulismo, item prioritário em um estudo sobre a supremacia do pragmatismo ante o ideológico na política brasileira, em relação a qual oferece um diagnóstico sombrio:

"Silentes, acovardadas nossas esquerdas permitem que a direita, sucessivamente derrotada nas urnas, estabeleça a pauta nacional, e nela nos enredamos: ‘mensalão’, redução da menoridade penal, violência, fracasso da política, fracasso dos políticos... o eufemismo de ‘fracasso da democracia’."

Militantes em disputa
Matheus Machado, em um texto tão polêmico quanto pertinente, (publicado ontem neste site) resume com propriedade o atual dilema entre conservadorismo e necessidade de avanços progressistas, e o papel da militância em tal quadro:

"Desde que o PT chegou à presidência escuto de meus amigos governistas que é 'um governo em disputa'. A tese era que a política de coalizão abrigaria forças muito diversas e que cabia disputar internamente e tomar cuidado com as críticas para não enfraquecê-lo. O resultado prático foi que a crítica e aguerrida militância petista acabou se abstendo das manifestações de rua e se dedicando cada vez mais a simplesmente justificar o governo."

"Mesmo agora, depois de dez anos no poder e com aprovação popular em torno de 70%, ainda vejo petistas mais preocupados em justificar publicamente os descalabros do que em criticar o abandono de causas históricas do Partido dos Trabalhadores, como a Previdência, os Direitos Humanos ou as bandeiras dos povos da floresta. Enquanto isso os militantes das outras forças da esfera federal, como a bancada fundamentalista, fincavam os pés, iam para as ruas e lançavam grandes campanhas para empurrar para a direita o centro do governo. A impressão que dá é que se o governo federal estava realmente em disputa, os antigos militantes petistas perderam por W.O."

Lógica binária
Há fatores que potencialmente agravaram o conformismo do petismo e de seus apoiadores, a começar da própria conjuntura político-partidária do país nas últimas duas décadas, fortemente polarizada entre PT e PSDB, o que reforça uma mentalidade do tipo "nós contra eles", binária e maniqueísta.

Assim, a necessária luta interna por uma agenda mais progressista para a administração federal tendeu a ser negligenciada, substituída, como menciona Matheus, por um discurso que apregoa a defesa das plataformas da aliança capitaneada por PT e PMDB, sob o alegado risco de municiar o adversário tucano.

Tal distorção está no centro de um processo no qual, em nome de uma discutível hegemonia partidária – desmentida, na prática, a cada votação no parlamento, verdadeiras operações de guerra -, boa parte da base petista omite-se ante a cessão não só às demandas dos demais membros da aliança, mas ao exercício público da militância na defesa de suas posições no interior da coligação.

O resultado prático de tal dinâmica tem sido o abandono de bandeiras históricas do PT e o conservadorismo crescente que tem caracterizado o governo Dilma Rousseff.

Ainda no bojo dessa dicotomia PT-PSDB, um dos expedientes recorrentes dos analistas simpáticos ao atual governo tem sido compará-lo, de forma reiterada, ao de FHC, mas não ao de Lula, seu antecessor direto e que lhe entregou um país em muito melhores condições do que ele recebera do cacique tucano.

O fato de tal comparação fazer todo o sentido no âmbito da disputa presidencial que ora se delineia não anula o fato de que, contraposto ao de Lula, o governo Dilma apresenta, em diversas áreas, indiscutíveis retrocessos.

O fator internet
Como mencionado em post recente, há tempos pesquisas vêm demonstrando que a web 2.0, com suas possibilidades interativas que têm nas redes sociais sua expressão mais visível, estimula a formação de grupos virtuais com forte identificação ideológica.

Em decorrência de tal dinâmica, nas "igrejinhas" que de tal processo decorrem, a discordância e o dissenso, quando não negligenciados ou sequer levados em conta, tendem a ser punidos com a restrição ou bloqueio do contato de quem se coloca contra o senso comum dominante no grupo virtual.

Transplantado para a seara política, esse fenômeno estaria a estimular a formação de comunidades virtuais em que prevaleceria, para cada participante, uma tendência a constituir grupos interativos marcados pela identificação com determinadas linhas, programas, ideologias, partido ou políticos, em detrimentos de outros.

Desnecessário apontar que tal modelo tende a reforçar a já citada dicotomia "nós x eles", com o agravante de desestimular o conhecimento das argumentações, táticas e planos de um e de outro bloco contendor.

O alerta de Lênin sobre a necessidade prioritária de se conhecer o que pensa e trama o adversário como forma de adivinhar lhe os passos têm sido irresponsavelmente negligenciado.

Revendo o conceito de "PIG"
O embate político, naturalmente, não se dá exclusivamente através das redes digitais, embora venha sendo de forma crescente por estas influenciado.

Para além da dinâmica acima referida e do binarismo PT-PSDB, outro fator a agravar o imobilismo da militância petista advém do hábito, ora disseminado, de desdenhar a priori as críticas às gestões petistas, descartando-as como maquinações de uma mídia corporativa cuja ação a qualificaria como "PIG" (Partido da Imprensa Golpista).

Qualquer observador criterioso da cena midiática brasileira sabe que esta é, em larga medida, a expressão de uma plutocracia associada ao grande capital e ao mercado financeiro - e, assim, infesa ao que seja reivindicação social e contrária ao programa dos partido ditos progressistas - e que as críticas a ela dirigidas, em larga medida, se justificam.

Nos últimos quatro anos, boa parte do material publicado por este blog dedica-se justamente a examinar seus descalabros e denunciá-los.

Ocorre, porém, que a crítica à mídia feita com rigor e caso a caso não pode ser substituída pelo hábito genérico e automático de utilizar as graves deficiências da mídia brasileira como salvo-conduto para blindar toda e qualquer medida governamental, sob o risco de substituir o frequente tendenciosismo midiático – que, repito, é condenável – pela recusa a submeter as decisões governamentais a qualquer forma de criticismo – o que é inaceitável numa democracia.

Ademais, como mencionado em um post anterior, mostra-se cada vez mais questionável a premissa segundo a qual o tal de "PIG" tenderia a se colocar invariavelmente contra os governos petistas.

O silêncio quanto à truculência dos governos Dima e Haddad ante greves e o apoio entusiasmado às privatizações são sinais claros de que, quando a ideologia neoliberal que orienta a mídia corporativa e as medidas tomadas pelo governo petista se harmonizam, não há relação de oposição entre eles – pelo contrário.

Alguns analistas, como o jornalista e blogueiro Luis Carlos Azenha, vão mais longe e apontam uma identidade de interesses entre a mídia corporativa e o modelo orientador da estratégia desenvolvimentista ora priorizada por Dilma.

O fato de boa parte da militância se recusar a enxergar tais nuances, substituindo o seu papel de força reivindicatória interna pela defesa incondicional do governo e pela adoção do maniqueísmo segundo o qual o "PIG" é sempre a encarnação do mal, a leva, na atual situação, a situações contraditórias, que põem a própria sustentabilidade de sua posição em xeque: no leilão do petróleo, por exemplo, sua tentativa de justificar o retorno à privatização em moldes fernandistas encontrou eco na opinião de jornalistas os quais despreza e odeia, pela negatividade e marcação cerrada que alegadamente fazem ao governo – casos de Miriam Leitão, Carlos Sardenberg e William Waack, exultantes com a medida.

Ora, o fato de tal medida ser saudada por tais arautos do mercado e do neoliberalismo não deveria levar a militância a uma reavaliação reflexiva, que superasse o mero automatismo com que defende o governo Dilma?

Críticas contraproducentes
Além disso, a esta altura da peleja, parecem questionáveis os efeitos do imenso investimento da militância em desqualificar a mídia, não sendo despropositado apontar que ele resulta contraproducente em ao menos três aspectos, além dos já apontados:

Mantém a esquerda e seus canais comunicacionais em uma posição meramente reativa e a reboque da mídia corporativa, que acaba por pautar-lhes;

Agrava a sensação de saturação da crítica de mídia como instrumento político, saturação esta que o mencionado Azenha já diagnosticara por ocasião do primeiro encontro entre blogueiros progressistas, em 2010;

Demonstrar, através da crítica de mídia e sobretudo para a própria militância, que grupos comunicacionais reconhecidamente conservadores e antipetistas são conservadores e antipetistas toma, dia após dia, um tempo e um investimento em trabalho enormes, os quais poderiam ser melhor gastos na organização de formas de pressão pública para que o governo que a militância apoia aprovasse um marco regulatório para as comunicações, bandeira histórica da esquerda e do partido e item de primeira necessidade para o aprimoramento da democracia no Brasil.

A Justiça como inimiga
Um terceiro fator a desviar a militância petista de sua prioritária missão de lutar contra o conservadorismo e pelas bandeiras históricas do partido advém dos ódios decorrentes da relações entre o partido e a Justiça – particularmente o STF -, no bojo do julgamento da AP 470, vulgo "mensalão".

Não se questiona, aqui, o mérito da revolta petista contra as decisões do tribunal – cujos métodos questionáveis foram repetidas vezes por este blog criticados. E sim a constatação de que muita energia está sendo dispersada num combate diário, feito de denúncias - fundadas ou não -, tentativas de desqualificação, e acompanhamento à lupa dos mínimos gestos dos ministros do Supremo e do Procurador-Geral, sendo que é pouquíssimo provável que tal mobilização resulte em algo efetivamente proveitoso, que não o exorcismo de eventualmente justificáveis ódios e ressentimentos pessoais.

O momento é grave e apresenta desafios concretos: o tamanho e a importância da luta política contra o conservadorismo no Brasil, neste momento, pedem ações mais articuladas e objetivamente efetivas.

Se a militância petista investisse na luta política interna metade da energia que diariamente gasta para desqualificar Joaquim Barbosa certamente o governo Dilma não seria reiteradas vezes tachado de conservador.

Estratégia de vitimação
A todos esses fatores, acrescenta-se um temor adicional: o de que tanto o hábito de culpar o "PIG" quanto o de acusar o Judiciário – em ambos os casos antevendo intenções golpistas - esteja levando parte considerável do petismo não só à intransigência ante críticas, mas ao hábito de se vitimar, considerando, ante críticas e ponderações, que o partido é uma vítima frequente de injustiças.

"Incrível como tudo é culpa do PT" é uma resposta ouvida com frequência entre a militância e nas redes sociais, à mínima ponderação ou crítica que se faça; resposta esta que evidencia, a um tempo, o processo de vitimação acima referido e a recusa em reconhecer que um partido no poder - e há mais de 10 anos - está naturalmente sujeito a muitas críticas e inquirições, ainda mais se ora promove um retrocesso conservador em franca contradição com sua plataforma eleitoral, tão crítica às privatizações e ao capitalismo predatório.

Da necessidade de mobilização
A reação de muitos petistas ao conservadorismo atroz do governo Dilma e a atitudes francamente contrárias ao espírito democrático petista tomadas por alguns de seus governadores e prefeitos mostra que caráter retrógrado que acometeu a atual administração federal não é um fenômeno isolado. Ele (se) reflete, cada vez mais, (n)o comportamento de uma militância que se mostra disposta a avalizar a renúncia a princípios éticos e programáticos em troca da manutenção do poder – ainda que este poder, em larga medida, esteja servindo para repor uma pauta conservadora e privatista, a qual difere tanto das bandeiras históricas do PT quanto dos compromissos eleitorais da candidata Dilma.

A militância do PT é uma força social representativa, que teria muito a contribuir para o aprimoramento da democracia brasileira caso saísse de sua posição majoritariamente conformista de hoje, em que, malgrado as raras e louváveis exceções que confirmam a regra, prevalece a defesa acéfala de toda e qualquer medida governamental.

Com a ajuda dos simpatizantes e dos demais setores de esquerda que ainda se dispõem a dar um voto de confiança ao PT, a militância poderia, vindo a público, colaborar de forma decisiva no sentido de corrigir a rota excessivamente conservadora que o governo Dilma assumiu desde seu início e radicalizou ainda mais nas últimas semanas.

Mas trata-se de uma missão cuja urgência é máxima, determinada por novas privatizações no horizonte - altamente ameaçadoras à autodeterminação nacional que Dilma jurou defender - e pela necessidade de impor uma marca esquerdista efetiva à aliança liderada pelo PT, resgatando os valores históricos do petismo e evitando, assim, a fuga de um eleitorado mais à esquerda que não suporta mais o retrocesso e o descompromisso com a agenda de campanha do atual governo federal.

Tal mobilização vai acontecer?

Muito provavelmente não, pois o pragmatismo eleitoral tende a atropelar escrúpulos e consciências, mas o recado está dado.

Fonte:
http://cinemaeoutrasartes.blogspot.com.br/2013/05/o-papel-da-militancia.html

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Uma anedota para os ativistas da Rede Sustentabilidade

 22/05/2013 - por Matheus Machado (*) em seu blog BHAZ
- BH de A a Z

Conta uma anedota da política norte-americana que o ex-presidente Franklin Delano Roosevelt certa vez recebeu o sindicalista e ativista negro A. Philip Randolph, ouviu a todas as suas demandas e, por fim, respondeu: “eu concordo com tudo que você disse. Agora, obrigue-me a fazê-lo.”

O resultado do encontro teria sido uma longa campanha por direitos civis, que culminaria com a organização de uma marcha que, segundo os organizadores, colocaria cem mil negros nas ruas de Washington em 1941.

A ameaça de uma marcha massiva de negros na capital criou o clima político que permitiu a Roosevelt lançar a Executive Order 8802, que proibia a discriminação racial e religiosa nos trabalhos da indústria de defesa nacional dos EUA.

Com a Executive Order 8802 Roosevelt conseguia cancelar a marcha, tranquilizando os conservadores defensores do apartheid norte-americano, e garantir a primeira grande vitória para o incipiente movimento pelos direitos civis.

A anedota pode não ser verdade (aqui um bom artigo sobre isso, há inclusive grandes chances de ser parte da construção folclórica de Roosevelt – uma espécie de Hugo Chávez norte-americano, eleito quatro vezes consecutivas e artífice do New Deal.

Mas, ainda assim, ela diz muito sobre uma concepção de política que parece ter sido esquecida no Brasil. Entre outras coisas, a anedota encerra uma conversa de gabinete entre um ativista e um presidente colocando a disputa política em seu lugar: na praça pública.

Não que a disputa política tenha sido esquecida.

Desde que o PT chegou à presidência escuto de meus amigos governistas que é “um governo em disputa”. A tese era que a política de coalizão abrigaria forças muito diversas e que cabia disputar internamente e tomar cuidado com as críticas para não enfraquecê-lo.

O resultado prático foi que a crítica e aguerrida militância petista acabou se abstendo das manifestações de rua e se dedicando cada vez mais a simplesmente justificar o governo.

Mesmo agora, depois de dez anos no poder e com aprovação popular em torno de 70%, ainda vejo petistas mais preocupados em justificar publicamente os descalabros do que em criticar o abandono de causas históricas do Partido dos Trabalhadores, como a Previdência, os Direitos Humanos ou as bandeiras dos povos da floresta.

Enquanto isso os militantes das outras forças da esfera federal, como a bancada fundamentalista, fincavam os pés, iam para as ruas e lançavam grandes campanhas para empurrar para a direita o centro do governo. A impressão que dá é que se o governo federal estava realmente em disputa, os antigos militantes petistas perderam por W.O.

Não é um uma situação isolada.

Já é possível ver o fenômeno entre os ativistas da Rede Sustentabilidade, proto-partido criado em torno de Marina Silva.

Preocupados que estão em construir o partido, o grupo se apressa em justificar, nas redes sociais, cada nova “manota” de Marina.

Na semana passada Marina Silva respondeu a uma pergunta sobre o casamento gay diferenciando “Estado Ateu” de “Estado Laico” e afirmando que o pastor Marco Felicianoestá sendo criticado por ser evangélico e não por suas posições políticas equivocadas” (veja o original em vídeo aqui).

O argumento de Marina é distracionista, cria uma vítima inexistente para evitar lidar com a situação de opressão real, e é idêntico ao que Feliciano usava meses atrás (em março comentei isso aqui).

É claro que também é exagerada a afirmação de que ela teria “defendido” o pastor, mas isso não pode ser usado para minimizar o fato.

Não existe nem nunca existiu no Brasil um projeto de “Estado Ateu”, isso é um factóide levantado a cada vez que alguém tenta tirar crucifixos de repartições públicas, doutrinação de escolas ou moral religiosa de nossas leis.

Não existe no Brasil um ateísmo militante à lá Dawkins, e por aqui os ataques contra práticas religiosas de que tenho notícia são feitos por outros religiosos, e não por turbas de ateus fundamentalistas.

Ainda não entendi porque Marina quis citar o pastor Feliciano em sua resposta sobre o casamento gay, mas pelo menos poderia ter usado o tempo para deixar claras as suas diferenças do pastor.

Poderia ter usado o tempo para dizer que não achava os africanos amaldiçoados, ou que nem todo evangélico acha que os homossexuais são criminosos, mas ao invés disso usou para minimizar a vasta campanha contra o pastor Marco Feliciano ecoando o argumento do próprio: a campanha seria perseguição religiosa. De uma só vez ela desqualificou um movimento nacional contra a permanência de Marco Feliciano na CDHM e ainda repetiu o argumento do próprio.

Os ativistas da Rede Sustentabilidade se apressaram em explicar Marina Silva de todas as formas, alguns chegando ao ponto de acusar os detratores de perseguirem também a pré-candidata.

Isso me preocupa principalmente porque vários dos melhores ativistas por um Estado verdadeiramente laico que conheço são simpáticos à Rede, e a possibilidade de vê-los silenciar em prol de um projeto nebuloso de poder é aterradora.

Em um momento em que os Direitos Humanos no país tem sido atacados cotidianamente, e que até o que as pessoas fazem em ambiente privado e de comum acordo é motivo de expulsão de universidade pública, precisamos de defesas claras dos nossos direitos.

Parece, afinal, que a melhor forma de silenciar ativistas barulhentos é convencê-los de que a disputa política não é feita nas ruas, mas internamente, dentro do partido, nos gabinetes.

O primeiro passo, claro, deve ser convencê-los de aderir ao fetiche da delegação política (aqui um texto clássico e curtinho do Bourdieu sobre o assunto).


Depois de incorporados à forma partidária de organização, parece que todas as críticas precisam ser sussurradas, e não abertamente rasgadas como anteriormente.

A liderança, num passe de mágica, passa a ser símbolo e representante do grupo na mesma proporção em que o grupo se silencia, aceitando a representação.

Acontece que muitas vezes o que se faz é passar um cheque em branco: depois de entregue não há muito o que fazer.

Não tenho nenhum interesse em participar de um partido político, mas entendo quem decide atuar politicamente por essa forma.

Porém é preciso lembrar que, ao contrário do que dizem os manuais partidários, a disputa política é feita aqui fora, em público, nas ruas, e se a Rede quiser realmente construir uma opção democrática deveria ter isso em mente.

Os ativistas negros que organizavam a marcha a Washington em 1941 claramente preferiam Roosevelt às suas contrapartes do Partido Republicano, mas nem por isso silenciaram frente ao que consideravam injusto.

Alguns deles passaram os próximos anos falando que a Executive Order 8802 não era suficiente.


Se os ativistas da Rede quiserem realmente defender o Estado laico, é bom que aprendam com o exemplo de Randolph a obrigar suas lideranças a fazê-lo.

(*) Matheus Machado é formado em História, especialista em Gestão Educacional e fake amador (@coalacroata).

Fonte:
http://www.bhaz.com.br/uma-anedota-para-os-ativistas-da-rede/

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.