Mostrando postagens com marcador COPOM. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador COPOM. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Copom sobe Selic na surdina

06/9/2013 - Por Paulo Kliass, de Paris - Jornal Correio do Brasil

Em seu 6° encontro deste ano, 27-28/ago, o Comitê deliberou mais uma vez pelo aumento da taxa SELIC

Muito pouca gente parece ter se dado conta do acontecimento.

As páginas de economia dos jornalões e os minutos de televisão preferiram não comemorar muito o fato. Afinal, parte da população já começa a perceber os prejuízos que a grande maioria sofre a cada vez que o governo resolve pelo caminho da elevação da taxa oficial de juros.

Apesar disso, o Comitê de Política Monetária (COPOM), em sua 177ª reunião ordinária, decidiu arrochar ainda mais a política monetária praticamente na surdina, quase sem nenhum alarido. Fez tudo no escurinho do cinema, quase incógnito.

Em seu sexto encontro desse ano, realizado em 27 e 28 de agosto, o Comitê deliberou mais uma vez pelo aumento da taxa SELIC. Assim, a taxa referencial de juros saiu dos 8,5% e foi para 9% ao ano. Tratava-se da quarta elevação em reuniões seguidas, em uma trajetória de alta que começou em 17 de abril desse ano. Naquela época, a SELIC estava em 7,25% e desde então passou a sofrer a espiral um novo aumento a cada 45 dias, periodicidade de reuniões do colegiado.

Mas como aquela semana estava totalmente tomada por outros fatos da conjuntura política e econômica, pouca atenção foi dada à decisão. O governo parece completamente perdido no quesito “diretrizes de política econômica”. 

Fica um pouco girando feito biruta de aeroporto, à mercê das mudanças repentinas dos ventos e sem uma linha de conduta racional e coerente a seguir.

As notícias do mundo real da economia não apresentavam nenhuma indicação de risco de descontrole das variáveis econômicas, que pudesse justificar a decisão pelo aumento dos juros oficiais. Essa alternativa não se colocava nem mesmo sob a ótica conservadora, resultado de uma suposta necessidade de promover um controle sobre um possível excesso de demanda.

Elevação da SELIC: o equívoco e o custo
Nesse caso, a estratégia de aumento da taxa oficial de juros obedeceu apenas e tão somente aos interesses da finança. Os únicos a lucrarem com essa política monetária extemporânea são os bancos e as demais instituições do sistema financeiro.

De um lado, se beneficiam pela maior remuneração que passam a receber pela aplicação de seus ativos em títulos da dívida pública. E de outro lado, ganham muito mais ainda pela elevação das taxas cobradas nas operações de crédito e empréstimo concedidas a indivíduos, famílias e empresas.

Em sumo, o que se vê é o governo estimulando e premiando a atividade parasitária do financismo em nossas terras, contra o empreendedorismo da economia real.

Ora, se a Presidenta Dilma estava insatisfeita com o quadro observado até então e reclamando que a economia não deslanchava, algum assessor tinha de lhe explicar que uma das razões para tanto era justamente o problema do elevado custo financeiro das atividades empresariais e o limite para maior nível de endividamento, atingido também pelo lado do consumo. Em tais condições, deve parecer óbvio – até para quem não estudou economia – que aumentar a taxa de juros tem o significado de um verdadeiro tiro no pé. 

Ganham os bancos e os especuladores. Perdemos todos os demais.
Por outro lado, o aumento da taxa de juros também apresenta uma fatura pesada para as próprias finanças públicas.

A taxa SELIC é a que se utiliza, como piso mínimo, para calcular a remuneração dos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional. Considerando-se que o total do estoque da dívida atual é de aproximadamente R$ 2 trilhões, conclui-se sem maiores dificuldades o tamanho da encrenca.

Esse aumento de 0,5% implicará um dispêndio adicional de R$ 10 bilhões no orçamento anual da União, apenas a título de novas despesas com juros. Ora, se a própria Presidenta elegeu o Pacto nº 1 como sendo o de austeridade fiscal, fica evidente que seus próprios auxiliares diretos já começam a descumprir suas recomendações.

Afinal, gastar recurso do Estado – supostamente escasso na atual conjuntura – com rubricas de dimensão financeira não pode ser considerado como bom sinal de rigor no controle da despesa pública.

Semana carregada: de Obama a Donadon
A conjuntura política e econômica estava bastante conturbada. A agenda estava tomada por uma série de eventos e processos de elevada sensibilidade. Terminaram por atrair mais a atenção do que essa reunião do COPOM. Já estava na pauta da política internacional a ameaça dos EUA em invadir a Síria, com a desculpa do suposto uso de armas químicas do governo de Assad contra as oposições. Ainda no plano das relações internacionais, veio à cena as “trapalhadas” dos responsáveis pela diplomacia brasileira na Bolívia, com a fuga espetacular do senador condenado pela justiça, com o auxílio e apoio do embaixador substituto.

A saia justa custou o posto do Ministro Patriota e colocou a nossa Presidenta em dificuldades frente ao Presidente Morales e aos demais parceiros. Por outro lado, vale lembrar que as denúncias de espionagem que a sociedade e o governo brasileiros estão sendo vítimas por parte dos norte-americanos tampouco haviam sido esclarecidas, com a participação direta do Presidente Obama.

Na política interna, o foco estava dividido entre dois pontos. De um lado, a negativa do STF em conceder os embargos dos condenados no caso do mensalão. De outro lado, a verdadeira vergonha nacional, patrocinada pelo plenário da Câmara dos Deputados, ao não proporcionar quórum para a cassação do deputado-presidiário Donadon.

Com uma coleção de itens tão candentes como esses, é até um pouco compreensível que “apenas mais uma reunião do COPOM” não estivesse tão à frente na lista de prioridades de cobertura e preocupação da grande imprensa.

Mas o ponto a se indagar é que até pouco tempo antes do encontro, a queixa generalizada era que a economia continuava patinando e que o Brasil não conseguia decolar para patamares mais interessantes de seu ritmo de atividade.

Mas, como costuma acontecer com certa frequência, as vozes ouvidas pelas editorias de economia dos meios de comunicação foram apenas aquelas vinculadas ao mundo do financismo. Criou-se, assim, mais uma vez o falso consenso em torno do modelito do monetarismo inescapável.

A lógica embutida no raciocínio favorável a mais essa elevação da SELIC voltava-se para os possíveis riscos derivados do movimento de desvalorização cambial. Mas isso não representava novidade alguma. Essa hipótese já estava posta na mesa há muito tempo.

Todos sabiam que o processo de valorização artificial de nossa moeda frente ao dólar norte-americano – e demais moedas estrangeiras consideradas “fortes” – estava com seus dias contados.

Além de ser extremamente perverso para nossa economia, o real valorizado combinava apenas com o interesse do capital especulativo internacional, que para cá se dirige em busca da rentabilidade estratosférica.

Mas o problema é que a equipe econômica há muito tempo se acomodou ao real sobrevalorizado. Os dividendos políticos fáceis derivados da farra dos eletrônicos chineses importados e da festa das famílias de classe média na ponte aérea para Miami devem ter falado mais alto. Valia manter a popularidade alta das pesquisas a qualquer custo.

Desvalorização cambial e a tensão no ar
No entanto, agora que a economia norte-americana começa a dar sinais de reaquecimento, a situação muda de figura. O FED (Banco Central dos EUA) cogita de um aumento na sua taxa básica de juros, depois de um longo período com taxas quase próximas a zero. Com isso, o diferencial de rentabilidade dos especuladores pelo mundo afora muda de patamar. Uma parte dos recursos sai do circuito terceiro-mundista e se volta para lá, em busca dessa alternativa de menor risco e menor remuneração.

Esse movimento de redução da enxurrada de dólares em nossa direção provoca uma tendência de desvalorização do real, no caminho de uma taxa de câmbio mais realista. Normal, é isso mesmo que se espera de uma política cambial menos fantasiosa.

O problema é que esse rearranjo provoca uma elevação de nossos preços internos, em razão da presença forte de produtos e componentes importados em nossa economia. E a inflação ameaçada, atiça os nervos dos monetaristas, que começam a clamar por elevação dos juros. O ciclo se fecha. 

E o COPOM resolve atender aos pleitos das finanças, aumentando outra vez os juros.

Mas o fato é que o governo perdeu a oportunidade de efetuar esse choque de câmbio necessário em um ambiente mais tranquilo, como até há poucos meses atrás. Agora terá de fazê-lo com mais cuidado, pois a inflação já havia iniciado um fase de alta, arriscando chegar na banda superior da meta.

De qualquer forma, existem outros mecanismos de evitar o alastramento da alta de preços provocados pela desvalorização.

E não será a elevação da SELIC a corrigir esse fato. Estão aí outros instrumentos, como o aumento do depósito compulsório dos bancos, a substituição de produtos importados mais sensíveis e a ação mais incisiva do governo junto às empresas e corporações.

Afinal, o mais importante é não se deixar amedrontar pela chantagem e pelo pânico.

Quem não se lembra da “terrível” semana da inflação do tomate, quando tudo parecia perdido, a nos orientarmos pelos editoriais dos grandes meios de comunicação. Amedrontado, o governo também havia cedido às pressões à época e aumentou a SELIC por conta disso.

Mas a safra dos hortifrutigranjeiros obedece a uma dinâmica que nada tem a ver com as decisões do COPOM. Assim, logo depois o tomate voltou aos preços de antes, até mais baixos. O pequeno detalhe é que, apesar disso, a SELIC não baixou.

As informações oriundas da economia real tampouco são muito claras para se perceber uma tendência firme de retomada das atividades no patamar exigido pelo País.

Apesar das boas notícias relativas ao PIB do segundo trimestre (crescimento de 1,5% na comparação com o mesmo período do ano passado), as estatísticas da produção industrial ainda são titubeantes. Em julho ela voltou a recuar 2%, acumulando um crescimento de apenas 0,6% ao longo de 12 meses.

Muito pouco para as nossas necessidades! Frente a esse quadro, a elevação dos juros é um das poucas decisões que o governo deve evitar sem nenhuma vacilação.

(*) Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

Fonte:
http://correiodobrasil.com.br/noticias/opiniao/copom-sobe-selic-na-surdina/642493/?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm_campaign=b20130907

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Ora, então que aumentem o depósito compulsório!

25/07/2013 - Paulo Kliass (*) - do site Carta Maior

Por mais que esperneiem os chapabranquistas inveterados e os governistas de maneira geral, o fato é que a atual conjuntura econômica carrega consigo um grau razoável de incerteza e de insegurança.

Dessa forma, apontar os equívocos da política econômica não pode ser confundido com as críticas apresentadas pelo conservadorismo e pelo financismo, que buscam soluções ainda mais ortodoxas do que as já conservadoras medidas que têm sido implementadas pela equipe econômica.

Pelo contrário, trata-se aqui de apontar caminhos que permitam à nossa sociedade reencontrar o caminho do desenvolvimento sustentável em termos econômicos, sociais e ambientais.

Permanecer calado ou fazer o ilusório jogo do contente é a pior contribuição que se pode oferecer para essa mudança necessária.

Notícias preocupantes: crescimento do PIB, setor externo e emprego

É bem verdade que não estamos ainda em um quadro de recessão ou de estagnação econômica, apesar das expectativas de crescimento do PIB para esse ano se apresentarem como muito mais modestas do que as taxas inicialmente previstas pelo governo.

A Lei de Diretrizes Orçamentárias, encaminhada pelo Executivo ao Congresso Nacional em meados do ano passado, por exemplo, mencionava um crescimento do PIB de 5,5% em 2013.

Hoje em dia, integrantes do próprio Ministério da Fazenda reconhecem que o simples fato de se atingir 2% já pode ser objeto de comemoração.

As estatísticas relativas ao setor externo também são fonte de preocupação.

Apesar da manutenção de superávit na Balança Comercial (diferença entre o total de exportações e importações), a cada mês revela-se mais instável a situação da chamada conta de Transações Correntes, onde são computados os valores relativos às movimentações de natureza financeira do setor externo.

Para o primeiro semestre desse ano, por exemplo, o déficit foi de US$ 43,5 bilhões, um valor 73% mais elevado do que o do mesmo período do ano passado.

Apesar da folga relativa proporcionada pelo elevado estoque de nossas reservas internacionais (US$ 374 bi), o quadro começa a ficar tenso também nas contas externas.

A recente divulgação dos dados oficiais a respeito da dinâmica do emprego também aponta uma criação líquida de postos de trabalho ainda positiva.

O Relatório do CAGED relativo ao primeiro semestre, no entanto, demonstra que os 826 mil postos criados representam um índice 30% inferior ao desempenho do mercado de trabalho observado no período janeiro-junho do ano passado.

Ou então, um crescimento quase 50% inferior aos dados observados para o emprego ao longo do primeiro semestre de 2011.

A conclusão a se tirar é que a economia ainda cresce, mas a uma passada perigosamente mais lenta do que o ritmo observado nos anos anteriores e mais devagar do que o previsto pelo próprio governo.

O equívoco das medidas conservadoras do governo
O cardápio de medidas apresentadas e adotadas pela equipe de Dilma até o momento, no entanto, tem sido muito influenciado pela orientação do conservadorismo.

Em um quadro sensível como esse que vivemos, o governo tenta se vangloriar com um discurso que clama pela austeridade fiscal, que propõe cortes nas despesas públicas, que generaliza a concessão de isenções tributárias ao grande capital, que se orgulha pela geração de superávit primário e que tem provocado a elevação da SELIC durante as últimas 3 reuniões consecutivas do Comitê de Política Monetária (COPOM).

Ora, elas são o tipo de medida que incentiva a paralisia e não a busca do salto para frente, a saída para a crise.

A pretexto de tentar se sair bem na foto e demonstrar uma suposta “seriedade” na condução da política econômica, o que se consegue é promover a aproximação do Brasil às zonas perigosas da retração do nível de atividade.

Porém, os setores ligados aos interesses do capital financeiro não se dão jamais por satisfeitos. Insistem, persistem e repetem “ad nauseam” suas formuletas, supostamente as únicas eficientes para assegurar o equilíbrio macroeconômico.

O mais interessante é que seu raciocínio sempre termina com a exigência pura e simples de uma elevação da taxa de juros. E ponto final!

Em conjunturas passadas, por exemplo, o argumento esgrimado para que Henrique Meirelles mantivesse a SELIC na estratosfera se ancorava na suposta necessidade de oferecer alta rentabilidade ao capital especulativo internacional e assegurar um fluxo de ingresso de recursos externos em direção às nossas praias.

Já nos tempos mais recentes, o argumento utilizado para pressionar por novos aumentos da taxa oficial a cada nova reunião periódica do COPOM tem sido o eterno risco de retorno da inflação.

A manutenção do “tripé” e os juros elevados

Toda a ação no campo da economia está orientada pelo paradigma do famoso “tripé da política econômica”, em vigência desde a edição do Plano Real em 1994.

Criado para tentar por fim à espiral inflacionária que assolava o Brasil há muito tempo, o modelo pressupunha:
a) meta anual de inflação a ser cumprida pelo governo, com um índice como centro (atualmente fixada em 4,5% ao ano) e uma diferença de 2% para cima e para baixo;
b) geração de superávit primário para pagamento de juros e serviços da dívida pública;
c) liberdade de fluxo de capitais externos e na formação da taxa de câmbio.

A variável sobre a qual o governo menos tem capacidade de influenciar é o ritmo de crescimento dos preços.

Os modelos de macroeconomia que embasam esse tipo de ajuste encaram a inflação como sendo um problema de descompasso entre oferta e demanda de bens e serviços no conjunto da sociedade.

Em razão da livre ação das forças no mercado, um determinado volume de demanda agregada maior do que a oferta agregada pode significar fator de desequilíbrio.

Em tais circunstâncias, esse fenômeno tende a provocar preços mais altos nos mercados de bens e serviços, em comparação ao que seriam em situação de suposto equilíbrio.

De acordo com esse raciocínio, caberia à política monetária entrar em ação com o intuito de retirar recursos dessa pressão da demanda sobre a oferta. Esse seria o caminho para reequilibrar os preços de uma forma geral e evitar a inflação. E aqui entra o pulo do gato da política monetária contracionista.

A hipótese subjacente é que a elevação dos juros operaria como atrativo para parcela desses recursos da demanda, que deixariam de se dirigir ao consumo de bens e serviços e seriam reorientados à poupança, em busca da maior rentabilidade oferecida pelos títulos no mercado financeiro.

Como se pode perceber, trata-se de um mundo completamente idealizado, bastante distante da realidade concreta vivida pela maioria da população de um país chamado Brasil no ano de 2013.

As pressões inflacionárias mais recentes não serão resolvidas apenas pelo fato do COPOM aumentar a SELIC, pois a maior parte da pressão sobre a demanda vem de setores que nem tem essa capacidade toda de poupança e muito menos que deixariam de consumir para aplicar seus recursos em títulos oferecidos pelas instituições financeiras.

É o caso típico da tão famosa “inflação do tomate” de alguns meses atrás. Os preços recuaram pela dinâmica cíclica da produção e oferta de determinados alimentos.

O “esquecimento” de uma alternativa: depósito compulsório

Mas então, vá lá, sejamos generosos e vamos conceder um crédito a essa hipótese equivocada - que o problema seja realmente o excesso de demanda agregada e que ela deva mesmo ser reduzida.

Nesse caso, qualquer manual básico de macroeconomia tradicional oferece uma alternativa à elevação da taxa de juros para se obter o mesmo resultado de redução da pressão da demanda sobre a oferta.

Trata-se do aumento da alíquota do depósito compulsório.

O interessante é que nenhum desses sábios do financismo - que enchem a boca para defender maior rigidez na condução da política monetária – menciona essa alternativa a ser utilizada pelo governo.

O depósito compulsório é um instrumento já existente na regulamentação de nosso sistema financeiro e prevê que os bancos sejam obrigados recolher junto ao Banco Central um percentual de todos os seus depósitos.

A ideia é evitar que os bancos emprestem a terceiros um volume muito grande dos recursos que ali são depositados.

Esse mecanismo de controle sobre a chamada “criação monetária” pelo sistema bancário permite, assim, atuar sobre a quantidade de recursos que são canalizados para consumo. Com isso, tem-se uma redução da massa monetária disponível para a demanda agregada.

Atualmente, por exemplo, a alíquota de recolhimento compulsório sobre os depósitos à vista nas instituições financeiras é de 44%. Em outros tempos, já foi bem maior.

No primeiro semestre de 2003, por exemplo, estava em 60%. Em 1999, oscilou entre 65% e 75%. Ou seja, há espaço para uma eventual mudança.

Assim, se o governo pretende realmente “enxugar a liquidez”, como se diz no jargão do economês, ele pode aumentar o nível do depósito compulsório, ao invés de continuar elevando a taxa oficial de juros. O efeito sobre a redução da demanda agregada será no mesmo sentido.

E a maior parte da sociedade ficará agradecida, uma vez que não haverá o enorme impacto negativo sobre as despesas financeiras do orçamento do Estado.

Resta saber se há disposição da equipe de Dilma em contrariar os interesses da banca e liberar recursos para despesa orçamentária nas áreas sociais e não para gastos parasitas com o financismo.

(*) Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=6210

sábado, 20 de abril de 2013

Mais uma rendição ao financismo

18/04/2013 - Paulo Kliass (*) - Carta Maior

A terceira reunião do Comitê de Política Monetária (COPOM) do Banco Central (BC) realizada esse ano acabou por cumprir o ritual que dele esperavam os mais ativos representantes da banca privada.

As semanas que antecederam esse peculiar encontro dos integrantes da diretoria do BC foram marcadas por uma sucessão de lances visando a quebrar a resistência do núcleo central do governo.

E, no final das contas, esses grupos formadores de opinião do mercado financeiro acabaram sendo vitoriosos.

Ao que tudo indica, o “lobby” articulado - principalmente com o apoio dos grandes órgãos de comunicação - conseguiu emplacar mais uma vez a tese do catastrofismo.

Ou o governo endurece com firmeza a política monetária imediatamente, ou abre-se o caminho para o retorno do fantasma incontrolável da inflação elevada”.

Bingo! A taxa oficial de juros, a SELIC, acabou sendo aumentada em 0,25%, passando ao patamar de 7,5% ao ano.

É impressionante como a agenda de debate sobre o fenômeno inflacionário continua sendo sequestrada pelos divulgadores da ortodoxia, sem que haja espaço para ideias e versões mais oxigenadas com ventos portadores de informações mais completas acerca da realidade concreta.

Toda e qualquer tentativa de apresentar alternativas para acompanhamento e mesmo atuação sobre preços é imediatamente taxada de populista, irresponsável e - pasmem! - bolivariano-chavista.

A pauta do clube da finança é composta de apenas um item: elevação da taxa de juros. E ponto final!

Dessa forma, os resultados dos índices de preços coletados por instituições como o IBGE, a FGV, a FIPE, o DIEESE e outros são apresentados de acordo com o menu do dia.

A ideia é sempre passar o clima do desespero anunciado, o dragão que ameaça o retorno a cada período que antecede a reunião do COPOM e exige “rigor e firmeza por parte dos responsáveis pela condução da política monetária”. Haja paciência!

Há outros caminhos além de aumentar a SELIC
O fenômeno inflacionário, no entanto, é muito mais complexo do que uma simples elevação na SELIC possa resolver. E ainda mais em uma realidade como a brasileira, onde o histórico de taxas bastante elevadas de inflação (anteriores ao Plano Real, de 1994) e os recordes catastróficos de taxa real de juros (pós Plano Real) comprometem de forma substantiva aquilo que o economês chama de “eficácia da política monetária no combate à inflação”.

Se por acaso o governo estiver mesmo convencido da tese (equivocada, diga-se de passagem) de que o problema atual da subida dos preços está associado a um excesso de demanda agregada no conjunto da sociedade, então que lance mão de outros instrumentos para conter esse suposto sobre-consumo.

Já escrevi a respeito de alternativas como, por exemplo, o depósito compulsório, instrumento presente em qualquer manual básico de macroeconomia.

Mas o financismo morre de medo dessa medida e, espertamente, esquece de mencioná-la como alternativa à elevação da taxa de juros. Afinal, deixaria de ser aquinhoado com a transferência graciosa de recursos bilionários do orçamento federal.

Mas no momento atual, é totalmente descabida essa interpretação do crescimento dos preços, bem como a utilização da elevação da SELIC para evitar que o processo se mantenha.

Peço desculpas antecipadas aos leitores, mas o assunto exige um detalhamento particular dos dados, para que possamos compreender e debater com a versão conservadora.

O regime de metas de inflação trabalha, para o período atual, com um intervalo entre 2,5% e 6,5% (centro da meta em 4,5%) para que se mantenha um consenso de que o crescimento de preços anual da economia esteja dentro de uma faixa considerada - digamos assim - razoável.

A decomposição do índice de inflação
O índice oficial usado para tanto é o Índice Nacional de Preços de Consumidor Amplo (IPCA), coletado periodicamente pelo IBGE em 11 capitais e regiões metropolitanas, considerando uma cesta idealizada de consumo de um universo de famílias com renda variando entre 1 e 40 salários mínimos.

Os preços são anotados pelos pesquisadores por subitens da estrutura de despesas. E assim consolida-se o crescimento médio e ponderado, chegando-se ao tão famoso índice de inflação, tanto para o mês como para o acumulado para o ano. Então, vamos lá.

Por que a inflação voltou com força ao debate?

Em primeiro lugar, é claro, pelo fato dos indivíduos estarem sentindo, em seu cotidiano, que alguns itens têm ficado mais caros. Ou seja, percebem que o poder de compra de sua renda diminui.

E as manchetes escancaram: inflação supera meta e atinge 6,59%!

Ocorre que a análise mais detalhada de tais informações nos demonstra que os itens que mais contribuíram foram os do subgrupo “alimentação e bebidas” – cujos preços subiram em média 13,5%. Vejamos os demais subgrupos como se comportaram:

Inflação geral: 6,6%

Alimentação e Bebidas: 13,5%
Habitação: 2,9%
Artigos para residência: 2,8%
Vestuário: 6,8%
Transportes: 1,4%
Saúde: 6,3%
Despesas pessoais: 10,7%
Educação: 7,6%
Comunicação: 1,2%

Por outro lado, além de ter apresentado o maior crescimento dos preços, o subgrupo também representa maior participação no total de despesas das famílias e contribui com quase 25% da ponderação no índice final.

Há uma certa sazonalidade na oferta desses produtos, que obedecem a tendências que vão desde a evolução das “commodities” agrícolas no mercado internacional até as safras dos nossos produtos agrícolas e da produção semanal dos hortifrutigranjeiros.

Apesar de ter sido ironicamente classificada como a “inflação do tomate”, o fato é que há outros itens que subiram muito mais do que a média da inflação geral e pesam na composição final do IPCA. E isso a maior parte das donas de casa sabe há muito tempo.

Vejamos o que ocorreu com os produtos que mais subiram no subgrupo:

Farinha de mandioca: 151%
Tomate: 122%
Batata inglesa: 97%
Cebola: 76%
Repolho: 71%
Inhame: 61% 
Aipim: 53%
Alho: 53%
Cenoura: 51%
Feijão mulatinho: 40%

Os demais subgrupos apresentam produtos e serviços dentro da média do crescimento geral dos preços, com raras exceções apresentando crescimento de 2 dígitos, como foi o caso de fumo e cigarros (39%) e alguns serviços pessoais e domésticos nunca superiores a 12%.

Aumento dos juros: medida ineficaz e cara
Ora, parece claro que não precisa ser formado em economia para perceber que o aumento da SELIC em 0,25% não terá efeito absolutamente nenhum sobre esses preços, em especial o dos alimentos.

Aliás, estes já começaram a apresentar uma queda, exatamente por não serem submetidos a regime de monopólio ou oligopólio. As famílias não vão deixar de consumir para aumentar sua poupança, em função do aumento de juros tornar mais atrativas as aplicações oferecidas pelos bancos.

O próprio Ministro Mantega (foto) reconheceu que a elevação dos juros oficiais não terá efeito algum sobre o preço do tomate. Mas, segundo ele, atuará sobre as expectativas de inflação. E aí começamos a entrar em um terreno perigoso e pantanoso.

Isso porque implica aceitação explícita de que o governo está refém do mercado financeiro. Se o financismo exige alta da SELIC com o argumento de que não há outra alternativa para conter os preços, então o governo cede para evitar expectativas de inflação futura.

Não se pode aceitar a chantagem e entrar no jogo da profecia auto-realizada dos formadores de opinião em matéria de economia. Afinal, o universo de pessoas consultadas pela pesquisa Sensus (que baliza as decisões do BC) é todo formado por profissionais do mercado financeiro. Ou seja, são eles mesmos que criam as expectativas que devem ser atendidas. Uma loucura! E esse equívoco estratégico pode custar muito caro!

A Presidenta Dilma ofereceu uma grande contribuição à sociedade brasileira, quando orientou ao Presidente do BC, Alexandre Tombini, que iniciasse uma trajetória de queda da SELIC.

Em 31 de agosto de 2011, o COPOM decidiu reduzir a taxa que estava em 12,5%, promovendo diminuições sistemáticas por 9 reuniões consecutivas.

Desde 10 de outubro de 2012 que a taxa oficial se mantinha em 7,25%.

Mais do que o percentual da elevação, o que mais chama a atenção é essa rendição desnecessária às pressões do financismo.

A decisão vai custar aos cofres públicos a “bagatela” de R$ 5 bilhões anuais, o equivalente ao custo adicional dos 0,25% de aumento da taxa de juros sobre um estoque da dívida pública de R$ 2 trilhões.

O governo costuma apresentar o argumento da seriedade no controle do gasto público quando vem a público justificar medidas de redução de despesas em áreas socialmente sensíveis como previdência, saúde, educação e outras.

No entanto, não vacila um segundo quando se trata de destinar um volume de recursos como esse para uma atividade completamente parasita como as despesas financeiras de juros e serviços da dívida pública.

(*) Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=6055

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade e, excetuando uma ou outra, inexistem no texto original.