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quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

STF: em 1995, Celso de Mello reconheceu separação de poderes

Cassação de mandatos é adiada no aniversário do AI-5 

Se, como já indicou, sacramentar a cassação dos deputados condenados pelo que a mídia convencionou chamar de "mensalão", o ministro do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello irá de encontro a seus próprios princípios. Em 1995, Mello acatou recurso do então vereador de Araçatuba (SP) Pedro Martinez de Souza (PPB), questionando a perda de seu mandato após condenação por crime eleitoral. O decano do STF proferiu então que um parlamentar somente poderia perder o mandato por ato da mesa legislativa, como assegura a Constituição. Celso de Mello contribuiu assim para formar a maioria que permitiu a Souza voltar à Câmara de Araçatuba em 1996. 

Por causa da internação de Mello esta manhã para tratar uma pneumonia, a definição da Corte sobre os mandatos foi adiada. Ele será o último ministro a se pronunciar na matéria, já que o sucessor de Cezar Peluso, Teori Zavascki, está impedidoNesta quinta, o Ato Institucional Nº 5 completa 44 anos. Entre 1968 e 1978, o AI-5 permitiu a cassação generalizada de mandatos pela ditadura.

Mello (ao fundo) e, abaixo, com Joaquim Barbosa. Fotos: FRP/ABr

Estão ameaçados de perda do mandato os deputados federais João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP). A votação do STF, que pode resultar na cassação dos três condenados na Ação Penal 470, está empatada em 4 a 4. Por remeter a decisão à Câmara votaram o relator-revisor Ricardo Lewandowski, Carmen Lúcia, Dias Toffoli e Rosa Weber. Votaram pela cassação imediata o relator e atual presidente da Corte Suprema Joaquim Barbosa, além dos ministros Gilmar Mendes, Luiz Fux e Marco Aurélio Mello. 


No parágrafo 2º do artigo 55, a Constituição da República Federativa do Brasil diz que, caso ainda se encontre o sentenciado no exercício do cargo parlamentar por ocasião do trânsito em julgado desta decisão, "a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa".

Impasse e risco de crise institucional
A conclusão do julgamento da AP 470 foi interrompida na última segunda-feira, 10, quando a votação sobre cassar ou não os mandatos dos três parlamentares estava em 4 votos a 4. Toda a polêmica vem do fato de que a Constituição tem duas interpretações sobre o tema. A primeira refere-se à condenação em ação criminal, que é a hipótese para suspensão de direitos políticos. Na segunda interpretação é aberta exceção no caso de parlamentares, atestando que somente as respectivas Casas Legislativas podem decretar a perda de mandato após processo interno específico. 

No dia 6, a discussão começou na Corte Suprema com os votos do presidente da instituição e relator da ação, Joaquim Barbosa, e do ministro-revisor, Ricardo Lewandowski. Eles apresentaram votos opostos. Barbosa defende a perda de mandato imediata por condenação criminal, enquanto Lewandowski diz que não cabe ao Supremo a intervenção política. Sem o voto computado oficialmente, o ministro Celso de Mello sinalizou, nas duas últimas sessões, que deverá acompanhar o entendimento de Barbosa. Para o relator, a perda do mandato deve ser decretada judicialmente pelo STF, e ao Congresso Nacional cabe apenas ratificar a determinação.

O risco de que parlamentares tenham seus mandatos cassados por outro dos poderes da República provocou duras críticas. Esta semana o presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), antecipou em entrevista coletiva que o Poder Legislativo reagiria com firmeza caso o Judiciário exorbitasse suas atribuições com cassação de deputados federais. A maioria dos líderes da Casa - até mesmo de partidos de oposição como o PSDB - manifestou apoio a Maia. Parlamentares do PT acusaram Joaquim Barbosa e os ministros que o seguiram no voto de tentar provocar uma crise institucional. Ao que tudo indica, a bola está com Celso de Mello e esperemos que seja coerente, marcando um gol para as instituições democráticas. (R.B., com Agência Brasil e portal '247')

Leia aqui o voto do ministro Celso de Mello há 17 anos.

Mais:
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Grotescos e malandros alimentam crise entre STF e Congresso

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Bacuri recebe título póstumo de Cidadão Paulistano. Sobre a morte de Eduardo Leite e a cumplicidade da Folha

Do blog "Limpinho e cheiroso", via Blog do Miro
SÃO PAULO - Hoje, dia 7 de dezembro, o assassinato brutal de um herói da luta contra a ditadura empresarial-militar (1964-85) completa 40 anos. Logo mais, às 19 horas, na Câmara dos Vereadores de São Paulo, Eduardo Collen Leite, o Bacuri, receberá in memoriam o título de Cidadão Paulistano, por iniciativa dos vereadores Juliana Cardoso e Ítalo Cardoso (PT).

Para quem não o conheceu, trata-se de mais um dos casos de absoluta crueldade da repressão. Na madrugada da véspera de ser retirado do Dops para ser assassinado, aos 25 anos de idade, a repressão lhe entregou – na cela onde estava sozinho – um exemplar da Folha da Tarde que noticiava sua “fuga”.

Para que jamais esqueçamos a história, a Folha da Tarde era aquele pasquim que o senhor Otávio Frias – pai do senhor Otávio Frias Filho – cedeu graciosamente ao esquadrão da morte durante os dois anos finais dos 1960 e que assim continuou até o final dos anos de 1970.

Bacuri tem uma das histórias mais bonitas de nossa resistência. Quando foi preso, sua companheira – a camarada Denize – estava grávida. Meses depois, nasceu a Maria Eduarda.

Quem não puder comparecer ao evento, envie uma mensagem dirigida a essas duas mulheres para o endereço da Denize Crispim Perez: zdenize@gmail.com.

Leia a seguir o texto sobre Bacuri que está no sítio do Tortura Nunca Mais:

Cumplicidade entre a mídia e a repressão

O relato abaixo serve para demonstrar a ação combinada e orgânica entre a repressão da ditadura militar de 64 e os órgãos da mídia oligárquica no Brasil.

O assassinato de Eduardo Collen Leite, o “Bacuri”, é um dos mais terríveis dos que se tem notícia, já que as torturas a ele infligidas duraram 109 dias consecutivos, deixando-o completamente mutilado. Quando o corpo foi entregue aos familiares estava sem orelhas, com olhos vazados e com mutilações e cortes profundos em toda a sua extensão.

Foi preso no dia 21 de agosto de 1970, no Rio de Janeiro, pelo delegado Sérgio Fleury e sua equipe, quando chegava em sua casa. Passou pelo Cenimar/RJ e DOI-Codi/RJ, onde foi visto pela ex-presa política Cecília Coimbra, já quase sem poder se locomover.

Do local da prisão, Eduardo foi levado a uma residência particular onde foi torturado. Seus gritos e de seus torturadores chamaram a atenção dos vizinhos, que avisaram a polícia. Ao constatar de que se tratava da equipe do delegado Fleury, pediram apenas para que mudassem o local das torturas.

Após ser torturado na sede do Cenimar, no Rio de Janeiro, Eduardo foi transferido para o 41° Distrito Policial, São Paulo, cujo delegado titular era o próprio Fleury.

Novamente transferido para o Cenimar/RJ, Eduardo permaneceu sendo torturado até meados de setembro, quando voltou novamente para São Paulo, sendo levado para a sede do DOI-Codi. Em outubro, foi removido para o Dops paulista, sendo encarcerado na cela 4 do chamado “fundão” (celas totalmente isoladas).

Em 25 de outubro, todos os jornais do País divulgaram a nota oficial do Dops/SP relatando a morte de Joaquim Câmara Ferreira (comandante da ALN), ocorrida em 23 de outubro. Nesta nota, foi inserida a informação de que Bacuri havia conseguido fugir, sendo ignorado seu destino. Foi encontrado nos arquivos do Dops a transcrição de uma mensagem recebida do Dops/SP pela 2ª seção do IV Exército, assinada pelo coronel Erar de Campos Vasconcelos, chefe da 2ª Seção do II Exército, dizendo “que foi dado a conhecer a repórteres da imprensa falada e escrita o seguinte roteiro para ser explorado dentro do esquema montado”.

O tal roteiro falava da morte súbita de Câmara Ferreira após ferir a dentadas e pontapés vários investigadores. E mais adiante diz “Eduardo Leite, o Bacuri, cuja prisão vinha sendo mantida em sigilo pelas autoridades, havia sido levado ao local para apontar Joaquim Câmara Ferreira (...) Aproveitando-se da confusão, Bacuri (...) logrou fugir (...)”. Estava evidenciado o plano para assassinar Eduardo Collen Leite

O testemunho de cerca de 50 presos políticos recolhidos às celas do Dops paulista (entre eles, o gaúcho Ubiratan de Souza, da VPR) neste período prova que Eduardo jamais saíra de sua cela naqueles dias, a não ser quando era carregado para as sessões diárias de tortura. Eduardo era carregado porque não tinha mais condições de manter-se em pé, muito menos de caminhar ou fugir, após dois meses de torturas diárias.

O comandante da tropa de choque do Dops/SP, tenente Chiari da PM paulista, mostrou a Eduardo e a inúmeros outros presos políticos, no dia 25, os jornais que noticiavam sua fuga.

Para facilitar a retirada de Eduardo de sua cela, sem que os demais prisioneiros do Dops percebessem, o delegado Luiz Gonzaga dos Santos Barbosa, responsável pela carceragem do Dops àquela época, exigiu o remanejamento total dos presos, e a remoção de Eduardo para a cela n° 1, que ficava defronte à carceragem e longe da observação dos demais presos. Seu nome foi retirado da relação de presos, as dobradiças e fechaduras de sua cela foram lubrificadas de forma a evitar ruídos que chamassem a atenção.

Os prisioneiros políticos, na tentativa de salvar a vida de seu companheiro, montaram um sistema de vigília permanente. Aos 50 minutos do dia 27 de outubro

Segundo testemunho de Ubiratan, todos os presos chegaram junto às grades e estendiam braços e mãos para cumprimentar ou simplesmente tocar em Bacuri, ao mesmo tempo que vibravam talheres e copos metálicos no ferro das grades numa demonstração de protesto pela iminente morte de um companheiro. Todos sabiam que Bacuri seria executado.

Eduardo não foi mais visto. Os carcereiros do Dops, frequentemente questionados sobre o destino de Bacuri, só respondiam que ele havia sido levado para interrogatórios em um andar superior. Os policiais da equipe do delegado Fleury respondiam apenas que não sabiam; apenas o policial conhecido pelo nome de Carlinhos Metralha é que afirmou que Eduardo estava no sítio particular do delegado Fleury. Tal sítio era usado pelo delegado e sua equipe para torturar os presos considerados especiais ou os que seriam certamente assassinados e, por isso, deveriam permanecer escondidos.

Em 8 de dezembro, 109 dias após sua prisão, e 42 dias após seu sequestro do Dops, os grandes jornais do País publicavam nota oficial informando a morte de Eduardo em “um tiroteio nas imediações da cidade de São Sebastião”, no litoral paulista. Era evidente o conluio entre a repressão e a mídia, nesta farsa montada para eliminar Eduardo Leite.

A notícia oficial da morte de Eduardo teve um objetivo claro: tirar as condições da inclusão de seu nome na lista das pessoas a serem trocadas pela vida do embaixador da Suíça no Brasil, que havia sido sequestrado em 7 de dezembro. Seu nome seria incluído nessa lista e seria impossível soltar o preso Eduardo que, oficialmente, estava foragido e, além do mais, completamente desfigurado e mutilado pela tortura.


As informações são do grupo Tortura Nunca Mais e de Ubiratan de Souza.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

"Utopia e Barbárie", de Silvio Tendler

Por Vinnicius Moraes, em seu blog*
Nessa quinta-feira, na abertura do 1º Encontro Regional de Blogueiros Progressistas, em Juiz de Fora, assisti ao filme "Utopia e Barbárie", do cineasta Silvio Tendler.

O documentário retrata os sonhos e as inúmeras lutas que moveram a humanidade desde o início do século XX. Contudo, o roteiro alerta aos espectadores sobre a proximidade dos dois movimentos: utopia e barbárie.

Após a exibição do filme, o documentarista conversou com os participantes do Encontro, que lotaram o Anfiteatro João Carriço, na região central da cidade.

Durante o bate-papo, citando o que dissera o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a blogueiros que o entrevistaram nessa quarta-feira ("as Forças Armadas dizem que não têm mais arquivo"), perguntei ao cineasta se, em sua opinião, ocultar a verdade - mesmo depois de tanto tempo - não é uma nova forma de barbárie, em que se tortura toda a sociedade brasileira...

Concordando com o argumento que apresentei, Silvio afirmou que "existir, ainda hoje, gente insepulta é um crime", citando detalhes da história do jornalista Bernardo Kucinscki - que participa de "Utopia e Barbárie" - em sua luta para encontrar a irmã Ana Rosa, desaparecida desde abril de 1974.

Outro momento bastante interessante foi a "leitura" do filme apresentada pelo jornalista juiz-forano Laerte Braga, a partir da citação - no documentário - do escritor Guy Debord, que escreveu em 1967 "La société du spectacle" ("A Sociedade do Espetáculo").

Silvio falou também sobre a imprensa brasileira e sobre os anos do século XX que considera "o ano orgásmico" e "o ano brochante".

Mais precisamente sobre o filme, são tantas as passagens marcantes, que pretendo assistir-lhe novamente.

Apenas como ilustração, registro a indignação que senti - mais uma vez - ao ouvir o então ministro Jarbas Passarinho dizer, dirigindo-se ao presidente Costa e Silva, durante a reunião do Conselho de Segurança que discutia a implantação do AI-5 (Ato Institucional nº 5): "às favas, senhor presidente, neste momento, todos, todos os escrúpulos de consciência".

Minha repulsa à declaração do ministro só não foi maior do que a causada quando ouvi, no filme, o nome "Fleury" [do delegado Sérgio Fleury, do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) de São Paulo, durante a ditadura militar no Brasil].

Ainda, conheci um pouco da história do jornalista Álvaro Caldas (na foto abaixo, em abril de 1973, após "ser atropelado por um Fenemê - caminhão da antiga Fábrica Nacional de Motores").


Emocionante também a declaração de Dilma Rousseff sobre a enorme solidão que sentiu após sair do Presídio Tiradentes, em 1972. A economista relata que, naquele momento, embora estivesse "livre", todos os seus amigos estavam presos, no exílio ou mortos.

"Utopia e Barbárie" é uma grande aula... adolescentes, jovens, adultos: todos deveriam vê-lo!

*Segundo informação veiculada pela Produtora Executiva Ana Rosa Tendler, em sua página no microblog twitter, o documentário estará disponível a partir de dezembro. Para saber mais: www.caliban.com.br