segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Sobrevivência e terrorismo: a sina da oposição

05/12/2013 - A sina da oposição: sobrevivência e terrorismo
- Jeferson Miola (*) - de Porto Alegre - Correio do Brasil

Depois da incandescência das ruas em junho, análises apressadas pintavam um cenário de terra arrasada para a Dilma.

Foi incrível a seletividade de determinados analistas, que alardeavam o pior dos mundos para a Presidenta, mas omitiam que a insatisfação era generalizada e difusa, e abarcava todo o sistema político, a política, os governos e os políticos.

Passado o rescaldo daqueles acontecimentos, sucessivas pesquisas de opinião indicam um ambiente de melhora do desempenho eleitoral de Dilma.

Em todas as simulações – de todos os institutos de pesquisa -, a Presidenta ostenta considerável chance de reeleição, inclusive no primeiro turno.

A oposição, entretanto, segue colecionando dificuldades.

Para ela, o cenário mais alentador é, curiosamente, aquele no qual figuram as “candidaturas-sombras” de Marina Silva e José Serra.

Os até agora “candidatos titulares” Eduardo Campos e Aécio Neves [acima] peleiam com seus fantasmas para manterem suas candidaturas, podendo chegar em 2014 menores do que são hoje.

A potencial reeleição de Dilma, que culminaria um ciclo de 16 anos de governos dirigidos pelo PT, levará o reacionarismo capitaneado pelo PSDB, PPS e DEM ao ocaso.

Com sua visão de um país arcaico, excludente e colonizado, aqueles partidos perdem a capacidade de interpretação e de aderência ao Brasil contemporâneo.

A profecia deles, do “fim da raça”, [1] finalmente terá se realizado; porém, com as setas invertidas – em desfavor deles mesmos.

Nesse contexto, a candidatura do Aécio é tão sólida quanto a chance de se converter em pó.

O PSDB, pela primeira vez na trajetória do partido, enfrenta a perspectiva real de uma derrota acachapante no próximo ano.

Para os tucanos [mas também para seus satélites PPS e DEM], a eleição de 2014 terá como prioridade a sobrevivência partidária e a preservação dos espaços de poder ameaçados de mudar de guarda.

Não se pode descartar, por isso, a hipótese da candidatura presidencial de José Serra em lugar da de Aécio.

Alckmin e Aécio teriam, assim, a função de proteger a joia da coroa do PSDB: os governos de SP e MG.

Aliás, uma tarefa difícil, para quem terá de se explicar sobre escândalos escabrosos: cartel do metrô e o genuíno mensalão.

Adicionalmente, outros dois espectros rondam as eleições.

O primeiro, de nome Joaquim Barbosa.

Sua candidatura, se confirmada, materializaria eleitoralmente o bloco de poder conformado pela mídia conservadora e setores reacionários do Judiciário.

É esse bloco que, na realidade, agenda e articula o combate ideológico ao PT e ao governo Dilma, substituindo os partidos da direita, que estão aos frangalhos e minguando sua audiência na sociedade.

Não existe espaço no Brasil contemporâneo para uma nova farsa do gênero “caçador de marajás”.

A Rede Globo não conseguirá converter Joaquim Barbosa em um santo; aliás, um Ministro adepto de manobras fiscais para investir em Miami.

O império da família Marinho não conseguirá construir essa nova mitificação da política brasileira, como fez com Fernando Collor em 1989 para derrotar Lula.

A opção Joaquim será calculada não pela aspiração de vitória com ele, mas como variável para levar a eleição para o segundo turno.

O contexto proclive para a ocorrência de segundo turno é aquele que apresenta na cédula eleitoral os nomes de Dilma, Serra, Marina e Joaquim.

O justiceiro, jacobino, vingativo, exemplar e inexpugnável Barbosa seria um veículo para se tentar barrar a reeleição direta de Dilma.

O outro espectro que ronda a próxima eleição de 2014 atende pelo nome de Lula.

Com considerável insistência é cogitada a candidatura dele em lugar da de Dilma; insinuação que se propaga na base de apoio do governo, nos meios empresariais, no sistema financeiro e junto a setores militantes.

Os pretextos são uníssonos, tanto dentro como fora do PT: a heterodoxia econômica e o estilo da Presidenta.

Embora o próprio Lula rechace, essa insinuação paira no ar como uma bruma, fomentada na mídia pelas manjadas “fontes próximas ao ex-Presidente”.

É problemático esse procedimento, porque involuntariamente [ou deliberadamente?] expõe Dilma a tensões conservadoras [e inclusive regressivas] na definição do programa e no perfil do eventual segundo governo.

Porém, ao mesmo tempo, não deixa de ser cômodo para o governo – e terrível para a oposição – saber que pode contar com um suplente eleitoralmente insuperável, caso a conjuntura econômica e política degringole.

Hoy por hoy – como se diz em castelhano -, a perspectiva é desalentadora para a oposição conservadora, que vive o dilema de tentar sobreviver enfrentando uma tendência de derrota e de definhamento de sua representação política.

A realidade para a direita é tão mais dramática quanto mais evidente é a obsolescência programática e a incapacidade de oferecer uma visão generosa de futuro para um país que, não sem importantes limites e contradições, finalmente passou a ingressar na modernidade.

Devemos nos preparar para uma conjuntura complicada até as eleições de 2014.

A oposição não se dará por vencida, e poderá promover um terrorismo político, econômico, moral e midiático jamais visto na política brasileira.

Não se pode menosprezar a capacidade de sabotagem, de difusão de ódio e a vilania deles nessa luta derradeira de sobrevivência.

Eles querem sequestrar o Brasil dos brasileiros.

(*) Jeferson Miola, integrante do Instituto de Debates, Estudos e Alternativas de Porto Alegre (Idea), foi coordenador-executivo do 5º Fórum Social Mundial.

Fonte:
http://correiodobrasil.com.br/noticias/opiniao/a-sina-da-oposicao-sobrevivencia-e-terrorismo/667678/?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm_campaign=b20131206

[1] Proferido por Jorge Bornhausen, do DEM

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

domingo, 8 de dezembro de 2013

Ideário de Jango vive

06/12/2013 - Ideário de Jango vive na luta de seu filho pelas reformas sociais de base
- Por Redação, com ABr - de Brasília - Correio do Brasil

Restos mortais do ex-presidente Jango foram transportados de volta ao Sul do Brasil

Pouco antes da partida do voo que transportou os restos mortais do ex-presidente João Goulart, nesta sexta-feira, para serem novamente enterrados – agora, com honras militares a um chefe de Estado – em São Borja, João Vicente Goulart, filho do ex-presidente, defendeu as ideias do pai.

Para ele, o Brasil precisa avançar em educação e nas reformas agrária e tributária.

– Para se modernizar o país precisa avançar, precisa conduzir a reforma agrária, a reforma educacional, a reforma tributária; em vez de tributar salários, tem que tributar patrimônio.

Hoje, nós da família estamos retornando com os restos mortais dele [Goulart] para sua cidade, para o seu povo, para a sua terra.

Sem dúvida, além de cumprir esse papel, estamos fazendo revisionismo da vida, da luta e das propostas do João Goulart há 50 anos – afirmou.

João Vicente disse que o Brasil precisa de uma agenda que retome pontos essenciais do governo de Jango e citou as reformas de base propostas pelo político e que contribuíram para motivar o golpe militar de 1964.

– O golpe não foi dado contra o presidente, foi contra as reformas de base propostas pelo governo João Goulart [foto] e que até hoje muitas delas se fazem necessárias – disse o filho do ex-presidente que também defendeu a reforma do Estado brasileiro.

Criadas durante o governo João Goulart, as chamadas reformas de base, propunham uma série de reformas institucionais visando a atuar sobre os problemas estruturais do país, entre elas, as reformas bancária, fiscal, urbana, eleitoral, agrária e educacional.

As medidas, de apelo social e popular, não foram bem recebidas por setores conservadores ligados ao latifúndio e às indústrias.

O acirramento das posições culminou com o golpe de estado, em 1º de abril de 1964, no qual os militares depuseram o então presidente.

– O ano de 2014 não é apenas o ano da Copa do Mundo, também são 50 anos do golpe de Estado e, antes da festa do futebol, a sociedade brasileira deveria refletir sobre os 50 anos do golpe para que nunca mais aconteça – disse o filho de Jango.

Os restos mortais de João Goulart serão enterrados na tarde desta sexta-feira, em São Borja.

Antes, haverá uma celebração religiosa na Igreja Matriz São Francisco, onde o povo da cidade, numa atitude de resistência, velou o corpo do ex-presidente, apesar da pressão da ditadura.

Os resto mortais foram exumados em novembro a pedido da família que duvida da causa da morte do ex-presidente.

Cardiopata, ele teria sofrido um infarto, mas uma autópsia nunca foi realizada.

A suspeita da família é que Jango tenha sido envenenado a mando do governo brasileiro, na chamada Operação Condor, a aliança entre as ditaduras do Cone Sul para eliminar opositores além das fronteiras nacionais. A investigação é conduzida pela Comissão Nacional da Verdade (CNV).

Fonte:
http://correiodobrasil.com.br/noticias/politica/ideario-de-jango-vive-na-luta-de-seu-filho-pelas-reformas-sociais-de-base/668041/?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm_campaign=b20131207

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

sábado, 7 de dezembro de 2013

O choro hipócrita por Mandela

"À época do apartheid, numa das revoltas do Soweto, sob o governo branco de Botha, o governo terrorista e racista de Israel ofereceu armas nucleares ao governo sul africano para enfrentar o levante do povo negro.

Mandela era classificado como terrorista não só por Margareth Teatcher, mas pelos norte-americanos, israelenses e sicários.

Mandela, comunista, sempre foi visto com desconfiança, mesmo depois de solto e presidente do seu país, por essa gente.

Hoje, com sua morte, existe a dor entre os que são oprimidos e a hipocrisia entre os que oprimem.

Num mundo de líderes medíocres, de figuras de segunda categoria política, Chávez, Nelson Mandela e Fidel Castro [foto] somavam as únicas lideranças mundiais com status de estadistas. Resta Castro.

Cada vez mais vamos tomando a feição de objetos, diante do deus consumo, denúncia feita pelo próprio papa.

E quando morre uma figura como Nelson Mandela, não é questão do mundo ficar mais pobre.

Fica mais sombrio, frio e acelera o rumo ao precipício que o capitalismo com todas as suas malignidades, racismo, opressão, exploração, etc, vai nos levando."
(Laerte Braga)

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06/12/2013- Chora por Mandela, mas acha um absurdo pobre querer os mesmos direitos
- Leonardo Sakamoto - em seu blog

Precisamos de mais pessoas como Mandela.

Pessoas que são capazes de usar a força quando necessário e adotar uma atitude conciliadora quando preciso. Mas que não descartam qualquer uma das duas ações políticas.

Por conta da morte de Mandela, estamos sendo soterrados por reportagens que louvam apenas um desses lados e esquece o outro, como se as folhas de uma árvore existissem sem o seu tronco e os galhos.

O apartheid não morreu apenas por conta do sorriso bonito e das falas carismáticas do líder sul-africano, mas por décadas de luta firme contra a segregação coordenada por uma resistência que ele ajudou a estruturar.

É fascinante como regimes execrados pelo Ocidente foram, muitas vezes, os únicos que estenderam a mão a Mandela e à luta contra o apartheid.

E como, décadas depois, muitos países prestam suas homenagens a ele, sem um mísero mea culpa por seu papel covarde durante sua prisão.

Ou, pior: como veículos de comunicação desse mesmo Ocidente ignoram a complexidade da luta de Mandela, defendendo que o pacifismo foi o seu caminho.

Desculpem, mas a necessária conciliação para curar feridas ou a tolerância são diferentes de injustiça.

E ser pacifista não significa morrer em silêncio, em paz, de fome ou baioneta.

A desobediência civil professada por Gandhi é uma saída, mas não a única e nem cabe em todas as situações em que um grupo de pessoas é aviltado por outro.

“Eu celebrei a ideia de uma sociedade livre e democrática, na qual todas as pessoas vivam juntas em harmonia e com oportunidades iguais.

É um ideal pelo qual espero viver e o qual espero alcançar.

Mas, se for necessário, é um ideal pelo qual estou pronto para morrer'', disse ele, ao ser condenado a 27 anos de prisão.

As histórias das lutas sociais ao redor do mundo são porcamente ensinadas.

Ao ler o que os jovens aprendem nas carteiras escolares ou no conteúdo trazido por nós jornalistas, fico com a impressão que a descolonização da Índia, o fim do apartheid na África do Sul ou a independência de Timor Leste foram obtidas apenas através de longas discussões regadas a chá e um pouco de desobediência.

Dessa forma, a interpretação dos fatos, passada adiante, segue satisfatória aos grupos no poder.

Muitos que hoje lamentam por Mandela detestam manifestações públicas e mudanças no status quo.

Adoram um revolucionário quando este é reconhecido internacionalmente e aparece em estampas de camisetas, mas repudiam quem ocupa propriedades, por exemplo, “impedindo o progresso''.

Leio reclamações da violência de protestos quando estes vêm dos mais pobres entre os mais pobres – “um estupro à legalidade” – feitas por uma legião de pés-descalços empunhando armas de destruição em massa, como enxadas, foices e facões.

Ou contra povos indígenas, cansados de passar fome e frio, reivindicando territórios que historicamente foram deles, na maioria das vezes com flechas, enxadas e paciência.

Ou ainda professores que exigem melhores salários e resolvem ir às ruas para mostrar sua indignação e pressionar para que o poder público mude o comportamento.

Todos eles são uns vândalos.

Daí, essa pessoa que ama Mandela, mas não sabe quem ele é, pensa: poxa, por que essa gente maltrapilha simplesmente não sofre em silêncio, né?

Muitas das leis criticadas em protestos e ocupações de terra ou mesmo no apartheid não foram criadas pelos que sofrem em decorrência de injustiça social, mas sim por aqueles que estavam ou estão na raiz do problema e defendem regras para que tudo fique como está.

Nem sempre a legalidade é justa. E essa frase assusta muita gente.

Mandela é a inspiração.

Com ele, é possível acreditar que manifestações populares e ocupações resultem nos pequenos vencendo os grandes.

E, com o tempo, os rotos e rasgados sendo capazes de sobrepujar ricos e poderosos.

Por isso, o desespero inconsciente presente em muitas reclamações sobre a violência inerente ou involuntária desses atos.

Ou na tentativa de reescrever a história editando aquilo que não interessa.

Enquanto isso, mais um indígena foi morto no Mato Grosso do Sul.

Mas tudo bem. Devia ser apenas mais um vândalo, não um homem de bem como Mandela.

Enfim, precisamos de mais pessoas como Mandela.

Pois os bons do século 20 estão morrendo antes que realmente entendamos suas mensagens.

Fonte:
http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2013/12/06/chora-por-mandela-mas-acha-um-absurdo-pobre-querer-os-mesmos-direitos/

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.


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Pablo Neruda - homenagem do Educom a Nelson Mandela

FICA PROIBIDO 

Fica proibido chorar sem aprender,
levantar-se um dia sem saber o que fazer, 
ter medo de suas lembranças.

Fica proibido não rir dos problemas,
não lutar pelo que se quer,
abandonar tudo por medo,
não transformar sonhos em realidade.

Fica proibido não demonstrar amor, 
fazer com que alguém pague por suas dívidas
e mau humor.

Fica proibido deixar os amigos,
não compreender o que viveram juntos,
chamá-los somente quando necessitar deles.

Fica proibido não ser você mesmo diante das pessoas,
fingir que elas não lhe importam,
ser gentil só para ser lembrado,
esquecer aqueles que gostam de você.

Fica proibido não fazer as coisas por si mesmo quando puder fazê-las,
ter medo da vida e de seus compromissos,
não viver cada dia como se fosse o último suspiro. 

Fica proibido sentir saudades de alguém sem se alegrar,
esquecer seus olhos, seu sorriso, só porque seus
caminhos se desencontraram,
esquecer seu passado e pagá-lo com seu presente.

Fica proibido não tentar compreender as pessoas,
pensar que as vidas delas valem mais do que a sua,
não saber que cada um tem seu caminho e sua sorte,
não ter um momento para quem necessita de você,
não compreender que o que a vida dá ela também tira. 

Fica proibido não buscar a felicidade,
não viver sua vida com uma atitude positiva,
não pensar que podemos ser melhores.

Fica proibido não pensar que sem você este mundo não seria igual.

Shosholoza, Madiba

Shosholoza, Madiba (Seguindo adiante, Madiba)
Wen'uyabaleka (Você está indo embora)
Wen'uyabaleka (Você está indo embora)
Kule ... Zontaba (Através das montanhas)
Stimela siphume South Africa (Trem da África do Sul)


Canto e silêncio para Rolihlahla Madiba Mandela, de etnia Xhosa, de um pequeno vilarejo em Transkei, oeste da África do Sul e que se tornou exemplo da luta pela libertação de seu povo e da equidade racial.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

A Amazônia que o BNDES financia

05.12.13 - Por Bruno Fonseca e Jessica Mota
- da série #BNDESnaAmazônia - Agência Pública

Pela lei de acesso à informação, a Pública obteve 43 contratos do BNDES com grandes corporações nacionais para empreendimentos na Amazônia.

Nos calhamaços de papel assinados e rubricados diversas vezes por gigantes da economia brasileira – Vale, Eletrobrás, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Votorantim, Alcoa, dentre outros -, saltam cifras de 500 milhões, 1 bilhão, até quase 10 bilhões de reais.

São os contratos de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a uma série de megaempreendimentos na Amazônia, que não são disponibilizados publicamente pelo banco, embora todas essas obras sejam custeadas com o dinheiro de impostos.

A Pública entrou com um pedido de acesso à informação para obter os contratos dos principais investimentos do BNDES em projetos de infraestrutura na Amazônia brasileira e obteve 43 contratos que revelam detalhes sobre o financiamento de projetos de empresas e estados – as garantias exigidas, os compromissos socioambientais acordados – e descobriu que, na prática, muitas dessas obras desrespeitam o que foi assinado, contribuindo para muitos dos problemas que a reportagem vem encontrando ao longo da produção dessa série, motivando inclusive ações judiciais.

O curioso é que isso ocorre apesar da complexidade de procedimentos que o processo de obtenção do financiamento implica. Para pleitear um empréstimo, é preciso enviar um pedido formal, que tem de ser acompanhado de documentação específica de acordo com a modalidade de financiamento – o banco oferece 11 produtos diferentes, cada um com linhas de financiamento específicas.

Esse documento inicial tem que conter dados gerais sobre a operação e dados específicos sobre o projeto em questão, incluindo informações sobre os aspectos econômicos e financeiros da empresa e do seu mercado de atuação; e sobre os aspectos jurídicos, com todos os estudos e licenças de operação e meio ambiente emitidos pelos órgãos responsáveis, como o IBAMA ou a Secretaria de Meio Ambiente.

Caso o projeto apresente algum impacto ambiental, são negociadas medidas de compensação através de outras linhas de apoio paralelas oferecidas pelo BNDES, voltadas ao meio ambiente.

A empresa também responde a um questionário sobre os aspectos e impactos sociais da empresa e do projeto.

Assim, o Comitê de Enquadramento e Crédito do BNDES, formado pelos 23 superintendentes do banco, classifica a operação com base nos riscos ambientais apresentados na proposta.

Só então o banco prossegue com a aprovação e a contratação do financiamento do projeto pela diretoria, formada pelo presidente, vice e sete diretores do BNDES. O contrato de financiamento não é disponibilizado no site do BNDES ou em outra plataforma ao alcance do público.

No caso dos contratos internacionais, o acesso à Pública foi negado, mesmo pela Lei de acesso à informação.

CLÁUSULAS SÃO INSUFICIENTES PARA PROTEÇÃO DE DIREITOS HUMANOS E MEIO AMBIENTE
Através da análise dos 43 contratos aos quais a Pública teve acesso, foi possível perceber que mesmo com tantas exigências formais por parte do BNDES, as cláusulas que dizem respeito à proteção dos direitos humanos e meio ambiente são estipuladas, em sua maioria, através de parágrafos padronizados, e não garantem o cumprimento de compromissos de acordo com a especificidade dos projetos.

Por exemplo, a frase “manter em situação regular suas obrigações juntos aos órgãos do meio ambiente, durante o período de vigência deste Contrato” está presente em todos os documentos analisados, bem como “adotar, durante o período de vigência deste Contrato, as medidas e ações destinadas a evitar ou corrigir danos ao meio ambiente, segurança e medicina do trabalho que possam vir a ser causados pelo projeto”.

Não há detalhes tampouco nas Disposições Aplicáveis aos Contratos do BNDES, destinadas a todos os contratantes, que se limitam a estipular o cumprimento das obrigações estabelecidas por Lei, sem maiores acréscimos.

Até onde se sabe, não haveria uma customização. As cláusulas [socioambientais] não são desenhadas de acordo com o projeto, são cláusulas padrão”, critica Caio Borges, pesquisador da Conectas – ONG que promove os direitos humanos na África, América Latina e Ásia.

Na visão do pesquisador, o processo ideal para esses contratos envolveria três etapas: a elaboração de uma política de direitos humanos, a realização de auditoria em direitos humanos – “que criariam ferramentas operacionais [para] que essa política esteja efetivamente dentro da rotina e dos processos da empresa”, como explica Caio – e a criação de mecanismos operacionais de denúncia e reclamação a exemplo das ouvidorias dos bancos multilaterais, como o Banco Mundial.

Deve existir um canal institucional de diálogo em que uma pessoa que se sinta atingida possa ligar para o banco e dizer que aquele projeto está violando algum direito dela ou que alguma política do banco está sendo descumprida e que aquele projeto não está seguindo os procedimentos que o próprio banco estipula”, diz Caio que acredita que só assim, e com uma melhor fiscalização dos órgãos públicos responsáveis pela concessão de licença, seria possível estancar o uso de dinheiro público em projetos que descumprem as salvaguardas sócio-ambientais tanto no Brasil como em outros países.

DE BELO MONTE A IMPERATRIZ: LICENÇAS QUESTIONADAS
É este o caso de diversos empreendimentos que tiveram suas licenças ambientais questionadas, como a polêmica usina de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará.

Mesmo após a Justiça brasileira determinar paralisação das obras por ilegalidade no licenciamento ambiental, o BNDES não divulgou qualquer modificação ou sanção em relação aos contratos de mais de 25 bilhões de reais firmados com o consórcio responsável, a Norte Energia.

E isso em um contrato que se destaca entre outros do BNDES por haver um maior detalhamento nas condicionantes socioambientais, entre eles, a obrigação de cumprimento das diretrizes dos Princípios do Equador, estabelecidas pelo International Finance Corporation (IFC), do Banco Mundial.

Ali se estipulam as regras para avaliações ambientais; proteção a habitats naturais; segurança de barragens; populações indígenas; reassentamento involuntário de populações; trabalho infantil, forçado ou escravo; projetos em águas internacionais e saúde e segurança no trabalho; dentre outros.

Já na construção da usina produtora de celulose da Suzano, em Imperatriz, no Maranhão, objeto de um contrato de mais de 2,7 bilhões de reais, o BNDES determinou à Suzano “adotar, durante o período de vigência deste Contrato, medidas e ações destinadas a evitar ou corrigir danos ao meio ambiente, segurança e medicina do trabalho que possam vir a ser causados pelo projeto”.

Entretanto, a construção da usina, em andamento no interior do Maranhão, está envolvida na morte de três funcionários, isso após o Ministério Público do Trabalho ter constatado, seguidamente, problemas de segurança no canteiro de obras.

Uma das empresas envolvidas no projeto, a Imetame, chegou a se recusar a  assinar um Termo de Ajustamento de Conduta do MPT (leia mais aqui), o que mostra como, na prática, a lei é ignorada.

- Leia e baixe os 45 contratos que a Pública teve acesso e que estão exibidos no final dessa matéria, acessando o link da fonte:

Fonte:
http://www.apublica.org/2013/12/amazonia-bndes-financia/

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.