sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Ação Penal 470 e o triângulo de quatro pontas

16/11/2012 - Tarso Genro (*) - Carta Maior


A nota da Executiva Nacional do PT sobre os resultados da ação penal 470, [ver aqui] tornou-se um marco mais importante para o futuro democrático do país do que o próprio resultado do processo judicial, por três motivos relevantes: compõe sua crítica com argumentos extraídos dos próprios fundamentos do Estado de Direito e não ataca a legitimidade daquela Corte superior do Estado;

mostra que a decisão foi motivadamente política, portanto, alheia – em relação aos líderes do PT - ao que consta nos autos do processo;

e não defende que os réus deveriam ser absolvidos, provadas as condutas ilícitas que lhe foram imputadas.

O conteúdo da nota, certamente, levou em consideração que criticava, ao meu ver corretamente, a mesma instituição que decidiu brilhantemente sobre as pesquisas com células tronco e sobre a demarcação – que entendeu contínua - da reserva “Raposa Serra do Sol”, decisões que honram a parte da história democrática e humanista daquele Tribunal.

É óbvio que, no imediato do cenário político nacional, a nota terá pouca influência. No entanto, à medida que o tempo passar e vierem outros julgamentos à tona, vai ficar claro que se foi um fato relevante, para o Estado de Direito, a proposição de ação penal contra figuras elevadas da República, esta relevância ficou pela metade. O próprio Supremo - no discurso técnico do processo - admitiu abertamente que foi invertido o ônus da prova: os réus, que já estavam condenados pelo linchamento midiático, é que deveriam provar a sua inocência, pois já tinham sua culpa definida na consciência média da sociedade.

O rigor das penas e a execração pública dos réus como criminosos provados, a tentativa de desqualificação permanente dos Juízes que esboçavam mínimas divergências com a visão de “direito penal máximo”, adotada pelo Relator, completam este quadro de desequilíbrio entre a potência acusatória - social e judicial - e o exercício do direito de defesa. Culpados ou não, os réus, neste contexto jurídico e político, foram “mal julgados”. E isso não é certamente um avanço para o Estado de Direito, pois em cada julgamento - sejam os réus cidadãos importantes ou não da República - o Direito inteiro está presente e o Estado, por inteiro, avança na salvaguarda dos seus fundamentos democráticos ou transpõe os limites que separam a legalidade e o arbítrio.

Quero fundamentar, para que não fique como uma mera acusação vazia ao Supremo - e em respeito a ele - os motivos que dão base ao entendimento de que a condenação foi fundamentalmente política.


Faço-o, através dos próprios fundamentos da teoria do processo no nosso sistema de garantias.

Trata-se da concepção universal, nos Estados Democráticos de Direito, de que o sistema processual (para que se tenha um processo justo que tenda para um resultado justo), deve supor - como diz Ferrajoli - a configuração “de uma relação triangular entre sujeitos” (acusação, defesa, Juiz) e ainda garantir o “desinteresse”, a “indiferença” pessoal do juiz, a respeito do que está em jogo no processo.


A pressão exercida de forma massificante pela mídia para a condenação dos réus - aceita em nosso sistema de leis e não estranha ao Estado Democrático
de Direito- , e a “premiação”, com prestígio político espetacular outorgado ao Relator e aos que votaram pelas condenações, se não torna o processo nem ilegal nem ilegítimo (porque o sistema de Justiça supõe que os Juízes devem ser imunes a estas pressões), pode redundar em sentenças injustas.

Em determinadas circunstâncias concretas as condições do julgamento livre são tão alteradas que podem mudar o circuito processual que garante um julgamento justo: um quarto sujeito (no caso concreto a mídia), torna-se tão ou mais importante do que o sujeito acusatório formal, o Ministério Público, pois tem força para unificar o juízo forjado na sociedade com o juízo produzido no processo, independentemente das provas.


A peça acusatória formal, assim, passa a ter muito mais chances de aceitação pelo público e pelos julgadores do que as razões de defesa. Não se trata, portanto, necessariamente, nem do “caráter”, nem de compromisso prévio de Juízes com preconceitos políticos, dos quais todos os seres humanos não estão livres. Trata-se de reconhecer a criação programada da desigualdade de condições dos réus, para enfrentarem o processo.


A presença dominante de uma “quarta ponta do triângulo” - acusação do Estado, defesa e juiz, no caso mais mídia como “quarta”, instiga que seja exigido dos réus que comprovem sua inocência, liberando Ministério Público de apresentar as provas que confortem os tipos penais da acusação. A partir daí configura-se um “vale tudo” judicial porque e fundamentação da justiça da sentença já está incorporada pelo senso comum.

Nesta hipótese a relação interna ao processo judicial, que foi alterada pela mídia, é dominada por um outro (quarto e novo) pólo acusatório - mais forte socialmente do que o próprio Ministério Público - e que constituiu um processo paralelo ao processo judicial: o inquisitório da cena pública. Neste - pela sua “partidarização” explícita - não só não está garantido o direito de defesa dos réus, mas faz presente no juízo judicial que decide as penas, a pré-disposição condenatória pelo reconhecimento de um “clamor popular” devidamente forjado.


O “partido nazista” nos processos judiciais da Alemanha de Hitler e o “partido stalinista” na velha URSS eram a “quarta ponta do triângulo” nas suas respectivas épocas históricas.

Acompanhei partes do processo pela TV Justiça e não vi estes argumentos serem brandidos pela defesa. São argumentos que partiriam “da política para o Direito”, ou seja, os réus fariam a sua defesa a partir da política para apresentar os seus argumentos de direito, com a convicção já formada de que o seu julgamento seria decidido politicamente, como o foi.


Talvez os argumentos a que me refiro tenham sido apresentados pela defesa, mas convém repeti-los (se o foram), pois o tema condensa duas questões chaves da democracia contemporânea: o direito à livre formação da opinião e o poder da “grande mídia”, para moldar uma democracia, segundo os interesses que ela representa no cenário nacional.

O ponto de partida valorativo que formou o convencimento majoritário na Suprema Corte foi político, mas a sua fundamentação abrigou-se, obviamente,
num discurso jurídico coerente. Mas este discurso de coerência já foi moldado para dar curso à tomada decisão, eminentemente política, de condenar os réus. Para a crítica adequada da sentença, no entanto, o caminho deve ser inverso: deve-se partir de argumentos jurídicos internos ao que deve ser - no Estado Democrático de Direito - um processo judicial penal dentro do sistema de garantias constitucionais, como fez a nota do PT, para chegar à crítica política da sentença judicial, que representou um juízo “total” sobre o PT e também sobre os governos do Presidente Lula.

Quero asseverar, ainda, que a decisão do Supremo que interpretou a Lei da Anistia e reconheceu o seu alcance para impedir o processamento de assassinos, torturadores e estupradores - criminosos comuns, portanto - a serviço da ditadura militar (como decisão política para uma “transição generosa e negociada”) foi muito mais grave para o futuro do país, do que os resultados da Ação Penal 470.

Naquela oportunidade ocorreu também um julgamento predominantemente político e a reação dos partidos de esquerda à decisão do Supremo, incluindo do próprio PT, esteve à beira da indigência. À distância temporal dos fatos históricos, por mais relevantes que sejam, tornam-se menos dramáticos.

Quando eles se repetem, porém, no seu conteúdo mais íntimo, – ou seja, um novo julgamento fundamentalmente político num processo penal importante - é necessário unificar certos episódios históricos para darmos coerência ao discurso democrático.

O episódio atual tem uma carga mais dramática, porque a própria movimentação da mídia exigindo a condenação dos réus, tornou os ataques ao PT como conjunto e aos governos do Presidente Lula, uma questão do cotidiano, que abalou moralmente milhões de pessoas que nos admiram e defendem nossos projetos para o país. O julgamento que envolvia a Lei de Anistia reportava-se a fatos que, para a maioria, pareciam longínquos e não envolviam diretamente os principais dirigentes políticos que estavam na cena pública. Lamentavelmente aquela decisão do Supremo foi subvalorizada pelos 
democratas de todas as extrações ideológicas do país, que não se deram conta (ou não viram por conveniência) que a cultura jurídica em formação sufocava a evolução democrática das instituições.


Pouquíssimos registravam na sua agenda a questão do julgamento e eventual punição dos torturadores como questão importante para o país e para os seus mandatos parlamentares.


Mas a sombra da Teoria do Domínio Funcional dos Fatos começou ali.

Só que começou ao inverso: para punir os torturadores, temeu a maioria do Supremo que o “domínio funcional dos fatos” levasse ao encadeamento de uma linha de responsabilidades, que poderia parecer provocação aos militares da época, responsáveis diretos pelos laços de comando do regime. No processo atual, a cadeia de comando e do domínio dos fatos”, reconhecidamente não provados - meramente presumidos - promoveu penas indevidas ou, no mínimo, desproporcionais para a maioria dos réus: um processo devido e legal com um resultado manifestamente injusto.


A agenda da reforma política com a valorização dos partidos, a consagração das alianças verticais e a proibição do financiamento privado das campanhas, combinada com a democratização dos meios de comunicação, são as tarefas do próximo período.
Consagrar o direito das comunidades formarem suas opiniões num contraditório livre e sem censura - tanto do poder econômico como do próprio estado - é o pré-requisito de um modelo autenticamente democrático de um Estado de Direito contemporâneo.
Se isso não ocorrer à médio prazo a “quarta ponta do triângulo”, que dominou nesta ação penal, pode dominar a política e o Estado como um todo.

E aí todos, sempre, seremos réus ideológicos, como diria Drummond, de um mundo caduco.

(*) Tarso Genro é governador do Rio Grande do Sul

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21265

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

A Um Herói de Purpurina

22/11/2012 - Antonio Fernando Araujo

É difícil tratar com ironias uma cerimônia do porte da posse de um presidente da mais alta instituição jurídica do país sem também levar em conta que nesse universo de eventos desconcertantes há pouco mais de dois anos nossa Família GAFE da Imprensa (Globo/Abril/Folha/Estadão) protagonizava sua desejada assunção de Marina Silva à presidência da república.

Não que Joaquim Barbosa tenha se tornado uma Marina Silva de toga e, muito menos pelo fato das iniciais do seu nome coincidirem com as de Jader Barbalho e que apenas isso nos autoriza a fazer de conta que a moeda de troca em qualquer dos casos tenha sido a mesma, justamente aquela que também foi utilizada para transformar Fernando Collor de Mello de um exótico "caçador de marajás" em Presidente da República e daí no maior patife que o Planalto Central, até então já vira florescer.

Apesar disso e se for esse o caso, pois nada nos impede, vamos então apostar que algumas capas de revistas e meia-dúzia de manchetes bem postadas no topo das suas páginas sejam as varinhas de condão que ainda conservam o mesmo fascínio que não só encantou aquele hóspede da "Casa da Dinda" e comprou o silêncio venal do senador do Pará quanto exaltou o moralismo desajeitado da ex-seringueira do Acre e agora se dispõe a borrifar a purpurina negra da toga sobre o verde-amarelo da faixa presidencial que o agora, tornado "caçador de corruptos" e nossa Família GAFE, tornada agora madrinha, já sonham exibir-se em janeiro de 2015, numa espécie de maquinação antecipada com ares de patriotismo de oportunidade.

Se assim for, a ironia que se pretende aqui não é nem de longe a advinda do fato dessa grande mídia empresarial já, há algum tempo, ter percebido o quanto sai barato produzir um herói a cada semana, mas a jubilosa constatação de que, ao menos nesse aspecto e talvez até de forma idêntica ainda que fortuita, não é assim que a grande massa costuma forjar seus verdadeiros heróis.

Por seus veículos, grande massa e grande mídia, tão perto de uma legítima e profunda identidade com a parcela maior da população brasileira se encontra a primeira quanto tão distante e desassociada dela se encastela a outra.

Embora saibamos que em qualquer dos casos seus custos possam ser similares, seus significados contudo, em muito ultrapassam o preço de uma bala disparada contra o peito de Getúlio, a vida de algumas centenas de jovens brasileiros dependurados e torturados em "paus-de-araras", de outros tantos exilados como o foi José Dirceu, ou simplesmente mortos na luta heroica contra o fascismo tupiniquim, não importando aqui se, em um rosário de ironias, nos for permitido incluir - e apenas como um símbolo -, a perda de um dedo mindinho da mão esquerda, nem que seja tão somente para que boa parte dos ideais daquela juventude não se perca assim de todo, vazada pelos ralos de uma democracia caricata que se instalou no país pós-ditadura civil-militar.

No entanto, de uma coisa estamos certos, por mais irônico que tudo possa parecer. Nesses cenários não há sarcasmo algum que se mantenha como tal.



Será simplesmente insustentável que floresça a crença de que o barro que se utilizou para moldar a História heroica de toda uma geração tenha sido o mesmo empregado pelas caducas algumas e decadentes outras, Redações - ainda que conservem o glamour e as garras afiadas -, da nossa Imprensa GAFE quando ela se dispõe a produzir lendas e mais lendas, todas elas, desafortunadamente calcadas sobre seus tristes heróis de purpurina.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Poderosos e “poderosos” no mensalão

16/11/2012 - PAULO MOREIRA LEITE
- coluna Vamos Combinar - revista Época

Num esforço para exagerar a dimensão do julgamento do Supremo, já tem gente feliz porque agora foram condenados “poderosos…

Devagar. Você pode até estar feliz porque José Dirceu, José Genoíno e outros podem ir para a cadeia e cumprir longas penas.

Eu acho lamentável porque não vi provas suficientes.

Você pode achar que elas existiam e que tudo foi expressão da Justiça.

Poderosos?” Vai até o Butantã ver a casa do Genoíno…



Poderosos sem aspas, no Brasil, não vão a julgamento, não sentam no Supremo e não explicam o que fazem. As maiores fortunas que atravessaram o mensalão ficaram de fora, né meus amigos. Até gente que estava em grandes corrupções ativas,  com nome e sobrenome, cheque assinado, dinheiro grosso, contrato (corrupção às vezes deixa recibo)  e nada.

Esses escaparam, como tinham escapado sempre, numa boa, outras vezes.

É da tradição.

Quando por azar os poderosos estão no meio de um inquérito e não dá para tirá-los de lá, as provas são anuladas e todo mundo fica feliz.

É só lembrar quantas investigações foram anuladas, na maior facilidade, quando atingiam os poderosos de verdade…

Ficam até em segredo de justiça, porque poderoso de verdade se protege até da maledicência… E se os poderosos insistem e tem poder mesmo, o investigador vira investigado…

Poderoso não é preso, coisa que já aconteceu com Genoíno e Dirceu.

Já viu poderoso ser torturado? Genoíno já foi.

Já viu poderoso ficar preso um ano inteiro sem julgamento sem julgamento?

Isso aconteceu com Dirceu em 1968.

Já viu poderoso viver anos na clandestinidade, sem ver pai nem mãe, perder amigos e nunca mais receber notícias deles, mortos covardemente, nem onde foram enterrados? Também aconteceu com os dois.

Já viu poderoso entregar passaporte?

Já viu foto dele com retrato em cartaz de procurados, aqueles que a ditadura colocava nos aeroportos. Será que você lembrou disso depois que mandaram incluir o nome dos réus na lista de procurados?

Poderoso?

Se Dirceu fosse sem aspas, o Jefferson não teria dito o que disse. Teria se calado, de uma forma ou de outra. Teriam acertado a vida dele e tudo se resolveria sem escândalo.

Não vamos exagerar na sociologia embelezadora.

Kenneth Maxwell, historiador respeitado do Brasil colonial, compara o julgamento do mensalão ao Tribunal que julgou a inconfidência mineira. Não, a questão não é perguntar sobre Tiradentes. Mas sobre Maria I, a louca e poderosa.

Tanto lá como cá, diz Maxwell, tivemos condenações sem provas objetivas. Primeiro, a Coroa mandou todo mundo a julgamento. Depois, com uma ordem secreta, determinou que todos tivessem a vida poupada – menos Tiradentes.

Poderoso é quem faz isso.

Escolhe quem vai para a forca.

“Poderoso” pode ir para a forca, quando entra em conflito com sem aspas.

Genoíno, Dirceu e os outros eram pessoas importantes – e até muito importantes – num governo que foi capaz de abrir uma pequena brecha num sistema de poder estabelecido no país há séculos.

O poder que eles representam é o do voto. Tem duração limitada, quatro anos, é frágil, mas é o único poder para quem não tem poder de verdade e  depende de uma vontade, apenas uma: a decisão soberana do povo.

Por isso queriam um julgamento na véspera da eleição, empurrando tudo para a última semana, torcendo abertamente para influenciar o eleitor, fazendo piadas sobre o PT, comparando com PCC e Comando Vermelho…

Por isso fala-se  em “compra de apoio”, “compra de consciências”, “compra de eleitor…” Como se fosse assim, ir a feira e barganhar laranja por banana.

Trocando votos por sapatos, dentadura…

Tudo bem imaginar que é assim mas é bom provar.

Me diga o nome de um deputado que vendeu o voto. Um nome.

Também diga quando ele vendeu e  para que.

Diga quem “jamais” teria votado no projeto x (ou y, ou z) sem receber dinheiro e aí conte quando o parlamentar x, y ou z colocou o dinheiro no bolso.
Estamos falando, meus amigos, de direito penal, aquele que coloca a pessoa na cadeia. E aí é a acusação que tem toda obrigação de provar seu ponto.

Como explica Claudio José Pereira, professor doutor na PUC de São Paulo, em direito penal você não pode transferir a responsabilidade para o acusado e obrigá-lo a provar sua inocência.

Isso porque ele é inocente até prova em contrário.

O Poder é capaz de malabarismos e disfarces, mas cabe aos homens de boa fé não confundir rosto com máscara, nem plutocratas com deserdados…

Poder é o que dá medo, pressiona, é absoluto.

Claus Roxin

Passa por cima de suas próprias teorias, como o domínio do fato, cujo uso é questionado até por um de seus criadores [Claus Roxin], o que já está ficando chato

Nem Dirceu nem Genoíno falam ou falaram pelo Estado brasileiro, o equivalente da Coroa portuguesa. Podem até nomear juízes, como se viu, mas não comandam as decisões da Justiça, sequer os votos daqueles que nomearam.

Imagine se, no julgamento de um poderoso, o ministério público aparecesse com uma teoria nova de direito, que ninguém conhece, pouca gente estudou de verdade – e resolvesse com ela pedir cadeia geral e irrestrita…



Imagine se depois o relator resolvesse dividir o julgamento de modo a provar cada parte e assim evitar o debate sobre o todo, que é a ideia de mensalão, a teoria do mensalão, a existência do mensalão, que desse jeito “só poderia existir”, “está na cara”, “é tão óbvio”, e assim todos são condenados, sem que o papel de muitos não seja demonstrado, nem de forma robusta nem de forma fraca…


Imagine um revisor sendo interrompido, humilhado, acusado e insinuado…

Isso não se faz com poderosos.

Também não vamos pensar que no mensalão PSDB-MG haverá uma volta do Cipó de Aroeira, como dizia aquela música de Geraldo Vandré.

Engano.

Não se trata de uma guerra de propaganda. Do Chico Anísio dizendo: “sou…mas quem não é?”

Bobagem pensar em justiça compensatória.

Não há José Dirceu, nem José Genoíno nem tantos outros que eles simbolizam no mensalão PSDB-MG. Se houvesse, não seria o caso. Porque seria torcer pela repetição do erro.

Essa dificuldade mostra como é grave o que se faz em Brasília.

Mas não custa observar, com todo respeito que todo cidadão merece: cadê os adversários da ditadura, os guerrilheiros, os corajosos, aqueles que têm história para a gente contar para filhos e netos?


Aqueles que, mesmo sem serem anjos de presépio nem freiras de convento, agora serão sacrificados, vergonhosamente porque sim, a Maria I, invisível, onipresente, assim deseja.

Sem ilusões.


Não, meus amigos. O que está acontecendo em Brasília é um julgamento único, incomparável. Os mensalões são iguais.

                          Mas a política é diferente. É só perguntar o que acontecia com os brasileiros pobres nos outros governos. O que houve com o desemprego, com a distribuição de renda.


E é por isso que um deles vai ser julgado bem longe da vista de todos…



E o outro estará para sempre em nossos olhos, mesmo quando eles se fecharem.

Fonte:
http://colunas.revistaepoca.globo.com/paulomoreiraleite/2012/11/16/poderosos-e-%E2%80%9Cpoderosos%E2%80%9D-no-mensalao/

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Um Julgamento Político

16/11/2012 - Mauro Santayana em seu blog


O julgamento da Ação 470, que chega ao seu fim com sentenças pesadas contra quase todos os réus, corre o risco de ser considerado como um dos erros judiciários mais pesados da História.

Se, contra alguns réus, houve provas suficientes dos delitos, contra outros os juízes que os condenaram agiram por dedução.

Guiaram-se pelos silogismos abengalados, para incriminar alguns dos réus.


       O relator do processo não atuou como juiz imparcial: fez-se substituto da polícia e passou a engenhosas deduções, para concluir que o grande responsável fora o então Ministro da Casa Civil, José Dirceu. Podemos até admitir, para conduzir o raciocínio, que Dirceu fosse o mentor dos atos tidos como delituosos, mas faltaram  provas, e sem provas, não há como se condenar ninguém.

         O julgamento, por mais argumentos possam ser reunidos pelos membros do STF, foi político. Os julgamentos políticos, desde a Revolução Francesa, passaram a ser feitos na instância apropriada, que é o parlamento. Assim foi conduzido o processo contra Luis XVI. Nele, de pouco adiantaram os brilhantes argumentos de seus notáveis advogados, Guillaume Malesherbes, François Tronchet e Deseze, que se valiam da legislação penal comum.

       O julgamento era político, e feito por uma instituição política, a Convenção Nacional, que representava a Nação; ali, os ritos processuais cediam lugar à vontade dos delegados da França em processo revolucionário. A tese do poder absoluto dos parlamentares para fazer justiça partira de um dos mais jovens revolucionários, Saint-Just. Ela fora aceita, entre outros,  por Danton e por Robespierre, que se encarregou de expô-la de forma dura e clara, e com a sobriedade própria dos julgadores -  segundo os cronistas do episódio - aos que pediam clemência e aos que exigiam o respeito ao Código Penal, já  revogado juntamente com a monarquia.

        - “Não há um processo a fazer. Luis não é um acusado. Vocês não são juízes, vocês são homens de Estado. Vocês não têm sentenças a emitir em favor ou contra um homem, mas uma medida de segurança pública a tomar, um ato de providência nacional a exercer. Luis foi rei e a República foi fundada”.

E Robespierre, implacável, explica que, em um processo normal, o Rei poderia ser considerado inocente, desde que a presunção de sua inocência permaneceria até o julgamento. E arremete:
       - “Mas, se Luis é absolvido, o que ocorre com a Revolução? Se Luis é inocente, todos os defensores da liberdade passam a ser caluniadores”.

Os fatos posteriores são conhecidos.

      O STF agiu, sob  aparente ira revolucionária de alguns de seus membros, como se fosse a  Convenção Nacional. Como uma Convenção Nacional tardia, mais atenta às razões da direita - da Reação Thermidoriana, que executou Robespierre, Saint Just e Danton, entre outros - do que a dos montagnards de 1789. Foi um tribunal político, mas sob o mandato de quem? Quem os elegeu? E qual deles pôde assumir, com essa grandeza, a responsabilidade do julgamento político, que assumiu o Incorruptível? E qual dos mais exacerbados poderia dizer aos outros que deviam julgar como homens de Estado, e não como juízes?

     Como o Tartufo, de Molière, que via a sua razão onde a encontrasse, foram em busca da teoria do domínio do fato, doutrina que, sem essa denominação, serviu para orientar os juízes de Nurenberg, e foi atualizada mais tarde pelo jurista alemão Claus Roxin [foto].

Só que o domínio do fato, em nome do qual incriminaram Dirceu, necessita, de acordo com o formulador da teoria, de provas concretas.

Provas concretas encontradas contra os condenados de Nurenberg, e provas concretas contra o general Rafael Videla e o tiranete peruano Alberto Fujimori.

       E provas concretas que haveria contra Hitler, se ele mesmo não tivesse sido seu próprio juiz, ao matar-se no bunker, depois de assassinar a mulher Eva Braun e sua mais fiel amiga, a cadela  Blondi. Não havendo prova concreta que, no caso, seria uma ordem explícita do Ministro a alguém que lhe fosse subordinado (Delúbio não era, Genoíno, menos ainda), não se caracteriza o domínio do fato.


Falta provar, devidamente, que ele cometeu os delitos de que é acusado, se o julgamento é jurídico.

Se o julgamento é político, falta aos juízes provar a sua condição de eleitos pelo povo.

     Dessa condição dispunham os membros da Convenção Nacional Francesa e os parlamentares brasileiros que decidiram pelo impeachment do Presidente Collor. As provas contra Collor não o condenariam (como não condenaram) em um processo normal. Ali se tratou de um julgamento político, que não se pretendeu  técnico, nem juridicamente perfeito, ainda que fosse presidido pelo então presidente do STF.

       A nação, pelos seus representantes, foi o tribunal. O STF é o cimo do poder judiciário. Sua sentença não pode ser constitucionalmente contestada, mesmo porque ele é, também, o tribunal que decide se isso ou aquilo é constitucional, ou não.




A História, mais cedo do que tarde, fará a revisão desse processo, para infirma-lo, por não atender às exigências do due process of law, nem a legitimidade para realizar um julgamento político.


    O julgamento político de Dirceu, justo ou não, já foi feito pela Câmara dos Deputados, que lhe cassou o mandato. 
      
Este texto foi publicado também nos seguintes sites:
http://www.jb.com.br/coisas-da-politica/noticias/2012/11/16/mensalao-um-julgamento-politico/
http://www.conversaafiada.com.br/
http://blogdadilma.com/index.php/politica/1253-grave-erro-de-um-julgamento-politico
http://midiacrucis.wordpress.com/2012/11/16/mensalao-um-julgamento-politico/
http://www.viomundo.com.br/politica/santayana-julgamento-da-ap-470-corre-o-risco-de-ser-um-dos-erros-judiciarios-mais-pesados-da-historia.html
http://falariodasostras.blogspot.com.br/2012/11/a-nacao-pelos-seus-representantes-foi-o.html
http://contextolivre.blogspot.com.br/2012/11/um-julgamento-politico.html
http://cezarcanduchopt13.blogspot.com.br/2012/11/mensalao-um-julgamento-politico.html
http://www.dignow.org/post/mensal%C3%A3o-um-julgamento-pol%C3%ADtico-mauro-santayana-4782316-39372.html
http://olhosdosertao.blogspot.com.br/2012/11/grave-erro-de-um-julgamento-politico.html
http://jornalaico.blogspot.com.br/2012/11/o-maior-erro-judiciario-da-historia-do.html
http://www.paraiba.com.br/colunista/joao-costa/39915-tal-qual-o-tribunal-do-santo-oficio-torquemada
http://www.tribunadaimprensa.com.br/?p=52653
http://www.gustavoguedesnatal.com/2012/11/o-julgamento-da-ap-470-foi-politico.html
http://blogdadilma.com/index.php/politica/1244-mauro5
http://007bondeblog.blogspot.com.br/2012/11/mensalao-um-julgamento-politico-mauro.html
http://luizfelipemuniz.blogspot.com.br/2012_11_01_archive.html
http://facasuahistoria.blogspot.com.br/2012/11/altamiro-borges-grave-erro-de-um.html
http://altamiroborges.blogspot.com.br/2012/11/grave-erro-de-um-julgamento-politico.html?spref=bl
http://wwwcenopoesiadobrasil.blogspot.com.br/2012/09/carta-de-jao-pessoa-rbtr.html

Fonte:
http://www.maurosantayana.com/2012/11/um-julgamento-politico.html