quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Nota pública dos presos políticos da USP

Reafirmamos nossa luta contra a polícia, dentro e fora da universidade, que reprime a população pobre e trabalhadora todos os dias 
08/11/2011
Ocupa USP   

Nós, estudantes da USP, que lutamos contra a polícia na universidade e pela retirada dos processos administrativos contra estudantes e trabalhadores, viemos por meio desta nota pública, denunciar a ação da tropa de choque e da polícia militar na madrugada do dia 8/11.
Numa enorme demonstração de intransigência em meio ao período de negociação e na calada da noite, a reitoria foi responsável pela ação da tropa de choque da PM que militarizou a universidade numa repressão sem precedentes. Num operativo com 400 homens, cavalaria, helicópteros, carros especializados e fechamento do Portão 1 instalou-se um clima de terror, que lembrou os tempos mais sombrios da ditadura militar em nosso país.
Resistimos e nos obrigaram a entrar em salas escuras, agrediram estudantes, filmaram e fotografaram nossos rostos (homens sem farda nem identificação). Levaram todas as mulheres (24) para uma sala fechada, obrigando-as a sentarem no chão e ficarem rodeadas por policiais homens com cacetetes nas mãos. Levaram uma das estudantes para a sala ao lado, que gritou durante trinta minutos, levando-nos ao desespero ao ouvir gritos como o das torturas que ainda seguem impunes em nosso país. Tudo isso demonstra o verdadeiro caráter e o papel do convênio entre a USP e a polícia militar.
A ditadura vive na USP. Tropa de choque, polícia militar, perseguições a estudantes e trabalhadores, demissão de dirigentes sindicais, espionagem contra ativistas e estudantes, repressão através de consultas psiquiátricas aos moradores do CRUSP (moradia estudantil).
Nós, que estamos desde as 5h sob cárcere e controle dos policias, chamamos todos a se manifestarem contra a prisão de 73 estudantes e trabalhadores por lutarem com métodos legítimos por seus direitos.
Responsabilizamos o reitor João Grandino Rodas, e toda a sua burocracia acadêmica e o governador do estado de SP Geraldo Alckmin, junto ao seu secretário de segurança pública, por toda a repressão dessa madrugada. Reafirmamos nossa luta contra a polícia, dentro e fora da universidade, que reprime a população pobre e trabalhadora todos os dias.
Fora PM! Revogação do convênio! Retirada dos processos! Liberdade aos presos políticos!
"Pode me prender, pode me bater, pode até deixar-me sem comer, que eu não mudo de opinião! Porque da luta eu não saio não!"

Fonte: Jornal Brasil de Fato

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Violência no Chile contra jornalistas




Recebi a mensagem abaixo do jornalista brasileiro João Paulo Charleaux, que vive no Chile e cobre, desde o início, a mobilização dos estudantes em defesa de um novo modelo de ensino para o país. Pela gravidade da denúncia, silêncio da grande mídia e aparente desinformação dos órgãos de defesa dos jornalistas brasileiros a respieto da repressão aos jornalistas que cobrem o assunto, é preciso difundir esta notícia em nossas redes. 
Milton Bellintani.

Caros,
Nao me lembro de ter escrito antes sobre um assunto tao grave, tao revoltante e tao negligenciado. Passei uma semana entrevistando vítimas, policiais e ministros no Chile. Há uns 20 jornalistas brutalmente agredidos pela polícia em um ano. Esta provavelmente seja a única reportagem profunda sobre esse assunto que vc encontrará no mundo hoje. Poucas vezes tive a sensacao de escrever um negócio últil como esse aí:

Chile vive onda de perseguição a jornalistas, com prisões, espancamentos e atentados a bomba

João Paulo Charleaux*

A tropa de choque avançava pela direita, disparando escopetas de gás lacrimogêneo. Do lado oposto, manifestantes atiravam paus e pedras. No fogo cruzado, o fotógrafo da IPS (International Press Service) Fernando Fiedler engolia seco e apertava o obturador da câmera. Daquela vez, ele esperava ser atingido.

Fiedler só não podia imaginar que o alvo principal da polícia chilena naquela operação fosse ele mesmo, não os manifestantes. O fotógrafo foi arrastado pela Rua Pio IX e brutalmente espancado por um grupo de policiais. Em seguida, foi atirando dentro de um camburão e levado à 6ª Delegacia de Polícia, no bairro Recoleta, em Santiago.

O fotógrafo perguntou diversas vezes onde estava e qual o motivo da detenção. Mas ninguém respondeu. Um dos guardas calou Fiedler com uma chave no pescoço. O fotógrafo ajoelhou, de dor. A câmera foi arrancada e todas as imagens que mostravam a polícia disparando as escopetas de gás lacrimogêneo na direção do corpo dos manifestantes – e não para o alto, como diz a norma – foram apagadas do cartão de memória da máquina. “É para preservar o meu trabalho”, disse um deles, cuja identificação no uniforme dizia “Andrade”.

As duas últimas imagens que Fiedler conseguiu fazer antes de ser capturado, e que não foram apagadas pelos policiais, são essas:


Veja o depoimento de Fernando Fiedler:

 


O caso de Fiedler converteu-se no primeiro “sequestro” de um repórter por agentes do Estado chileno desde o fim da ditadura Pinochet (1973-1990) e, longe de ser um episódio isolado, revelou a existência de uma política sistemática de agressão aos jornalistas que trabalham no Chile. A acusação é negada pelo governo e pela polícia.
Desde março de 2010, 12 repórteres que registravam manifestações de rua a serviço de agências internacionais de notícias foram vítimas de ameaças, agressões, torturas, detenções arbitrárias e atos de censura cometidos pela polícia chilena. Pelos menos cinco jornalistas de emissoras, jornais e produtoras locais sofreram agressões semelhantes no mesmo período.
A maioria dos casos está concentrada nos últimos seis meses, período que os estudantes chilenos foram às ruas pedir educação pública e de qualidade. O recrudescimento da repressão também ocorre no momento que o presidente do Chile, Sebastián Piñera, atinge a pior avaliação entre todos os presidentes das Américas, apenas 22%.
Fotógrafo perdeu um olho
Embora a violência contra a imprensa no Chile tenha aumentado durante o mandato de Piñera – primeiro presidente de direita eleito democraticamente no país nos últimos 50 anos –, a polícia local já atuava com a mesma brutalidade antes disso.
Em maio de 2008, o fotógrafo da agência espanhola de notícias Efe Victor Salas perdeu o olho direito depois de ser agredido com um golpe de cassetete por um policial da cavalaria que reprimia um protesto de rua, na cidade de Valparaiso.
Na madrugada de 1 de novembro, uma bomba montada dentro de um extintor de incêndio explodiu na frente do edifício onde fica o jornal La Tercera, um dos principais do Chile, rompendo os vidros da fachada.
As agressões são noticiadas brevemente pelas agências de notícias onde os jornalistas agredidos trabalham, como foi o caso do jovem fotógrafo Hector Retamal, da AFP (Agence France Presse), espancado pela polícia chilena quando cobria uma manifestação de estudantes, no dia 18 de outubro, em Santiago.
Retamal conta que apanhou tanto que ainda é incapaz de lembrar exatamente como as coisas aconteceram. Ele só pode entender o que sofreu depois de ouvir outros colegas fotógrafos contando o que viram.
Opera Mundi conversou com ele um dia depois do episódio. O fotógrafo estava abatido. Disse que ainda sentia dor na mandíbula e no ouvido esquerdo, mas trabalhava normalmente. “Fui surrado pela polícia dentro de um camburão, com chutes e socos na cara, nas costelas e nas costas. Também usaram cassetetes e escudos para me agredir. Depois de apanhar muito, fui liberado. A acusação foi de ter obstruído o trabalho da polícia”, disse.

Veja o depoimento de Hector Retamal:



O caso de Retamal é semelhante a muitos outros, como o do fotógrafo Jorge Veillegas, da agência de notícias chinesa Xinhua. No dia 18 de agosto de 2010, policiais capturaram o fotógrafo, que cobria uma manifestação de rua, e pressionaram contra o rosto dele uma granada de gás lacrimogêneo, antes de soltá-lo. A inalação do clorobenzilideno malononitrilo pode ser fatal, dependendo da concentração e do tempo de exposição.
Flagrantes da violência policial
A disponibilidade de celulares com câmeras tornou mais fácil flagrar episódios de agressão contra a imprensa. Diversos vídeos podem ser encontrados hoje na internet, mostrando excessos da polícia chilena. A novidade fez com que a polícia também incorporasse na tropa de choque um policial responsável por gravar imagens.
Num desses flagrantes, Luis Narváez, do canal local de televisão Chilevision, aparece sendo detido no dia 6 de outubro, depois de defender seu câmera, Gonzalo Barahona, capturado na mesma ação. O repórter da CNN Nicolás Oyarzún e o jornalista de outra emissora local de TV, a Megavision, Jorge Rodríguez, também foram agredidos por policiais no mesmo dia.



Ítalo Retamal e Dauno Totoro, documentaristas da produtora audiovisual chilena CEIBO também foram agredidos pelos Carabineros.




Num dos casos mais grotescos, o fotógrafo independente Francisco Maturana, que fazia imagens de uma manifestação estudantil em Santiago, no mês passado, teve um fuzil enfiado dentro das calças por um membro da tropa de choque, enquanto era segurado por outros dois policiais. Maturana está processando a polícia por detenção ilegal e tortura.

Não há sequer a quem pedir direito de reprodução pela foto que mostra Maturana sendo agredido, porque o autor não se identifica, temendo represálias da polícia.
“Venha ver o exemplo que nós somos”
Depois de colher várias histórias de repórteres agredidos, a reportagem do Opera Mundi foi convidada para um encontro com o ministro da Secretaria Geral de Governo, Andrés Chadwick, no Palacio de La Moneda, sede da Presidência, em Santiago, no dia 21 de outubro.
Chadwick negou categoricamente que haja uma política de perseguição sistemática à imprensa. “Venha ver de perto o exemplo de liberdade de expressão que nós somos hoje”, disse o ministro, apenas um dia depois de o governo ter invocado a Lei de Segurança Nacional, do tempo da ditadura, para reprimir os manifestantes. Na véspera, um tanque lança-água da tropa de choque havia apontado o canhão na direção da reportagem do Opera Mundi, um braço de distância do veículo. Não queriam fotos.
* * *
Andrés Chadwick - Em todos os países, os jornalistas podem ter problemas, de repente, com a polícia. Imagino que o Brasil não seja uma exceção.
Opera Mundi - No Brasil, não há nenhum fotógrafo processando o Estado por sequestro cometido pela força policial, como acontece com o sr. Ferando Fiedler.
Chadwick - É um exagero. É preciso dar o nome correto às coisas. Uma detenção irregular não é um sequestro.
Opera Mundi - Só que, no Chile, quem vai julgar isso é a Justiça Militar. O sr. pensa que esses jornalistas agredidos podem confiar no resultado desse julgamento? É correto que um militar seja julgado por outro militar?
Chadwick - Se não estiverem satisfeitos com a sentença, podem recorrer à Suprema Corte de Justiça.
* * *
O pronunciamento de Chadwick é parco e raro. Marcelo Castillo, presidente do sindicato nacional dos jornalistas do Chile (Colegio de Periodistas) tenta ouvir isso da boca do ministro há meses. “Fizemos inúmeras denúncias sobre detenções de jornalistas que estavam trabalhando nas ruas, mas nunca obtivemos uma resposta”, disse Castillo.

Opera Mundi também teve acesso ao documento enviado pela Associação dos Correspondentes Estrangeiros no Chile ao governo. O Ministério do Interior, responsável hierarquicamente pela polícia, nunca deu resposta.

Leia a íntegra do documento aqui.

O processo movido por Fiedler é precisamente por “sequestro”, como caracterizado no artigo 141 do Código Penal do Chile. Veja a integra nesse link.

A repressão e a aparente conivência do Estado levou o relator da ONU (Organização das Nações Unidas) para Liberdade de Expressão, Frank La Rue, a pedir acesso ao país no mês passado. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos) também incluiu o assunto em sua última sessão, em São José da Costa Rica. Mas – com exceção da ONG Repórteres Sem Fronteiras – nenhuma outra organização de jornalistas ou de empresas de comunicação fez qualquer pronunciamento a respeito.

Silêncio internacional

No dia 18 de outubro, a SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa) esteve reunida em Lima, com representantes dos principais jornais das Américas. A organização emitiu um comunicado alertando para os ataques contra a imprensa, mas não no Chile – em Cuba, Venezuela, Bolívia e Equador, principalmente. O principal jornal do Chile, El Mercurio, publicou na sequência um editorial intitulado “assédio à imprensa na América Latina”, mas tampouco deu destaque às agressões sofridas pelos jornalistas dentro do Chile.

*JoaoPaulo Charleaux é correspondente do OperaMundi, onde foi publicado originalmente este texto e fotos

Fonte: Os vídeos foram extraídos do YOUTUBE

domingo, 6 de novembro de 2011

O IRÃ E A PERIGOSA APOSTA DE ISRAEL


Do Blog de Mauro Santayana*


Não se trata mais de hipótese: os falcões americanos e o governo britânico estão dispostos a apoiar ação militar de Israel contra o Irã, embora grande parte da opinião pública israelita advirta que essa aventura é arriscada. Aviões militares de Israel fazem manobras no Mediterrâneo e já se fala no emprego de mísseis de alcance médio contra o suposto inimigo. Seus líderes da extrema-direita, entre eles religiosos radicais, estimulam os cidadãos, com o argumento de que se trata de uma luta de vida ou morte.
Toda cautela é pouca na avaliação política da questão de Israel. Em primeiro lugar há que se separar o povo judaico do sionismo e do Estado de Israel - que parece condenado a sempre fazer guerra. Como disse um de seus grandes pensadores, se todos os estados possuem um exército, em Israel é o exército que possui o estado. É explicável que, com sua história atribulada e as perseguições sofridas, sobretudo no século 20, sob a brutalidade nazista, os judeus se encontrem na defensiva. Isso, no entanto, não autoriza a insânia de sua política agressiva contra os palestinos em particular, e contra os muçulmanos, em geral.
A política belicista de Israel, alimentada pelos fundamentalistas, e estimulada pelos interesses norte-americanos, tem impedido a paz na região. Os palestinos são tão semitas quanto os judeus, embora muitos dos judeus procedentes da Europa não sejam semitas em sua origem étnica, posto que convertidos a partir do século VIII. Os dois povos poderiam viver em paz, se o processo de ocupação da Palestina pelos judeus europeus tivesse seguido outra orientação. Mas o passado não pode ser mudado. Sendo assim, é tempo para o entendimento entre os dois povos – mas para parcelas das elites de Israel e seus patrocinadores americanos, a guerra é um excelente negócio. Sem a guerra, a receita de Israel – um território pobre de petróleo, tão próximo das mais pejadas jazidas do mundo – seria insuficiente para manter seu poderoso e bem remunerado exército e suas elites dirigentes, contra as quais começam a mover-se também os indignados, e com razão.
Israel nasceu sob o ideal de um sistema socialista baseado na solidariedade dos kibbutzim, mas hoje não se distingue mais dos países capitalistas. Os ensandecidos partidários da ação militar contra Teerã talvez imaginem que essa iniciativa tolha o reconhecimento do Estado da Palestina pela ONU, mas deixam de atentar para os grandes riscos da operação, apontados pelos judeus de bom senso. Em primeiro lugar há uma questão ética em jogo, que o mundo já medita há muito tempo: por que Israel pôde desenvolver as suas armas nucleares, e os outros países da região não podem investigar o aproveitamento do conhecimento nuclear para fins pacíficos? Em visão mais radical, mas nem por isso contrária à ética: porque Israel dispõe de 200 ogivas nucleares e os outros países não podem dispor de armas atômicas? O que os faz tão diferentes dos outros? Se o Estado de Israel se sente ameaçado pelos vizinhos, os vizinhos também têm suas razões para se sentirem ameaçados por Israel.
Façamos um rápido exercício lógico sobre as conseqüências de um ataque aéreo – que já não se trata de hipótese, mas de timing – de Israel às instalações nucleares do Irã. Como irão reagir a Rússia e a China e, antes das duas grandes potências, o que fará a Turquia? A Grã Bretanha, segundo informou ontem The Guardian, já está estudando participar de uma expedição contra o Irã e só o governo dos Estados Unidos – exceto alguns falcões - está relutante. Haveria, assim, uma aliança inicial entre Sarkozy, Cameron e Netanyahu contra o Irã. Talvez os europeus e os próprios norte-americanos vejam nesse movimento uma forma de superar o acelerado descontentamento de seus povos contra a submissão dos estados aos banqueiros larápios. O encontro de um bode expiatório, como parece a propósito a antiga Pérsia, poderia ser uma forma de buscar a unidade interna de ingleses, franceses, norte-americanos – e judeus. É ingenuidade imaginar que o provável ataque se concentrará nas instalações de pesquisa nuclear. Uma vez iniciada a agressão, ela não se limitará a nada, e se repetirá o holocausto da Líbia, com seus milhares de mortos e feridos, em nome dos “direitos humanos” dos ricos.
O mapa geopolítico de hoje é um pouco diferente do que era em 1948 e 1967, quando se criou o Estado de Israel e quando ele se ampliou para além das fronteiras estabelecidas pela comunidade internacional.
É assustador pensar em uma Terceira Guerra Mundial, com novos atores em cena, entre eles possuidores das armas apocalípticas, como a China, o Paquistão e a Índia. Diante da insanidade de certos chefes de Estado de nosso tempo, é uma terrível probabilidade – e com todas as conseqüências impensáveis.

Está é Laísa. Ela está marcada para morrer


por Leonardo Sakamoto*
62 Esta é Laísa. E ela está marcada para morrer
Laísa Santos
As ameaças de morte que Laísa Santos Sampaio têm sofrido seguem um roteiro conhecido: recadinhos, invasões da própria casa, ter o cachorro alvejado por balas… E o final de uma história semelhante foi visto recentemente, quando assassinaram sua irmã, Maria do Espírito Santo da Silva, juntamente com o marido dela, José Claudio Ribeiro da Silva, ambos lideranças do Projeto de Assentamento Agroextrativista Praia Alta Piranheira, localizado a cerca de 50 quilômetros da sede do município de Nova Ipixuna, Sudeste do Pará. O caso ganhou repercussão internacional em maio deste ano.
A professora de 45 anos é o próximo alvo dos pistoleiros porque manteve a luta da irmã.
Maria e Zé Cláudio foram emboscados em uma estrada e executados com tiros na cabeça no dia 24 de maio de 2011. Por denunciarem a ação de madeireiros ilegais, sofriam constantes ameaças e intimidações. Zé Cláudio ainda teve uma orelha decepada e levada pelos seus assassinos, provavelmente para mostrar aos mandantes que o serviço foi realizado com sucesso.
Naquela mesma tarde, a notícia do assassinato foi lida no plenário da Câmara dos Deputados, que estava se preparando para transformar o atual Código Florestal em embrulho de peixe. Ouviu-se, então, uma vaia vinda das galerias e da garganta de deputados da bancada ruralista ali presentes. Um desrespeito que, se não fosse no Congresso Nacional, seria difícil de acreditar.
O projeto em Nova Ipixuna garante o sustento de mais de 500 famílias com a produção de óleos vegetais, açaí e cupuaçu. Porém, ao invés de procurar formas de replicar esses modelos de sucesso, o Congresso Nacional está discutindo maneiras de passar por cima de suas riquezas naturais e da qualidade de vida das populações que os mantém, rifando as leis que os protegem. Agora, o Senado analisa o Código. Apenas um milagre nos separa de uma lei esvaziada, que vai reduzir a proteção ambiental e anistiar, na prática, quem desmatou além da conta, rifando a qualidade de vida das futuras gerações.

*publicado originalmente no Blog do Sakamoto 
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Fonte: Extraído do Site Envolverde

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Bancada ruralista busca retroceder diversas conquistas da sociedade brasileira




Por Vanessa Ramos
Da Página do MST

No meado do mês de março, a bancada ruralista tornou pública propostas que podem alterar principalmente o cenário político do Brasil e contribuir para o aumento da disparidade de classes, caso sejam aprovadas. Além da polêmica reforma do Código Florestal, o setor estabelece mudanças na legislação trabalhista, fundiária, tributária, indigenista e quilombola.
Os principais pontos da agenda são: reforma do Código Florestal; impedir a criação de unidades de conservação e a demarcação de áreas indígenas e quilombolas; revisar a legislação trabalhista; impedir atualizações dos índices de produtividade; autorizar apenas desapropriações de terras se houver recursos no orçamento da União; liberar organismos geneticamente modificados; facilitar o registro de agrotóxicos; e barrar a aprovação da PEC 300, que prevê o confisco de propriedades rurais onde for constatado trabalho escravo.
O objetivo dos ruralistas é aprovar todas essas bandeiras até 2015, período em que terminam os atuais mandatos. Para isso, eles contam com apoio de 217 parlamentares (deputados e senadores), que compõem a atual bancada ruralista, para priorizar o interesse do setor.

Desde que as propostas, referentes ao Código Florestal, tornaram-se públicas,  pesquisadores, cientistas e estudiosos têm apontado os principais problemas e os desafios futuros a serem enfrentados, caso seja aprovado pelo Senado e sancionado pela presidenta Dilma Roussef.
Segundo Zilda Ferreira, jornalista e especialista em educação ambiental, em entrevista à Página do MST, o novo Código Florestal fere as leis ambientais, além de significar um retrocesso às conquistas políticas do Brasil.
Para Zilda, “a Reforma Agrária e a soberania alimentar poderiam, efetivamente, promover a emancipação social do trabalhador brasileiro.”
Leia a entrevista:

O que as alterações no Código Florestal significam para o Brasil?

Se novo Código Ambiental for aprovado pelo Senado e sancionado
pela presidenta, várias catástrofes ambientais poderão ser desencadeadas, além de afetar a soberania política do país, em virtude do  lobby conservacionista. Vou destacar apenas os principais danos à natureza e o desrespeito às leias ambientais.
Primeiro: as mudanças nas regras de preservação da mata nativa nas propriedades rurais, que constam no novo Código Florestal, aprovado na Câmara, aumentam em 22 milhões de hectares desmatadas no país. O equivalente ao Estado do Paraná. Esse número representa as áreas de reserva legal que poderão ser desmatadas legalmente.

O texto permite que nenhum hectare daquilo que já foi desmatado ilegalmente precise ser restaurado. Além da reserva legal, o novo Código reduz a proteção das áreas de preservação permanente (APPs), que são as margens dos rios, encostas, topos dos morros e vegetação litorânea, como mangues e restingas.

O novo texto diz ainda que as APPs, ocupadas com agricultura, não precisam ser  recuperadas com vegetação nativa. Ou seja, um incentivo ao desrespeito às leis ambientais vigentes. Os argumentos dos ruralistas são muitos, mas não se sustentam. Não ouviram os cientistas e nem os ambientalistas. Essas mudanças, previstas no novo Código Florestal, vão aumentar: erosão dos solos; degradação dos mananciais (por falta de proteção das nascentes); aterramento de rios e lagos; redução da umidade relativa do ar; aumento do efeito-estufa; comprometimento da qualidade da água; perda da biodiversidade; desertificação; entre outros danos à Mãe Terra.
Além disso, geólogos, geógrafos além de outros especialistas apontaram como principal causa da tragédia na região serrana do Rio de Janeiro, ocorrida no início deste ano, que dizimou quase mil vidas, a ocupação irregular no topo dos morros e às margens dos rios. Com novo Código Florestal, essas ocupações passam ser legais.

Qual das mudanças  lhe causa mais  preocupação?

É muito difícil apontar qual é mais importante e qual me preocupa mais. Elas estão todas, de certa forma, interligadas. Mas, creio que a proposta da reforma da legislação trabalhista seja o maior retrocesso às conquistas sociais.
Os defensores argumentam o custo elevado da contratação de mão-de-obra, pelo suposto excesso de encargos sociais. Querem corte nos direitos do trabalho. Como ninguém tem coragem de dizer que o trabalhador brasileiro ganha muito, atacam os encargos. Porém, o custo do trabalho no Brasil é notoriamente baixo, seja qual for o critério adotado para determinar o que é  salário e o que é encargo.
Como mostram todas as experiências internacionais, sem nenhuma exceção, a retirada de direitos trabalhistas não gera nenhum novo posto de trabalho. Essas demandas retratam a mentalidade escravocrata dos ruralistas.

A agenda da bancada ruralista contrapõe-se a Reforma Agrária?

A Reforma Agrária e a soberania alimentar poderiam, efetivamente, promover a emancipação social do trabalhador brasileira. Isso permitiria um país sem miséria. Mas, quebraria o modelo atual do agronegócio. Seria um sonho, principalmente para as crianças indígenas que morrem de fome no Mato Grosso do Sul, um dos maiores exportadores de commodities e onde impera a fortaleza do agronegócio. Este é o retrato do porquê a agenda ruralista contrapõe-se a Reforma Agrária.

Elas ( propostas da bancada ruralista) significam retrocesso às conquistas políticas. Uma verdadeira contrarrevolução jurídica, prevista nos países latino-americanos por Boaventura de Souza Santos. As elites, através do judiciário, pretendem barrar conquistas como: ações afirmativa; acesso à educação; demarcação de terras indígenas e de quilombolas; além de criminalizar os movimentos sociais, principalmente o MST, e anistia aos torturadores na ditadura.
Vão discutir reforma tributária sem onerar as grandes fortunas. A mudança no Código Florestal e a violência no campo têm como finalidade adiar o debate sobre a  Reforma Agrária e soberania alimentar, que possibilitariam a autonomia da classe trabalhadora.

As mudanças na legislação trabalhista e fundiária são decisivas na atual crise do capitalismo. É preciso mobilização para que a concentração de terra não aumente ainda mais e a força de trabalho não seja escravizada, ou seja, que os donos do capital não se apropriem da natureza e de nossa força de trabalho.


quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Primeiro Encontro Mundial de Blogueiros

Por Sérgio Bertoni

A realização do 1º Encontro Mundial de Blogueir@s, de 27 a 29 de outubro de 2011, em Foz de Iguaçu, Paraná, Brasil, encerrou com chave de ouro uma etapa e dá início a uma nova fase do processo de organização de Blogueir@s e ativistas das redes sociais que lutam pela Democratização das Comunicações no Brasil e no Mundo.


Desde o 1º Encontro Nacional, realizado em agosto de 2010 em São Paulo, os encontros realizados serviram para que pudéssemos nos conhecer, criar laços de amizade e companheirismo, trocar informações e estabelecer relações e alianças entre blogueir@s de diversas regiões, além de aprender a separar o joio do trigo. Os encontros permitiram também fazer um diagnóstico bastante amplo da situação das comunicações no Brasil e no Mundo, assim como avaliar o verdadeiro papel da novas mídias neste contexto e apontar novos desafios.

Painéis de debates estiveram presentes em todos os encontros realizados. Personalidades e estudiosos deram contribuições fundamentais à nossa discussão. Trabalhos em grupos, que aconteceram em maior ou menor grau em cada um dos estados onde os encontros foram realizados, deram o ponta-pé inicial ao processo de troca de experiências e debate de ações concretas. Redes se formaram e novas ideias se disseminaram.

Agora é hora de ousarmos na construção dos próximos encontros, sejam eles regionais, estaduais, nacionais ou mundial. Precisamos unir todo o conteúdo acumulado até aqui e partir para debates ainda mais profundos e democráticos que envolvam um número cada vez maior de pessoas e temas. Para isso precisamos inovar:
- na elaboração dos programas dos encontros, tornando seus processos de construção coletivos e ainda mais colaborativos; 
- no formato dos próximos encontros, dando mais espaço para os debates entre os participantes de forma a proporcionar a elaboração de planos de ação concreta; e
- abrindo espaço para temas não abordados até aqui.

É preciso que as comissões organizadoras, dentro de sua proposta democrática e horizontal, assumam o papel de facilitadores do processo e ajudem no estabelecimento de pontes entre o movimento de blogueir@s e ativistas das redes sociais, da cultura digital, do movimento sindical e dos movimentos sociais.

É fundamental também que @s blogueir@s assumam mais responsabilidades nos processos de preparação dos encontros, estabeleçam contatos, apresentem propostas, criem alianças, compartilhem informações e conteúdo e não fiquem esperando que as comissões organizadoras cuidem de tudo, entregando-lhes pacotes "prontos". Precisamos manter a horizontalidade do movimento e isso só será possível com ampla participação de cada blogueir@.

Passada a etapa de análise e diagnóstico é chegada a hora de passar para o campo da ação concreta, aquela que nos permitirá construir efetivamente a tão sonhada Democratização da Comunicações. Para tanto, se faz premente estabelecer alianças estratégicas com os distintos movimentos supra-citados, criar laços sólidos com eles, ouví-los e juntos identificar pontos de convergência entre as distintas lutas e, a partir daí, elaborar planos de ação comuns.

Como bem diz a Carta de Foz "O direito humano à comunicação é hoje uma questão estratégica" , ou seja, é uma bandeira de luta de toda a Humanidade e para que alcance resultados concretos precisa estar articulada em várias frentes, unindo movimentos distintos "preservando e valorizando a diversidade".

É um grande desafio, mas é um desafio gostoso!

Imaginem o efeito multiplicador que teria uma aliança entre Blogueir@s,  Rádios e TVs comunitárias, por exemplo. Blogueir@s produzindo conteúdo e estes meios de comunicação transmitindo-o às suas comunidades em lugar de repetir notícias veiculada pela velha mídia, como muitas vezes acontece nos dias de hoje. Ou ainda, sindicatos e o movimento de sem-terras colocando a questão da Democratização das Comunicações como direito humano fundamental em suas pautas e a Blogosfera repercutindo as lutas desta companheirada de forma contínua e sistemática. Com certeza, todos os movimentos envolvidos ganhariam com isso, aumentando a ressonância de suas reivindicações na sociedade brasileira e mundial.

Não podemos esquecer também da juventude engajada nos movimentos de Cultura Digital e Software Livre que lutam pela Democratização e Compartilhamento do Conhecimento e produz instrumentos essenciais ao trabalho d@s blogueir@s: software e soluções para o trabalho em redes. Quanto mais trocarmos informações e experiências,  mais nos entenderemos mutuamente e mais coesos seremos nessa luta pela Democratização de nossas Sociedades reais ou virtuais.

Fica aqui, então, a nossa sugestão: avançar mais na democracia, ousar mais na formulação dos próximos encontros e estabelecer alianças estratégicas com vários setores da sociedade civil.

O novo faroeste caboclo do Cerrado



por Thiago Foresti, da Carta Capital
131 O novo faroeste caboclo do Cerrado
Índios funi-ô caminham por uma clareira no Santuário dos Pajés, aberta pela construtora Emplavi. Foto: Thiago Foresti
O ambiente climatizado e formal do Prédio da Justiça Federal em Brasília não é exatamente o lugar onde os antropólogos se sentem mais à vontade. Pelo menos é o que as mãos levemente trêmulas e a voz às vezes vacilante de Jorge Eremites demonstram. Ele está diante da juíza Clara Mota dos Santos, cuja fala contundente e precisa contrasta com seu rosto jovem. Apesar de o antropólogo vestir terno preto, deixa transparecer adereços indígenas nos pulsos, pescoço e orelhas. Nas mãos carrega anotações e diários de campo, tudo escrito à caneta.
Ele está cercado de advogados de empreiteiras e representantes da Fundação Nacional do Índio, a Funai. A data: sexta-feira, 27 de outubro. Todos prestam atenção nas perguntas da juíza, que, de toga e em frente a um crucifixo gigante pendurado na parede, colhe o depoimento.
“Porque esses índios não podem realizar esses rituais em outro lugar?”, pergunta a juíza. “Excelentíssima, derrubar árvores sagradas para eles representa algo como pisar em crucifixos para nossa cultura”, responde o antropólogo.
Jorge Eremites, o depoente, é responsável por um laudo bastante controverso e combatido, no qual atesta que os 50 hectares do último quinhão de cerrado nativo do Plano Piloto do Distrito Federal é na verdade uma terra indígena, o Santuário dos Pajés.
A audiência foi resultado dos crescentes protestos de estudantes no noroeste do Plano Piloto, no Distrito Federal (DF). A região é hoje palco de uma das maiores e mais caras disputas indigenistas do país, envolvendo de um lado a Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap), e do outro o índio Santixiê, que representa uma tribo com 16 indígenas da etnia funi-ô tapuia.
Construtoras x Índios
O território reivindicado por Santxiê é hoje o metro quadrado mais caro do país. Cada lote foi negociado por cerca de 15 milhões de reais pela Terracap, empresa estatal de Brasília que negocia as terras da união. Duzentos apartamentos já foram vendidos na planta a uma média de 1,5 milhão cada.
“Alguns dos meus clientes pagaram por esses lotes à vista e agora não podem construir, isso é um absurdo. Cada dia de obra parada nos custa algo em torno de 60 mil reais”, diz Antônio Gomes, advogado das construtoras Emplavi, João Fortes e Brasal. Gomes foi presidente da Terracap na época da negociação dos terrenos com as empreiteiras. Na época ele chegou a chamar os índios funi-ô tapuia de “interesseiros” e disse que era um despropósito criar uma reserva indígena numa área tão valiosa. “Não admitimos a criação dessa reserva nem por hipóteses. Meus clientes pagaram pela terra e tem documentos que atestam essa propriedade. Nós não vamos aceitar mais interrupções nas obras. Vamos até o Supremo Tribunal Federal se for necessário”, diz o advogado em entrevista para jornalista durante o intervalo da audiência.
Em 2009 o juiz Hamilton de Sá Dantas, a pedido de uma ação civil pública, impediu a Terracap de reformatar parte do setor noroeste, defendendo ali a demarcação legal do Santuário dos Pajés. A Procuradoria da República do Distrito Federal, também solicitou à Funai a criação de um Grupo de Trabalho (GT) para decidir de uma vez por todas se o local é território indígena, ou não. Essa era inclusive o condicionante 2.35 da Licença Prévia concedida pelo Instituto Brasília Ambiental (Ibram) para o início das construções no Noroeste: resolver a questão indígena – solução que só poderia ser apontada pela Funai.
Desse modo, sem o licenciamento completo e sem a questão indígena resolvida, os lotes começaram a ser leiloados no Noroeste em 2008 pela Terracap. Só dois anos mais tarde, em 2010, a Funai publicou portaria no Diário Oficial autorizando uma diligência técnica a estudar o caso do Santuário dos Pajés. A conclusão do antropólogo Jorge Eremites foi de que os funi-ôs tapuia eram uma comunidade tradicional e terminava o laudo recomendando a criação de 50 hectares de Terra Indígena. O resultado do seu trabalho foi elogiado e defendido pela Associação Brasileira de Antropologia (ABA), mas não agradou à Funai, que reprovou o laudo e solicitou estudos complementares.
Um saco de gatos chamado Funai
A sessão do dia 27 de outubro, que durou nove horas, tinha por objetivo esclarecer o laudo e o trabalho dos antropólogos, mas o que ficou mais evidente durante toda a audiência foi a falta de clareza dos processos burocráticos da Funai.
“A senhora poderia dizer por que o laudo do antropólogo Jorge foi reprovado?”, pergunta a juíza para Maria Auxiliadora, diretora de assuntos fundiários da Funai, que prestou depoimento logo após o antropólogo. “Não saberia citar, vossa excelência. Teria que consultar meu corpo técnico”, respondeu.
Os relatos demonstraram que o trabalho de campo também não foi tranquilo. Houve desentendimentos e desavenças entre integrantes da equipe e os índios: “Não escolhi minha equipe, vossa excelência, e todos os antropólogos que me foram designados já tinham uma opinião formada sobre o trabalho”. Em seu relato, Jorge contou que uma das antropólogas apareceu apenas duas tardes na aldeia. Já outro entrou em conflito com os índios por afirmar que a divindade deles era hermafrodita.
Nem mesmo o georreferenciamento da Terra Indígena ficou claro. Um topógrafo designado pela FUNAI também prestou depoimento e confundiu ainda mais os presentes que se amontoaram na mesa da juíza para tentar entender até onde iam os 50 hectares reivindicados pelos indígenas.
A sessão terminou com a leitura da decisão da desembargadora Selene Maria de Almeida, a mesma do caso Belo Monte. A decisão, na prática, autorizava as construtoras a ligarem os motores das retroescavadeiras já no dia seguinte.

*publicado originalmente no site da Carta Capital.

Fonte: Site Envolverde.

Nota da editora do Blog. Estive na  região Amazônica. Passei um dia num seminário na UFPA. Conversei com estudantes de geologia e oceania, além de professores/doutores da Instituição.
Essa matéria retrata bem o que vi e ouvi: o marketing e a maquiagem ambiental são armas das empresas modernas, que usam  as ONGs, a mídia,  a justiça, e até mesmo a academia para  aumentar a injustiça socioambiental." A vida  dos habitantes  do interior  da Amazônia está muito mais devastada do que a própria floresta", dizia Thiago de Mello, no seu  Livro AMAZÔNIA:  A Menina dos Olhos do Mundo.
Conheço os Cerrados, onde morem mais crianças ídigenas de fome, em virtude do agronegócio. Agora, nas periferias das cidades, as empreiteiras expulsam os índios. Assim aumenta a injustiça socioambiental. (Zilda Ferreira) 

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Quilombolas da Amazônia têm seus territórios ameaçados por projetos hidrelétricos e minerários


 por Bianca Pyl.

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Foto: Bianca Pyl.
O livro “Terras Quilombolas em Oriximiná: pressões e ameaças”, que acaba de ser lançado pela Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP), traz dados preocupantes que evidenciam os desafios enfrentados pelas 35 comunidades quilombolas do município paraense de Oriximiná, na região Amazônica, para proteger suas terras mesmo aquelas já tituladas.
Os quilombolas em Oriximiná constituem uma população de cerca de 8.000 pessoas que se distribuem por 35 comunidades rurais em nove territórios étnicos nas margens dos Rios Trombetas, Erepecuru, Acapu e Cuminã. Quatro dos territórios já se encontram titulados e um quinto está parcialmente regularizado – a dimensão da área titulada em Oriximiná corresponde a 37% do total das terras quilombolas tituladas no Brasil.
O estudo inédito confirmou a contribuição das terras quilombolas na proteção das florestas. O estudo de imagens de satélite demonstrou que apenas 1% dos territórios quilombolas em Oriximiná encontra-se desmatado e que, de forma geral, o ritmo do desmatamento nas terras quilombolas está diminuindo.
Mas a pesquisa revela também que as terras quilombolas estão sob risco. Além do avanço de desmatamento na direção das áreas quilombolas foram identificados diversos fatores de risco, como a ação das empresas madeireiras; as iniciativas de concessão florestal pelo governo federal e estadual;  e os projetos minerários e hidrelétricos, envolvendo empresas privadas e o governo federal, que pretendem explorar os recursos dos territórios destas comunidades, causando grande impacto em seus modos de vida.
Dentre as pressões identificadas pela pesquisa da CPI-SP chamam a atenção os interesses minerários: são 94 processos minerários incidentes nas terras quilombolas em Oriximiná, sendo que 10 deles são concessão de lavra em nome da Mineração Rio do Norte. Quatro dos territórios quilombolas têm mais de 70% de sua extensão sob interesses minerários em diversas etapas.
Na região de Oriximiná, na bacia do Rio Trombetas, o Ministério de Minas e Energia realiza estudos para a construção de 15 empreendimentos hidroelétricos: 13 deles contam com estudos de inventário; um com estudo de viabilidade e um com projeto básico. Segundo o “Plano Nacional de Energia 2030”, a área total a ser inundada por tais hidroelétricas soma 5.530 quilômetros quadrados abrangendo terras quilombolas, terras indígenas e unidades de conservação.
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Foto: Bianca Pyl.
A publicação aponta ainda que o direito a consulta livre, prévia e informada  — previstos na Convenção 169 — não tem sido respeitado na medida em que muitas decisões que afetam diretamente essas comunidades estão sendo tomadas sem que os quilombolas tenham acessam a informação completa e acessível, tenham a oportunidade de refletir internamente sobre as questões postas e de fato possam expressar sua opinião.
Com a divulgação do livro, a CPI-SP busca apoiar as comunidades quilombolas nas suas demandas por políticas públicas para a proteção e gestão dos territórios quilombolas antes e depois da titulação e pelo cumprimento do direito a consulta livre, prévia e informada.
Para ter acesso a publicação completa clique aqui.

Fonte: Site Envolverde

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Avanço da comunicação pública


por Mario Osava, da IPS
617 Avanço da comunicação públicaAssunção, Paraguai, 31/10/2011 – Os meios de comunicação públicos crescem na América Latina com novos conceitos, acentuando sua independência do Estado e do setor privado, afirmaram jornalistas, acadêmicos e funcionários reunidos na capital Paraguai. “A comunicação pública e do governo precisam ir por linhas separadas”, destacou o ministro da Comunicação do Paraguai, Augusto dos Santos, ao falar no Seminário Internacional “Mídia Pública e Sociedade: a Experiência Global e o Caminho Latino-Americano”, realizado no dia 26. Autonomia, compromisso com a cidadania e “ouvir todos os setores” são condições necessárias para a primeira, disse Santos.
O Paraguai, que recebeu o seminário no contexto da XXI Cúpula Ibero-Americana, realizada nos dias 28 e 29, em Assunção, inaugurou em agosto sua primeira rede pública de televisão, ainda com transmissões experimentais. Já no Equador os meios de comunicação públicos registraram um rápido avanço impulsionado pela Constituição aprovada em 2008, que gerou “a disputa do relato” com grupos privados que dominavam a comunicação social no país, segundo o subdiretor do jornal equatoriano El Telégrafo, Orlando Pérez. El Telégrafo, Equador TV e Rádio Pública logo aderiram à carta magna que, entre outras regras, impede a aquisição de veículos pelos banqueiros, que antes controlavam boa parte do setor, destacou.
Depois, “diversificaram-se as vozes e os conteúdos. As 14 nações indígenas existentes no Equador conquistaram suas frequências de rádio, inauguraram transmissões em suas próprias línguas e formaram jornalistas”, disse Pérez. Os meios de comunicação públicos de alcance nacional e as rádios comunitárias, às quais se somaram “tribos juvenis urbanas”, despertaram “uma reação sem precedentes” dos grupos privados tradicionais, que perderam participação no “mix de publicidade” e na audiência, ressaltou. Pérez acrescentou que a circulação do El Telégrafo foi boicotada pelo setor privado, com exemplares retirados das bancas.
O Peru, por outro lado, chega com atraso ao movimento que vive a América Latina desde a década passada. Seus meios de comunicação foram “desmantelados, reduzidos a nada” pelo segundo governo de Alan García (2006-2011) e agora busca reconstruí-los com uma visão pública e de inclusão social, informou a atual diretora de Comunicação, Blanca Rosales. “Meu escritório tinha apenas duas pessoas”, e eram administrativas. A Rádio Nacional não cobria nem mesmo a capital Lima e a emissora de TV sobrevivia com um orçamento insignificante, disse Rosales. Espera-se que a situação mude com a chegada ao poder do esquerdista Ollanta Humala, que “não era o favorito dos meios de comunicação privados”, recordou.
No Brasil já havia vários veículos estatais, incluindo 22 emissoras de televisão estaduais, nove rádios e a TV Brasil. Após um longo processo de debates, em 2007 foi criada a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) para administrar a mídia pública. Por outro lado, existe a NBR, emissora de televisão claramente estatal, que informa sobre as políticas do governo. Porém, as duas últimas administrações, embora muito populares, nada puderam fazer para mudar as comunicações no Brasil, dominadas por grupos privados, devido à “correlação de forças” e ao escasso apoio social para implantar, por exemplo, algum sistema de regulação das emissoras de TV, admitiu Carlos Tibúrcio, assessor da Presidência.
“A sociedade brasileira discute pouco sobre os meios de comunicação” e os empresários do setor reagem a qualquer proposta de regulação ou alteração, como se violassem seus “direitos adquiridos”, explicou Tibúrcio. Contudo, pedem intervenção estatal agora que as operadoras telefônicas pretendem entrar na produção de conteúdo para televisão, acrescentou. Tibúrcio afirmou que a mídia pública deveria receber mais recursos das autoridades. Diante “do poder concentrado dos meios de comunicação privados”, o Estado tem de “tratar de forma desigual” os diferentes sistemas para estabelecer algum equilíbrio, afirmou.
Os recursos financeiros têm que vir do orçamento nacional, isto é, dos impostos pagos pela população, afirmou, por sua vez, Ivanir Bortot, editor-chefe da Agência Brasil, administrada pela EBC. A TV Brasil nasceu com vocação também internacional: seu sinal chega a 69 países. Porém, não alcança todo o território nacional, como locais isolados e pouco povoados que jamais interessariam aos meios de comunicação privados.
Chegar a todo o país é uma das três condições que, segundo o especialista argentino Martin Becerra, compõem o caráter público de uma mídia. As outras são a participação social no controle e na programação, e uma sustentabilidade que garanta sua permanência, ao contrário de órgãos estatais que podem desaparecer quando muda o governo.
Fazer-se público é um processo, exige capacitação dos jornalistas e condições de “independência e pluralidade”, dois conceitos repetidos por diferentes oradores no seminário promovido pela Secretaria de Informação e Comunicação para o Desenvolvimento, do governo paraguaio, junto com o Banco Mundial, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e a agência Inter Press Service (IPS).
Como modelos de televisão pública de outros continentes apresentaram-se a NHK, do Japão, a britânica BBC e a Televisão Espanhola (TVE), campeã de audiência em seu país. Outros veículos internacionais, com Telesur, fundado em 2005 por Venezuela, Argentina, Cuba e Uruguai, apresentaram-se como exemplos no seminário de Assunção, que continuou o debate iniciado em um encontro em junho em Montevidéu.
Nove agências nacionais, incluindo a Venezuelana de Notícias (AVN), a cubana Prensa Latina e a Notimex, formaram em junho a União Latino-Americana de Agências de Notícias (Ulan), buscando sinergia para se fortalecer no campo jornalístico, destacou Daniel Giarone, gerente de Desenvolvimento Internacional da argentina Telam. Também foi destacado o papel exercido pelas rádios públicas e comunitárias, como a Paraguai Rádio Viva e a boliviana Rádio Pio 12, além de iniciativas como a Associação Latino-Americana de Educação Radiofônica e a Associação Mundial de Rádios Comunitárias. Envolverde/IPS

Fonte: Site Envolverve/IPS

A voz de Lula e outras vozes

O ex-presidente brasileiro (2003-2010) não é só o líder do maior partido de esquerda do mundo, o Partido dos Trabalhadores, e uma das figuras mais carismáticas do planeta. Parte de sua militância, antes e agora, desde que começou sua carreira sindical nos anos 70 até seu giro pela Europa para pedir uma solução política para a crise, consiste em convencer e convencer. Com fatos, mas também falando com sua voz rouca para enunciar argumentos simples e emocionar. O artigo é de Martín Granovsky.

Era de manhã e caía uma chuva tropical quando o moderador Sergio Bertoni disse: “Queremos dar-lhes a notícia de que o presidente Lula tem câncer”. Não havia maiores informações. Fez-se um silêncio denso entre os 468 participantes do Congresso Mundial de Blogueiros, em Foz do Iguaçu. Passou menos de um minuto em meio ao painel “Experiências na América Latina” para se conseguir mais dados (era câncer de laringe e Lula já estava internado no Hospital Sírio Libanês de São Paulo) e tuitar: “Uma desgraça. Lula, dirigente popular e pedagógico, tem câncer de laringe”.

O ex-presidente brasileiro (2003-2010) não é só o líder do maior partido de esquerda do mundo, o Partido dos Trabalhadores, e uma das figuras mais carismáticas do planeta. Parte de sua militância, antes e agora, desde que começou sua carreira sindical nos anos 70 até seu giro pela Europa para pedir uma solução política para a crise, consiste em convencer e convencer. Com fatos, mas também falando com sua voz rouca para enunciar argumentos simples e emocionar. “Que problema”, disse alguém no twitter desde a Argentina. “O mesmo aconteceu com Castelli, orador da Revolução”, escreveu @raulcaminos. Castelli teve câncer de garganta.

O Encontro Internacional de Blogueiros, impulsionado por Joaquim Palhares, o inquieto editor do site de esquerda Carta Maior, com mais de 60 mil leitores cadastrados com nome e sobrenome, tratou de vozes.

Entre os 468 participantes, 250 eram de Foz e 218 de fora. Vieram de 17 estados do Brasil e de 23 países distintos, entre eles a Argentina, representada por Damián Loreti, que integrou a equipe que redigiu a Ley de Medios, o pesquisador Martín Becerra e outro Martín, que assina esta nota.

O Congresso emitiu um documento final reivindicando a liberdade de expressão, repudiando qualquer tipo de censura e criticando os monopólios midiáticos. Participou do encontro Ignacio Ramonet, diretor do Le Monde Diplomatique em espanhol, sempre preocupado em pedir uma atitude aberta ante às mudanças tecnológicas envolvendo o jornalismo e enfatizar que as novidades não devem supor uma queda da qualidade profissional nem um cataclismo.

Os detalhes da experiência argentina despertaram muito interesse. A Ley de Medios poderia ser copiada no Brasil? Diplomático, Loreti disse que não se sentia autorizado para dizer o que outro país deve fazer, mas lembrou que, na elaboração da lei argentina, foram fundamentais “a participação popular, a vocação política e a decisão de basear-se em princípios dos direitos humanos” vigentes na América e no mundo. “Mesmo que a mão invisível do mercado alcançasse algum âmbito da comunicação, é certo que não seria suficiente para garantir a pluralidade nos meios de comunicação”, disse após esclarecer que a legislação argentina não regula conteúdos nem tem jurisdição sobre a imprensa escrita.

Para Loreti, especialista em Direito à Informação, “historicamente os meios de comunicação não são os oradores, mas sim o fórum público”.

Blanca Josales, diretora de comunicação do Peru, disse que para o governo de Ollanta Humala “a comunicação é um direito vinculado com a inclusão social”. Além disso, destacou que “o direito à informação é uma política pública”.

Ahmed Bahgat, do Egito, explicou um cyberativista não é o mesmo que um blogueiro. Ele contou que, durante as revoltas no Cairo, tiveram que driblar a divisão da polícia política encarregada da guerra eletrônica, que chegou a internar um blogueiro em uma instituição de saúde mental. Bahgat narrou que, enquanto enganavam a vigilância deviam construir redes de confiança. “Nós prestávamos atenção em quem estava trabalhando na rua e quando víamos que sua informação era séria nos conectávamos para trocar dados”, relatou. Terminaram desenhando círculos que serviam para checar a informação. Como uma redação virtual, mas nas praças e nos bairros das principais cidades do Egito.

Jesse Freeston mostrou um impactante vídeo sobre Honduras, onde um colaborador de um dirigente do presidente Porfirio Lobo se aproximava e, apontando para um periodista, dizia: “Faça com que o matem”. Freeston disse que, na América Latina, Honduras tinha o maior volume de jornalistas assassinados. Um dos ameaçados destacava no vídeo que tornar-se conhecido internacionalmente era uma das principais formas de proteção.

O autor do vídeo citou o encarregado da embaixada dos EUA na Guatemala, Hugo Llorens. É o mesmo diplomata que substituiu o embaixador Lino Gutiérrez na Argentina. Gutiérrez e outros membros do Departamento do Estado viram interrompidas suas carreiras depois que a Chancelaria dos EUA iniciou uma investigação interna por supostas irregularidades. O Página/12 informou em 2005 sobre o papel de Gutiérrez e sua equipe na teia de relações entre a empresa Cogent, Ciccone e o empresário Mario Montoto. É provável que Llorens tenham um guarda-chuva de proteção maior que o resto de seus colegas, porque segue na carreira.

O espanhol Pascual Serrano pediu para que não se sinta “um êxtase místico pelas redes”, ainda que “seria um suicídio renunciar aos artefatos da tecnologia”. Ao falar dos indignados disse que “a rua e o acampamento sozinhos, sem partidos, sem política, não servem” e defendeu que “a organização segue sendo importante como foi durante toda a vida, com pessoas que se juntam cara a cara e discutem”, porque “o ativismo virtual só consegue melhoras virtuais e não há possibilidade de mudança sem uma construção coletiva”.

Na mesma linha, Becerra disse que “é arriscado acreditar que as redes sociais medem o humor popular” e também que “pode haver um risco de endogamia, porque se reúne gente que pensa de maneira bastante parecida”.

Andrés Thomas Conteris, fundador nos EUA de Democracy Now em espanhol, ressaltou a “perspectiva das histórias populares como uma tarefa a realizar”. Ao comentar a crise econômica dos EUA deu um dado: enquanto outras crises que envolveram escândalos econômicos chegaram a envolver mil investigadores do FBI, “desta vez há só 15”. E um outro: as dívidas dos estudantes pelos créditos para seus estudos representam uma soma superior à dívida de cartões de créditos. Às 14h10min, um dos organizadores atualizou a informação. Lula estava sob controle médico. Aplausos.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

Fonte: Carta Maior

Jakobskind lança livro sobre a Líbia



Líbia: Barrados na fronteira, de autoria do jornalista Mário Augusto Jakobskind, será lançado no próximo dia 11 de novembro, sexta-feira, a partir das 18h30 na Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Rua Araújo Porto Alegre, 71, 7º andar. Antes da noite de autógrafos, haverá debate sobre o papel da mídia e o que ocorreu na Líbia nos últimos meses de conflitos. Está confirmada a presença do deputado federal Protógenes Queiroz (PCdoB-SP), um dos integrantes da frustrada viagem da delegação brasileira, que tinha como objetivo preparar um relatório para a ONU sobre a invasão daquele país pelas forças da OTAN. O livro é mais uma edição da BOOKLINK (www.booklink.com.br), e conta com o apoio da ABI.

Além de analisar os acontecimentos naquele país do Norte da África, o autor mostra como os meios de comunicação manipularam fatos com a edição de imagens e textos que tiveram o objetivo de convencer a opinião pública sobre a “missão humanitária” exercida pelos bombardeios da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), fator determinante para a definição de um dos lados da disputa entre adeptos e opositores do regime líbio, capitaneado por Muammar Kadhafi.

O presidente da ABI, Maurício Azêdo, no texto de apresentação, assim se refere sobre o lançamento: “Com extremado senso de oportunidade jornalística, já demonstrado em outros trabalhos publicados pela mesma editora, Mário Augusto Jakobskind nos oferece neste seu mais novo livro não apenas o relato episódico de relevante acontecimento histórico, mas um amplo e circunstanciado painel da tragédia que se abateu sobre a Líbia e seu povo após a união de poderosas forças do Ocidente – Estados Unidos, Grã-Bretanha e França – para a derrubada de um dirigente nacional, Muammar Kadhafi, que durante mais de quatro décadas foi protagonista de destacados momentos da vida internacional.”

O autor, experiente repórter, com passagens por diversas redações, também fez parte da delegação brasileira à Líbia, que ficou barrada na fronteira da Tunísia e a Líbia. E atualmente é conselheiro da ABI e o representante da entidade junto à EBC (Empresa Brasileira de Comunicação). Dois dos seus livros também foram publicados com o selo da BOOKLINK: Parla! e Cuba: Apesar do bloqueio.  



domingo, 30 de outubro de 2011

Carta de Foz do Iguaçu

 

 Encontro Mundial de Blogueiros.

 


O 1º Encontro Mundial de Blogueiros, realizado em Foz do Iguaçu (Paraná, Brasil), nos dias 27, 28 e 29 de outubro, confirmou a força crescente das chamadas novas mídias, com seus sítios, blogs e redes sociais. Com a presença de 468 ativistas digitais, jornalistas, acadêmicos e estudantes, de 23 países e 17 estados brasileiros, o evento serviu como uma rica troca de experiências e evidenciou que as novas mídias podem ser um instrumento essencial para o fortalecimento e aperfeiçoamento da democracia.
Como principais consensos do encontro – que buscou pontos de unidade, mas preservando e valorizando a diversidade –, os participantes reafirmaram como prioridades:
- A luta pela liberdade de expressão, que não se confunde com a liberdade propalada pelos monopólios midiáticos, que castram a pluralidade informativa. O direito humano à comunicação é hoje uma questão estratégica;
- A luta contra qualquer tipo de censura ou perseguição política dos poderes públicos e das corporações do setor. Neste sentido, os participantes condenam o processo de judicialização da censura e se solidarizam com os atingidos. Na atualidade, o WikiLeaks é um caso exemplar da perseguição imposta pelo governo dos EUA e pelas corporações financeiras e empresariais;
- A luta por novos marcos regulatórios da comunicação, que incentivem os meios públicos e comunitários; impulsionem a diversidade e os veículos alternativos; coíbam os monopólios, a propriedade cruzada e o uso indevido de concessões públicas; e garantam o acesso da sociedade à comunicação democrática e plural. Com estes mesmos objetivos, os Estados nacionais devem ter o papel indutor com suas políticas públicas.
- A luta pelo acesso universal à banda larga de qualidade. A internet é estratégica para o desenvolvimento econômico, para enfrentar os problemas sociais e para a democratização da informação. 
O Estado deve garantir a universalização deste direito. A internet não pode ficar ao sabor dos monopólios privados.
- A luta contra qualquer tentativa de cerceamento e censura na internet. Pela neutralidade na rede e pelo incentivo aos telecentros e outras mecanismos de inclusão digital. Pelo desenvolvimento independente de tecnologias de informação e incentivo ao software livre. Contra qualquer restrição no acesso à internet, como os impostos hoje pelos EUA  no seu processo de bloqueio à Cuba.
Com o objetivo de aprofundar estas reflexões, reforçar o intercâmbio de experiências e fortalecer as novas mídias sociais, os participantes também aprovaram a realização do II Encontro Mundial de Blogueiros, em novembro de 2012, na cidade de Foz do Iguaçu. Para isso, foi constituída uma comissão internacional para enraizar ainda mais este movimento, preservando sua diversidade, e para organizar o próximo encontro.

Fonte: Blogueiros Progressistas do Estado de São Paulo (Esmaeel)

sábado, 29 de outubro de 2011

A Islândia põe os seus banqueiros na prisão


Escrito por  Claudi Pérez

Islandia
“A primeira vítima da crise financeira constitui-se como uma valente tentativa de pedir responsabilidades”. Claudi Pérez (El País) conta neste artigo a história da ascensão e da queda da economia islandesa.

A Interpol emitiu um mandado de busca em nome de Sigurdur Einarsson, presidente executivo de um dos maiores bancos da Islândia, o Kaupthing, que acabou nacionalizado quando da crise de 2008.
Procura-se. Homem, 48 anos, 1,80 metros, 114 quilos. Calvo, olhos azuis. A Interpol acompanha esta descrição de uma foto na qual aparece um tipo bem barbeado enfiado num desses fatos escuros de 2000 euros e enfeitado com um impecável nó de gravata. Vê-se à légua que se trata de um banqueiro: este não é um desses cartazes do oeste selvagem. A delinquência mudou muito com a globalização financeira. E contudo esta história tem contornos de western de Sam Peckinpah ambientado para o Árctico. Isto é a Islândia, o lugar onde os bancos vão à ruína e os seus dirigentes podem ir para a cadeia sem que o céu se abata sobre as nossas cabeças; a ilha onde apenas meio milhar de pessoas armadas com perigosos tachos podem derrubar um governo.
Isto é a Islândia, o pedaço de gelo e rocha vulcânica que em tempos foi o país mais feliz do mundo (assim, tal como consta) e onde agora os taxistas lançam os mesmos olhares furibundos que em todas as partes quando se lhes pergunta se estão mais chateados com os banqueiros ou com os políticos. Enfim, Isto é a Islândia: paraíso sobrenatural, reza o cartaz que se avista do avião, mesmo antes de desembarcar.
O tipo da foto chama-se Sigurdur Einarsson. Era o presidente executivo dum dos grandes bancos da Islândia e o mais temerário de todos, Kaupthing (literalmente, "a praça do mercado"; os islandeses têm um estranho sentido de humor, para além duma língua milenar e impenetrável). Einarsson já não está na lista da Interpol. Foi detido há uns dias na sua mansão de Londres. E é um dos protagonistas do livro mais lido na Islândia: nove volumes e 2400 páginas para uma espécie de saga delirante sobre os desmandes que a indústria financeira pode chegar a perpetrar quando está totalmente fora de controlo.
Nove volumes: praticamente episódios nacionais em que se demonstra que nada disso foi um acidente. A Islândia foi saqueada por cerca de 20 ou 30 pessoas. Uma dezena de banqueiros, uns poucos empresários e um punhado de políticos formaram um grupo selvagem que levou o país inteiro à ruína: 10 dos 63 parlamentares islandeses, incluindo os dois líderes do partido que governou quase ininterruptamente desde 1944, tinham empréstimos pessoais concedidos por um valor de quase 10 milhões de euros por cabeça. Está por demonstrar que isso seja delito (embora pareça que parte desse dinheiro servia para comprar acções dos próprios bancos: para fazer inchar as cotações), mas pelo menos é um escândalo enorme.
A Islândia é uma excepção, uma singularidade; uma raridade. E não só por deixar os seus bancos ir à falência e perseguir os banqueiros. A ilha é uma paisagem lunar com apenas 320 000 habitantes a meio caminho entre a Europa, os EUA e o círculo polar, com um clima e uma geografia extremos, com uma das tradições democráticas mais antigas da Europa e, último tópico, com uma gente de indomável carácter e uma forma de ser e fazer do mais peculiar. Um lugar onde um desses taxistas furibundos, depois de deixar para trás a capital, Reikiavik, se mete por uma língua de terra rodeada de água e deixa o jornalista ao pé da distinta residência presidencial, com o mesmíssimo presidente esperando na soleira da porta: qualquer um pode aproximar-se sem problemas, não há medidas de segurança, nem sequer um polícia. Só o pormenor exótico duma enorme pele de urso polar no alto duma escadaria tira do pasmo quem numa primeira entrevista com um presidente dum país dá com um mandatário - Ólagur Grímsson, que considera "uma loucura" que os seus concidadãos "tenham de pagar a factura da banca sem serem consultados".
E do presidente ao cidadão de pé-no-chão: da particularidade à categoria. Arnar Arinbjarnarsson é capaz de resumir o apocalipse da Islândia com surpreendente impavidez, à frente dum fumegante capuchino no central Café Paris, a dois passos do Althing, o Parlamento. Arnar tem 33 anos e estudou engenharia na universidade, mas, ao acabar nem sequer lhe passou pela cabeça desenhar pontes: um dos bancos contratou-o, apesar de não ter formação financeira. "A banca estava a experimentar um crescimento explosivo, e para um engenheiro é relativamente simples aprender matemática financeira, sobretudo se o ordenado for estratosférico", alega.
A Islândia costumava ser o país mais pobre da Europa nos princípios do século XX. Nos anos oitenta, o governo privatizou a pesca: dividiu-a em quotas e fez uns quantos pescadores milionários. A partir daí, sob o influxo de Ronald Reagan e Margaret Thatcher, o país converteu-se na quintessência do modelo liberal, com uma política económica de baixos impostos, privatizações, desregulamentações e além do mais: a sombra de Milton Friedman, que viajou durante essa época para Reikiavik, é alargada. Aquilo funcionou. O rendimento per capita situou-se entre os mais altos do mundo, o desemprego estabilizou em 1% e o país investiu em energia verde, unidades industriais de alumínio e tecnologia. O cúmulo deu-se com o novo século: o Estado privatizou a banca e os banqueiros iniciaram uma corrida desaforada pela expansão dentro e fora do país, ajudados pelas mãos deixadas livres com a falta de regulamentação e com taxas de juro à volta de 15% que atraíam as poupanças dos dentistas austríacos, dos reformados alemães e dos comerciantes holandeses. Uma economia sã, assente em sólidas bases, converteu-se numa mesa de black jack. Nem sequer faltou uma campanha nacionalista a favor da supremacia racial da casta empresarial, o que talvez demonstre como é perigoso meter esse tipo de tontarias na cabeça das pessoas, seja "as casas nunca baixam de preço" ou "os islandeses controlam melhor o risco pelo seu passado viking".
A festa descontrolou-se: os activos dos bancos chegaram a multiplicar o PIB por 12. Apenas a Irlanda, outro exemplo de modelo liberal, se aproxima dessas cifras. Até que da noite para o dia - com o colapso da Lehman Brothers e o estouro financeiro mundial - tudo se desmoronou, no que foi "o choque mais brutal e fulminante da crise internacional", assegura Jon Danielsson, da London School of Economics.
Mas voltemos a Arnar e ao seu relato: "a banca começou a desbaratar dinheiro em farras com champanhe e estrelas de rock; comprou ou ajudou a comprar meia Oxford Street, vários clubes de futebol da liga inglesa, bancos na Dinamarca, empresas por toda a Escandinávia: tudo o que estivesse à venda e tudo a crédito". Os executivos concediam créditos milionários a si mesmos, a familiares, a amigos e aos políticos próximos, frequentemente sem garantias. A Bolsa multiplicou o seu valor por nove entre 2003 e 2007. Os preços dos andares triplicaram. "Os bancos levantaram um obsceno castelo de cartas que levou tudo à frente", conta Arnar, que conserva o seu emprego, mas com metade do ordenado. Acaba de comprar um barco a meias com o pai com a intenção de mudar de vida: quer dedicar-se à pesca.
A fábula duma ilha de pescadores que se converteu num país de banqueiros tem uma moral: "Talvez seja a hora de voltar ao começo", reflecte o engenheiro. "Talvez todo esse dinheiro e esse talento que a banca absorve quando cresce demasiado não só se converta num foco de instabilidade, como que subtraia recursos a outros sectores e possa chegar a ser nocivo ao impedir que uma economia desenvolva todo o seu potencial", diz o presidente Grímsson.
A magnitude da catástrofe foi espectacular. A inflação descontrolou-se, a coroa veio por ali abaixo, o desemprego cresceu a toda a velocidade, o PIB caiu 15%, os bancos perderam uns 100 mil milhões de dólares (há-de passar muito tempo até haver números definitivos) e os islandeses continuaram a ser ricos, mais ou menos: metade do que eram antes. De quem foi a culpa? Dos bancos e dos banqueiros, naturalmente. Dos seus excessos, daquele forrobodó de crédito, da sua desmedida cobiça. Os bancos são o monstro, a culpa é deles e, de toda a forma, dos políticos que lhes permitiram tudo isso. OK. Não há dúvida. Somente dos bancos?
"O país inteiro viu-se apanhado numa bolha. A banca sentiu um desenvolvimento repentino, coisa que agora vemos como algo estúpido e irresponsável. Mas as pessoas fizeram algo parecido. As regras normais das finanças permaneceram suspensas e entramos na era do vale tudo: duas casas, três casas por família, um Range Rover, uma moto de neve. Os salários subiam, a riqueza parecia sair do nada, os cartões de crédito deitavam fumo", explica Ásgeir Jonsson, ex-economista chefe da Kaupthing. O também economista Magnus Skulasson assume que essa loucura colectiva levou um país inteiro a parecer dominado pelos valores de Wall Street, da banca de investimento mais especulativa. "Nós islandeses contribuímos decisivamente para que se passasse o que passou, por permitirmos que o governo e a banca fizessem o que fizeram, mas também participamos dessa combinação de cobiça e estupidez. Os bancos merecem ficar afastados do jogo e nós merecemos uma parte do castigo: mas só uma parte", afirma no restaurante dum hotel central.
Uma coisa salva os islandeses, de alguma maneira os redime de parte desses pecados. No seu incisivo Indignai-vos!, Stephane Hessel descreve como os financeiros na Europa e nos EUA, culpados indiscutíveis da crise, salvaram o buraco e continuam com a sua vida como sempre: voltaram os lucros, os bónus, essas coisas. Em compensação, as suas vítimas não recuperaram o nível de ganhos, e muito menos o emprego. "O poder do dinheiro nunca havia sido tão grande, insolente, egoísta com todos", acusa e, contudo, "os banqueiros mal suportaram as consequências dos seus desaforos", acrescenta no prólogo do livro o escritor José Luis Sampedro.
Assim é: salvo talvez no Árctico. A Islândia fez uma valente tentativa de pedir responsabilidades. "Deixar falir os bancos e dizer aos credores que não vão cobrar tudo o que se lhes deve ajudou a mitigar algumas das consequências das loucuras dos seus banqueiros", assegura por telefone a partir do Texas o economista James K. Galbraith.
Contada assim, a versão islandesa da crise tem um toque romântico. Mas a economia é sempre mais prosaica do que parece. Há quem relate uma historia diferente: "Simplesmente, não havia dinheiro para resgatar os bancos: caso contrário, o Estado tê-los-ia salvado: Chegamos a pedi-lo à Rússia!", critica o politólogo Eirikur Bergmann. "Foi um acidente: não queríamos, mas tivemos de deixá-los falir e agora os políticos tratam de vender essa lenda de que Islândia deu outra resposta".
Seja como for, a crise deixou uma cicatriz enorme que continua bem visível: há controlo de capitais, um delicioso eufemismo do que no hemisfério Sul (e mais concretamente na Argentina) costuma chamar-se corralito. O desemprego continua acima dos 8%, taxas desconhecidas por estes lares. A queda da coroa empobreceu todo o país, excepto as empresas exportadoras. Quatro em cada dez lares endividaram-se em divisas ou com créditos ligados à inflação (parece que, em geral, para comprar segundas residências e carros de luxo), o que deixou um buraco considerável no bolso das pessoas. Depois de deixar falir o sistema bancário, o Estado nacionalizou-o e acabou a injectar montões de dinheiro - o equivalente a uma quarta parte do PIB - para que a banca não deixasse de funcionar e agora começa a reprivatizá-lo: a vida, de algum modo, continua igual.
Tudo isso elevou a dívida pública acima de 100% do PIB e para controlar o défice os islandeses nem sequer se livraram da maré de austeridade que percorre a Europa desde o Estreito de Gibraltar até à costa da Gronelândia: mais impostos e menos gastos públicos. No final a Islândia teve que pedir um resgate ao FMI e o Fundo aplicou as receitas habituais: elevaram o IRS e o IVA islandeses e criaram novos impostos, e pelo lado dos gastos baixaram os salários e benefícios sociais e estão a fechar escolas; reduziu-se o Estado social. Que é o que costuma suceder quando de repente um país é menos rico do que pensava.
"Andámos uma década para trás", encerra Bergman. E mesmo assim o governo e o FMI asseguram que a Islândia crescerá este ano uns 3%: a queda da coroa permitiu um arranque das exportações, há sectores de ponta - como o alumínio - que estão a ter uma crise muito proveitosa, e, ao fim e ao cabo, a Islândia é um país jovem com um nível educativo excelente. Entre a dezena de fontes consultadas para esta reportagem, contudo, não abunda o optimismo. Um dos economistas mais brilhantes da Islândia, Gylfi Zoega, desenha um panorama preocupante: "os bancos ainda não estão operacionais, os balanços das empresas estão prejudicados, o acesso ao mercado de capitais está fechado, o governo mostra uma debilidade alarmante. Não há consenso sobre que lugar deve Islândia e a sua economia ocupar no mundo. Vamos à deriva... não se engane: nem sequer o colapso dos bancos foi uma opção; não havia alternativa. A Islândia não pode ser modelo de nada".
Há quem duvide inclusivamente de que os banqueiros venham finalmente a dar com os ossos na cadeia: "os executivos foram detidos várias vezes, e depois, postos em liberdade: como tantas outras vezes, isso é mais uma brincadeira com a opinião pública que outra coisa", assegura Jon Danielsson. Hannes Guissurasson, assessor do anterior governo e conhecido pela sua férrea defesa de postulados neoliberais, até traça uma estreita linha entre o delito e algumas das práticas bancárias dos últimos anos. "Muito poucos banqueiros vão parar à prisão, se é que algum vai: a excessiva tomada de riscos infringe que lei?" pergunta-se.
Mas os mitos são os mitos (e um jornalista deve defender a sua reportagem até ao último parágrafo) e a Islândia deixa várias lições fundamentais. Uma: não está claro se deixar cair um banco é um acto reaccionário ou libertário, mas o custo, ao menos para Islândia, é surpreendentemente baixo; o PIB da Irlanda (cujo governo garantiu toda a dívida bancária) caiu o mesmo e as suas perspectivas de recuperação são piores. Dois: ter moeda própria não é um mau negócio. Em caso de aflição desvaloriza-se e vitória, vitória que se acabou a história; isso permite sair da crise com exportações, algo que nem a Grécia nem a Irlanda (nem a Espanha) podem fazer.
O último e definitivo ensinamento vem da mão do grupo selvagem que ninguém viu vir: nem as agências de notação nem os auditores anteciparam os problemas (ainda que o que uma boa auditoria não descobre, uma boa crise desvela: Pricewaterhousecoopers está acusada de negligência). Mas os problemas estavam aí: a prova é que a imensa maioria dos executivos da banca estão na rua e alguns aguardam julgamento. O nosso Sigurdur Einarsson, o banqueiro mais procurado, tratou de comprar uma mansão em Chelsea, um dos bairros mais exclusivos de Londres, por 12 milhões de euros. A maioria dos banqueiros que tem problemas com a justiça fizeram o mesmo durante os anos do boom, e menos mal que o fizeram: as pessoas apupavam-nos no teatro, atiravam-lhes bolas de neve em plena rua, lançavam bocas nos restaurantes ou deixavam espirituosas pinturas nas casas. Saíram a correr da Islândia. O caso é que Einarsson não teve de sair: vivia na sua estupenda mansão londrina desde 2005. A hipoteca não era problema: Einarsson decidiu alugá-la ao banco enquanto vivia na casa; ao fim e ao cabo, um presidente é um presidente e esse é o tipo de demonstrações de talento financeiro que só trazem surpresas no improvável caso de que a justiça se meta no meio.
A Islândia parece o lugar adequado para que sucedam coisas improváveis: segundo as estatísticas, mais de metade dos islandeses acredita em elfos. No avião de volta percebe-se melhor a publicidade do aeroporto, sobretudo porque as fontes consultadas descartam que, se finalmente há condenação dos banqueiros, o governo islandês vai conceder apenas um indulto. Isto é a Islândia: paraíso sobrenatural. Ai não que não é!
IslandiaO 'caso Icesave' (e outras peculiaridades)
O tubarão putrefacto é um dos pratos típicos da Islândia, que tem uma noite infindável (não só pelas horas de escuridão), uma das poucas primeiras-ministras do mundo (Johana Sigurdardottir, abertamente lésbica) e um museu do pénis (e isto não é uma gralha). A lista de peculiaridades é infindável: é mais fácil entrevistar o presidente da Islândia que o presidente da câmara de Reikiavik, Jon Gnarr, célebre por fazer acordos só com quem tenha visto as quatro temporadas de The Wire. Com a crise, as singularidades alcançaram mesmo o sempre aborrecido sector financeiro: em Londres chegaram a aplicar-lhe métodos antiterroristas.
Landsbanki, um dos três grandes bancos islandeses, abriu uma filial pela Internet com uma conta de poupança a altas taxas de juro, Icesave, que fez furor entre britânicos e holandeses. Quando as coisas começaram a dar para o torto e o governo britânico detectou que o banco estava a repatriar capitais, aplicou-lhe a lei antiterrorista para congelar os fundos. Esse foi o detonador de toda a crise: provocou a falência em cadeia de toda a banca. E continua a dar tremendas dores de cabeça à Islândia.
A Holanda e o Reino Unido devolveram aos seus cidadãos 100% dos depósitos e agora exigem esse dinheiro: 4 mil milhões de euros, um terço do PIB islandês, nada menos. O governo chegou a um acordo para que os cidadãos pagassem em 15 anos e a 5,5% de juro: as pessoas organizaram-se para deitá-lo abaixo num referendo, depois do veto do presidente. Assim chegou um segundo pacto, mais vantajoso (juros de 3%, a pagar em 37 anos), e de novo as pessoas decidirão em Abril em referendo se pagam ou não pelos desmandes dos seus bancos [o artigo foi escrito antes do referendo de dia 9 de Abril, do qual saiu recusado este novo acordo – quase 60% dos islandeses votaram não]. Agni Asgeirsson, ex-executivo que foi despedido da Kaupthing e agora trabalha como engenheiro em Río Tinto, é cortante a esse respeito: "o primeiro acordo era claramente uma fraude. Este é mais discutível. Não queremos pagar, mas isso acrescentaria incerteza legal sobre o futuro do país. Mas interessante é como reagiram as pessoas". Esse é talvez o maior atractivo da resposta islandesa: a parlamentar e ex-magistrada francesa Eva Joly (a quem se atribuiu o início da investigação sobre a banca) assegura que o mais chamativo na Islândia é que num país "que se considerava a si mesmo um milagre neoliberal e onde se tinha perdido gradualmente todo o interesse pela política, agora as pessoas querem ter o destino nas suas próprias mãos".
"Isso sim: a fé nos políticos e nos banqueiros demorará a voltar, antes de muito, muito, tempo", diz a terminar o cônsul de Espanha, Fridrik S. Kristjánsson.

Artigo de Claudi Pérez/El País. Tradução de Paula Sequeiros.

Fonte: Rede Democrática

Grupo de manifestantes rasga revistas Veja em frente à sede da Abril

 
Thaís Naldoni, gerente de Jornalismo de IMPRENSA | 28/10/2011 19:12
Quem passou pela Editora Abril, no final da tarde desta sexta-feira (28), foi surpreendido por um protesto, realizado pelo movimento "Anonymous", junto com integrantes do "Acampa Sampa" 
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Um grupo de cerca de trinta jovens - munido de exemplares da revista Veja, com a chamada de capa "Dez motivos para se indignar com a corrupção", faixas com os dizeres "Chega de Mentira", além de um megafone - parou em frente à sede da Editora para um manifesto contra Veja.

Reprodução
Capa de Veja
Segundo apurou IMPRENSA, o grupo, sob gritos de palavras de ordem, passou a picar exemplares da revista. Alguns dos manifestantes estavam com máscaras semelhantes à que ilustrava a capa da publicação. Os seguranças da Editora Abril se posicionaram em frente à porta giratória de entrada, para impedir que houvesse uma tentativa de invasão.

No Facebook, postado no perfil "#acampasampa" está a explicação para o movimento. Um texto atribuído ao "Anonymous" diz que o grupo, que está acampado desde o dia 15/10 em protesto contra o sistema político-econômico vigente, "recebeu com indignação a matéria de capa da edição de 26 de outubro da revista Veja". "A matéria 'Dez motivos para se indignar com a corrupção' demonstra mais uma vez a tendência conservadora do conselho editorial do grupo Abril, e sua prática de manipulação da informação pelo método de omissão e ênfase", diz o texto.

O grupo afirma, ainda, que a revista "manipula símbolos". "A manipulação de símbolos é flagrante, por exemplo, com o uso descontextualizado da imagem da máscara de Guido Fawkes, que se tornou símbolo dos levantes anticapitalistas no mundo todo, visando canalizar a insatisfação dos 99% da população para as pautas que interessam ao privilegiado grupo econômico da qual a publicação é porta-voz: o empresariado, sobretudo paulista".

Até o fechamento desta nota, a manifestação acontecia de forma pacífica.

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Fonte: Portal Imprensa