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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Requião, candidato a Presidente

14/02/2014 - Eleições 2014 - Requião: “sou candidato a Presidente
- Rodrigo Vianna - Escrevinhador

Roberto Requião acaba de dar uma entrevista histórica ao jornalista Frédi Vanconcelos, na revista “Caros Amigos”. A entrevista mostra que há uma avenida aberta para politizar o debate no Brasil – pela esquerda, de cara limpa.

Requião não cede um milímetro. Defende os governos petistas (“vejo o PT como melhor que os outros; ao mesmo tempo em que eu acho que é muito pouco”), mas não abre mão da crítica dura à tibieza do partido para lidar com a Globo e outros interesses.

Lá pelas tantas, o senador e ex-governador do Paraná afirma: “sou candidato a presidente”!

Fico a imaginar como o Brasil iria a ganhar com uma candidatura desse tipo – que travasse o debate.

Todos sabemos das dificuldades (impossibilidades?) para se obter a candidatura numa convenção do PMDB. Mas só a luta pra chegar até lá já seria didática.

O Brasil merece e precisa de um nome como o de  Requião, disposto ao bom combate.

Acompanhe abaixo alguns trechos da entrevista. A revista chega às bancas na próxima semana. Vale a pena conferir na íntegra. (Rodrigo Vianna) 

= JOAQUIM BARBOSA E O “MENSALÃO” =

”O Joaquim Barbosa simulando uma diária pra fazer uma conferência de 30 minutos e um passeio numa biblioteca de uma hora, duas horas, é uma coisa típica da classe média deslumbrada.

Então o Joaquim Barbosa revela ali o verdadeiro Joaquim Barbosa, um classe média eventualmente deslumbrado [foto], que foi instrumentalizado pela mídia na questão do mensalão.

Eu não defendo a utilização do dinheiro público, nem o que ocorreu no financiamento das campanhas, não acho nenhuma graça nisso, mas aquela história do domínio do fato e a influência da mídia em cima do mensalão feriu profundamente as normas do direito brasileiro.


O mensalão foi uma aberração jurídica, porque, entre outras coisas, pelo domínio do fato, pela forma com que foi feito o processo, o esquecimento do fato precursor do mensalão, que é o fato mineiro, do Marcos Valério.


Então, foi uma aberração jurídica, foi uma manipulação induzida pela mídia e pelo deslumbramento dos ministros. Aquilo foi um show, não foi um julgamento."

= CHANTAGEM DA IMPRENSA =

Eu peguei um Estado [Paraná] quebrado. A primeira coisa que fiz foi racionalizar as despesas. Evidente que não as despesas com saúde e educação, mas as que eu julgava desnecessárias.

Diminuí os valores dos investimentos na imprensa. E passei a ser procurado por esses “heróis” da mídia, os donos de jornais, que diziam o seguinte: “ou você libera o dinheiro ou vai apanhar como nunca um político apanhou no Paraná”.

Daí, eles começaram a me bater desesperadamente, o que não me incomodou muito. Eu fui governador três vezes e senador duas vezes com toda essa mídia em cima de mim.

– Mas a chantagem foi assim direta?

"Direta, ou você dá dinheiro ou você vai apanhar diariamente. Eu preferi apanhar diariamente. Isso começou comigo, na verdade, na prefeitura.

Fui prefeito e pressionado pela Globo por verba. Não dei verba e eles começaram a bater em mim."

= DILMA, AÉCIO E EDUARDO =

Eu acho que ainda a Dilma é melhor que o Aécio e o Dudu Beleza. Eu fui relator da CPI dos títulos públicos, eu analisei como é que o Eduardo Campos conseguiu os financiamentos com os títulos públicos, com os precatórios.

– Como que ele conseguiu e por que o senhor o chama de Dudu Beleza?

Não sou eu que chamo, é Recife que chama.

Eu fiz a campanha do Dudu Beleza para a prefeitura do Recife a pedido do Arraes (Miguel, ex-governador e avô de Eduardo Campos [foto]), fiz gravações, eu era o prefeito mais popular do Brasil.

O Arraes era muito meu amigo, vinha muito pra Curitiba pra conversar comigo, mas o Dudu é a contraposição do Arraes.


- Por quê?

Porque o Dudu é o quadro da direita brasileira. A Dilma está à esquerda do Dudu, com todos os seus erros de condução.”

= ELEIÇÃO NO PARANÁ E PAULO BERNARDO =

- No segundo turno se estiverem os dois (Gleisi/PT x Richa/PSDB), o senhor não vai votar na Gleisi?

"E eu vou colocar o Bernardo [marido de Gleisi, Ministro das Comunicações] no poder? Veja bem, o Bernardo esteve no poder em Londrina, ele não consegue um voto lá, ele acabou com o Zeca do PT no Mato Grosso do Sul, não chega isso?

Veja o que ele está fazendo no Ministério das Comunicações, de favorecimento da grande mídia… Eu não sou inimigo da Gleisi [foto], eu sou amigo dela há muitos anos.

Do Paulo Bernardo não sou, e você sabe por que. É possível ser amigo do Paulo Bernardo? Amigo dele é o Marinho (da Globo), não sou eu.”

= Projeto Nacional =

A reforma política é a reforma da economia. Tirar a influência do Banco Central e dos banqueiros no Banco Central. Foi o que a Dilma começou a fazer e recuou. Basicamente é isso, um projeto nacional.

Nós temos que ter um projeto de industrialização, um projeto de comércio exterior, nos não podemos ficar ao sabor da globalização, que já fracassou.

“Vou me apresentar na convenção nacional do PMDB como candidato à Presidência da República. Aí você me pergunta, você vai ganhar? Ora, eu não sou idiota, eu sei no que se transformou o meu PMDB, mas eu vou cumprir a minha obrigação junto com um grupo de economistas que trabalham comigo e apresentar um projeto. Quero estabelecer um contraponto.

Fonte:
http://www.rodrigovianna.com.br/plenos-poderes/requiao-sou-candidato-a-presidente.html

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

quarta-feira, 27 de março de 2013

A estranha apatia da gestão Dilma

25/03/2013 - Requião critica governo FHC e estranha apatia da gestão Dilma
- da Redação do Portal Carta Maior

Para o senador paranaense, falta uma diretriz firme ao governo diante da volta de ideias que "quebraram o Brasil três vezes".

Deplorando a adoção de propostas liberais por "certa esquerda", ele prega a construção de um projeto nacional “doutrinariamente à esquerda, fundado na solidariedade, na distribuição da renda e dos benefícios do avanço tecnológico, na prevalência, sempre, dos interesses populares e nacionais”.
Da Redação

O senador Roberto Requião (PMDB-PR) (foto) fez um irônico pronunciamento na quarta-feira (20/3), criticando opiniões recentes de economistas que participaram do governo Fernando Henrique Cardoso.

Um deles, Ilan Goldfajn (foto), ex-diretor do Banco Central, em artigo publicado no jornal ‘O Estado de S. Paulo’, afirmou que “para manter a inflação sob controle pode ser necessário temporariamente reduzir o consumo e desaquecer o mercado de trabalho”.

Ou seja, segundo o economista chefe e sócio do Itaú-Unibanco, a saída para o país está em provocar uma recessão e aumentar o desemprego.

Não faltaram também farpas para a gestão petista.

Cortejo de fantasmas
Para o senador, o que se vê é um “cortejo de fantasmas, que procura aterrorizar o país com ideias fossilizadas que, quando aplicadas, quebraram o Brasil por três vezes”.

Em recentes viagens à Polônia e à Suécia, Requião contou que, ao ler notícias do Brasil, foi assaltado por espectros do passado, propondo a volta de velhas e falidas políticas, que “quebraram o país três vezes”.

Um a um foram listados os responsáveis pelo desastre: os irmãos Mendonça de Barros, Gustavo Loyola, Pedro Malan, Pérsio Arida, André Lara Rezende, Gustavo Franco, Edmar Bacha e Mailson da Nóbrega perfilados ao lado dos pais do neoliberalismo, o Nobel de Economia Milton Friedman e o apoiador de primeira hora do golpe de 1964, Eugênio Gudin.

Não ficaram de fora os “especialistas” da GloboNews e da CBN, “que nada entendem de tudo” e as palestras do Instituto Millenium, em linha direta com os integrantes da Marcha com Deus pela Família e Liberdade, defensores da deposição do governo João Goulart, há meio século. Mas Requião não mirou apenas o passado.

Privatismo à la Thatcher
Sua preocupação voltou-se também para a falta de iniciativa do atual governo.

Aterroriza-me a ideologia do superávit primário. Desassossega-me não o aumento da inflação, e sim corrosão de nossa base industrial, sucateando-se ao céu aberto da incúria governamental” e “a paralisia das obras de infra-estrutura”.

Em seguida perguntou publicamente aos integrantes do governo Dilma: “De que têm medo os nossos próceres ministeriais? Intimidam-nos a insepulta Delta ou o libérrimo Cachoeira?”.

E adiante criticou “o abuso, o desregramento das concessões, superando até mesmo toda fobia privatista de Margareth Thatcher, como se vê agora no caso dos portos”.

O parlamentar terminou dizendo que “a direita sabe o que quer”.

A incógnita estaria na inação governamental e na adesão a certas teses mercadistas tidas como “modernas” e “responsáveis”.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21795&editoria_id=4

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade e, excetuando uma ou outra, inexistem no texto original.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Dilma refém do PMDB

Acabo de chegar de Mato Grosso do Sul. Voltei muito preocupada com a possibilidade de golpes em cascata em toda a América do Sul. A situação ambiental na região Centro-Oeste que conheci há 50 anos, quando meus pais deixaram o Paraná, é desoladora. O agronegócio passa por cima de tudo e de todos como um trator. Para meu desespero, quando voltei ao Rio, onde moro há dezenas de anos, meu colega de blog Rodrigo Brandão alertou-me que o deputado Henrique Alves (PMDB-RN) seria o presidente da Câmara. Não dormi mais. As imagens de Alves afrontando o governo Dilma durante a reforma do Código Florestal não saíam das minhas retinas. Assim, mesmo com problemas domésticos e de saúde, pedi ao Rodrigo que me ajudasse a fazer uma pesquisa e construir um texto para mostrar o perigo que significa Henrique Alves presidente da Câmara e o risco que correríamos se o PT entregasse as duas Casas legislativas ao PMDB.
Zilda Ferreira

Cenário ameaçador se desenha para os próximos dois anos, caso PT abra mão do comando da Câmara e do Senado

Alves: na presidência da Câmara, ele pode desestabilizar governo Dilma

Por Rodrigo Brandão* e Zilda Ferreira**

Em 2010, durante a discussão de alianças para as eleições gerais daquele ano, PT e PMDB fecharam um acordo. Com a perspectiva de elegerem bancadas numericamente muito próximas na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, os dois maiores partidos brasileiros e líderes da Frente Brasil Popular combinaram um rodízio de presidentes nas duas Casas para a legislatura 2011-15. Meses atrás o presidente do PT, Rui Falcão, foi aos líderes do PMDB reiterar a vigência do "pacto", o que significa que em fevereiro toda a bancada petista, a maior da Câmara, deve ajudar a eleger o deputado federal Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) presidente para o biênio que encerra a legislatura, a terminar em janeiro de 2015.

Aí entra um problema, apontado por algumas lideranças do PT no Legislativo. Nenhuma menção ao Senado foi feita. E o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) já se lançou candidato à sucessão de José Sarney, para a qual é favorito absoluto. Mesmo porque no Senado, ao contrário da Câmara, o regimento não permite candidaturas avulsas. Ou seja, somente candidaturas indicadas diretamente pelos partidos são aceitas, uma por partido.

Renan Calheiros pode ser um presidente do Senado melhor do que foi José Sarney. Alvo constante de campanhas difamatórias por parte da grande imprensa, Calheiros poderá ser mais permeável aos projetos de lei ligados a esse campo que a esquerda luta para emplacar no Brasil. Como um guarda-chuva a abarcar os pontos principais desta agenda está a reforma do marco regulatório das comunicações, mas podemos aí enumerar a desconcentração da propriedade de mídias e o próprio fim da propriedade cruzada dos meios de comunicação, além da recuperação de aspectos fundamentais da Lei de Imprensa derrubada pelo STF – como o direito de resposta. Em resumo, lutamos por uma “Ley de Medios” aos moldes daquela aprovada na Argentina.

Há também no horizonte a necessidade de aprovação do Marco Civil da Internet, cujo texto (construído por lideranças do Parlamento em conjunto com ativistas pelas mídias livres) tramita por comissões. O Marco Civil é fundamental para garantir neutralidade da rede e que o Brasil se imponha a tentativas monopolistas – e censoras – surgidas na arena internacional, com uma legislação progressista e soberana.

A alternativa Requião
Por outro lado, um senador como Roberto Requião (PMDB-PR), que em seus dois últimos mandatos à frente do governo do Paraná (2003-10) implantou várias políticas para a democratização das comunicações e tem sido leal ao governo democrático-popular, seria certamente um nome ainda mais adequado para liderar a Câmara Alta no biênio que encerra a atual legislatura. Biênio esse que coincide com os dois últimos anos do (esperamos) primeiro mandato da presidenta Dilma Rousseff.

Requião é um nacionalista e um progressista, é o governador que parou o Porto de Paranaguá para impedir embarque e desembarque de soja transgênica. Lideranças como ele, à frente do Legislativo, significam que retrocessos como a derrubada da portaria presidencial que restringe compra de terras por estrangeiros, caso passem na Câmara, dificilmente passem sem resistência pelo Senado.

Tudo isso leva em conta um cenário em que o acordo PT-PMDB de 2010 não é cumprido na sua totalidade, mas apenas em parte. Se realmente "acordo político foi feito para cumprir", como tem repetido Rui Falcão, o PMDB estaria obrigado a incondicionalmente apoiar um nome do PT para a presidência do Senado. Que poderia ser o piauiense Wellington Dias ou o acreano Jorge Vianna. Não vai acontecer, tudo indica.

Voltemos então nossas atenções à Câmara. E aí vem, além do problema com a “palavra dada” pela metade e que pode transformar-se em impasse, um impasse ainda maior e que ameaça a própria continuidade do projeto político que elegeu Lula em 2002 e 2006 e Dilma em 2010. Com o PMDB senhor das duas Casas Legislativas e Michel Temer, outro peemedebista, vice-presidente da República, praticamente toda a linha sucessória da presidenta Dilma Rousseff passa a ser formada por filiados a apenas um dos partidos que compõem a coalizão de governo.Lembremos que esse mesmo partido, hoje base do governo Dilma, participou da coalizão liderada por Fernando Henrique Cardoso entre 1995 e 2002, antes de apoiar a primeira candidatura presidencial de José Serra. Dilma ficaria então refém, na governabilidade e na própria sustentação do projeto político do PT, de um partido que levou alguns anos para desembarcar no governo Lula.

Eleição de Henrique Alves pode afetar governabilidade
O nome apontado até o momento pelo PMDB para presidir a Câmara dos Deputados é motivo de grande inquietação. Henrique Alves é membro da bancada ruralista e foi uma das principais lideranças do Congresso Nacional na articulação para aprovação e na própria defesa da reforma do Código Florestal, um dos piores retrocessos da nossa história republicana e que acabou por constranger a presidenta Dilma às vésperas da Rio+20. Mesmo com a clara orientação do Planalto a sua base para que barrasse os pontos fundamentais do projeto de lei, o líder do PMDB orientou sua bancada no sentido contrário e ainda articulou apoios em outros partidos governistas para atropelar um acordo construído por toda a base aliada no Senado, que atenuava os aspectos mais negativos da reforma. 

Alves contribuiu assim diretamente para abalar a credibilidade do Brasil diante do mundo inteiro num momento dos mais delicados, talvez o maior desafio do governo Dilma no campo geopolítico. Depois de afrontar o governo, está prestes a ganhar de presente a direção da Câmara Baixa e com o apoio do PT. 

Com os ruralistas chegando de corpo e alma ao comando da nave-mãe do Poder Legislativo, é de se esperar que todos ou pelo menos a maioria dos pontos constantes em sua agenda ganhem selo de urgência ou urgência urgentíssima, garantias de que determinado projeto de lei terá celeridade e prevalência diante de outros. Entre as prioridades ruralistas está, para substituir a portaria do Poder Executivo – baseada em um parecer da Advocacia Geral da União – que restringe compra de terras por estrangeiros, a aprovação de uma lei escancarando o mercado de imóveis rurais ao capital externo.

Em toda a região Centro-Oeste é grande a campanha para derrubar essa restrição imposta pelo governo Dilma. O agroimperialismo ganha cada vez mais terreno e assim pode acelerar a ocupação dos cerrados com as culturas intensivas da soja e da cana-de-açúcar (biocombustível), além da pecuária intensiva. É um processo que desrespeita as peculiaridades do bioma e massacra as populações indígenas, com o objetivo de produzir commodities para exportação. Completando o cenário de horrores no Centro-Oeste, crescem as pressões para que o governo libere a instalação de dezenas de pequenas hidrelétricas no Pantanal, além de usinas de álcool. 

A respeito da questão indígena, há mais uma ameaça no horizonte e que pode transformar-se em pesadelo ao termos uma liderança negativa como Henrique Alves à frente da Câmara. É que outra prioridade da bancada ruralista para os próximos anos legislativos é a reforma do Código Mineral, defendida de peito aberto inclusive por latifundiários que sonham ocupar o Ministério da Agricultura. Com a reforma, os ruralistas pretendem abrir caminho à concessão de licenças para mineração dentro de reservas indígenas.

Tanto a liberação da compra de terras por estrangeiros como a reforma do Código Mineral são projetos de lei que já passaram em comissões justamente na Câmara dos Deputados, obviamente dominadas por ruralistas e seus representantes. Por sinal, o nó político-parlamentar que vivemos hoje, com o setor agropecuário superrepresentado (para dizer o mínimo) no Congresso Nacional, em grande parte se deve às falhas do sistema político e eleitoral brasileiro. Uma reforma política, implantando o financiamento público de campanhas, é urgente. Com o PMDB aliado ao latifúndio concentrando tanto poder, trata-se apenas de um sonho distante. 

Câmara dos Deputados sob liderança de forças progressistas
Já que o PMDB se dispõe a cumprir apenas parte do acordo de rodízio, infelizmente sem ao que parece grande resistência do PT, que seja esse “pacto” adiado para outro momento ou congelado ad eternum. Em lugar de entregar as duas Casas Legislativas e deixar Dilma Rousseff “nas mãos” de um dos dois grandes partidos da base, seria melhor então que o PT mantivesse o comando da Câmara. Nomes não faltam. O pernambucano Fernando Ferro, o baiano Emiliano José e o paulista Paulo Teixeira são lideranças comprometidas com a necessária (e urgente) regulação da mídia e, no caso de Ferro, trata-se de um deputado com histórico marcado pelo respeito ao meio ambiente.

A particularidade na Câmara é que ali, onde o regimento permite candidaturas avulsas, começam a surgir sinais de que haverá dissidência. O deputado Júlio Delgado (PSB-MG) já manteve conversas com lideranças de pelo menos quatro partidos e o PDT, outro integrante da base de governo, já sinalizou que pode apoiá-lo. O PSB nos abre pelo menos duas alternativas que trariam ao menos mais pluralismo à cúpula do Legislativo, além disso melhorando a interlocução com a agenda dos movimentos sociais: Beto Albuquerque (PSB-RS) mas, principalmente e enfaticamente, Luiza Erundina (PSB-SP; foto).


Albuquerque é um apoiador de primeira hora dos governos Lula e Dilma, mas Erundina é uma líder política nascida na Paraíba e eleita em 1988 a primeira mulher prefeita de São Paulo, responsável pela até hoje considerada melhor gestão que a “mais brasileira das cidades brasileiras” – por reunir em profusão gente de todas as partes do país – viu. Erundina tem sido uma líder incansável na defesa de pautas como a Comissão da Verdade e a Lei de Transparência Pública, ambas saídas do papel em grande parte graças ao esforço da deputada, a revogação da Lei de Anistia e a regulação da mídia. Com Erundina à frente da Câmara, os movimentos pelos direitos humanos ganhariam uma importante interlocutora. Erundina é também uma liderança que agrega, que colocaria o PSB pela primeira vez no comando do Poder Legislativo Federal e poderia ajudar a aparar certas arestas entre os governistas.

As cartas estão na mesa. Num ano que promete ser dos mais difíceis, quando embates duros deverão ser travados tanto na arena doméstica quanto fora de nossas fronteiras – mas nos interessando diretamente, sobretudo os próximos às fronteiras –, podemos o PT e a esquerda aproveitar a eleição das Mesas Diretoras do Legislativo para dar uma nova cara ao Congresso Nacional. É fundamental neste momento oxigenar a própria base de apoio ao governo, agregando seus membros e mobilizando-os em torno de projetos que motivaram a própria candidatura Dilma Rousseff em 2010.
*
** da Equipe do Blog EDUCOM

quinta-feira, 31 de maio de 2012

A urgência da união sul-americana

19/05/2012 - Mauro Santayana (*)
extraído do site Carta Maior

A América do Sul terá que unir-se com urgência, para que não se torne território aberto à disputa feroz pelos seus recursos naturais, no futuro que se apressa a chegar. Ao lado da África, a América Latina sempre foi vista como um território de todos, menos de seus próprios habitantes.
(Mauro Santayana)

Não há mais espaço para a dúvida: a América do Sul terá que unir-se com urgência, para que não se torne território aberto à disputa feroz pelos seus recursos naturais, no futuro que se apressa a chegar. Ao lado da África, a América Latina sempre foi vista como um território de todos, menos de seus próprios habitantes. Em nome da Fé e da Civilização, espanhóis e portugueses, holandeses e franceses, aqui chegaram para ocupar e dominar as civilizações existentes, como as andinas.

Nesse aspecto, o Brasil é uma exceção importante: os indígenas brasileiros ainda se encontravam no neolítico, ao contrário dos habitantes da cordilheira, senhores de uma cultura respeitável. Isso parece pouco, mas não é. Dos europeus que tentaram a conquista, os ibéricos tiveram mais êxito, não só na América do Sul, mas também em grande parte da América do Norte, até a chegada em massa dos seus rivais britânicos. O que nos interessa, no entanto, é esse continente em suas razões geográficas, políticas, econômicas e culturais. E não “subcontinente”, como muitos insistem em nos considerar.

Geograficamente, nós constituímos uma realidade própria. Ainda que o istmo do Canadá una o Hemisfério Ocidental, e que grande parte da América do Sul política se encontre ao norte do Equador, e nela considerável parcela do Brasil, da Colômbia à Terra do Fogo somos uma realidade geográfica e histórica bem identificada. Sempre foi do interesse dos colonizadores que vivêssemos, brasileiros e hispano-americanos, bem separados uns dos outros.

Mesmo durante os 60 anos em que as coroas de Portugal e da Espanha estiveram unidas, a administração colonial se manteve separada e os contatos se limitavam às autoridades. Nossos povos não se conheciam, a não ser nos raros pontos fronteiriços.

Ao desdenhar os nossos povos, o arrogante Kissinger disse que nada de importante ocorreu no Hemisfério Sul. Ele, em sua visão preconceituosa e imperialista, se esqueceu de que a descoberta e conquista da América foram o fato mais importante de toda a História do Ocidente.

Essa importância começa com a viagem de Colombo, em 1492, mais arriscada do que a ida do homem à Lua. Os astronautas que desceram no satélite da Terra foram precedidos de sondas e exaustivos cálculos matemáticos; da metalurgia de novas ligas metálicas para as aeronaves, de todos os cuidados. Os navegantes do fim do século XV só contavam com sua coragem a fim de vencer o Mar Oceano em frágeis caravelas.

Devemos a Napoleão o surgimento da América do Sul como realidade política. Antes dele e da invasão da Península Ibérica por suas tropas, a América do Sul era assunto britânico, por intermédio de Lisboa e de Madri. A vitória de Waterloo confirmou a presença britânica no continente até a Primeira Guerra Mundial.

Éramos, segundo Hegel, em seu Curso de Filosofia da História, entre 1818 e 1822, uma região em constantes rebeliões chefiadas por caudilhos militares, enquanto a América do Norte, sob a razão protestante, anunciava uma nova civilização. Mas insinuava certo otimismo:

“A América é, portanto, a terra do porvir, onde, nos tempos futuros se manifestará, talvez, no antagonismo da América do Norte com a América do Sul, o ponto de gravidade da História Universal. É uma terra de sonho para todos aqueles que se encontram cansados do bric-à-brac da Velha Europa. Napoleão teria dito: Esta velha Europa me entedia.” 

E continua: “A América deve se separar do solo sobre o qual se passou, até agora, a história universal”.

Estamos no momento exato de separar-nos da velha Europa, coisa que os Estados Unidos só serão capazes de fazer quando os hispano-americanos se tornarem a etnia predominante naquele país.

A hora é, portanto, da América do Sul. E o primeiro movimento necessário nessa direção é o fortalecimento do Mercosul.

Roberto Requião
Essa constatação foi a tônica do primeiro encontro sobre “Crise, Estado e Desenvolvimento: Desafios e Perspectivas para a América do Sul”, promovido pela Representação Brasileira no Parlasul, por iniciativa do Senador Roberto Requião, sexta-feira passada [18/05/12], no Senado, de que participaram o Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, Alto Representante Brasileiro no Mercosul, o Professor Carlos Lessa e este colunista. Temos que nos apressar, e negociar com o espírito de solidariedade efetiva, a quebra de barreiras internas no continente, base necessária aos acordos políticos.

Samuel Pinheiro Guimarães
 Nesse sentido, é interessante a proposta ousada da Argentina, de estabelecimento de uma tarifa comum, de 35% por cento, para a entrada de produtos estrangeiros no Mercosul, e abolição total das tarifas no espaço do acordo aduaneiro.

A História mostra – e o exemplo mais importante é o da Alemanha – que a união política necessita de uma união aduaneira prévia. Ainda em 1834, a Prússia iniciou esse processo de união aduaneira (Zollverein) com os numerosos estados alemães, o que possibilitou a união política quase 50 anos depois.

Carlos Lessa
Mas uma união aduaneira exige mais do que interesses econômicos, para se tornar uma união política. Exige certa identidade étnica, espírito de solidariedade e semelhante visão do mundo, o que ocorria na Alemanha, antes e depois de Bismarck, e que não existe na Europa de hoje. Temos, na América do Sul, não obstante a identidade cultural própria de nossos povos, certa identidade étnica, história mais ou menos comum de países que foram colônias, continuidade geográfica e espírito de solidariedade.
Mauro Santayana

Pressionados pela crise que provocaram, os governantes dos países nórdicos sentem-se tentados a nova aventura de conquista, econômica, política e, se for preciso, militar, da América do Sul. Pelo que fizeram e estão fazendo nos países produtores de petróleo, podemos prever o que se encontram dispostos a fazer em busca das matérias primas e dos nossos territórios que cobiçam. Para que não sejamos dominados neste século, como advertia Perón em 1945, temos que nos unir, logo, sem tergiversações menores, e respeitando-nos como povos rigorosamente iguais.

O problema, mais do que ideológico, é geopolítico. É o do nosso espaço, que eles consideram vital para eles. Nosso dever, na História, é o de resistir e construir nova forma de convívio, criador e solidário, no espaço que ocupamos há meio milênio.

(*) Colunista político do Jornal do Brasil, diário de que foi correspondente na Europa (1968 a 1973). Foi redator-secretário da Ultima Hora (1959), e trabalhou nos principais jornais brasileiros, entre eles, a Folha de S. Paulo (1976-82), de que foi colunista político e correspondente na Península Ibérica e na África do Norte.